- O Estado de S.Paulo
O anseio dos paulistas era a possibilidade de manter as importantes vitórias sociais que haviam conquistado nos 70 anos anteriores
De 9 de julho a 2 de outubro de 1932, as tropas paulistas, mal armadas, mal treinadas e mal comandadas, com o apoio raquítico de Mato Grosso, lutaram contra a ditadura que governava o Brasil. Chamado de Revolução Constitucionalista, o maior movimento armado do século 20, no Brasil, tinha como mote uma nova Constituição, prometida por Getúlio Vargas, em 1930, mas que ia sendo adiada, transformando o país numa ditadura comandada pelo caudilho gaúcho com o apoio dos “tenentes”, grupo de jovens oficiais do Exército, que desde a década de 1920 tentava dar novo rumo político à nação.
Representado por uma nova Constituição, o anseio dos paulistas era a possibilidade de manter as importantes vitórias sociais que haviam conquistado nos 70 anos anteriores. A única chance de vitória teria sido a marcha fulminante em direção ao Rio de Janeiro, logo após a deflagração do movimento. Quando o coronel Euclides Figueiredo determinou que as tropas parassem na divisa do Estado para aguardar a chegada do general Klinger, escolhido pelos líderes revolucionários para chefe militar do movimento, a derrota no campo de batalha passou a ser uma questão de tempo.
Getúlio Vargas percebeu rapidamente que a sorte havia mudado e começou a asfixiar São Paulo, enviando tropas bem preparadas e bem armadas, em grande parte formadas pelas polícias dos outros Estados, para lutarem contra os revolucionários.
A luta teve momentos de bravura, de covardia, de competência e de incompetência de ambos os lados. Comparada com as grandes guerras que assolaram o mundo, a Revolução de 1932 é um evento menor, com perto de mil mortos. Como contraponto, a Guerra Civil Espanhola deixou mais de um milhão de mortos e desaparecidos em pouco menos de três anos de combates.
Mas 1932 é apenas uma etapa de um movimento muito mais amplo, iniciado em São Paulo na segunda metade do século 19, e que tem como colunas o ciclo do café, a abolição da escravidão, a imigração e os ideais republicanos (bem diferentes dos esposados pelos proclamadores da República).
Os voluntários paulistas pegaram em armas em 1932 porque desejavam manter os avanços sociais que transformaram o Estado na potência econômica do País. Soma das vontades, competências e poder econômico dos paulistas tradicionais e dos imigrantes que vieram aos milhares dos mais variados países para cá, São Paulo era diferente dos demais Estados brasileiros.
A diferença não era apenas no grau de riqueza do Estado, ela permeava a sociedade em escolas públicas de alto nível, atendimento à saúde, em grande parte oferecido pelas Santas Casas, políticas sociais adotadas pelos empresários de comum acordo com os trabalhadores, valores éticos, respeito ao trabalho e ao sucesso individual e contínua busca pela melhora das condições de vida da população.
Ao ver os “tenentes”, apoiados por Getúlio Vargas, tentando mudar o duramente conquistado, os paulistas pegaram em armas para defender os valores morais, o respeito ao trabalho, a educação e a saúde que eram realidade no Estado.
Como diz o poeta Paulo Bomfim, um dos maiores conhecedores da Revolução de 1932, ninguém morre por uma Constituição, muito menos num país com perto de 80% de analfabetos, como era o Brasil à época, o que faz a ideia de Constituição ser algo no mínimo abstrata.
Muito mais que uma Constituição, o que moveu os paulistas foram os princípios éticos que dão dignidade e permitem o desenvolvimento de uma sociedade. Tanto que, já em 1934, São Paulo cria a USP, a primeira e melhor universidade do País, como passo seguinte em sua jornada rumo ao progresso. E até hoje a marcha prossegue.
Pena que nem sempre o Brasil comungou com São Paulo e que, ao longo das últimas décadas, tenhamos perdido os valores que deram vida a 1932. Se eles tivessem sido adotados pela nação o Brasil seria outro País.
*É ex-presidente e atual 1º secretário da Academia Paulista de Letras
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