- Valor Econômico
Aumento da ocupação em ritmo lento limita a recuperação do consumo
O mercado de trabalho dá sinais de melhora, com o avanço um pouco mais forte da criação de vagas com carteira assinada. No mês passado, foram gerados quase 71 mil postos de trabalho formais, num movimento mais disseminado pelos diversos setores da economia, com destaque para o comércio, a construção civil e os serviços. De janeiro a outubro, as contratações com carteira assinada superaram as demissões em quase 842 mil vagas, o melhor resultado para o período em cinco anos, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
São boas notícias, mas a situação no mercado de trabalho ainda é delicada. O desemprego é muito alto, a taxa de subutilização da força de trabalho continua nas alturas e há muitos trabalhadores na informalidade, sem contar o expressivo número de pessoas desocupadas há mais de 24 meses.
Mercado formal reage, mas quadro geral segue difícil
No terceiro trimestre, por exemplo, havia ainda 3,15 milhões de pessoas procurando emprego há dois anos ou mais, o equivalente a 25,2% do total de 12,5 milhões de desempregados no período, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua trimestral. É um número apenas 1,2% menor do que os 3,187 milhões do mesmo trimestre de 2018, indicando uma queda lenta do desemprego de longo prazo. Além da gravidade do resultado em si, trabalhadores que ficam tanto tempo desocupados têm mais dificuldades para voltar ao mercado de trabalho. Há o risco de estarem desatualizados, num cenário em que a tecnologia muda muito rápido.
Outro número preocupante é o da taxa de subutilização da força de trabalho, que ficou em 24% no período de julho a setembro. Isso equivale a 27,5 milhões de pessoas, incluindo, além dos desempregados, quem está empregado mas trabalha menos horas do que gostaria, quem gostaria de trabalhar mas não procurou emprego e quem buscou ocupação, mas não estava disponível para trabalhar (por doença, por exemplo). O número é mais baixo que os 28,4 milhões do segundo trimestre deste ano, mas ainda superior aos 27,2 milhões do terceiro trimestre do ano passado.
Em vários Estados do Nordeste, o quadro é ainda mais dramático. No terceiro trimestre, a taxa de subutilização da força de trabalho chegou a 41,6% no Maranhão, a 41,1% no Piauí, a 39% na Bahia, a 36,3% em Sergipe e a 35,4% no Rio Grande do Norte. O resultado evidencia a disparidade da situação do mercado de trabalho em termos regionais. Em Santa Catarina, por exemplo, a taxa ficou em 10,6%, alcançando 14,7% no Mato Grosso, 16,3% no Rio Grande do Sul e 16,3% no Mato Grosso do Sul. O economista-chefe da corretora Tullett Prebon, Fernando Montero, observa que todos os Estados do Norte e do Nordeste, com exceção de Rondônia, têm taxas de subutilização acima da média nacional, enquanto todos os Estados do Centro-Oeste, do Sudeste e do Sul têm taxas inferiores à média.
Outro aspecto que mostra a situação ainda precária do mercado de trabalho é a fatia dos trabalhadores no setor informal. No terceiro trimestre, a informalidade permaneceu no nível recorde de 41,4% dos ocupados, como destaca Montero, acrescentando que os informais são 47,3% dos empregados no setor privado. Trabalhadores na informalidade têm menos confiança para gastar e têm menos acesso ao crédito, o que os faz consumir menos. Montero nota ainda que, do aumento de 4,368 milhões de empregos dos últimos três anos, mais da metade - 2,286 milhões - é composta por “subocupados por insuficiência de horas trabalhadas”.
O cenário para a renda também é pouco animador. No terceiro trimestre, o rendimento médio dos trabalhadores ficou em R$ 2.298, ainda 0,7% abaixo do observado no mesmo trimestre de 2014, descontando a inflação. Com uma parcela expressiva dos ocupados está na informalidade, muitos trabalhadores têm salários mais baixos.
Todos esses números não desmentem a recuperação em curso do emprego formal, apontada pelo Caged. Outubro foi o sétimo mês de alta consecutiva da criação de vagas com carteira assinada. Nas contas do Itaú Unibanco, foram geradas 63 mil postos de trabalho, na série com ajuste sazonal, o que levou a média de três meses encerrada em outubro para 60 mil empregos, uma aceleração em relação aos 55 mil do mês anterior. Segundo os economistas do banco, isso é consistente com crescimento do PIB de 2,1% em ritmo anualizado, mais que o 1,9% do mês anterior e o 1% de três meses antes.
Nos cálculos da MCM Consultores Associados, a criação de vagas avançou de 61,6 mil em setembro para 73,7 mil em outubro, em termos dessazonalizados. Os principais destaques, de acordo com a consultoria, foram os setores da construção civil, que viu a geração de empregos formais acelerar de 6,5 mil para 10,2 mil, e o comércio, segmento em que a criação de postos de trabalho subiu de 6,7 mil para 21,6 mil, também na série com ajuste sazonal.
A melhora do mercado de trabalho de fato está em curso, mas o caminho até um quadro mais razoável ainda será longo. O país deve ter um quarto trimestre melhor, num cenário marcado por expansão mais forte do crédito, juros mais baixos e liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Para 2020, é possível que o crescimento fique na casa de 2% ou um pouco mais - para 2019, o PIB deve avançar em torno de 1%. No entanto, a queda do desemprego e a geração de empregos de melhor qualidade não deverão ser das mais velozes. Isso acaba por limitar em alguma medida a própria recuperação do consumo das famílias, o componente da demanda que deve puxar a retomada da economia.
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