Como as famílias endividadas, o governo tem procurado cortar gastos e algum resultado positivo aparece, mas insuficiente para deixar a casa em ordem. Ainda será preciso muito esforço e a reforma da Previdência será indispensável ao conserto das contas públicas. Em Brasília, o corte vem funcionando, os gastos vêm sendo contidos e o Tesouro Nacional conseguiu fechar o primeiro semestre no azul, com superávit de R$ 70,52 bilhões no balanço primário, isto é, sem contar os juros vencidos. Como sempre, nem deu para festejar. Todo aquele dinheiro sumiu no buraco de R$ 95 bilhões da Previdência, como tem ocorrido normalmente. Em resumo: apesar do saldo positivo no dia a dia das operações do Tesouro, o governo central fechou a primeira metade do ano com um déficit de R$ 26,67 bilhões. O cálculo inclui um pequeno saldo negativo das operações do Banco Central (BC).
Em conjunto, governos de Estados e municípios, somados a empresas estatais, acumularam no período um superávit de R$ 19,08 bilhões. O balanço geral do setor público foi um déficit primário de R$ 5,74 bilhões, o melhor para os primeiros seis meses do ano desde 2015, no início da grande recessão.
Quando se acrescentam os juros, o resultado é um rombo de R$ 186,85 bilhões, valor correspondente a 5,35% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse enorme saldo negativo, conhecido como resultado nominal, é um dos piores do mundo, mas as contas públicas brasileiras têm aspectos até mais feios e preocupantes quando examinadas de outros ângulos.
É mais fácil avaliar o desastre das finanças públicas a partir de perspectivas mais amplas. Em 12 meses o déficit nominal chegou a R$ 456,89 bilhões, soma equivalente a 6,54% do PIB estimado para o período. Nos países emergentes e em desenvolvimento, esse déficit ficou em média em 3,9% no ano passado e deve bater em 3,8% neste ano, segundo estimativa do Fundo Monetário Internacional.
O rombo da Previdência, de R$ 199,123 bilhões, corresponde sozinho a 2,85% do PIB. Cada novo resultado confirma a impossibilidade de arrumar as finanças públicas sem mexer, seriamente, nos critérios de aposentadorias. Mas ainda há quem negue que o problema exista. O sumidouro das contas previdenciárias é muito mais, embora nem todos percebam esse fato, que um abstrato problema contábil. É uma fonte de grandes danos para toda a sociedade, incluídos os grupos menos preparados para entender o significado dos números.
O rombo da Previdência só é coberto, a cada ano, porque dinheiro do Tesouro é desviado para isso e porque o governo se endivida para cobrir suas necessidades e continuar funcionando. Na prática, esse enorme desarranjo financeiro retira dinheiro de funções essenciais do governo, como segurança, educação, saneamento básico, assistência médica, investimentos em vias de transporte e pesquisas destinadas a facilitar a produção e a elevar o padrão de vida das famílias.
A dívida pública excessiva também prejudica o funcionamento do governo e atrapalha o conjunto da economia. Forçado a renegociar seguidamente compromissos muito pesados, o Tesouro compete com empresas e famílias pelo dinheiro disponível no mercado. Um dos maus efeitos é a persistência de juros muito altos e prejudiciais aos negócios e à criação de empregos.
Em junho, a dívida bruta do governo geral, de R$ 5,50 trilhões, correspondeu a 78,7% do PIB. A proporção foi a mesma do mês anterior, por efeito de fatores passageiros, mas a tendência é de aumento.
A relação dívida/PIB tende a crescer enquanto o governo for incapaz de pagar uma boa parcela dos juros vencidos. Isso será possível somente quando houver superávit primário, isto é, quando sobrar algum dinheiro da operação – já muito deficiente – da chamada máquina pública.
Dívida moderada, controlada e barata pode ser muito útil ao governo, assim como às empresas e às famílias. Crédito pode tornar a vida mais confortável, fortalecer a atividade empresarial e ampliar a ação do governo. Fora de controle, no entanto, a dívida se converte num monstro faminto. É o caso da dívida pública brasileira.
Correção: O número da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de que trata o editorial Aperfeiçoar, não desfigurar (A3, 27/7) é 438/2018.
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