- O Globo
Ao ofender a memória de mais uma vítima da ditadura militar, Bolsonaro voltou a cruzar o limite da decência. A previsão de que ele respeitaria o cargo de presidente estavam furadas
Jair Bolsonaro nunca respeitou a memória das vítimas da ditadura. O capitão se projetou na política como porta-voz dos porões. Notabilizou-se por defender a tortura, insultar os mortos, mentir sobre fatos históricos.
Quando a Câmara homenageou Rubens Paiva, o então deputado cuspiu no busto diante da família. Quando a Justiça Federal ordenou a busca por restos mortais no Araguaia, ele disse que “quem procura osso é cachorro”.
Na votação do impeachment, Bolsonaro exaltou um torturador em rede nacional. Na campanha presidencial, ironizou o assassinato de Vladimir Herzog. “Suicídio acontece”, debochou.
O jornalista foi morto numa cela do DOI-Codi, e os militares alteraram a cena do crime para simular um enforcamento.
No fim de 2018, houve quem apostasse numa guinada do presidente rumo ao equilíbrio e à moderação. Ao assumir o poder, ele abandonaria o radicalismo e passaria a respeitara liturgia do cargo. Os fatos têm demonstra do que essa previsão era furada.
Quase todos os dias, o presidente tem disseminado ódio e preconceito. Ontem, ao ofendera memória de Fernando Santa Cruz, voltou a cruzar o limite da decência. O então estudante tinha 26 anos quando foi capturado pela repressão.
Era pai de um bebê de 2 anos, hoje presidente da Ordem dos Advogados do Brasil. Sua mãe, Elzita Santa Cruz, peregrinou por mais de quatro décadas em busca da verdade. Ela não mudou de endereço nem de número de telefone, à espera de notícias que nunca chegaram. Morreu no mês passado, aos 105 anos, sem conhecer o paradeiro do filho.
Ontem Bolsonaro falou duas vezes sobre o caso. De manhã, para atingir o presidente da OAB, disse saber como o pai dele desapareceu. “Ele não vai querer ouvir a verdade. Eu conto para ele”, provocou.
À tarde, afirmou que Santa Cruz foi morto por outros militantes de esquerda. A versão é desmentida por documentos oficiais: ele estava sob custódia do regime quando desapareceu.
A lei 1.079, de 1950, tipifica os crimes de responsabilidade passíveis de impeachment do presidente da República. Diz o artigo 9º, VII: “Proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário