- Valor Econômico
Será difícil atuar em 2022 sem começar a articular agora
O apresentador Luciano Huck afirmou anteontem, em um jantar promovido pelo Renova BR na Casa Fasano, que não é hora de fazer oposição. A depender da estratégia de cada um, talvez não seja mesmo, mas o que parece fora de dúvida é que é hora de fazer política.
Será difícil para Luciano Huck, caso ele de fato queira concorrer em 2022, tomar a decisão de lançar-se ou não na tormenta na 25ª hora, como tentou fazer este ano, ao ser pressionado a antecipar sua decisão.
Há uma sensação difusa de que Jair Bolsonaro elegeu-se em um ambiente de repúdio à classe política, nomeadamente ao PT. Ganhou Bolsonaro, como poderia ter ganho Sergio Moro, Joaquim Barbosa ou Huck, caso um 'outsider' se aventurasse. Sobretudo para os dois últimos, o cavalo passeou arreado, para usar um jargão político. Esta é uma sensação bem presente entre as forças do PSDB e de outros partidos que chegaram a apostar no apresentador e que agora veem uma sucessão presidencial mais difícil.
Quem quiser concorrer na próxima eleição antes precisará construir um partido ou aliança, um programa, uma mensagem. Não chegarão três reis magos trazendo ouro, incenso e mirra. O exemplo a ser seguido é o do próprio Bolsonaro, que começou a se apresentar como candidato com enorme, até exagerada antecedência mesmo para os padrões brasileiros: em uma formatura militar de 2014 já se posicionava como presidenciável.
O apresentador terá que explicitar suas intenções mais cedo. Os que conversam com Huck dizem que ele tem consciência de que para chegar a 2022 terá que passar antes por algumas etapas prévias. Ou deixar logo claro que está fora.
A roda deverá começar a girar no próximo mês, com a disposição do PPS em mudar de identidade, trocando até de nome, para credenciar-se como canal para uma coisa nova. Não é segredo que o PPS seria a sigla de Huck, caso ele disputasse eleição este ano.
Segundo o prefeito de Vitória, Luciano Rezende, um cético em relação à disposição do apresentador entrar na cena pública, há desconforto entre os que se filiaram recentemente na sigla - muitos dos quais integrantes dos movimentos de renovação da política - com a palavra "socialista" no nome do partido. "Eu mesmo não sou socialista", diz.
Há também o sentimento de que, no polo oposto ao bolsonarismo, a vertente com maior potencial de crescimento não está à esquerda. A esquerda continua capturada pelo PT e o petismo está encarcerado em Curitiba. O documento divulgado pela cúpula do partido no último fim de semana mostra que a sigla nada esquece e nada aprende, como os Bourbon depois da Revolução Francesa.
Quando se parte do princípio de que o antipetismo explicou a eleição de Bolsonaro, retira-se o peso ideológico da vitória de um ultradireitista. Eleito pela negação, Bolsonaro não representaria uma guinada social. A sociedade estaria onde sempre esteve.
É esta a narrativa de 2018 que parte dos derrotados na eleição de outubro tenta desenvolver. É como se tentassem convencer o interlocutor de que o eleitor não os despreza, rejeita o PT, e que Bolsonaro foi um acidente de percurso, ponto fora da curva. Para os que pensam assim a ameaça ao bolsonarismo, portanto, está no segmento do que se convencionou chamar de "centro".
O diagnóstico dos que se propõem a fazer uma renovação é que este segmento naufragou na eleição por ter ficado excessivamente identificado com a velha política. Em outras palavras, a sobrevivência em 2017 de Michel Temer depois da conversa de porão com o dono da JBS liquidou nas urnas de 2018 o PSDB, MDB, DEM e um vasto et cetera.
O PPS espera receber em sua nova forma gente do Agora! e, quem sabe, o PV e o Rede Sustentabilidade, que podem ter dificuldade de sobreviver em um cenário sem coligações proporcionais e com cláusula de barreira em elevação. O que falta ao agrupamento, e que Huck poderia fornecer, é projeto de poder.
O movimento do PPS, contudo, não é o único que se desenvolve agora e nem Huck é uma alternativa solitária para 2022. O Novo cresceu antes e acima do previsto e irá tentar se credenciar como opção real. O quinto lugar de João Amoêdo na eleição presidencial, o fato de ter passado pela cláusula de barreira e a vitória de Romeu Zema em Minas Gerais fortaleceu a disposição da sigla em dobrar a aposta na próxima eleição. Para um dos candidatos do Novo este ano, o fluminense Marcelo Trindade, o partido deve manter a estratégia de não usar o fundo partidário no processo eleitoral, o que inviabiliza coligações. "É difícil se aliar com quem não pensa assim", comentou Trindade, que disputou o governo do Rio e teve 1,1% dos votos.
A relação do Novo com o entorno de Huck é fria e o partido deve construir candidatura própria em 2022, mas Minas Gerais é um enigma. O Estado lembra a esfinge da tragédia grega, devora os que não o decifram, liquida projetos políticos, não apenas personalidades. Foi assim com todos os governadores eleitos desde 1986, exceto, até certo ponto, Aécio Neves. Se Zema for um fracasso, se Minas permanecer assombrada por mensalões e folhas atrasadas, não há como Amoêdo não pagar a fatura. Se fizer uma gestão exitosa, aí o projeto do Novo em 2022 ganha ímpeto, seja com Amoêdo ou outro candidato.
Militares
São cinco militares no primeiro escalão do governo. Ou seis, caso se considere como tal o futuro ministro da Infraestrutura, que foi do Exército por 16 anos. O segundo escalão também começou a ganhar um tom castrense, como mostrou a indicação ontem do general Floriano Peixoto Neto para um posto na Secretaria-Geral da Presidência ou a do general Theophilo para a Secretaria Nacional da Segurança Pública. Sem contar o general Mourão como vice-presidente. O quadro montado por Bolsonaro torna inevitável olhar algumas fotografias antigas.
Figueiredo assumiu com sete ministros militares ou de origem no Exército, em 1979. No governo Geisel eram seis, sem contar o vice, um general. No de Médici, sete, além do vice almirante. Costa e Silva extrapolou, com oito. Castelo Branco assumiu com cinco.
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