sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Bruno Boghossian: Mediocridade internacional

Folha de S. Paulo

Presidente falou demais quando ataque era só ameaça e liderou hesitação quando tropas avançaram

Quando a invasão da Ucrânia era uma ameaça que deixava o mundo sob tensão, Jair Bolsonaro falou demais. Foi a Moscou para prestar solidariedade aos russos que intimidavam o país vizinho e espalhou a falsa impressão de que o governo local não estava interessado numa guerra. "A leitura que eu tenho do presidente Putin é que ele é uma pessoa que também busca a paz", declarou.

Uma semana depois, tropas enviadas pelo Kremlin atravessaram a fronteira ucraniana, e Bolsonaro preferiu se encolher. Na manhã em que a guerra começou, o presidente ignorou o assunto: conversou com apoiadores sobre o jogo do Palmeiras, voou para mais um evento de campanha antecipada e manteve a diplomacia brasileira num vergonhoso estado de hesitação.

O presidente se viu numa posição difícil. Após viajar 11 mil km para cumprimentar um autocrata que dava todos os sinais de que iniciaria uma guerra, a única saída para o presidente seria admitir que cometeu um erro básico –ou reconhecer que foi enganado, por não ter a menor ideia do que acontece pelo mundo.

O desarranjo diplomático produzido por Bolsonaro em seu mandato fez com que um país que ocupa uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU levasse mais de 10 horas para reagir oficialmente à invasão. Seguindo as frouxas diretrizes do governo para a política externa, o Itamaraty pediu o fim "das hostilidades" e cobrou negociações, mas se recusou a condenar o ataque russo.

Durante o dia, Bolsonaro escolheu dedicar seu tempo a uma motociata, um evento eleitoreiro e algumas palavras vazias. Depois de muito silêncio, ele desautorizou críticas à invasão e soltou um eloquente "a guerra não interessa para ninguém".

O episódio expõe mais uma vez a rara combinação de incompetência e mediocridade de Bolsonaro na arena internacional. Ainda que os posicionamentos do presidente nesse setor tenham assumido uma dimensão de total insignificância, suas decisões ainda são capazes de aprofundar a degradação do país.

 

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