Rumo
à reeleição, afloram os piores instintos políticos. A busca por adesões excita
os currais
Para
quem não está entendendo o sucesso da plataforma eleitoral antipovo do
candidato Arthur Lira à
presidência da Câmara,
inclusive com o embarque da esquerda na caravana bolsonarista, aqui vai uma
explicação. O deputado alagoano e suas costas quentes exploram muito bem, pois
a conhecem profundamente, a oportunidade que o calendário oferece.
O
tempo do Congresso se
divide em dois. No primeiro, os dois anos iniciais do mandato, procuram-se
realizar os avanços e as reformas. No segundo biênio, o bom senso dá lugar ao
vale-tudo da renovação dos mandatos. Quando coincide com a campanha da
reeleição também do presidente da República, a confluência de interesses chega
ao paroxismo. É o que está se vendo neste momento.
Deputados e senadores só pensam em poder, emendas e cargos que os ajudem eleitoralmente. No Senado os prazos são outros, pois o mandato é de oito anos, mas a essência é a mesma.
O ex-deputado e ex-ministro Roberto Brant, com sabedoria mineira, costumava comparar o que ali se passava com as diferentes etapas de uma festa: até a metade, os convidados mantêm a compostura e a elegância, conservam o glamour das novas ideias que trouxeram de casa. Mas, ao bater a meia-noite, tendem ao desespero. Jogam para o ar o que tinham de melhor e partem para o uso e o abuso.
Rumo
à reeleição, afloram os piores instintos políticos. A busca por adesões excita
os currais. Principalmente se quem vai exercer o poder o faz em nome do
presidente da República.
Avanços
políticos, alguns verdadeiramente civilizatórios, como foi a extinção do
imposto sindical, voltam à mesa de negociação com cínica naturalidade.
Celebrado no passado como novo sindicalismo, tal como Jair Bolsonaro foi celebrado como
nova política, o malfadado imposto foi reprovado com amplo apoio popular. Para
os que dele viviam, os chamados pelegos, a extinção teria sido a razão do
enfraquecimento dos sindicatos. Raciocínio que é uma impostura. Sem ele, os sindicatos
ganharam autenticidade. Ao associar-se ao projeto, a esquerda atinge o
trabalhador em uma de suas mais difíceis conquistas.
Na
cabala de votos, sobretudo do PT,
o candidato bolsonarista se solidariza também com o período do uso da Petrobrás na montagem de um
extenso esquema de corrupção. Acena com a facilitação da volta da candidatura
Lula por intermédio da desmoralização da Operação Lava Jato,
já abalada por certos equívocos dos principais condutores das investigações.
Momento em que os extremos se encontram. Todos deliram na mesma farra eleitoral
embora saibam que, Lula,
candidato, nunca mais.
Incluiu-se
na barganha temática um tranco na Lei da Ficha Limpa,
outro avanço com apoio popular prestes a ser perdido. O candidato bolsonarista
promete atenuar a lei, quem sabe, abrindo uma janela de fuga. As lacunas são
conhecidas, entre elas uma das piores é o poder de juízes locais de fustigar os
inimigos políticos com um peteleco jurídico, mas não é nesta circunstância que
a discussão será justa e eficiente.
De
posse da chave do cofre do governo nesta campanha, o candidato bolsonarista à
presidência da Câmara promete reabastecê-lo de recursos, com a aprovação da
também defenestrada CPMF.
Uma regressão em proporções nunca vistas, camuflada pela infamante versão de
que o único obstáculo ao absurdo imposto sobre transações era um capricho do
atual presidente da Câmara. O fantasma da meia-noite da virada do mandato
vestiu, com isso, sua máscara. A Câmara inteira era aliada da sociedade, contra
o imposto. Não se sabe como será agora.
Se ficar a serviço deste projeto de poder, o Congresso deixa de ser proteção para ser ameaça. Pode-se prever o quadro de desequilíbrio que vem por aí. A economia, mal; a recuperação, incerta; o desemprego, subindo; o isolamento internacional, absoluto; o Congresso, servil. Para a sociedade, perplexa, nega-se até a vacina contra a morte.
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