Folha de S. Paulo
Presidente falou demais quando ataque era
só ameaça e liderou hesitação quando tropas avançaram
Quando a invasão da Ucrânia era uma ameaça
que deixava o mundo sob tensão, Jair Bolsonaro falou demais. Foi a Moscou para
prestar solidariedade aos russos que intimidavam o país vizinho e
espalhou a falsa impressão de que o governo local não estava interessado numa
guerra. "A leitura que eu tenho do presidente Putin é que ele é uma pessoa
que também busca a paz", declarou.
Uma semana depois, tropas enviadas pelo Kremlin atravessaram a fronteira ucraniana, e Bolsonaro preferiu se encolher. Na manhã em que a guerra começou, o presidente ignorou o assunto: conversou com apoiadores sobre o jogo do Palmeiras, voou para mais um evento de campanha antecipada e manteve a diplomacia brasileira num vergonhoso estado de hesitação.
O presidente se viu numa posição difícil.
Após viajar 11 mil km para cumprimentar um autocrata que dava todos os sinais
de que iniciaria uma guerra, a única saída para o presidente seria admitir que
cometeu um erro básico –ou reconhecer que foi enganado, por não ter a menor
ideia do que acontece pelo mundo.
O desarranjo diplomático produzido por
Bolsonaro em seu mandato fez com que um país que ocupa uma cadeira no Conselho
de Segurança da ONU levasse mais de 10 horas para reagir oficialmente à
invasão. Seguindo as frouxas diretrizes do governo para a política
externa, o
Itamaraty pediu o fim "das hostilidades" e cobrou
negociações, mas se recusou a condenar o ataque russo.
Durante o dia, Bolsonaro escolheu dedicar
seu tempo a uma motociata, um evento eleitoreiro e algumas palavras vazias.
Depois de muito silêncio, ele desautorizou críticas à invasão e soltou um
eloquente "a guerra não interessa para ninguém".
O episódio expõe mais uma vez a rara
combinação de incompetência e mediocridade de Bolsonaro na arena internacional.
Ainda que os posicionamentos do presidente nesse setor tenham assumido uma
dimensão de total insignificância, suas decisões ainda são capazes de
aprofundar a degradação do país.
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