O Estado de S. Paulo
O desfile de blindados promovido pelo
ministro da Defesa e pelo presidente da República, mais que fuligem, deixou no
ar o sentimento de tristeza e impotência. Num clima de águas malparadas, o País
mora no impasse. Quando isso ocorre, o vencedor é sempre o constrangimento. E o
dia foi de muitos constrangimentos: da sociedade, da economia, dos poderes e
até dos militares – as Forças Armadas do Brasil mereciam outro destino.
O vexame democrático e institucional é inegável e não tem como voltar atrás. Agosto é mesmo mês de desgosto e são quase três anos de “agostos”. A repercussão internacional dos tanques envelhecidos, enchendo a Praça dos Três Poderes de fumaça, foi péssima. Essa desinteligência retrai investimentos, afeta a economia, reduz qualquer esperança. Empresários e operadores de mercado já se dão conta de que, desse modo, o Brasil não irá longe.
A índole autoritária do presidente é
superlativa. Mas não resulta em vitórias claras. O desfile militar no dia da
votação da PEC do voto impresso foi um tiro no pé, pois deixou claro que se
trata de governo sem direção estratégica, forjado na truculência e no
improviso. Foi assim a tentativa de pressionar o Congresso. Nas últimas horas,
a intimidação vinha por meio de pastores, ministros, verbas e redes
bolsonaristas. Sendo a derrota inevitável, para Bolsonaro era importante não
levar goleada. No papel de vítima de complô, poderia se agarrar à retórica da
fraude eleitoral. É seu refúgio. No entanto, das redes sociais brotaram memes
de sarcasmo: sabe-se que do abismo e do ridículo não há volta.
Assim, a Câmara votou dividida entre
deputados afirmativos, revoltados, constrangidos, oportunistas e pusilânimes. O
placar não foi avassalador. Impassível, o constrangimento segue sua trajetória.
Pressões sobre os poderes e a sociedade seguirão em desfile, é da natureza de
Jair Bolsonaro e seus seguidores. Resta o silêncio apreensivo.
*Cientista político e professor do Insper
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