Valor Econômico
Programa de ajuste precisa começar a
acontecer
Seria bom que o governo concluísse logo o
debate sobre mudanças na meta de inflação. A cacofonia tem custado caro ao
país. E vamos combinar que, depois de quatro anos de cercadinho, não precisamos
de mais ruídos.
O gráfico abaixo, elaborado pelo Valor
Data, mostra a evolução dos juros longos. No caso, o custo das Notas do Tesouro
Nacional (NTN) série B com vencimento em 2050. No dia 6 de fevereiro, o
primeiro dia útil após a intensificação da pressão política sobre o Banco
Central, a taxa atingiu 6,6% ao ano. Tal nível só havia sido registrado antes
em abril de 2016, no pré-impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
O juro subiu para níveis de crise. Foi na
direção contrária à buscada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Num ambiente assim, o Tesouro Nacional tem vendido menos títulos, como mostrou este jornal em sua edição de ontem. Como em outros momentos de turbulência, passou a leiloar lotes menores de papéis, até para não sancionar preços que considera exagerados. Tem pago parte dos vencimentos da dívida pública com as reservas do “colchão de liquidez”, prudentemente reforçado ao longo de vários meses que antecederam a eleição.
Esse climão não condiz com um país que tem
sido saudado no mundo como a bola da vez, a economia prestes a decolar como
nova potência verde e fonte de energia limpa.
A contradição existe porque a ideia de
reduzir as metas de inflação para 2024 e 2025 e, supostamente, abrir caminho
para a redução dos juros pareceu voluntarista. É aquela sensação de nova matriz
macroeconômica que está no ar desde a campanha eleitoral.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem
se esforçado para sinalizar aos agentes econômicos que não é bem assim e que o
rombo nas contas públicas será domado. Tem a seu favor o fato de haver
conquistado o grau de investimento para a cidade de São Paulo quando prefeito.
Lançou um pacote de R$ 243 bilhões logo no dia 12 de janeiro. Além disso, tem
prometido para as próximas semanas a proposta de um novo arcabouço fiscal que
terá por objetivo controlar o endividamento. A reforma tributária foi alçada à
condição de prioridade e a expectativa é que agregue 1% ao crescimento do
Produto Interno Bruto (PIB). Mas, como se admite nos corredores do ministério,
falta acontecer. Com 45 dias de governo, há pouco resultado a mostrar em termos
de ajuste fiscal.
Pelo contrário, o Congresso resiste a
reinstituir o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais
(Carf), que responde por R$ 50 bilhões do pacote. E, a julgar pelas últimas
duas semanas, não deve ser pacífica a retomada da cobrança dos tributos
federais sobre combustíveis, com a qual se esperam receitas de R$ 28,8 bilhões
este ano.
A concretização do pacote de janeiro, aliado
ao andamento do arcabouço fiscal e da reforma tributária, ajudaria a construir
uma perspectiva de sustentabilidade nas contas públicas. A partir desse ponto,
aí sim, seria possível debater a política de juros de uma forma útil para o
país.
Os pontos de debate são muitos. Não há quem
negue que a taxa de juros básica do Brasil, hoje em 13,75%, é alta. Em seu
desdobramento mais recente, a disparada da Selic trouxe dificuldades para
empresas endividadas, e pode estar se formando um novo “meteoro” no mercado de
crédito.
Muitos especialistas acham que uma meta de
inflação de 3% para 2024 e 2025 é exageradamente rigorosa. O próprio Banco
Central analisou manter o objetivo permanentemente em 3,5%. Há também, não é de
hoje, uma discussão sobre como aplicar o regime de metas de inflação.
São discussões válidas, mas que não
deveriam tomar energia que seria mais bem empregada na aprovação das medidas
que abririam um caminho incontroverso para a queda dos juros.
Quando assumiu o Ministério da Fazenda, em
2003, o ex-ministro Antonio Palocci alertou numa reunião com empresários do
topo: “Preparem-se. O PT é pura emoção”. Vinte anos depois, o modo de decisão
de Lula baseado no debate parece intocado. Não faltarão, nos próximos meses,
tretas em torno da condução da economia.
Nesse ambiente, será importante zelar pelas
instituições e pela estabilidade das regras do jogo, para que todos possam ter
clareza sobre o que está se passando e qual o rumo traçado à frente.
A autonomia do Banco Central é um exemplo.
É uma medida que protege a condução dos juros do ciclo político. Sua
instituição contou pontos na avaliação de risco do Brasil e contribuiu
positivamente para um dos objetivos do atual governo, que é recuperar o grau de
investimento para o país. Foi uma medida construída no Congresso Nacional. Não
por acaso, a cúpula do Legislativo reagiu aos ataques de Lula.
Foi pela recuperação de um ambiente de
normalidade institucional que o presidente recebeu os votos decisivos de que
precisava para chegar ao Palácio do Planalto. Vieram de uma parcela da
população que o apoiou não por causa de sua gestão econômica, mas apesar dela.
Isso não deveria sair do radar.
Um comentário:
…depois de 4 anos não precisamos de mais ruídos. Perfeito, espero que seja ouvido e praticado pelos atuais .
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