O Estado de S. Paulo
O ser humano nasce e já se sente ameaçado.
A emoção primordial é o medo, como já identificara Thomas Hobbes, no século 17.
Uma das principais fontes do medo são as
incertezas – é o diabo que está por perto, mas é invisível. “No escuro, some a
confiança (sublata lucerna nulla est fides)”, advertia o poeta Catullo, no
século 1 antes de Cristo.
A economia brasileira vive hoje um quadro
especialmente carregado de incertezas, que turva o horizonte e põe as pessoas
na defensiva. E quando prevalece a defensiva, as mesmas incertezas parecem
ainda maiores.
A incerteza mais recente é a nova cepa do
coronavírus, a variante Ômicron. Suspeita-se de que seja altamente
transmissível, que ataca até mesmo os totalmente vacinados. Mas ainda há
dúvidas sobre seu grau de letalidade e se as atuais vacinas serão capazes de
combatê-la.
Daí seguem-se outras incertezas: até que ponto será preciso exigir o distanciamento social, o recesso de empresas e o quanto a atividade econômica voltará a ser paralisada?
Outras incertezas já estavam no radar. Até
agora não foram normalizados os fluxos de mercadorias em escala global. Grande
número de indústrias não consegue produzir porque insumos e peças não chegam às
linhas de montagem. Com base nisso, muitos países fixaram políticas
protecionistas.
A inflação continua corroendo o poder
aquisitivo no mundo todo, especialmente no Brasil.
Os bancos centrais já começaram a puxar pelos
juros e deverão aprofundar essa política – o que contribuirá para frear o
consumo e a produção. Mas, pelo menos na área do petróleo, já se vê recuo
acentuado nos preços. Se essa tendência se confirmar e vier a ser reforçada,
boa parte da inflação de custos pode regredir, inclusive no Brasil. Mas esta
também não constitui uma certeza. Apenas uma tensão a mais, digamos assim.
E voltando ao Brasil, não há nenhuma
segurança de que as reformas sejam votadas num ano eleitoral. O rombo das
contas públicas tende a se alargar. É possível que auxílios emergenciais
reduzam os estragos no consumo produzidos pelo desemprego e pela perda de
renda, mas não a ponto de viabilizar forte avanço do setor produtivo. O
agronegócio pode descolar-se do quadro recessivo, mas a indústria tende a
continuar prostrada e pressionada com aumento de preços e falta de insumos.
O debate eleitoral e, mais do que isso, o
jogo político miúdo podem espalhar mais neblina na paisagem. A Pesquisa Focus
prevê avanço do PIB em 2022 de apenas 0,58%. O gráfico mostra como as
expectativas para o PIB e para o IPCA (inflação) foram se deteriorando com o
aumento das incertezas políticas e fiscais.
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