Professor não vê condições para um golpe militar no país porque apoio a Jair Bolsonaro não seria unânime no Comando das Forças Armadas
Sérgio Roxo / O Globo
SÃO PAULO - Historiador que se dedica a
analisar a participação dos militares na política brasileira, José Murilo de
Carvalho avalia que a participação da Marinha no desfile de tanques realizado
ontem em Brasília surpreendeu porque a Força é a mais profissionalizada. Ele vê
o dedo do ministro da Defesa, general Braga Netto, no episódio. Autor do livro
“Forças Armadas e Política no Brasil”, Carvalho acredita que não há condições
para um golpe militar no país porque isso só pode ocorrer quando existe apoio
unânime do Alto Comando das três Forças, o que, no momento, não haveria.
Qual o significado histórico do desfile de
tanques na Esplanada dos Ministérios ontem em Brasília?
Tropa circundando o Congresso é mau agouro,
lembra 12 de novembro de 1823, quando d. Pedro I fechou a Assembleia
Constituinte, e 10 de novembro de 1937, quando Getúlio Vargas fechou o
Congresso.
Ao realizar o desfile, o Exército mostra
que capitulou ao plano do presidente Jair Bolsonaro?
O que mais surpreendeu e desapontou foi a
participação da Marinha, a Força mais profissionalizada. As manobras eram dela,
e alegar que o desfile com tanques se destinava a convidar o presidente para
assistir chega a ser risível. Aí deve haver dedo do general bolsonarista (Braga
Netto), ministro da Defesa.
Em março, houve a troca do comando das três
Forças e do ministro da Defesa, Fernando Azevedo, por causa de resistências a
cumprir pedidos de Bolsonaro. O Exército se transformou num instrumento da
política do presidente?
Ainda acredito que essa não seja a posição majoritária do Alto Comando da Força. O desgaste político da imagem seria grande.
Como esse episódio pode afetar as eleições
presidenciais de 2022?
Com rejeição da PEC (Proposta de Emenda
Constitucional) do voto impresso, o presidente terá que inventar outros truques
para melar as eleições.
O senhor vê risco de ocorrer um golpe no
país com o apoio dos militares?
Golpe só com apoio unânime, ou amplamente
majoritário, dos Altos Comandos das três Forças. Ainda não vejo tal condição.
Como depois de 1964, há uma linha dura que hoje cerca o presidente, e os
moderados. Não creio que a linha dura seja majoritária dentro das Forças
Armadas.
O que as Forças Armadas precisariam fazer
para se desvincular do projeto político do presidente Jair Bolsonaro?
Os Altos Comandos precisariam avaliar com cuidado o dano que uma aventura golpista traria para a imagem das Forças e do país, aqui e no exterior. Seríamos uma segunda Venezuela. Não há mais Guerra Fria para usar como desculpa (como ocorreu em 1964).
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