quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Rosângela Bittar: Uma pedreira no meio do caminho

- Valor Econômico

PT e PSL não dizem a que vieram. Ninguém sabe o que vão fazer

Até a última eleição, a propaganda em horário gratuito no rádio e na televisão era um item fundamental para quem quisesse fazer uma campanha eleitoral competitiva. Essa propaganda é caríssima e os marqueteiros, responsáveis por sua elaboração, tanto caíram nas malhas da Lava-Jato, pelos arranjos de contabilidade e pagamentos ilícitos feitos, quanto agrediram a torto e a direito seus adversários.

Mentiu-se à vontade nessas peças publicitárias plasticamente lindas, a comida sumia da mesa do pobre arrancada por banqueiros malvados, mulheres grávidas, diáfanas, andavam pelos campos verdejantes para defender seu candidato. Sem eliminar essa propaganda não haveria como baratear as campanhas.

A mudança veio sem que os políticos e profissionais da área percebessem. O candidato Geraldo Alckmin (PSDB) disputou, e foi vitorioso, a conquista da mais ampla aliança e ficou com o maior tempo de TV, o que é importante para tornar-se conhecido nos cafundós e difundir suas promessas. Ficou em quarto lugar nos resultados. Não cresceu um décimo na preferência depois de iniciada a fase de propaganda. E não foi só ele que se equivocou sobre os novos tempos. Todos o invejaram e tentaram, antes, ter o amplo apoio para melhorar o tempo de propaganda gratuita.

Em primeiro lugar ficou o candidato que tinha o menor tempo, alguns segundos apenas, e se tornou conhecido nos grotões mais longínquos. Uma propaganda que funcionou muito bem, na TV, foi a reprodução nos jornais de maior audiência da chamada mídia gratuita, reportagem sobre atividades ao longo do dia, algumas delas de sucesso em outros carnavais: a caminhada para abraçar eleitores.

Esta foi a campanha do WhatsApp, todos já sabem, de eficácia percebida só no fim.

O Brasil está coberto pelas comunicações de um e outro meio, bastava aos políticos antenarem-se às transformações da sociedade, dos costumes e do eleitorado. São 17,8 milhões de clientes de TVs por assinatura, apenas, e uma cobertura de 97% com a programação da TV aberta que chega até por antena parabólica ao fim do mundo. São 30 milhões de assinantes de banda larga fixa.

Quanto ao celular, bem, há mais celulares que habitantes no Brasil, e não é porque muitos têm mais de um celular, essa duplicação se reduziu quando começaram a ser reduzidas as taxas cobradas pelas ligações entre operadoras. São 234 milhões de linhas de celular e 208 milhões de habitantes.

A propaganda pela internet foi ampla, geral e eficaz. Já se pode, portanto, começar a reescrever a história das campanhas eleitorais no país.

Outra mudança evidente foi que tradicionais cargos de governo sempre instrumentalizados para renovação de mandatos, de nada adiantaram. Ministros da Educação e das Cidades, por exemplo, ficaram fora do Parlamento, independentemente de seu desempenho que, nos dois casos, foi bem avaliado.

Percebe-se claramente o que não funcionou, e o que funcionou parece também muito claro.

"O mais determinante foi o discurso de rejeição ao PT, que deu certo para Jair Bolsonaro, e o discurso de manipulação, que deu certo para Fernando Haddad", comenta o ministro da Justiça, Torquato Jardim, especialista em legislação eleitoral e partidária, ex-integrante do Tribunal Superior Eleitoral.

O papel das fake news como peças de campanha, que desabaram como avalanche em 2018, é minimizado pelo especialista. "Fake news não tem jeito, pode-se coibir, processar, é caríssimo rastrear, muito difícil. Há estudos que apontam que o Brasil é o país que mais fabrica e mais acredita em fake news".

Desvendado o novo tempo, os políticos já se reposicionaram para o segundo turno? Ainda não. Desde segunda já se pode fazer campanha e as duas candidaturas a presidente estão paralisadas, mergulhadas em reuniões internas e acertos de opiniões de diferentes facções. O PT é o mais preocupado em não dar pistas, com a escolha de nomes e de programas, se vai ou não fazer estelionato eleitoral, como de costume. O PSL empacado na responsabilidade de agora fazer uma propaganda pela TV e rádio, espaço que não teve no primeiro turno, e em elaborar políticas e medidas que pode oferecer.

Não dizem a que vieram. Ninguém sabe o que vão fazer e é isso que preocupa a todos. Quando se pensa no déficit fiscal, na remuneração da dívida pública, no custeio do servidor público, no comprometimento de 92% da receita com o custeio, e confronta-se com o discurso do candidato Haddad, que vai acabar com a PEC de gasto, cancelar a reforma trabalhista, não fazer a reforma da Previdência, parece que o candidato é à P residência de outro país. Jair Bolsonaro e seu tema forte, a segurança, também não deu pistas. O diagnóstico dos problemas de segurança pública está feito em torno de três questões: financiamento, repartição de competências, e corrupção nas polícias civil e militar nos Estados. O que se exige no segundo turno é uma explicitação de como resolver isso.

Se o PT mantiver o discurso do ódio do nós e eles e não tomar as medidas necessárias à correção das contas e criação de emprego, o país vai ruir. Se Bolsonaro não apresentar rapidamente um plano para atacar os problemas que prometeu resolver, seu governo começará no tumulto. Quem já recebeu assessores de um e de outro está impressionado com a falta de noção sobre a administração pública. Até do PT, que acaba de sair de 16 anos de governo.

Outra providência urgente é uma indicação sobre quem e como se vai negociar com Donald Trump. Não é só da OCDE que ele pretende banir o Brasil. Depois de dar uns apertos no México, no Canadá, na Rússia, no Irã, na China, qualquer aluno da Casa de Rio Branco sabe que o próximo da fila é o Brasil.

Renovação?
Difícil falar da renovação extrema no Senado quando Renan Calheiros foi reeleito senador, pelo MDB, e vai pleitear logo ao chegar, por ter a maior bancada, a presidência do Senado. De novo.

Unanimidade
Grace Mendonça, a advogada-geral da União do governo Temer, já tem proposta de trabalho da iniciativa privada. Aliás, tem mais de uma, mas não deve fazer leilão. Só precisa de uma rápida quarentena.

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