O Estado de S. Paulo
O Brasil requer um presidente que saiba como o presidencialismo multipartidário funciona
Tem havido grande preocupação sobre riscos
de disfuncionalidades do presidencialismo brasileiro com as mudanças ocorridas
nas emendas individuais e coletivas dos parlamentares, que passaram a ter sua
execução obrigatória.
Com as emendas impositivas, o Executivo
perdeu uma ferramenta decisiva que, além de baixo custo, proporcionava liquidez
e transparência nas suas negociações com os legisladores. Como resultado, o
preço do apoio legislativo foi inflacionado quando os parlamentares perceberam
que não mais necessitavam votar consistentemente com o presidente para terem as
suas emendas executadas.
O Executivo foi obrigado a encontrar outras
ferramentas de formação e manutenção de maiorias legislativas. A saída
encontrada foi as emendas de relator, que além de caras não são transparentes.
Os presidentes da Câmara e do Senado passaram a definir quem seria beneficiado,
ao invés do Executivo. A consequência foi o enfraquecimento da disciplina
partidária, pois os legisladores não precisam mais seguir as preferências dos
líderes dos seus partidos para terem acesso a tais recursos.
Por ter uma base eleitoral nacional, a coordenação da execução de emendas parlamentares pelo presidente tem o potencial de seguir uma lógica virtuosa, de busca de aprovação de políticas universais. Já a coordenação da execução das emendas pelos próprios parlamentares, por estes terem uma base eleitoral muito mais circunscrita, tende a privilegiar políticas locais com maiores riscos de predação e ingovernabilidade.
Estaria o presidencialismo multipartidário
“ferido de morte” diante da obrigatoriedade da execução das emendas individuais
e coletivas e, especialmente, após a ressurreição das emendas de relator?
O vencedor em 2022 terá que montar uma
coalizão se quiser governar.
Já sabemos que os modelos de gerência de
coalizão de Lula, que sempre monopolizou recursos para o próprio PT e tratou os
parceiros como apêndice a partir de trocas ilegais e não republicanas, e de
Bolsonaro, que inicialmente ignorou os partidos e os legisladores e depois, em
situação de grande vulnerabilidade, ressuscitou o pântano das emendas de
relator, fracassaram.
Mas ninguém sabe ainda quais serão as
estratégias e termos de negociação dos outros candidatos.
Pretendem governar, de facto, via coalizão
por meio de um programa comum, tratar aliados como verdadeiros parceiros e
dividir poder e recursos de forma proporcional? Terão força política para rever
a impositividade das emendas individuais e coletivas? O que vão fazer com as
emendas de relator?
*CIENTISTA POLÍTICO E PROFESSOR TITULAR DA ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS (FGV EBAPE)
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