sábado, 8 de abril de 2023

O que a mídia pensa - Editoriais /Opiniões

Lula promove retrocesso que pune os pobres

O Globo

Atos sobre saneamento e privatização provam que ele prefere agradar a políticos e corporações das estatais

Nas urnas, Luiz Inácio Lula da Silva foi o preferido dos pobres. Na campanha, repetiu reiteradas vezes que seu objetivo era acabar com a miséria e a fome no Brasil. No poder, começa a ficar claro que, na hora de escolher entre interesses dos pobres ou dos políticos e corporações incrustadas no Estado, Lula prefere a segunda opção. Tal fato fica evidente nos decretos em que ele alterou o Marco do Saneamento aprovado há três anos e suspendeu a venda de sete estatais.

Até outubro, a nova legislação do saneamento propiciou, além da venda da Cedae no Rio de Janeiro, licitações em AlagoasEspírito SantoMato Grosso do Sul, Amapá, Ceará e Goiás. Os investimentos garantidos pelas concessionárias somam R$ 72,2 bilhões. A intervenção do governo Lula instala insegurança jurídica — já há processo no STF contra a contratação sem licitação da estatal paraibana por 30 municípios — e retardará a modernização do setor.

O objetivo da mudança é proteger estatais, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste, onde prefeitos de cerca de 800 municípios querem continuar a renovar contrato com as companhias estaduais de saneamento sem licitação nem metas a cumprir. Lula ainda atribuiu ao Ministério das Cidades autoridade para regular o saneamento básico, esvaziando a Agência Nacional de Águas (ANA). O que era feito com base em critérios técnicos passará a ser ditado por interesses políticos.

O resultado disso tudo é evidente: atrasará a meta de, até 2033, abastecer 99% das casas com água potável e coletar 90% do esgoto (já três anos atrasada em relação aos objetivos estabelecidos pela ONU). Hoje falta água a 35 milhões de brasileiros e coleta de esgoto a 100 milhões, e não há marca mais evidente da miséria que Lula diz querer combater do que as condições insalubres em que vive essa parcela da população.

A outra investida de Lula para agradar a grupos de interesse em seu governo foi a retirada de sete estatais do programa de privatizações. Entre elas, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), cujo modelo de venda estava pronto, elaborado com base num estudo comparativo do BNDES com as economias mais avançadas. A privatização e a nova regulação aumentariam a arrecadação em R$ 4,4 bilhões anuais, além de atrair bilhões em investimentos a um setor de desempenho sofrível, como sabe qualquer morador do Rio, onde cartas não chegam nem mesmo uma vez por semana a bairros de classe alta. Que dizer das áreas mais pobres, que Lula afirma defender?

Além dos Correios, Lula desistiu de privatizar Dataprev e Serpro (duas empresas de processamento de dados cujos serviços poderiam ser contratados de terceiros sem perda nenhuma), a EBC (mero braço de propaganda do governo cujo orçamento beira R$ 750 milhões), o Ceitec (fabricante de semicondutores ultrapassados, que trouxe quase R$ 1 bilhão de prejuízo sem conquistar nenhuma relevância para o Brasil nesse mercado) e duas outras estatais. Todas essas privatizações trariam mais recursos a um Estado falido, a que faltam recursos para prover serviços básicos aos mais pobres.

Lula pode até acreditar que o Brasil tem dinheiro sobrando para atender a todos. Mas os decretos sobre saneamento e venda das estatais provam que sua prioridade é garantir espaço para seus aliados e agradar às corporações sindicais que seriam afetadas pelas privatizações.

Abril Vermelho do MST põe em risco a articulação política do governo

O Globo

Com gestão petista, movimento volta a usar invasões como forma de exercer pressão contra agronegócio

Depois de longo tempo de inércia e de uma tentativa de melhorar sua imagem, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) retomou a invasão de propriedades privadas. Em março, já invadira quatro fazendas de plantação de eucaliptos, três delas da Suzano Papel e Celulose no Sul da Bahia. Na época, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira (PT), tentou minimizar: “É um caso isolado”.

