sábado, 20 de novembro de 2021

João Gabriel de Lima* - A gente não quer só dinheiro

O Estado de S. Paulo

O que faz a diferença no combate à pobreza e à desigualdade é o conjunto de políticas públicas

Bolsa do Povo, Vale Gás, Auxílio Brasil.

Como o Estadão mostrou nesta semana, em reportagem de Adriana Ferraz e Davi Medeiros, programas de transferência de renda para a população vulnerável multiplicam-se pelo País. Eles são bem recebidos na emergência econômica em que vivemos, em que os brasileiros sofrem com a inflação e o desemprego em alta. Pelo mesmo motivo, rendem votos num ano eleitoral.

Surge a pergunta: para além de resolver carências imediatas, até que ponto tais programas são eficazes em combater pobreza e desigualdade, nossos flagelos históricos, no médio e longo prazo?

A resposta passa pelo grupo de estudiosos que, desde os anos 1990, vêm elevando o nível do debate sobre o assunto no Brasil. Um dos principais integrantes da turma, Ricardo Paes de Barros, pesquisador do Insper, acaba de lançar, em parceria com vários acadêmicos, um estudo sobre a queda da desigualdade no Brasil no início deste século. PB, como é conhecido, e Laura Muller Machado, ambos do grupo de autores do estudo, são os entrevistados do minipodcast da semana.

PB colaborou com os governos de Fernando Henrique, Lula, Dilma e Temer. Em reportagem publicada na revista piauí, “Um liberal contra a miséria” – referência à sua formação na Universidade de Chicago – PB sugere que tal batalha deve transcender os debates entre “esquerda” e “direita”, dada a magnitude da questão.

Um dos méritos do novo estudo é mostrar, com mais clareza que trabalhos anteriores, a importância do que os pesquisadores do Insper chamam de renda não-monetária. Eles calcularam o valor de políticas sociais, como saúde e educação, no orçamento dos cidadãos vulneráveis. Benefícios como distribuição de remédios e material escolar também foram computados. Ou seja, não é só dinheiro. O que faz diferença é todo um conjunto de políticas bem estruturadas que garantam uma vida digna.

De acordo com os cálculos dos pesquisadores, o índice de Gini, principal métrica de desigualdade, recuou 3 pontos entre 2002 e 2017, o período de abrangência do estudo. Pelo menos 1 desses 3 pontos se deve a políticas públicas. “O gasto social do Brasil se elevou de R$ 372 bilhões para R$ 698 bilhões no período estudado, em valores corrigidos”, diz PB. “A diminuição na desigualdade mostra que tal investimento teve um retorno efetivo”.

Os autores admitem que o gasto social brasileiro poderia ser mais eficiente. Nosso País, no entanto, já foi referência mundial em diminuição de pobreza e desigualdade. Os responsáveis por essa façanha – PB e seu time entre eles – são bemvindos ao debate eleitoral que acaba de começar.

*Escritor, professor da Faap e doutorando em Ciência Política na Universidade de Lisboa

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