- Revista Veja
O centro já se move nos preparativos da alternativa aos extremos em 2022
Aquele espaço eleitoral localizado entre Jair Bolsonaro e Luiz Inácio da Silva por onde transitam políticos identificados com correntes do centro à direita civilizada já conta com um plano de ocupação e o nome de um favorito para representá-lo. É Luciano Huck. Ele concorre na preferência com o governador João Doria, mas no momento está em alta no certame dos aprontos preliminares às eleições de 2022.
O processo corre (mais ou menos) em segredo de política, a fim de não queimar etapas nem atrair atritos desnecessários, mas o objetivo está definido: afastar o PT da jogada e conquistar o lugar de antagonista de Bolsonaro, na canoa de quem a maioria desse pessoal embarcou por conveniência em 2018 e de quem se distancia desde o início do governo tido como “tosco” e, por isso mesmo, fator que facilita a aglutinação do centro.
Em público, os artífices da construção daquilo que já esteve em moda chamar de terceira via dizem que é cedo para falar em nomes e assumir candidaturas. Em privado, no entanto, atuam com afinco e o fazem com base em um cenário com os prováveis concorrentes: Bolsonaro, Fernando Haddad ou quem Lula escolher, João Amoêdo, Luciano Huck, João Doria e Ciro Gomes. Rodrigo Maia só entra na lista como possibilidade para vice.
Os trabalhos do centro (chamemos assim, pois até os nitidamente de direita recusam constrangidos o título, mesmo se tidos como “civilizados”) se concentram em Doria e Huck, o primeiro praticamente assumido como candidato e o outro ainda encenando indecisão embora já tenha dado o o.k. aos adeptos e nos bastidores esteja em plena construção da empreitada.
O governador e o apresentador estão sentados numa hipotética gangorra, em que hoje Huck está em alta e Doria em baixa. Isso se depreende das conversas em que são listados os atributos de um e de outro. Sobre o governador só se ouvem pontos negativos: impaciência, deslealdade, discurso radical beirando a intolerância, inabilidade política. O único destaque positivo seria o fato de “ter” São Paulo. Nesse aspecto há quem lembre: Geraldo Alckmin e José Serra também “tinham” São Paulo e perderam duas presidenciais cada um.
A respeito do apresentador há ainda poucas certezas, várias dúvidas, mas muita esperança, o que acaba por contar a favor dele no balanço da gangorra. Entre seus ativos são citados obviamente a visibilidade proporcionada pelo programa na Rede Globo, a quantidade de seguidores em redes sociais na casa dos quase 50 milhões, o empenho em ganhar conteúdo em viagens no Brasil e no exterior para conhecer realidades, projetos e ações bem-sucedidas.
Além disso, há o time composto de dois pilares importantes, Armínio Fraga na economia e Nizan Guanaes na comunicação, mais um grupo de aconselhamento formado por políticos experientes em cujo currículo está a arquitetura da candidatura Fernando Henrique Cardoso na qual o centro se expressou e depois, no governo, predominou.
Pesquisas internas também fazem os humores pender em favor de Huck. Doria aparece nelas com índices em torno de 5%, enquanto o apresentador chega a 16%, com bom grau de aceitação entre os mais pobres e, em âmbito regional, no Nordeste. Esses dois fatores o tornariam apto a entrar na base do PT. Um bom capital, mas ainda tido como insuficiente.
Há desafios a vencer, sendo o principal deles a capacidade de apresentar uma agenda que fale ao bolso, ao coração e ao bem-estar do eleitorado. Um discurso que se coadune com as demandas do mundo real, a fim de que a via alternativa não seja mera representação de equidistância artificial em relação aos extremos. Para isso, na avaliação dos operadores desse campo, é preciso fugir da lógica de acerto de contas com o passado, propor o que fazer daqui em diante entendendo que as pessoas querem emprego, renda e serviços adequados. No mínimo.
O candidato necessariamente terá de mostrar qualificação robusta, um dos motivos pelos quais ainda pairam dúvidas sobre a viabilidade eleitoral de Luciano Huck. E, pelo timing considerado mais adequado para martelos serem batidos em público, ele não terá chance de dirimi-las tão cedo. A ideia é que fique distante da eleição municipal de 2020 e estenda a definição oficial o máximo possível, a fim de não perder o holofote gigantesco da Globo. Quando seria isso? A partir do segundo semestre de 2021.
Um tempo enorme, ainda mais se levado em conta nosso ritmo de montanha-russa na política. O quadro, portanto, senhoras e senhores, é o de hoje devendo ser visto (e talvez anotado) na perspectiva do ponto de partida.
Publicado em VEJA de 27 de novembro de 2019, edição nº 2662
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