sábado, 19 de fevereiro de 2022

Carlos Alberto Sardenberg: O que fazer com os 30 quilos de cocaína?

O Globo

Em 9 de julho de 2019, quando tomava corpo o desmonte da Lava-Jato e de todo o sistema de combate à corrupção, o professor de Direito Constitucional Joaquim Falcão deu uma aula sobre esse tema aqui no GLOBO. Começou contando uma história que ouvira de um ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal.

A seguinte: “O Supremo julgava um traficante de drogas. Preso com 30 ou mais quilos de cocaína. Não lembro bem. Uma enormidade. Na apreensão, ou durante o processo, uma autoridade teria cometido ato duvidoso diante da lei. A defesa argumentou ofensa ao princípio de devido processo legal. Donde, in dubio pro reo. O debate no Supremo caminhava rotineiramente para a soltura e absolvição do traficante preso. Quando, surpresa, um ministro perguntou a seus colegas: E a cocaína? O que fazemos com os mais de 30 quilos apreendidos?”.

Claro que já perceberam aonde queremos chegar. À pergunta que os tribunais terão de responder em breve: o que faremos com o dinheiro da corrupção capturado em processos que vêm sendo anulados?

Esse dinheiro é tão concreto quanto os quilos de cocaína. Em dezembro passado, a Petrobras informou que chegara ao final de 2021 com R$ 6,17 bilhões recuperados em acordos de leniência, repatriações e delações. Dinheiro da corrupção apanhada pelos dois principais ramos da Lava-Jato, a de Curitiba e a do Rio.

Há outros processos de recuperação em andamento. A Petrobras informou que atua como coautora em 31 ações de improbidade administrativa e 85 ações penais vinculadas às diversas fases da Lava-Jato. Periga perder todas.

A Lava-Jato de Curitiba já foi desmantelada. Os garantistas, réus e advogados do grupo Prerrogativas — aquele que promoveu o jantar para Lula e Alckmin —, se preparam agora para desmontar os processos do juiz Marcelo Bretas, da Lava-Jato do Rio. A tática é a mesma: não provar a inocência dos clientes, mas anular os processos com base no que o professor Falcão chama de doença do processualismo.

Diz ele: “Longe viver sem o devido processo legal e o pleno direito de defesa. Ao contrário. Mas seu inchaço não nos leva à saúde da democracia. Quem transforma o saudável direito processual em patológico processualismo?”.

Um amigo advogado conta uma história que deve ser inventada, mas é boa assim mesmo. Diz que um empresário apanhado na Lava-Jato foi a um conhecido escritório de advocacia e disse que queria limpar seu nome, mesmo perdendo todo seu dinheiro. O advogado teria respondido: “Veio no escritório errado; aqui a gente salva o dinheiro, mesmo deixando o nome na lama”.

O PT não quer apenas Lula livre. Quer limpar o nome do candidato e do partido. Acaba de lançar uma história em quadrinhos para, explica o redator, facilitar o entendimento “de quem não aguenta mais ler textão”. Ou seja, deixem os processos de lado e fiquem com a seguinte narrativa, muito simples: não houve corrupção, Lula é inocente, culpado é o Moro.

O quadrinho admite que não houve sentença declarando Lula inocente, mas argumenta que a extinção dos processos é prova de inocência.

Não é, mesmo porque as provas da corrupção —e o dinheiro — não desaparecem simplesmente porque algum juiz considerou o processo irregular. Trata-se, sem tirar nem pôr, do mesmo caso da cocaína. Os tribunais que estão liberando geral vão fazer o que com os bilhões capturados? A Petrobras terá de devolver os R$ 6,17 bilhões?

Seria a consequência lógica. Se não houve um grande esquema de corrupção montado nos governos do PT e associados, se os processos foram extintos, então o dinheiro teria de ser devolvido a seus “donos”. E já tem ex-réus cogitando disso.

Para o PT, entretanto, isso não é o essencial. A questão está nas eleições. Sendo Moro candidato, é claro que colocará o tema no debate — e ele sabe muita coisa, tem muito documento e provas à disposição.

Por isso o PT ataca tanto o ex-juiz. E por isso publica seus quadrinhos. Para ludibriar os eleitores.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Se Lula adora dinheiro,Moro ama loucamente,viver na simplicidade ninguém quer.
O dinheiro do Moro é honesto,ele ganhou trabalhando duro.
Tá.