sábado, 26 de junho de 2021

Cristovam Buarque* - O bloco do avanço

Blog do Noblat / Metrópoles

Se não há esquerda e direita, também não há centro

Aqueles que aparecem na foto como representantes do “centro” costumam dizer que não há mais “esquerda” e “direita” no espectro político. Se não há esquerda e direita, também não há centro. Os conceitos das palavras esquerda e direita perderam seus significados tradicionais, no qual esquerda significava sintonia com avanços sociais, tecnológicos e econômicos, e direita significava conservadorismo contra avanços. Ao longo de décadas do século XX, as forças de esquerda empurraram reformas sociais em benefício de trabalhadoras e pobres, além de auxiliar no avanço econômico. A direita se manifestava contra as reformas até mesmo promovendo e dando sustentação a golpes autoritários.

Mas as revoluções tecnológicas e geopolíticas das últimas décadas do século XX – globalização, limites ecológicos ao crescimento, automação, esgotamento fiscal, gerencial e ético do Estado – terminaram ameaçando ganhos das classes trabalhadoras e colocando as forças de esquerda na defesa dos interesses destes grupos, mesmo sacrificando o progresso ao se posicionar contra as reformas do interesse dos grupos que ficaram excluídos, principalmente os pobres e as gerações futuras. Por sua vez, a direita passou a defender reformas que beneficiam aos donos do capital. Necessárias ao avanço econômico, mas que não beneficiam aos pobres e ainda tiram direitos de trabalhadores. A direita continuou direita do ponto de vista social e ecológico. A esquerda passou a ser direita do ponto de vista tecnológico, social e ecológico, ao se posicionar contra reformas necessárias, no lugar de apontar na direção de reformas estruturais progressistas, em sintonia com o avanço técnico, o progresso econômico, a justiça social e a sustentabilidade ecológica e fiscal.

Embora mudem a definição de conservadores e progressistas, a política requer a organização de forças políticas que lutem para superar o quadro de pobreza e o fim da apartação, distribuir renda, submeter a economia ao equilíbrio ecológico, entender a realidade da globalização e do esgotamento do Estado, dar eficiência e confiança à economia, fortalecer as instituições democráticas.

A política exige a organização dos que defendem estas bases para o futuro, e elabore e execute uma estratégia nesta direção. Chamar este grupo de nova esquerda pode confundir com a velha esquerda conservadora, que ficou para trás na defesa de benefícios sociais que já não refletem sintonia com o futuro, por representar apenas os trabalhadores do setor moderno e por ameaçar a sustentabilidade fiscal, provocando o sacrifício dos pobres e dos assalariados por causa da inflação. Este bloco do avanço requer um nome que o identifique, seja quadrado, redondo, vermelho, ou esquerda. Sem isto a política ficará sem definição de diferenças entre os que a praticam e disputam o poder, todos se sentindo o centro sem lados.

*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador

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