quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Zuenir Ventura - Não combinou com o vírus

- O Globo

Negacionistas não têm superego, ou seja, são desprovidos de senso de ridículo

 ‘Negacionismo’ é com certeza uma forte candidata ao título de “a palavra do ano” no concurso promovido pela coluna do Ancelmo Gois. De acordo com o “Dicionário crítico de psicanálise”, de Charles Rycroft, uma personalidade negacionista é aquela em que o paciente tem compulsão a opor sua vontade à dos outros, mesmo que isso o prejudique.

Os negacionistas não têm superego, ou seja, são desprovidos de senso de ridículo, só têm ego — e de que tamanho!

O exemplo internacional mais conhecido na política é, claro, Donald Trump, e o nacional, bem, é quase todo o nosso governo federal. Baseados em crenças e teorias conspiratórias, os pacientes desse que é considerado um distúrbio psicossomático negam, entre outras evidências: o aquecimento global, a lei da gravidade, a forma redonda da Terra, o desmatamento da Amazônia, a existência do Holocausto e da Ditadura Militar de 1964.

Há cerca de nove meses, desde que irrompeu a pandemia da Covid-19, o presidente Bolsonaro vem tentando impedir que o país tome consciência da verdadeira dimensão da tragédia e de seus efeitos nocivos. Primeiro, classificou a Covid-19 de “gripezinha”, negando em seguida que exista qualquer gravação mostrando a frase. Seria mais uma invenção da “grande mídia”, que ele desafiava a provar: “Não existe um vídeo ou um áudio meu falando disso”.

Em março deste ano, porém, o presidente usou a expressão pelo menos duas vezes publicamente. Uma delas em coletiva de imprensa no dia 20 de março: “Depois da facada, não vai ser uma gripezinha que vai me derrubar, talquei?”.

Na quinta-feira passada, num evento em Porto Alegre, ele voltou ao tema, garantindo estarmos “no finalzinho da pandemia”. Nesse mesmo dia, 21 estados e o Distrito Federal atingiam a alta na média móvel de mortes pela Covid-19.

Acho bom não contrariar o Bolsonaro, não convém. Mas dizer, com jeito, que da próxima vez ele não pode esquecer, precisa combinar antes o “finalzinho” com o vírus, talquei?

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