quinta-feira, 7 de abril de 2022

Míriam Leitão: A visita rápida dos investidores

O Globo

O Brasil não melhorou, o mundo é que piorou bastante. Isso é o que os economistas explicam, em resumo, sobre a forte entrada de capital nos últimos meses que provocou uma queda grande do dólar. A boa notícia é que investidores estrangeiros que não estavam nem um pouco interessados em Brasil, tempos atrás, agora vieram com força. Mesmo assim, estão entrando de forma temporária e focada. O objetivo principal é a bolsa, e nela, as empresas de commodities e bancos.

Mesmo se a guerra contra a Ucrânia acabasse hoje, a Rússia continuaria sendo vista como um parceiro não confiável. Está fora do radar dos investimentos, até porque centenas de empresas viraram as costas para o país de Vladimir Putin. Outros emergentes estão com problemas. Na Turquia, o presidente intervém no Banco Central na hora que quer. Na América Latina, a Argentina está no FMI, o Chile, que sempre foi o darling do mercado, está com um presidente novo e a Constituição sendo escrita. O Peru está com oito meses de governo, quarto gabinete e terceiro pedido de impeachment. Para se ter uma ideia de como o capital está correndo o mundo atrás de rentabilidade, mesmo o Peru estando nessa enorme crise houve uma entrada de capital na bolsa e a moeda se valorizou. O dólar caiu 7,2% diante do sol peruano.

No Brasil, o dólar caiu 15% em relação ao real este ano e isso ajudará a melhorar o ponto mais preocupante da conjuntura que é a inflação persistentemente alta. Amanhã sairá o número de março do IPCA e o indicador pode ser de 1,39%, levando o acumulado a 11%. E não vai parar aí porque as projeções indicam nova alta em abril, o que levará o índice a perto de 12%.

Os economistas dizem que essa taxa é alta, mas é diferente de 2015-2016 porque agora o mundo inteiro está inflacionado. Além disso projetam uma queda até o final do ano, mas até o BC admite que ficará acima do teto da meta. E as projeções estão perto de 8%.

Para o consumidor que estará no caminho da urna fará pouca diferença saber que o mundo também está com altos índices. Ele quer saber é do desconforto no bolso. Além do mais, a inflação nossa tem também um componente local. O governo tem sido um gerador de incerteza.

Basta ver o que houve na Petrobras. Há uma semana o país fala de Petrobras, e ontem foi anunciado o quarto nome para ocupar a presidência da companhia, José Mauro Ferreira Coelho. Não há tempo de cumprir todos os trâmites das leis de compliance da empresa até a assembleia-geral marcada para o dia 13. A área técnica da Petrobras contudo informa que pode ser levado à assembleia, mas fica pendente de análise de todas as etapas internas. Mesmo que não haja mais problema algum, há uma semana o governo está se afogando em crise numa empresa que deu lucro, que está na área de commodities, que está em alta, e que portanto tinha tudo para atrair mais investidores.

Metade da balança comercial brasileira é soja, petróleo e minério de ferro. Os investidores estão interessados nesses setores. Mas a avaliação de economistas é que a aposta é por um retorno financeiro rápido, não é uma avaliação de que o Brasil é um país no qual querem estar nos investimentos de longo prazo. “É uma janela de captação de dinheiro na bolsa e em alguns setores”, disse o executivo de um grande banco.

Outra razão de o dólar ter caído tanto é o fato de que a desvalorização do real havia sido exagerada. No começo da pandemia o dólar estava em R$ 4,00, subiu para R$ 5,70 no fim do ano passado. Houve uma desvalorização de 42%, isso foi o pior desempenho das moedas dos emergentes. Em grande parte, aconteceu pelas perturbações políticas e institucionais criadas pelo presidente. Da mesma forma que houve agora na Petrobras, Jair Bolsonaro cria as crises e fica se debatendo nela.

Bem o Brasil não está. Juros, inflação e desemprego em dois dígitos, passando para uma eleição polarizada, com juros futuros aumentando e trajetória da dívida ainda sem reversão. Além disso, o presidente continua criando sempre ruídos na área institucional. Ele tenta ameaçar adversários, usando uma linguagem ambígua quando fala sobre ou para as Forças Armadas. Tudo isso somado é muito ruim. Mas o dólar pode ficar mais baixo, apesar de todo o estresse, porque o Brasil tem um volume enorme de reservas e porque o saldo da balança comercial deve subir 25% este ano. Enquanto não vai embora, esse capital de curto prazo ajuda um pouco a melhorar os indicadores.

 

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