Blog do Noblat / Metrópoles
Um busca voto pela solidariedade com quem
passa fome, o outro propõe vingança contra criminosos
O jornal Correio Braziliense de ontem, 14
de outubro, trouxe na primeira página, fotos dos dois candidatos à Presidência
da República. Embaixo do Lula, a manchete “Promessa de combate à fome”, embaixo
do Bolsonaro, a manchete “Pela redução da maioridade penal”. Estas duas
posturas demonstram a diferença moral entre as propostas dos dois candidatos: o
primeiro, preocupado com o povo, especialmente sua parcela pobre; o segundo,
sua preocupação com o eleitor que se sente ameaçado pela violência e a
impunidade de menores de idade. O primeiro busca voto pela solidariedade com
quem passa fome, o segundo propõe vingança contra criminosos.
Só no dia 30 vamos saber o efeito destes comportamentos e suas bandeiras eleitorais. Mas já é possível perceber o dilema das forças progressistas, antes chamadas de esquerda, entre defender as propostas que interessam ao povo, no seu conjunto e longo prazo, ou falar para o eleitor e seu interesse específico do momento.
A fala moral correta é dizer que lugar de
criança é na escola e não na cadeia, como Lula vem dizendo; argumentar que um
sistema escolar de qualidade, em horário integral, é a melhor maneira de
eliminar a violência e a criminalidade no médio e longo prazo. É o discurso
certo para o povo, mas, o eleitor não olha o longo prazo, ele está de olho no
próximo dia 30, em busca de ações para os próximos quatro anos do mandato
presidencial. Para estes, o discurso certo é prender bandidos, não importa a
idade.
Da mesma forma, o povo precisa ser
protegido pela polícia, sem necessidade de armar as pessoas, mas o eleitor ameaçado
quer posse de armas para ter ilusão de se proteger pessoalmente. As forças
progressistas falam o certo moralmente, miram os interesses permanentes do povo
e da nação, mas cada eleitor ouve o que interessa, no imediato, para ele, sua
família, no máximo seu bairro ou condomínio no imediato. Esta é a razão pela
qual as últimas eleições elegeram um Congresso conservador, graças às bandeiras
que atendem ao imediato e aos indivíduos.
As bandeiras ecológicas para salvar a
humanidade antes do final do século sensibiliza menos ao eleitor do que as
bandeiras de desfazer a proteção ambiental para gerar emprego, salário e lucro.
A promessa de mais algumas vagas na universidade empolga mais ao eleitor do que
prometer que o povo e suas crianças terão escola de base com máxima qualidade
para todos.
Nas eleições vota cada eleitor
individualmente, com desejos e crenças pessoais, não vota o povo como entidade
coletiva, abstrata, com necessidades permanentes, mas não prioridade de cada
pessoa para um futuro comum. Este divórcio entre povo e eleitor que explica a
eleição de um Congresso conservador: o povo precisa de horizontes progressistas
que construa um país melhor e mais belo para todos, mas cada eleitor é
conservador e olha para o imediato.
A falha das esquerdas não está na escolha
da moral para o povo, esquecendo o que interessa ao eleitor no imediato, mas na
incapacidade de separar valores e crenças morais de bandeiras políticas, e
fazer o discurso que una a solidariedade com o povo aos desejos do eleitor:
matar a fome de quem precisa e garantir segurança para quem está ameaçado.
*Cristovam Buarque foi ministro, senador e
governador
Nenhum comentário:
Postar um comentário