- O Globo
Os potenciais candidatos já se mexem. E, pior para Bolsonaro, são todos do espectro político de centro
O presidente Bolsonaro é especialista em dar tiro no próprio pé, a começar pela introdução no debate, sem razão explícita, de palavras perigosas politicamente, como impeachment, ou delicadas, como reeleição, quando garantira na campanha que mandaria um projeto para o Congresso extinguindo essa possibilidade.
É verdade que os dois temas corriam à boca pequena nas conversas de bastidores dos parlamentares, e mesmo na opinião pública. Bolsonaro pode ter usado uma, reeleição, para neutralizar a outra, impeachment. Mesma tática de Trump.
Mas o fato é que o presidente se isola cada vez mais ao decidir montar em torno de si uma equipe de assessores que valem pela lealdade presumida. Dá a impressão de que se sente dormindo com o inimigo, no sentido figurado hétero, é claro.
Tirou um general de quem era amigo há 40 anos, Santos Cruz, para colocar outro, Luiz Eduardo Ramos, quatro estrelas da ativa e amigo do presidente também há muito tempo.
Tirou o general Floriano Peixoto para colocar em seu lugar o advogado e major da PM da reserva Jorge Antonio de Oliveira Francisco, amigo de seus filhos desde a infância, cujo pai foi chefe de gabinete de Bolsonaro na Câmara. “Um garoto de ouro”, conforme o presidente o definiu na posse.
No campo parlamentar, as dificuldades continuam grandes, mesmo que a reforma da Previdência tenha tudo para ser aprovada. Mas está sendo negociada dentro do Parlamento, sem que a equipe econômica participe, e Paulo Guedes tenha protestado contra os grandes lobbies do serviço público, que teriam tomado conta dos deputados. E vem mais por aí, com uma provável mudança da tabela de transição.
O presidente Bolsonaro ganhou a batalha das nomeações públicas, terminando com o toma lá dá cá e criando o chamado “banco de talentos”. São nomes técnicos indicados por políticos, o que é uma ideia inovadora e, se fosse implementada, seria um avanço no funcionalismo público.
Mas até mesmo esse sistema está emperrado, pela desconfiança que o Palácio do Planalto tem das indicações políticas. Desconfiança, aliás, retribuída. As várias decisões tomadas pela Câmara para limitar os poderes presidenciais, a ponto de Bolsonaro ter dito que querem que seja uma “rainha da Inglaterra”, são retaliações que, pelo ambiente instaurado no Congresso, continuarão.
As reformas econômicas estruturais serão aprovadas, mas dentro do que já está sendo chamado de calendário Maia. A ideia é transmitir imagem positiva do Congresso, afastada da do presidente.
Assim como Bolsonaro abriu prematuramente a discussão sobre reeleição, os potenciais candidatos já se mexem. E, pior para Bolsonaro, são todos do espectro político de centro, e começam a se distanciar dele.
O governador de São Paulo, João Doria, é um deles, e abriu debate contra o apoio de Bolsonaro ao governo do Rio para receber a prova de Fórmula 1. O presidente ironizou o empenho de Doria: “Dizem que quer ser presidente. Se for isso, não tem problema para ele, que tem que pensar no país. Se for candidato à reeleição ao governo, aí pode ter problemas lá no estado dele”.
Doria criticou o Rio, o que não é bom para seus planos nacionais. Ainda mais que ao lado de Bolsonaro está o governador Witzel, que, como o presidente, se preocupa com coisas irrelevantes para o estado, como a Fórmula 1, e é mais de bravatas do que de realizações no campo da segurança pública.
Witzel também se diz candidato a presidente. Embora pareça uma alucinação de uma noite de verão, depois que ele, do nada, se elegeu governador, tudo é possível.
Outro candidato potencial é o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que vem tendo destaque nacional com sua atuação no comando da reforma da Previdência.
O terceiro é o ministro da Justiça, Sergio Moro, o ministro mais popular do governo. No dia 30 teremos uma boa ideia do tamanho dessa popularidade nas manifestações a favor da Lava-Jato e dele próprio, acossado pelos diálogos hackeados. Moro já disse que não seria candidato se Bolsonaro concorrer, mas em política é bom nunca dizer nunca.
Há até uma chapa Moro e Rodrigo Maia sendo cogitada à boca pequena. Ou vice-versa, assim como João Doria também gostaria de ter Moro como vice-presidente. O que parece que não faltará é opção de centro para o eleitor, o que pode fazer Bolsonaro ficar limitado ao eleitorado de extrema direita que, por si só, não o elegeria.
Mas, em política, três anos são uma eternidade. Ainda mais num governo imprevisível como este.
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