Por Fernando Exman, Marcelo Ribeiro e Fabio Murakawa | Valor Econômico
Para analista do Diap, dificuldades maiores devem aparecer no Senado, onde a renovação foi maior
BRASÍLIA - O governo Jair Bolsonaro inicia hoje o ano legislativo com uma base parlamentar modesta, condição que deve obrigar os seus articuladores políticos a negociar com partidos independentes a aprovação até mesmo projetos de lei ordinária e medidas provisórias. Apesar do otimismo observado no Palácio do Planalto com a formação de uma ala governista robusta capaz de levar adiante propostas que exijam quorum qualificado, como a emenda constitucional da reforma da Previdência Social, parlamentares experientes e analistas políticos alertam para as dificuldades que o presidente da República e a equipe econômica devem enfrentar.
A situação de Bolsonaro é distinta, em relação à enfrentada por seus antecessores neste início de mandato. Embora tenha obtido uma ampla vitória nas eleições de outubro, concorreu com uma chapa composta somente por seu próprio partido e a sigla de seu vice. O PSL terá nesta nova legislatura 52 deputados e quatro senadores, enquanto o PRTB do vice Hamilton Mourão não elegeu parlamentar algum e ainda negocia adesões.
No entanto, um levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) demonstra o poder de atração que o Palácio do Planalto já exerceu sobre parte dos partidos com representação no Congresso Nacional. Segundo a entidade, o apoio consistente ao governo, aquele formado por partidos incondicionalmente fiéis ao Executivo, será de 257 deputados federais e de 37 senadores. Já o apoio condicionado às propostas do governo, aquele negociado caso a caso e que pode mudar de acordo com a conjuntura, será de até 117 deputados e 27 senadores. Bolsonaro enfrentará, portanto, uma oposição de 139 parlamentares na Câmara e de 17 no Senado.
"O governo não terá vida fácil, não tem uma base logo de cara. No Senado, será ainda mais difícil porque o governo nem tem um líder ainda e a renovação foi maior", afirmou ao Valor o analista político do Diap e assessor parlamentar Marcos Verlaine. Para ele, Bolsonaro enfrentará dificuldades para reformar a Previdência, uma vez que a sua proposta não está ainda totalmente definida, deve incorporar uma novidade em relação ao projeto que já tramita na Câmara dos Deputados - o sistema de capitalização - e é mais profunda do que a apresentada pelo ex-presidente Michel Temer.
A reforma da Previdência demandará o apoio de 308 deputados e 49 senadores, em dois turnos de votação em ambas as Casas. Já a aprovação de projetos de lei ordinária e medidas provisórias, por exemplo, exigem maioria simples: os votos favoráveis da maioria dos presentes. Projetos de lei complementar também passam por dois turnos de votação, mas precisam de 257 votos favoráveis na Câmara e 41 no Senado.
Entre os articuladores políticos do Palácio do Planalto, no entanto, existe um maior otimismo. Segundo o Valor apurou, o governo acredita ter uma "base móvel" na Câmara que pode atingir entre 350 e 360 deputados. Para a votação da reforma da Previdência, trabalha com o número de 325 votos a favor de sua proposta na Câmara. Aliados do presidente acreditam que, uma vez aprovada pelos deputados, a reforma não encontraria muitas dificuldades de passar no Senado. Até porque há interesse dos governadores pela aprovação, dizem.
"Já conversei com quase 20 líderes. O sentimento que tive na conversa com eles é que não teriam dificuldade em acompanhar a gente na pauta econômica. A divergência desse apoio condicionado pode acontecer nas pautas de costumes", afirmou ao Valor o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO). "Vamos supor que a gente perca 50% do apoio condicionado, o que é muito, ainda estaríamos perto dos 308 votos necessários para se aprovar PEC. Apesar dos embates naturais e discordâncias que levarão ao aperfeiçoamento do texto [da reforma da Previdência], a gente vai conseguir chegar no número."
Para o deputado José Guimarães (CE), que já liderou a bancada e o governo do PT, a base aliada à administração Bolsonaro se demonstra "frágil". "A base, quem defende hoje o Bolsonaro é a turma que faz política virtualmente. Então, quanto mais desgasta o clã Bolsonaro, envolvido em escândalos de corrupção, e quanto fica claro para o cidadão que a pauta de costumes não enche a barriga de ninguém, eles vão perdendo base", acrescentou o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG). "Começa frágil e tende ficar ainda mais frágil durante o processo."
Integrantes da bancada do PSL já se preparam para se revezar em plenário para defender Bolsonaro e as propostas a serem encaminhadas ao Congresso Nacional pelo governo. Uma ideia aventada por alguns deles, por exemplo, é escalar as mulheres da bancada para o embate mais sistemático com deputadas da oposição. Assim, evitariam críticas à atuação da ala masculina do partido e do governo.
Para o analista político do Diap e assessor parlamentar Marcos Verlaine, o caso envolvendo o senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, perdeu força. Ele disse acreditar que o governo pode usar projetos que tratam de costumes ou de segurança pública para animar sua base, mas deve enfrentar críticas ao aliar-se a figuras tradicionais da política. A oposição, por sua vez, complementa, deve passar a centrar seus esforços no mérito das propostas, e não apenas buscar desgastar o governo por meio de discursos.
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