O Globo
Com os partidos postulantes a uma cada vez
mais distante terceira via despejando votos a favor de Jair Bolsonaro, o
Tribunal de Contas da União “integrado” ao governo, como disse o presidente, e
o orçamento secreto de Arthur Lira comendo solto, quem poderá frear o vale-tudo
visto para a aprovação da excrescência batizada de PEC dos Precatórios?
Como sempre, os olhos estão voltados para o
Supremo Tribunal Federal. Primeiro na análise da constitucionalidade da emenda
que, numa só tacada, deu um calote no pagamento de precatórios e arrombou o
teto de gastos. Ela é flagrantemente inconstitucional nessas duas pontas. A
primeira já foi objeto de julgamento do próprio STF.
Mas não é essa a única providência que pode — e deve — partir do STF. Está tardando muito para que a ministra Rosa Weber, relatora das ações que discutem a legalidade das emendas do relator ao Orçamento, vulgo orçamento secreto, leve esse caso essencial para o país ao plenário da Corte.
A invenção de uma modalidade de emenda que é um fast-track de recursos orçamentários para as bases dos deputados e senadores, sem muita ingerência dos órgãos de controle e fiscalização, está não só colocando em xeque as contas públicas, como deturpando fortemente a governabilidade e, no limite, a democracia.
Se antes a sociedade se chocou quando
Roberto Jefferson denunciou o mensalão, que consistia no uso de agências de
publicidade para pagar a deputados em troca de apoio no governo Lula 1, que
dizer de uma engrenagem que, sem intermediários, irriga prefeituras e empresas
ligadas aos mesmos parlamentares, com fortes indícios de que parte desses
bilhões volta para os beneméritos?
Trata-se de um modelo de cooptação de apoio
no Congresso sem precedentes em matéria de volume de recursos e efetividade.
Tanto é assim que a votação desta quarta-feira comprovou o que já venho
escrevendo há tempos: graças ao controle que exerce sobre as emendas do
relator, em que o relator é só um laranja, Arthur Lira é hoje o homem mais
poderoso do Brasil.
Foi ele, e não nenhum ministro ou líder
governista, que garantiu os votos necessários à aprovação da PEC dos
Predatórios (não, não é um erro de digitação, trata-se de um projeto de predar
mesmo o Orçamento, em que os beneficiários do Auxílio Brasil são só
figurantes).
Lira faz o que faz, liberando até voto
transcontinental, de graça? Certamente, não. Vem aí, tão certo quanto que o sol
nascerá amanhã, um lauto aumento nas famigeradas emendas e no fundão eleitoral.
E então, ministra Rosa? É voz corrente no
STF que ela se cercou de informações a respeito do caráter conspurcatório da
democracia que tais emendas adquirem e de como isso representa um expediente
desigual de força, até eleitoral, por parte do presidente de turno.
Mais: se não for o Judiciário a disciplinar
essa imoralidade, quem mais? Algum presidente eleito na vigência de um
instrumento tão caro ao Legislativo terá coragem de revogá-lo? Dificilmente.
O mal tem de ser estancado já, e pela raiz.
Há diferentes apostas em Brasília quanto ao que Rosa proporá em seu voto e como
votarão os demais nove ministros. Ela pode desde julgar as emendas do relator
inconstitucionais e determinar sua extinção até estipular limites de valores e
freios a seu caráter praticamente secreto.
Mas é urgente que ela libere essas ações
para o plenário, sob pena de o consórcio Bolsolira continuar usando votações
que envolvem pedaladas monumentais com recursos públicos como ferramenta para
tentar viabilizar politicamente um presidente cuja popularidade precisa ser
levantada à custa de tratores, escavadeiras e, se possível, até guindastes. No
caso da turma que chancelou a PEC dos Predatórios, quanto mais superfaturados,
melhor.
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