Marcelo Ribeiro e Raphael Di Cunto | Valor Econômico
BRASÍLIA -O governo tem uma fórmula do que não fazer na relação com o Congresso Nacional, repetida inúmeras vezes pelo presidente Jair Bolsonaro ao anunciar que não fará o presidencialismo de coalizão. No entanto, ainda não sabe como fazer para construir uma base no Congresso, segundo avaliação feita até mesmo por parlamentares aliados. Assessores mais próximos têm apontado o caminho agora: a pressão popular. É improvável, porém, imaginar protestos em frente ao Legislativo pedindo a aprovação da reforma da Previdência - o usual é manifestações para pressionar contra as mudanças nas aposentadorias.
Bolsonaro começou dizendo no governo de transição que negociaria com as bancadas temáticas (agronegócio, evangélica, segurança pública e saúde, por exemplo) e indicou os ministros seguindo essa estratégia, com nomes referendados por frentes suprapartidárias. Mesmo os coordenadores desses grupos eram reticentes a este modelo e o presidente acabou nem tentando votar seus projetos dessa forma - nunca organizou, por exemplo, uma reunião com os ruralistas pedindo o apoio a determinado projeto em votação.
Antes mesmo do início da legislatura, o líder do governo indicado por ele - o deputado major Vítor Hugo (PSL-GO), um parlamentar de primeiro mandato que era consultor legislativo da Câmara até janeiro - disse que a articulação política mudaria de foco e a negociação seria com os partidos. Bolsonaro só se reuniu uma vez com os líderes, às vésperas de mandar a reforma da Previdência ao Congresso. Ontem, em meio à crise com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o presidente reuniu-se com major Vitor Hugo para tratar da Previdência.
Bolsonaro recebeu poucos presidentes de partidos e, segundo dois deles, nunca os convidou para participar da base aliada. E, se não há convite, não há apoio automático, disseram. O governo tampouco tem realizado encontro com partidos antes das votações, prática que era semanal nos governos do PT e MDB. A maioria dos projetos tem andado por acordos fechados na legislatura passada entre as siglas.
O governo terá que começar a mostrar trabalho em breve, quando chegarem ao plenário os primeiros projetos de Bolsonaro: sete medidas provisórias editadas desde janeiro para reestruturação dos ministérios, combate a fraudes no INSS e restrições à contribuição sindical. Nenhuma delas sequer tem comissão instalada para começar a ser discutida.
Assessores do governo defendem usar a "pressão popular" sobre o Congresso porque não seria possível que, no diálogo, os que se "beneficiaram do sistema patrimonialista" e de "esquemas da corrupção e do crime organizado" vão aprovar reformas e o pacote anti-crime".
"A única forma de ativar a lógica da sobrevivência política é por meio da pressão popular, da mesma força que converteu a campanha eleitoral do presidente Bolsonaro em um movimento cívico e tornou possível sua vitória", escreveu o assessor especial da presidência para assuntos internacionais, Filipe Martins. "Já que os deputados acham que seus pedidos não estão sendo atendidos e não se mostram dispostos a apoiar a Nova Previdência, que a sociedade se articule para cobrar de seus representantes as razões que justificam eles sacrificarem o país e fazerem o povo pagar a conta", disse o secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra.
Deputados experientes, contudo, acham improvável a pressão popular a favor da reforma. Relator do projeto do governo Temer, o deputado Arthur Maia (DEM-BA) conta que na semana passada, pela primeira vez em meses, publicou em suas redes sociais um discurso sobre as mudanças na previdência. "Foi bordoada atrás de bordoada. O clima mudou no país e há mais compreensão sobre a necessidade, mas o tema ainda é super criticado", disse.
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