- Folha de S. Paulo
Emendas na Previdência preservam economia, mas podam planos liberais do ministro
A reforma da Previdência recauchutada pela Câmara atropela ambições de Paulo Guedes, dificulta a mudança frequente da lei previdenciária e obriga os governadores a pedir votos aos deputados, caso queiram abater os gastos estaduais com aposentadorias. Tem lá também uma esquisitice que quebra as pernas do BNDES.
Caso o relatório emendado pelos deputados seja aprovado no plenário como está, deve resultar em contenção de despesa maior do que a prevista pela reforma Michel Temer, embora a conta de poupar R$ 915 bilhões seja, por ora, chute. Se vier pelo menos o dinheiro, já é lucro. No mais, o espírito da reforma Guedes foi para o vinagre.
É um resumo breve dos efeitos das mudanças na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) de Jair Bolsonaro e Guedes, consolidadas pela comissão especial da Câmara. A reforma é enorme, e certas mudanças, em particular no caso de servidores públicos, ainda serão mastigadas.
De mais notável, a princípio, temos:
Um: está congelado sem dia previsto de degelo o projeto de Guedes criar um regime de capitalização (trabalhadores que entrarão no mercado teriam de poupar para a Previdência em conta individual). A capitalização seria criada por lei complementar, pós-reforma, mas mesmo essa janela foi fechada pelo Câmara, na prática.
Dois: além de reinventar a Previdência, a capitalização seria um meio de acabar com a contribuição patronal para o sistema (sugeria o governo. Ainda não havia projeto de lei oficial). Trabalhadores que optassem por esse regime custariam menos para as empresas, com o que haveria mais empregos, imaginava Guedes. Era, na prática, um modo de embutir o desmanche das leis trabalhistas na reforma da Previdência e, segundo o ministro, mudar o padrão de poupança no país. Não vai passar.
Três: tirar do texto da Constituição o grosso das normas da Previdência ("desconstitucionalização") facilitaria futuras reformas (por exigir menos votos no Congresso). Não vai adiante.
Quatro: no caso da reforma do Regime Geral da Previdência Social (para trabalhadores do "setor privado", grosso modo), não há muita diferença em relação à reforma Temer, em particular na contenção de despesas. O dinheiro adicional da reforma Guedes-Bolsonaro vinha da poupança com o pagamento do abono do PIS/Pasep, que nem bem é assunto previdenciário. De qualquer modo, o talho no pagamento do abono, pago a quem ganha até dois salários, será bem menor do que o previsto, se algum. No mais, a reforma do RGPS não foi pouco emendada.
Cinco: a reforma pode criar tanto problemas quanto soluções para os governadores, por causa de aposentadorias especiais (policiais, bombeiros, professores), embora o aumento da cobrança de contribuição dos servidores tenha ficado na reforma. Só haverá reforma estadual obrigatória se os governadores convencerem o Congresso a recolocar esses dispositivos na PEC, derrubados na comissão especial, atendendo a pedido majoritário na Câmara, que não quer fazer o trabalho pesado sozinha, enquanto os governadores posam de bonzinhos, em especial os do Nordeste, quase todos de esquerda.
Seis: na PEC de Guedes-Bolsonaro, o BNDES perdia parte do dinheiro que recebe do PIS/Pasep (abrigado no FAT), uns R$ 6 bilhões por ano. Agora, vai perder tudo (R$ 18 bilhões), pois o relator quer usar esse dinheiro na Previdência. É mais de um terço da fonte de recursos do BNDES. O banco vai acabar ou virar tamborete?
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