Pelo visto não era. Tanto que o MST acaba de lançar o Abril Vermelho, um mês de especial mobilização, que começa com a invasão de 800 hectares de três engenhos no município de Timbaúba, em Pernambuco. Uma nota do movimento justifica a tomada das propriedades sob o argumento de que não cumprem sua “função social”, termo vago usado como espantalho para desviar a atenção de qualquer agressão ao direito à propriedade privada.

Não é coincidência que o MST retome as invasões com a volta ao Planalto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Como no passado, as pressões procuram levar o governo do PT a ceder cargos e poder no Instituto Nacional de Desenvolvimento e Reforma Agrária (Incra) ao MST. No fim de fevereiro, devido aos choques entre correntes do PT, foi anunciada a manutenção no Incra do agrônomo César Aldrighi, servidor de carreira. O nome preferido do MST era Rosilene Rodrigues. Ela não ficou na presidência, mas com a diretoria de Desenvolvimento.

Depois de dizer que não havia objeção aos nomeados para a cúpula do Incra, a integrante da direção nacional do MST Ceres Hadich deixou claro que é necessário substituir os superintendentes e responsáveis pelas delegacias regionais do órgão. Deixou no Incra, e certamente no Planalto, uma lista de nomes do agrado do movimento. Foi um repeteco do que aconteceu nos dois primeiros governos Lula.

Com DNA essencialmente anticapitalista, o MST não precisa de motivos para invasões. Como minguaram os outrora populares “latifúndios improdutivos”, resultado do avanço e modernização da agropecuária nas últimas décadas, o movimento voltou-se agora contra o que chama de “monocultura” (caso da soja e do eucalipto). Alega que ela ocupa espaços da produção de alimentos “para o povo”. Trata-se de argumento sem pé nem cabeça. As lideranças do MST fingem não saber que as extensas plantações de grãos são fonte importante de divisas para o país e servem de ração animal. As gôndolas dos supermercados e as feiras livres desmentem qualquer fantasia do MST.

Os primeiros desdobramentos das invasões não chegam a Brasília, ficam sob a responsabilidade da Justiça e polícia locais. Os efeitos políticos, porém, atingem Lula e seu governo, dependentes de votos da bancada ruralista no Congresso para aprovar o novo arcabouço fiscal, a reforma tributária e outras leis. A oposição já tenta criar na Câmara uma CPI sobre as invasões. Nem será necessário. O MST já trabalha contra Lula, ao pôr em risco a aprovação dos dois projetos que definirão o futuro de seu governo.

Emendas sob Lula

Folha de S. Paulo

Modelo de atendimento a parlamentares terá desafios de qualidade e transparência

É normal e desejável numa democracia que os legisladores eleitos pela sociedade tenham a palavra final sobre o Orçamento público —e que a alocação de recursos seja definida, em última análise, por meio do embate político.

Na prática, esse arranjo pode gerar resultados mais e menos virtuosos. No Brasil, onde predominam no Congresso múltiplos partidos de pouca ou nenhuma consistência programática, é forte o incentivo para que deputados e senadores criem despesas a partir de interesses pessoais e paroquiais, não raro pouco republicanos.

Desde a redemocratização, o mau uso das emendas parlamentares ao Orçamento tem sido objeto de escândalos de graus variados. O mecanismo, no entanto, continua crucial para as relações entre Planalto e Legislativo. O terceiro governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenta agora uma nova maneira de lidar com o problema.

De um lado, é preciso saciar o apetite por verbas de um Congresso pouco amigável; de outro, há que garantir um mínimo de controle e transparência ao processo.

Como o Orçamento deste ano já está aprovado e os parlamentares não podem mais emendá-lo, a saída encontrada foi reservar uma parcela dos recursos dos ministérios —R$ 9,8 bilhões— a ser distribuída conforme as preferências individuais de deputados e senadores.

Como noticiou a Folha, está previsto um sistema de identificação de cada despesa, de modo que se possa averiguar quem a determinou e quais foram os beneficiários. Resta saber como tudo correrá no cotidiano da política real.

Trata-se de alternativa ao modelo das emendas de relator, que gerou não poucos desmandos sob Jair Bolsonaro (PL) e acabou derrubado pelo Supremo Tribunal Federal em dezembro. Naquele, era o congressista encarregado de relatar o Orçamento quem fixava os pleitos a serem atendidos, de início sem identificar os demandantes.

