Valor Econômico
PSDB e Podemos precisarão conversar sobre
projeto comum
No dia 19 de outubro, quando “O Globo”
e Valor realizaram
o primeiro debate das prévias tucanas, a presidente do Podemos, Renata Abreu,
fez questão de ir ao Rio de Janeiro acompanhar o evento.
Antes de entrar no auditório, disse que
esperava ver um debate "equilibrado", que assegurasse não só a união
interna do próprio PSDB, mas também a construção de pontes com outros partidos
que buscavam consolidar uma terceira via, como o próprio Podemos. “Estamos
todos trabalhando para viabilizar uma terceira via, que não pode se digladiar.
Espero que tenha muito respeito não só aqui, mas depois também, nos debates que
ocorrerão entre os candidatos de centro”, afirmou.
Um desafio e tanto. Naquele dia, sim, correu tudo bem. Deu-se de forma polida a interação entre o governador de São Paulo, João Doria, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio. Mas, o ambiente dentro do PSDB foi se deteriorando.
Piorou tanto que hoje é difícil prever como
será o dia em que representantes do Podemos e do PSDB precisarão discutir os
rumos da terceira via. Tampouco está claro com quais tucanos Renata Abreu e
seus colegas de legenda se sentarão à mesa. O que ambos os lados sabem, apenas,
é que esse dia inevitavelmente chegará.
O Podemos e seu pré-candidato, Sergio Moro,
surpreenderam os adversários. Inclusive aqueles que estão dentro governo: não
se imaginava que o ex-ministro da Justiça executaria um plano tão estruturado
antes mesmo do fim de 2021.
Em poucos dias, o ex-juiz da Lava-Jato
formalizou sua filiação ao Podemos, apontou o ex-presidente do Banco Central
Affonso Celso Pastore como conselheiro econômico, mirando os agentes do mercado
financeiro que se desapontaram com as promessas liberais não cumpridas pelo
presidente Jair Bolsonaro, e publicou um livro para eternizar sua versão sobre
os episódios polêmicos que viveu na magistratura e no Executivo.
Não parou por aí. Tentou se reconectar com
o meio militar ao anunciar a filiação do general Carlos Alberto dos Santos
Cruz, outro ex-auxiliar de Bolsonaro que rompeu com o presidente e deixou o
governo. Moro possui bons contatos na caserna. Tem gente que não esquece uma
postagem da sua mulher em 25 de agosto de 2019, Dia do Soldado, com uma imagem
do marido desfilando numa parada militar de uniforme e arma junto ao corpo. A
legenda: “Moro foi um deles”.
Em relação ao PSDB, alguns integrantes do
governo Bolsonaro demonstravam maior inquietação com a postulação do governador
do Rio Grande do Sul. Argumentavam que sabiam o que esperar de Doria, em
referência aos embates do paulista durante os períodos mais críticos no
enfrentamento da pandemia. Já Eduardo Leite ainda seria testado no
enfrentamento com Bolsonaro e poderia atrair, além de um eleitorado mais jovem,
uma parcela da população que busca uma alternativa progressista nos costumes e
não intervencionista na economia.
Esta é uma visão de quem está próximo a
Bolsonaro, e não será nas próximas eleições que ela deverá ser testada.
Leite sucumbiu nas prévias. Nos quatro
colégios eleitorais, ganhou em apenas um, o formado por vereadores, deputados
estaduais e distritais, e ainda assim por pouca margem de votos. Doria venceu
entre os filiados, no grupo formado por prefeitos e vice-prefeitos e no colégio
constituído por governadores, vice-governadores, ex-presidentes do partido, seu
atual presidente, senadores e deputados federais.
Durante semanas preciosas, Leite fez mais
campanha para fora do partido. Esperava que um clamor popular aumentasse a
pressão sobre os delegados tucanos, o que acabou não ocorrendo. E acabou
assistindo ao seu principal adversário, veterano de prévias, conquistar os
votos que lhe asseguraram a vitória.
Na primeira quinzena de janeiro, Doria
retomará sua agenda de viagens aos finais de semana. Irá rodar as 27 unidades
da federação, incluindo as poucas que não conseguiu visitar durante as prévias,
e cada vez mais buscará passar a mensagem de que é o candidato capaz de unir
liberalismo econômico com proteção social. Para tanto, colocará para a
avaliação do eleitor o que vem fazendo em São Paulo e também mostrando de quem
pretende estar acompanhado, caso seja eleito presidente da República.
Assim como no caso de Moro, o primeiro nome
que surgiu foi o coordenador das discussões econômicas: Henrique Meirelles,
secretário de Fazenda de São Paulo, ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do
Banco Central. No entorno do governador, espera-se o envolvimento direto da
economista Ana Carla Abrão, ex-secretária de Fazenda de Goiás. É dado como
certo, também, que seus auxiliares nas áreas de educação e saúde permaneçam ao
seu lado durante a campanha, independentemente do Estado de origem ou de terem
mantido no passado conexões com outras siglas. Pretende mostrar que sabe montar
times e resolver problemas, além de afastar a pecha de desagregador. Até já
acenou para Moro.
Este, por sua vez, tem se reunido com
lideranças do seu próprio partido e aliados. E começou a intensificar os
movimentos em direção ao mercado.
Seus caminhos se cruzarão mais à frente.
Não há espaço para todos que querem ser a terceira via e, se o mais bem
posicionado não souber atrair para a sua candidatura os demais, acabará
ajudando a confirmar o vaticínio daqueles que apostam na manutenção da
polarização até o fim das eleições. Em outras palavras, que um candidato de terceira
via nada mais será do que o terceiro colocado.
Quando o momento chegar, o bom
relacionamento entre as cúpulas do Podemos e do PSDB será de grande valia. No
entanto, elas precisarão discutir o critério para escolher quem ficará com a
cabeça de chapa. Um deles, claro, será quem estiver pontuando mais nas
sondagens de intenção de voto. Quem estiver atrás tende a discordar, com o
argumento de que se deve olhar para os índices de rejeição ou dar preferência a
pesquisas qualitativas que apontem quais serão as motivações do eleitor. A
pré-campanha está só começando.
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