Ao fazer o balanço do segundo ano de implementação da agenda de reformas do Banco Central, o presidente da instituição, Ilan Goldfajn, disse na semana passada ter confiança de que ela terá continuidade no governo Jair Bolsonaro. São medidas indispensáveis para injetar mais eficiência e competição no sistema bancário e para fortalecer o arcabouço institucional que assegura autonomia e transparência nas missões do Banco Central de manter a estabilidade monetária e financeira.
Segundo Ilan, já existia uma agenda de reformas microeconômicas dentro do Banco Central antes de sua posse, em maio de 2016. O que a gestão atual teria feito foi apenas aglutinar as ações em andamento, dentro do que passou a chamar de agenda BC+, e comunicar melhor as iniciativas. Essa seria uma evidência de que, mais do que resultado do trabalho de uma ou outra pessoa, trata-se de uma agenda institucional do BC.
De fato, o Banco Central vem mantendo, ao longo dos anos, um trabalho consistente de aperfeiçoamento regulatório, como mostram os seus relatórios anuais de gestão. Mas os progressos são tímidos, com sério risco de retrocessos, se os presidentes do BC e da República não indicarem a direção correta.
Tome-se o exemplo dos compulsórios. De meados de 2016 para cá, o Banco Central promoveu um grande esforço - ainda incompleto - de simplificação das alíquotas de recolhimento obrigatório sobre depósitos feitos ao BC pelo sistema bancário. A preocupação foi reduzir os custos de observância das normas, que no fim são repassados para os clientes dos bancos.
Nos governos Lula e Dilma, as mudanças foram na direção contrária, tornando os compulsórios mais complexos. Logo depois da crise financeira de 2008, o Banco Central adaptou as regras para liberar liquidez para os bancos pequenos e médios, numa ação emergencial meritória. Nos anos seguintes, porém, a liberação de recursos assumiu características de fomento permanente, privilegiando setores da economia, como fabricantes de motocicletas.
No caso do combate aos altos juros cobrados no crédito bancário, a opção foi também pelo intervencionismo estatal. A presidente Dilma Rousseff determinou aos bancos públicos a redução dos juros para injetar competição no mercado. A estratégia funcionou por algum tempo, mas teve que ser abandonada, depois de provocar uma forte queda na rentabilidade dos bancos oficiais, corroendo sua base de capital.
Na gestão Ilan foi retomada a agenda de reformas que, até o primeiro governo Lula, procurava atacar as causas dos altos juros bancários, como a alta inadimplência, o excesso de crédito direcionado e a falta de concorrência no sistema bancário. Entre as iniciativas estão, por exemplo, a limitação do uso do crédito rotativo nos cartões de crédito, a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP) nos empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a regulamentação da Letra Imobiliária Garantida (LIG).
No Congresso, está avançada a tramitação do projeto que regulamenta a relação entre o Banco Central e o Tesouro Nacional, A proposta elimina qualquer resquício de financiamento da dívida pública pela autoridade monetária. Também é fundamental a aprovação da lei que aperfeiçoa as regras do cadastro positivo, que tem sido combatida por poderosos grupos de interesse que atuam no parlamento.
A lei de resolução de crises do sistema financeiro - que ainda não foi formalmente apresentada como projeto - merece subir ao topo na lista de prioridades. Desde a extinção do Proer, o Banco Central está sem instrumentos para combater crises bancárias, que ocorrem de surpresa e podem ter consequências devastadoras na economia. O modelo de "bail in", no qual os acionistas e grandes credores são os primeiros a serem chamados para a cobrir os prejuízos, já está consagrado na prática internacional.
Apesar dos avanços, porém, a agenda BC+ está incompleta. Por isso será fundamental o compromisso do futuro presidente do BC, Roberto Campos Neto, do presidente-eleito, Jair Bolsonaro, e do Congresso Nacional, com sua continuidade. Já há um bem-vindo compromisso com o projeto de autonomia do Banco Central, que não obteve apoio dos presidentes FHC, Lula e Dilma. Todos os pontos da agenda BC+ fazem parte da agenda liberal moderna que o novo governo afirma defender, em que a regulação garante o bom funcionamento do mercado financeiro, com eficiência e competição.
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