domingo, 16 de outubro de 2022

Elio Gaspari - Os debates elegerão o presidente

O Globo

Estima-se que 17 milhões de eleitores poderão decidir seu voto na última semana. Disso resulta que o desempenho de Lula e Bolsonaro nos debates será decisivo.

Os estrategistas dos candidatos dizem que nas cartucheiras não há balas de prata. Tudo bem, mas se as tivessem, não avisariam.

Seja qual for a opinião que eleitores têm de Lula ou de Bolsonaro, as candidaturas estão demarcadas com uma clareza nunca vista. Ambos governaram o país e mostraram a que vieram.

O mínimo que se pede a ambos é que apareçam nos debates sem o espírito dos ringues de MMA.

Até hoje nenhum dos dois apresentou ideias ou projetos para um país que está andando de lado há quase uma década, com nove milhões de desempregados. O comissariado petista zanga-se quando Lula é cobrado por clareza nessa questão. Já o entorno de Bolsonaro oferece um tênue sinal de que, se Paulo Guedes quiser, irá embora. Ele não há de querer, mas se isso acontecer, coisa melhor não virá.

A falta de ideias embaralhou a disputa de tal forma que Bolsonaro acusa Lula de ter na Venezuela um farol, mas, olhando-se para os últimos meses de seu governo, ele ficou parecido com o finado Hugo Chávez. Noves fora sua cooptação de militares e PMs, basta lembrar sua generosidade fiscal, bem como a agressividade com que desafia o Judiciário.

Uma boa ideia seria pedir aos dois candidatos que, durante um debate, assinem compromissos de não mexer na estrutura e na competência do Supremo Tribunal Federal.

Quem não quiser assumir compromisso aproveita a oportunidade e dá suas razões.

Elegância não significa fraqueza, e agressividade não significa sinceridade. Para ilustrar essa diferença pode-se ir ao debate passado. O que foi preferível ouvir: Lula, zangado, chamando o possível sacerdote Kelmon de “impostor”, ou Soraya Thronicke, que o classificou como “padre de festa junina”?

Os militares e as urnas

O Planalto colocou os comandantes militares numa posição girafa ao insinuar que as suspeitas de Jair Bolsonaro contra as urnas eletrônicas tinham respaldo, o que é duvidoso.

Veio o primeiro turno e, salvo um bolsonarista que teve 3 mil votos e diz que roubaram-lhe 400 mil, ninguém duvidou do processo de armazenamento e totalização dos resultados.

O Ministério da Defesa, que falou quando não devia, calou-se quando devia falar.

Vale o ensinamento do presidente americano Calvin Coolidge: quem fica calado nunca precisa voltar atrás.

O bordão de Damares

Sejam quais forem os motivos que levam a senadora eleita e ex-ministra Damares Alves a ilustrar suas revelações sobre prostituição infantil, uma coisa é certa: ela usa o assunto como um bordão para aquecer o auditório.

Um ministro do governo Bolsonaro estarreceu-se nos primeiros meses do governo ao ouvir uma intervenção da ministra naquilo que se chamava de “Conselho de Governo”. Ela começou a falar do assunto, descendo a detalhes e estimulou a curiosidade de Bolsonaro.

O assunto só morreu porque o general Augusto Heleno sugeriu que se passasse a outro assunto.

A carne na fila

Quando as grandes empresas compradoras de soja brasileira anunciarem o início de um boicote à compra de grãos colhidos no cerrado, começará uma pressão para que o embargo, também chamado de moratória, seja estendido às exportações de proteína animal, leia-se carne de boi e de frango.

Como o governo brasileiro se viu como um pária orgulhoso, ferra-se o agronegócio.

O pé de Bolsonaro

De uma cobra:

“Bolsonaro tem um problema com o próprio pé. Nesta campanha eleitoral atirou mais nele de que em Lula. Reuniu os embaixadores para falar mal das urnas eletrônicas, atravessou o oceano para fazer discurso para uma alçada em Londres durante o luto pela morte da rainha. De volta, foi à Aparecida para tumultuar uma cerimônia religiosa, com uma claque que vaiou sermão, ilustrada por um cidadão que empunhava uma caneca de cerveja.

Todos os tiros foram certeiros.”

Dívida com Temer

Tantos foram os insultos e grosserias do comissariado petista com Michel Temer que Lula deveria agradecer sua neutralidade no segundo turno.

