quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Quem Haddad será?: Editorial | Folha de S. Paulo

Prioridade de petista é ligar sua imagem à de Lula, o que prejudica a exposição de propostas

A oficialização de Fernando Haddad como candidato a presidente da República pelo PT no lugar de Luiz Inácio Lula da Silva desfaz um segredo de polichinelo.

Pelo menos desde janeiro, quando o Tribunal Regional Federal da 4ª Região confirmou a condenação de Lula pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, sabia-se que, salvo algum casuísmo jurídico inimaginável, o líder máximo do partido não poderia concorrer.

A decisão em segunda instância o tornou inelegível nos termos da Lei da Ficha Limpa, que foi aprovada com amplo apoio da bancada petista e sancionada em 2010 pelo então presidente Lula.

Ainda assim, o ex-mandatário passou os meses seguintes a afirmar, por meio de seus correligionários, que seria candidato. Ele tem, claro, o direito de interpor todos os recursos que entender cabíveis, e é fato que a estratégia de se apresentar como uma vítima do sistema político e judicial encontrou acolhida entre seguidores.

É inegável, porém, que insistir numa ficção significa ludibriar o eleitorado. Agora, a realidade se impôs.

O concorrente oficial, Haddad, dispõe de credenciais administrativas e políticas consideráveis —foi ministro da Educação e prefeito de São Paulo. Nada disso, porém, tem maior relevância na campanha.

Seu ponto forte é Lula ou, mais precisamente, a extraordinária popularidade do líder petista, em especial entre os eleitores mais pobres e menos instruídos. No Datafolha, 33% dizem que votariam com certeza em um postulante apoiado pelo ex-presidente.

Deve-se relativizar a cifra, contudo. A materialização da transferência de votos, ainda mais em situação tão insólita, é fenômeno difícil de prever. No campo da esquerda, ademais, Ciro Gomes (PDT) disputa as preferências com bom desempenho no Nordeste (14%).

Paradoxalmente, Lula também torna Haddad vulnerável. O ex-prefeito de São Paulo surge no pleito na condição de preposto, estafeta —um poste, como se diz no jargão eleitoral— de seu padrinho.

Se tal imagem já não convém a um presidenciável, há o agravante da experiência vivida com o desfecho desastroso do governo de Dilma Rousseff, outra criação lulista.

Outro complicador é que a insistência do partido em carregar a candidatura fictícia de seu cacique até o último instante possível encurtou o espaço de Haddad na propaganda de rádio e TV.

Ele precisará agora dedicar a maior parte do tempo a vincular seu nome ao do ex-presidente. Isso significa que a campanha não terá como foco a exposição de propostas para tirar o país da crise em que a administração petista o lançou.

Dado que o candidato tem chances reais de vitória, a tentativa de associá-lo à memória dos anos Lula, somada a uma discussão programática rasa, eleva os riscos de novo estelionato eleitoral.

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