O Globo
João Doria, Eduardo Paes e Flávio Dino
estão se provocando no Twitter para ver quem vacina mais, no que chamam de uma
“corrida do bem”. O esforço por imunizar mais gente, na leitura dos políticos,
seria uma disputa saudável, pela vida. Mas, por trás da brincadeira, vemos uma
briga por protagonismo político, de olho nas eleições, que está desorganizando
ainda mais o planejamento nacional da vacinação.
O Ministério da Saúde distribui as vacinas
aos estados em partes iguais, na proporção do público-alvo do Programa Nacional
de Imunizações. Como é possível então que São Paulo já esteja imunizando quem
tem 43 anos enquanto Minas Gerais, no critério de idade, parou na população
acima de 60?
Há três possibilidades para explicar a diferença. A otimista, mas também a mais improvável, é que se trata de uma superioridade logística e operacional dos paulistas. São Paulo estaria distribuindo e aplicando as doses de maneira muito mais rápida que Minas. Mas a diferença é tão grande e a opacidade dos dados tamanha, que faz pensar que pelo menos uma de duas outras coisas está acontecendo.
A segunda possibilidade é que os estados
adiantados estejam usando para a primeira dose parte do estoque que deveria ser
usado para a segunda. Se isso estiver acontecendo, a antecipação da vacinação
deixa de ser um sinal de sucesso, para ser um problema, e dos mais graves,
porque aplicamos muitas doses da CoronaVac, que oferece proteção muito baixa,
na primeira dose.
A terceira possibilidade é que um número
grande de pessoas dos grupos-alvo anteriores, como os mais velhos ou com
comorbidade, tenha ficado para trás, sem vacina.
É difícil dizer quanto isso aconteceu
porque simplesmente não sabemos quantos estavam no público-alvo. Não sabemos
quantas pessoas em cada localidade têm comorbidades. Na verdade, não sabemos
com precisão sequer a população por faixa etária, uma vez que nosso último
Censo foi em 2010.
E, como se navegar na penumbra não fosse
suficiente, ainda temos o problema de quem se vacina fora da sua cidade. O
problema, segundo a Fiocruz, é enorme: 15% dos imunizados, um em cada seis, se
vacinaram em outra cidade, se deslocando em média 252 quilômetros.
São cerca de três horas de viagem de carro,
o que sugere que parte desses 11 milhões de brasileiros pode ter ido a outro
estado para se vacinar buscando um calendário mais vantajoso. Isso gerará
distorções muito significativas na distribuição das doses entre os estados e os
municípios e poderá acentuar ainda mais o problema de quem não toma a segunda
dose.
A falta de coordenação da campanha nacional
de imunização não pode ser vista como uma corrida pela vida. Ela está deixando
pessoas que não foram aos postos sem vacina, pessoas que se imunizaram na
primeira dose sem a segunda dose e dificultará a distribuição equitativa. O
problema começa com o Ministério da Saúde, mas envolve também os governantes
“do bem”.
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