Valor Econômico
Ásia tem destaque crescente nas relações do
Brasil e, em 2021, 46,3% das exportações do país foram para economias da região
A aprovação do primeiro empréstimo do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB) para o Brasil transcende a operação de US$ 100 milhões para o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG). Sinaliza uma nova ponte para negócios Brasil-Ásia. E sinaliza também na direção de uma diversificação, mesmo modesta inicialmente, na tomada de recursos fora do eixo multilateral tradicional Estados Unidos-Europa.
A Ásia tem destaque crescente nas relações
econômicas internacionais do Brasil. O Ministério da Economia mostra que, em
2021, das exportações brasileiras, que somaram US$ 280,4 bilhões, quase metade
(46,3%) foi para a Ásia. Somente a China absorveu 32% do total vendido pelo
Brasil - mais do que a União Europeia, EUA e Mercosul juntos. O superávit
comercial acumulado com a China em 2021 é o maior já estabelecido no relacionamento
bilateral entre o Brasil e qualquer país. As vendas para a Ásia, mesmo
excluindo China e Japão, as duas maiores economias asiáticas, foram maiores do
que para os EUA ou União Europeia. Os embarques brasileiros também foram
maiores para a Malásia do que para Inglaterra, Escócia, Irlanda do Norte e
Gales juntos. As vendas para a Tailândia foram mais do que para a França. O
Brasil vendeu mais para a Índia do que para a Itália, mais para o Vietnã do que
para a Suíça, mais para as Filipinas do que para a Suécia. E exportou
igualmente mais para Bangladesh do que para Dinamarca, Finlândia, Áustria,
Irlanda, Hungria, República Tcheca e Eslováquia juntas.
A Asia é a região mais dinâmica para as
exportações brasileiras e com o aumento do comércio e investimentos é natural
que também cresça o movimento financeiro com a região, nota Cláudia Trevisan,
diretora-executiva do Conselho Empresarial Brasil-China. Desde 2005, dois
bancos oficiais chineses emprestaram mais de US$ 137 bilhões para a América
Latina - sendo US$ 62,2 bilhões para a combalida Venezuela e US$ 29,7 bilhões
para o Brasil. Pequim adotou mais cautela nos últimos três anos. Por sua vez,
os cinco grandes bancos comerciais chineses emprestaram cerca de US$ 40 bilhões
nos últimos anos, sendo US$ 16 bilhões para a Argentina e US$ 8 bilhões para
projetos no Brasil (dois deles em 2020).
Agora os dois bancos multilaterais de nova
geração sediados na China - o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em
inglês), conhecido como o Banco do Brics, e o AIIB - vão ampliando o leque para
financiamento internacional para o Brasil. O NDB é um banco com ambição global
na área de desenvolvimento. É onde o Brasil tem seu maior patrimônio no multilateralismo
econômico. Sempre será sócio majoritário, mesmo com a entrada de novos sócios,
e paritário com os outros fundadores (China, Rússia, Índia e África do Sul).
Desde que o brasileiro Marcos Troyjo
assumiu a presidência do NDB, em Xangai, em julho de 2020, os créditos para o
Brasil foram multiplicados, com mais US$ 4,2 bilhões, comparado a US$ 1 bilhão
desde que o banco tinha começado a funcionar em 2016. O país precisará utilizar
arquiteturas financeiras mais sofisticadas para atrair, por exemplo, investidores
internacionais focados em projetos de alto conteúdo de ESG (governança
ambiental, social e corporativa).
O AIIB tem viés mais asiático. Há uma
evidente liderança da China, que detém quase 30% do capital do banco, e Pequim
quer que a estratégia do AIIB seja consistente com suas próprias políticas. Mas
no banco fala-se em “coincidências’’ de projetos, e não em busca
necessariamente de integração na diplomacia chinesa de investir em uma moderna
rota da seda e redesenhar cadeias globais de valor.
O que ocorre no AIIB não é diferente da
criação do Banco Mundial, em 1944, para aderir às políticas americanas, e do
Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento, criado em 1991 para trazer o
Leste europeu para a economia de mercado. Alguns observadores notam, em todo o
caso, que nesse banco multilateral com 105 países membros, incluindo os
europeus, fica mais difícil a China usá-lo com o único propósito de ampliar sua
influência.
O governo chinês insistiu para o Brasil ser
um dos cinco maiores acionistas desse banco, sediado em Pequim. A então
presidente Dilma Rousseff (2011-2016) prometeu que o país entraria com capital
de US$ 3,2 bilhões. O governo Michel Temer, porém, constatou que o país não
tinha como respeitar o compromisso e reduziu a participação brasileira para
apenas US$ 5 milhões (US$ 1 milhão pago, com os outros US$ 4 milhões como
capital que pode ser exigido um dia). O Brasil entrou formalmente como sócio em
setembro de 2021. Quatro meses depois, já receberá US$ 100 milhões.
O AIIB tem menos amarras para, por exemplo,
financiar sem garantias do governo federal. Além disso, seu diretor jurídico, o
brasileiro Alberto Ninio, nota que o AIIB tem uma carteira adicional já
entabulada com o Brasil de mais US$ 250 milhões, pelo menos. O banco, com
capital de US$ 100 bilhões, tem autorização para destinar até 15% dos créditos
para projetos fora do continente asiático - está em 4% hoje.
Empresas brasileiras poderão participar de
projetos financiados pelo banco em qualquer região do mundo. É duro concorrer
com empresas chinesas na Ásia ou África. Mas as brasileiras terão chances em
projetos do AIIB na Argentina, Peru, Chile, Equador, Uruguai, também sócios do
banco, por exemplo.
O NDB e o AIIB têm altos ratings de
agências de classificação de riscos, e assim oferecem um capital barato. Os
recursos ficam ainda mais em conta para paises com superavit comercial robusto,
o que mostra que eles tem volumes importantes de moeda estrangeira à
disposição.
Para Sergio Gusmão Suchodolski, presidente
da Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE) e também do BDMG, essa
parceria fortalece o papel do Brasil, que se juntou aos demais membros do Banco
Asiático no desenho de uma nova arquitetura financeira internacional ‘que será
chave para fazer face aos desafios do desenvolvimento em economias
emergentes’’.
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