- O Globo
Ninguém segura essas mulheres
A agenda de Jane Fonda tem as sextas-feiras bloqueadas até o fim do ano. É dia de de ser presa por protestar diante da Casa Branca. Para facilitar as coisas, até se mudou para Washington. Não pretende deixar de se manifestar contra a política ambiental de Trump. Então, toda semana é presa, paga fiança, é solta e recomeça. Carne de pescoço, ela. Há décadas. Desde que, mal saída da adolescência, protestava contra a Guerra do Vietnã.
Não é a única atriz teimosa. Tivemos Leila, Odete, Evas, Tônia, Norma, Ruth, Ítala, Glauce, com Clarice na linha de frente das passeatas em 1968. Em Londres, os protestos do Climate Strike, iniciados pela adolescente Greta Thunberg, tinham Emma Thompson em destaque. Seguia o exemplo de suas conterrâneas Glenda Jackson (até eleita para o Parlamento) e Vanessa Redgrave, ícones da contracultura, sempre atuantes nas causas justas. Nossa diva máxima, Fernanda Montenegro, não está sozinha ao se manifestar contra o cerceamento da liberdade e o descaso com a cultura. E, se Marieta Severo vai prestigiar a neta Clara na montagem de “Roda viva” (peça em que há meio século a avó fez parte do elenco agredido por um comando terrorista), sublinha uma tradição que honra as mulheres de sua geração.
Como Heloisa Buarque, mestra que chega aos 80 abrindo comportas, desafiando e questionando o consagrado. Ou a filósofa Angela Davis, Black Power agora grisalha, recentemente entre nós a prestigiar o feminismo negro. Ou a psicanalista francesa Antoinette Fouque, nos anos 60 uma das criadoras Mouvement de Libération des Femmes, cuja memória foi celebrada por Rosika e Nélida há dias na ABL.
O bastão segue, de mão em mão. Ninguém segura essas mulheres. Andréa Beltrão, de outra geração, nos traz agora sua Antígona. Lembra que não é de hoje que a consciência feminina enfrenta corajosa o poder, como há 2.500 anos Sófocles imortalizou. Todas elas ensinam a não se calar e mostram que o espetáculo continua. Como a vida, à qual as mulheres nos trazem.
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