- O Globo
O Banco Central cortou a Selic, dentro do esperado, e rompeu mais uma vez o piso histórico. Mas qual o efeito disso na economia? Ajudará a amenizar o custo da dívida, isso representa em torno de R$ 20 bilhões a menos de pagamento de juros. Mas o grande resultado que se busca com a queda da taxa básica é o estímulo à atividade econômica. Desde a última reunião do Copom, a previsão do PIB de 2020 saiu de uma recessão leve (-0,9%) para um tombo histórico (-6,51%) no Boletim Focus. E certamente a projeção vai piorar nas próximas semanas. Menos juros e mais liquidez oferecida aos bancos deveriam atenuar a recessão, mas até agora nada garante esse efeito. Primeiro, porque a taxa menor não tem chegado na ponta e as empresas micro, pequenas e médias não têm tido acesso às linhas que o governo criou no contexto da pandemia.
Os dados de abril vislumbram a queda livre da economia: produção industrial, vendas do varejo e serviços tiveram quedas entre 11% e 18% em relação a março. O desemprego oculto, segundo o IBGE, pode estar atingindo 17 milhões de brasileiros que não procuram emprego porque acham que não vão encontrar. Além dos que já estão desempregados. Tudo é absolutamente incerto na economia. A bolsa e o dólar estão numa gangorra. Na última reunião do Copom, o dólar estava subindo. No dia 14 de maio chegou a R$ 5,93, em 10 de junho havia caído para R$ 4,88 e ontem estava em R$ 5,24. Os ativos têm oscilado por fatores externos. Refletem a esperança de recuperação mais rápida de economias centrais, o medo da segunda onda, a expectativa de um remédio ou uma vacina. O ruído político, provocado por um governo que não sabe governar, mas adora criar confusão, é grande. Quando é levado em conta, atrapalha ainda mais a economia.
Diante dessa incerteza provocada pela pandemia, e pela incompetência do governo, reduzir a taxa de juros para níveis nunca antes vistos não vai atenuar a queda da atividade. Mas é um movimento natural diante de uma economia que está em deflação e na qual se fala a inédita palavra “depressão”. A queda dos juros tem a vantagem de tornar mais baixo o custo de uma dívida que está subindo. Essa queda da Selic começou no governo Temer, que a pegou em 14,25% e a deixou em 6,5%. No governo Bolsonaro, continuaram os cortes e, com a crise, eles se aprofundaram até os 2,25% decididos ontem. Cada ponto a menos significa teoricamente um gasto menor de R$ 30 bilhões. Mas isso se na equação tudo o mais permanecer constante. A dívida bruta tem subido, a taxa longa nem sempre tem o mesmo movimento. Além disso, como parte das reservas está investida em papel do Tesouro americano, que está rendendo menos, o custo da dívida tem se mantido constante nos dois últimos anos, em torno de R$ 380 bilhões líquidos, segundo dados do Banco Central.
O Copom disse que o corte dos juros até agora “parece compatível com os impactos econômicos da pandemia”. Apesar de ter indicado na última reunião que esse seria o corte que encerraria o atual ciclo de relaxamento monetário, no comunicado após a decisão de ontem houve uma abertura para uma nova queda, dependendo da análise que fizerem dos impactos da Covid-19 e do efeito das medidas de crédito e de recomposição da renda.
Na verdade, novas reduções dos juros não ajudam muito. O Banco Central participou há três meses do anúncio no Palácio do Planalto de medidas de socorro a empresas, como a linha para cobrir o pagamento da folha, que nunca virou realidade. Até agora, três meses depois da primeira morte, o ministro Paulo Guedes disse ontem que o governo está finalizando o programa emergencial para minimizar os efeitos da pandemia. Várias das medidas anunciadas não se tornaram realidade.
Guedes, ao falar do que ele chama de segunda onda, a da crise econômica, disse que é consequência de termos “paralisado parcialmente a nossa economia” e que isso provocou “uma recessão que pode se transformar em uma depressão se não lutarmos adequadamente”.
Guedes acha que a luta adequada é a retomada das reformas. O momento, contudo, ainda é das medidas emergenciais para evitar a morte serial de empresas. E isso se faz com projetos que não sejam apenas peças de propaganda governamental, mas cheguem aos cofres das empresas, principalmente as micro, pequenas e médias.
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