Em qualquer fórmula, é grande o risco de perda de qualidade do gasto público, para nem falar de escândalos de malversação. Recursos escassos são pulverizados em uma miríade de obras e eventos de prioridade duvidosa —uma quadra esportiva aqui, uma festa junina acolá, por vezes um asfaltamento superfaturado de rua.

Cumpre lembrar que cada deputado e senador já dispõe de uma cota de emendas individuais à lei orçamentária, de execução obrigatória. Como as emendas de relator, o novo modelo de Lula é um extra.

Reformas já em curso para levar à queda do número de partidos podem minorar as distorções no futuro. Imprescindível em qualquer momento é que a sociedade disponha de meios para acompanhar e escrutinar as despesas públicas.

Estatais sem lei

Folha de S. Paulo

STF indeciso permite que empresas voltem a ser cabides de emprego para políticos

Ser político é uma profissão de risco, uma vez que a atividade está sujeita aos humores de um eleitorado notoriamente volúvel. Não são poucos aqueles que, sem aviso prévio, se veem privados de mandato e passam a depender de seus correligionários eleitos para conseguir um emprego até o próximo pleito, quando terão a chance de reconquistar votos.

A Lei das Estatais, aprovada em 2016 no rastro do escândalo na Petrobras, cria um problema para a categoria, ao limitar a nomeação de políticos para diretorias e conselhos de empresas públicas e sociedades de economia mista. Após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que marca o fim simbólico da Lava Jato, sobreveio um ataque maciço e infundado ao diploma.

Em dezembro de 2022, em votação-relâmpago, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que reduz de 36 meses para 30 dias a quarentena exigida de dirigentes partidários e sindicais e de organizadores de campanhas antes que possam exercer cargos em estatais. O Senado, felizmente, colocou a ideia na geladeira.

No mesmo mês, o PC do B entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal em que questiona a constitucionalidade da quarentena e outros pontos da norma. Na visão do partido, a lei criminaliza a política com uma espécie de presunção de improbidade.

O ministro André Mendonça pediu vista, o que adiaria qualquer decisão e manteria o statu quo. No entanto seu colega Ricardo Lewandowski, relator da matéria, alegou "periculum in mora" (risco de que a demora no entendimento judicial cause dano grave) e, passando por cima da vista de Mendonça, concedeu liminar que libera as nomeações políticas.

A medida monocrática se deu em meados de março, um pouco antes de Lewandowski deixar a corte devido à aproximação de sua aposentadoria compulsória por idade.

Agora, diante da perspectiva de cassação da liminar pelo plenário, foi a vez de o ministro Dias Toffoli pedir vista, prolongando assim seus efeitos pró-nomeações.

Os magistrados agravam, assim, as ameaças sobre a gestão profissional das estatais que já partem do Planalto e do Legislativo.

A ausência de definição do Supremo sobre a matéria abre caminho para que as empresas voltem a se tornar cabides de emprego para políticos —aviltando a negociação legítima que deve se dar com os postos de governo.

A dinâmica perversa de Lula

O Estado de S. Paulo

Na disputa por mudanças na política de preços da Petrobras, Lula incentiva aliados a brigar publicamente para, depois, arbitrar a disputa. O problema é quando a prática gera custos ao País

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que o governo pretende alterar a política de preços da Petrobras. Em entrevista à GloboNews, ele disse que a política de Preço de Paridade de Importação (PPI) “é um verdadeiro absurdo”, e uma mudança que considerasse os custos de produção da companhia no mercado interno poderia reduzir o diesel em até R$ 0,25 por litro. O ministro afirmou, também, que a empresa já havia recebido essa orientação do governo federal, que é o maior acionista da petroleira.

Como era de esperar, as declarações de Silveira geraram reação no mercado e derrubaram as ações da Petrobras. O recuo foi parcialmente contido quando a empresa divulgou um comunicado em que não apenas negou ter recebido qualquer proposta para mudar o PPI, como cobrou do governo que a apresentasse formalmente. No mesmo dia, Silveira assegurou que isso não afetaria a rentabilidade da companhia e frisou que as mudanças seriam discutidas somente após a posse dos novos membros do Conselho de Administração, o que daria mais equilíbrio entre a visão da União, representada no colegiado, e a da diretoria nomeada pelo presidente da empresa, o ex-senador Jean Paul Prates.

