O Globo
A dívida bruta teve uma forte queda, como
mostrou ontem o Banco Central, mas no mercado não há um único economista
confortável com as contas públicas. Primeiro, porque a dívida permanece em
patamar elevado e voltará a crescer em 2022. Segundo, porque o aumento da
inflação ajuda primeiro a arrecadação do governo, o que aconteceu no ano
passado, e só depois atinge as despesas, via indexação, o que acontecerá este
ano. Terceiro, porque os gastos com juros podem chegar a R$ 700 bilhões, com a
alta da Selic, para segurar a própria inflação. Tudo isso se somará a um ano
eleitoral com promessas de mais despesas por um presidente que fará de tudo
para se reeleger.
É preciso entender que a inflação elevada ajuda em um primeiro momento as contas públicas, mas depois provoca um efeito rebote. De início, a disparada dos preços significa mais dinheiro nos cofres dos governos federal, estadual e municipal. É fácil ver isso, por exemplo, nos preços dos combustíveis. Quanto mais alta a gasolina, maior a arrecadação dos estados com ICMS. E não é à toa que os chamados entes subnacionais fecharam o ano com superávit de R$ 97,7 bilhões (veja o gráfico). A energia elétrica em alta também ajudou, assim como o aumento dos preços das commodities em dólares, como soja e minério de ferro.
Depois, porém, vem o aumento das despesas
pela inflação. E um exemplo prático disso, explica o economista Felipe Salto,
diretor-executivo da Instituição Fiscal Independe (IFI), é o reajuste do
salário mínimo, que será de 10% em 2022. A inflação alta também ajuda a diluir
o endividamento sobre o PIB nominal, já que este último aumenta mais — por um
efeito estatístico — com a inflação mais alta. Salto explica de forma técnica
esse efeito:
— A inflação aumenta as receitas mais do
que aumenta as despesas, que estão atreladas à inflação passada, melhorando o
primário esperado. Isso reduz a tração da alta do numerador (dívida), ao mesmo
tempo em que o denominador (PIB nominal) sobe mais rápido com a inflação.
O aumento das despesas com juros já começou
a aparecer nas estatísticas. Apesar de 2021 ter começado com a Selic em 2% e
ter tido uma alta gradual para 9,25%, os gastos com juros dispararam de R$ 312
bilhões para R$ 448 bi. Neste ano, essas despesas podem chegar a R$ 700 bi,
pelas contas da IFI.
O Ministério da Economia tem comemorado o congelamento dos salários dos servidores públicos, como exemplo de austeridade. A medida, por sua vez, já está caindo por terra, com as promessas eleitorais do presidente Jair Bolsonaro, que tem anunciado aumento de salário até quando não arcará com a conta, como no reajuste de 33% para os professores da rede básica. A dívida caiu, mas as contas continuam ruins.
Pressão no
Banco Central
O Banco Central começa a reunião do Copom
hoje mais uma vez pressionado. Depois de o IPCA-15 de janeiro ter vindo acima
das expectativas, o Boletim Focus mostrou novo aumento das projeções de
inflação deste ano (de 5,15% para 5,38%) e também do ano que vem (de 3,4% para
3,5%). O BC já se comprometeu com uma alta de 1,5 ponto na Selic, para 10,75%,
mas terá que medir cada palavra do comunicado para conter a piora do humor do
mercado.
Vitória
dos técnicos
A criação de vagas pelo novo Caged ainda está sendo estudada pelos especialistas em mercado de trabalho. Para se ter uma ideia, 2021 terminou com saldo positivo de 2,7 milhões de vagas com carteira assinada, número maior do que os 2,6 milhões de 2010, quando a economia cresceu 7,5%. Um ponto, porém, já mudou nas apresentações do Ministério do Trabalho e é digno de nota. Os gráficos passaram a mostrar a quebra de série, de 2020 para frente, já que houve mudança de metodologia. Enquanto esteve sob as asas de Paulo Guedes, vinha tudo misturado para ajudar na tese de que a economia estava bombando.
Nenhum comentário:
Postar um comentário