Temer, por sua vez, deveria agradecer aos amigos que ajudaram a convencê-lo e não pensar com o fígado.

Carta na manga

O rei Charles III nunca foi um tipo popular, e seus pitis nos primeiros dias de reinado alimentaram-lhe a antipatia. Contudo, a sorte colocou-lhe uma carta na manga: ganhará alguma popularidade dando um título nobiliárquico aos pais de Kate Middleton, atual princesa de Gales.

A rainha Elizabeth era avara na concessão de títulos, mas o casal merece, sobretudo por Carole. Ela foi aeromoça, filha de uma mulher tenaz que decidiu tirar a família do andar de baixo. Carole criou uma empresa que enfeita festas, e o casal tornou-se milionário. (Na crise, perderam com dinheiro.)

O bisavô materno de Kate era estucador e trabalhava em palacetes que ela hoje frequenta. Nessa linha dinástica, um de seus ascendentes passou um tempo na cadeia, provavelmente por causa de dívidas. Muitos eram mineiros que viviam em bairros pobres e morriam de doenças pulmonares.

Malta viu antes

Está nas livrarias “Otávio Malta Jornalismo de Combate”, organizado por seu filho Dácio. Reúne 22 breves artigos de Malta. A capa diz tudo, mostrando o teclado de uma máquina de escrever Lettera 82, fabricada pela Olivetti. Fala de um tempo que passou, como o das caravelas. Todos os jornais onde Malta trabalhou acabaram-se, e ele morreu em 1984, aos 82 anos.

Cronista político desde os anos 20 do século passado, ele foi definido por Paulo Francis, seu colega na redação da Última Hora: “Um polemista de esquerda e uma doce criatura.” Ele batia duro, mas só para cima.

Quando a ditadura resolveu ajoelhar a Última Hora, Malta passou a escrever com o pseudônimo de Manoel Bispo.

Previa-se que em dez anos “um cérebro eletrônico irá editar os jornais”. Em 1964, os computadores eram chamados de “cérebros eletrônicos”.

Malta previu: “Os jornais estarão revolucionados pela pressão do cérebro eletrônico. Então, a polícia não perseguirá mais o redator, que usou a liberdade de imprensa para defender uma reivindicação, ou um direito, ou um ideia. Perseguirá uma máquina: o cérebro eletrônico.”

2022 e 1943

Na quinta feira, dia 13 de outubro, o senador Ignazio Benito La Russa foi eleito para a presidência do Senado italiano.

Veterano do movimento neofascista, ele coleciona peças dos tempos em que Mussolini governou a Itália. É admiração, mas é também senso de oportunidade. Faz pouco tempo, uma feirinha de Berlim, em frente ao apartamento da então primeira-ministra Angela Merkel, vendia uma cabeça de porcelana de Mussolini por uma ninharia.

Em 1943, no dia 13 de outubro, o governo italiano, que havia defenestrado Benito Mussolini, declarou guerra à Alemanha.

La Russa nasceu em 1947.

 

4 comentários:

Anônimo disse...

"Bolsonaro tem um problema com o próprio pé. Nesta campanha eleitoral atirou mais nele de que em Lula"

Bolsonaro é burro mesmo. Ele pode até ganhar mas se fosse inteligente, ou menos burro, JÁ TERIA GANHO.

Anônimo disse...

"Tantos foram os insultos e grosserias do comissariado petista com Michel Temer que Lula deveria agradecer sua neutralidade no segundo turno"

Acho q não. Ter o apoio declarado do Temer seria um tiro de Lula no próprio pé. E burrice assim é coisa do genocida.

Anônimo disse...

"O Ministério da Defesa, que falou quando não devia, calou-se quando devia falar." O general Paulo Sérgio Nogueira tenta superar a canalhice de Eduardo Pazuello, querendo ser mais capacho que o general barrigudinho... O novo capacho já obedece sem que o GENOCIDA precise mandar... Paulo Sérgio interpreta o que o capitão gostaria que acontecesse e se antecipa às ordens presidenciais! OMISSÃO é o máximo que estes generais nos oferecem! E é tudo que o GENOCIDA espera(va) deles!

ADEMAR AMANCIO disse...

Bolsonaro,se não fosse quem é,deveria estar à frente de Lula os cinco pontos,isto equivaleria dez pontos de diferença.