- Nas entrelinhas | Correio Braziliense
“Bolsonaro mantém uma posição ambígua em relação aos três projetos enviados pelo governo ao Congresso e um apoio velado à manifestação convocada para 15 de março”
O Congresso Nacional manteve os vetos do presidente Jair Bolsonaro a trechos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020 que tratam do chamado “Orçamento Impositivo” por 398 votos a 2. Quando ocorre uma maioria dessa magnitude, não tenham dúvida, houve um tremendo acordão, ainda que um dos lados, no caso o presidente Jair Bolsonaro, bata no peito e diga que não. O acordo incluiu o envio, pelo Palácio do Planalto, de três projetos para regulamentar o assunto, que serão analisados na próxima semana. Provavelmente, haverá disputa entre grupos governistas e da oposição que discordam do acordo feito nos bastidores da negociação entre a equipe econômica e os líderes do Congresso, principalmente seu presidente, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Há muitos interesses em jogo, além das emendas parlamentares ao Orçamento da União.
Seis vetos foram derrubados pelos congressistas, para impedir o bloqueio de verbas destinadas à pesquisa da Embrapa, Fiocruz, Ipea e IBGE, de autoria do deputado Arnaldo Jardim (SP), líder do Cidadania. Nesse caso, porém, a orientação do governo foi pela derrubada dos vetos. Votaram a favor 282 deputados e 50 senadores (eram necessários 257 e 41 votos, respectivamente). O líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), lembrou que o acordo fora costurado no fim do ano passado e assegura recursos para instituições científicas, inclusive para garantir pesquisas sobre o coronavírus.
A partilha
O grande impasse, porém, era mesmo em relação ao veto 52 de Bolsonaro, mantido pelo Congresso integralmente, relativo a emendas impositivas do relator do Orçamento no valor de R$ 30 bilhões. Com os três projetos encaminhados pelo governo, haverá redução de cerca de R$ 10 bilhões nessas emendas. Com as mudanças, as emendas do relator passam de R$ 30,1 bilhões (incluindo desonerações do Programa Verde e Amarelo, no valor de R$ 1,5 bilhão) para R$ 20,5 bilhões — R$ 9,6 bilhões a menos. As emendas individuais são mantidas em R$ 9,5 bilhões. O mesmo acontece com as emendas de bancada, que somam 5,9 bilhões. E as emendas de comissão permanecem em R$ 700 milhões. Nos bastidores, fala-se que as emendas do relator perderão mais R$ 5 bilhões, ou seja, o governo teria de volta R$ 15 bilhões.
O que mais irritou Bolsonaro não foram as destinações dos recursos, mas os dispositivos que davam poder aos parlamentares para indicar a ordem de prioridade para execução das emendas e o prazo de 90 dias para liberação dos recursos das emendas do relator do Orçamento, com claros objetivos eleitorais, o que o presidente considerou uma usurpação de poder do Executivo. Na verdade, impedia a liberação de recursos para os aliados em detrimento dos adversários.
A origem do conflito é uma mudança constitucional aprovada em 2015, durante a crise do governo Dilma Rousseff, com amplo apoio no Congresso, inclusive do então deputado federal Jair Bolsonaro. Pelas novas regras, as mudanças feitas pelos parlamentares ao Orçamento da União devem ser executadas obrigatoriamente. Na época, o discurso era acabar com o toma lá, dá cá. Há quatro tipos de emendas parlamentares: individuais, feitas por deputado ou senador com mandato vigente; de bancada, que reúnem os parlamentares do mesmo estado ou do Distrito Federal, ainda que sejam de partidos diferentes; de comissões, propostas pelas comissões permanentes ou técnicas da Câmara e do Senado; e do relator do Orçamento, incluídas pelo relator a partir das demandas feitas por outros políticos.
O Palácio do Planalto conduziu mal as negociações durante a aprovação do Orçamento, o que permitiu que o relator-geral, deputado Domingos Neto (PSD-CE), avançasse em R$ 30 bilhões do Orçamento, numa negociação que envolveu principalmente os líderes do Centrão na Câmara (PSL, PL, PP, PSD, MDB, PSDB, Republicanos, DEM, Solidariedade, PTB, Pros, PSC, Avante e Patriota). Bolsonaro tentou resolver o problema vetando as emendas, mas entrou em contradição com os setores do Congresso responsáveis pela aprovação das reformas, contra os quais mobilizou a opinião pública e lançou seus aliados de extrema-direita nas redes sociais. Como não assume o acordão publicamente, mantém uma posição ambígua em relação aos três projetos enviados pelo governo ao Congresso e um apoio velado à manifestação convocada para 15 de março.
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