A política de PPI foi adotada pela Petrobras em 2016, após anos de controle artificial dos preços dos combustíveis, prática adotada ao longo dos governos petistas. Basicamente, ela proíbe a companhia de praticar preços abaixo daqueles que uma empresa privada aplicaria ao importar gasolina e diesel para revender no País. A política reverteu os prejuízos bilionários que a companhia registrou, mas a frequência dos reajustes passou por mudanças nos últimos anos. Já foi diária, quinzenal e mensal, até perder periodicidade fixa mais recentemente.

Se deu liberdade para a companhia reduzir a volatilidade dos preços ao consumidor, a falta de um cronograma também reduziu o grau de transparência das decisões e abriu espaço para o retorno de interferências políticas. Exemplo disso é que em junho do ano passado, em meio à campanha eleitoral e sob pressão de Jair Bolsonaro, a Petrobras ficou quase 100 dias sem anunciar aumentos, apesar de acumular uma defasagem de quase 20% em relação aos preços internacionais. Isso só mostra que o cumprimento da regra não depende dos mecanismos para segui-la, mas da real disposição do governo em respeitá-la.

Não é segredo para ninguém a intenção do governo Lula de “abrasileirar” os preços dos combustíveis, tema que já havia sido explorado em sua campanha. A dúvida – e o verdadeiro pano de fundo dessa disputa – é quem vai pagar o custo astronômico dessa diretriz: a Petrobras, por meio de seu caixa, ou o governo, por meio de um fundo de estabilização de preços.

É legítimo que o governo queira reavaliar a política de preços da Petrobras, mas a maneira como isso tem sido feito não tem nada de auspiciosa. Mais do que divergências de ponto de vista ou mero atabalhoamento, ela revela um método que Lula da Silva rotineiramente costuma adotar: incentivar, nos bastidores, aliados a brigarem publicamente, aguardar para ver quem sobrevive e, por fim, arbitrar a disputa.

Em café da manhã com jornalistas, um dia depois do alvoroço a respeito da Petrobras, o presidente disse ter sido “pego de surpresa” na discussão entre Silveira e Prates. “A política de preços da Petrobras será discutida pelo governo no momento em que o presidente da República convocar o governo para discutir. Enquanto o presidente da República não convocar, a gente não vai mudar o que está funcionando hoje”, afirmou o petista.

Essa prática já foi adotada por Lula antes da apresentação do arcabouço fiscal, opondo, de um lado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad; e do outro, o ministro da Casa Civil, Rui Costa; e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Enquanto Lula se diverte testando sua força, todos os demais pagam o preço. Quando é apenas um ministro ou um presidente de uma companhia, os danos ficam mais contidos. O problema é quando a Petrobras, o País e a sociedade também têm de arcar com esses custo.•

Felicidade não se compra, se constrói

O Estado de S. Paulo

Ranking da Felicidade mostra que nações mais felizes combinam Estados capazes de aplicar a lei e distribuir riquezas equitativamente, instituições coesas e cidadãos solidários

Em uma longa tradição, desde que os utilitaristas no século 19 formularam o princípio moral e político da “máxima felicidade para o maior número de pessoas”, muitos argumentam que o sucesso dos governos se mede pelo bem-estar de seus cidadãos. Mas, como constatou Aristóteles, se todo mundo deseja a felicidade, quase ninguém concorda sobre o que ela é. O que faz uma vida feliz: o prazer, a riqueza, a honra ou alguma outra coisa? Há dez anos a Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável engaja cientistas e lideranças da sociedade civil para buscar respostas baseadas em evidências. A cada triênio, ela publica um Relatório da Felicidade Global ranqueando países com base em dados do Gallup mundial. O indicador-chave é subjetivo: “De 0 a 10, quão satisfeito você está com a sua vida?”. Mas daí surge a questão sobre quais hábitos, instituições e condições materiais produzem sociedades com níveis maiores de bem-estar.

Há uma forte correlação entre a felicidade e seis fatores: expectativa de vida e saúde física e mental; renda e emprego; apoio social (de familiares, amigos e colegas); liberdade pessoal; virtudes; e integridade e eficácia dos governos. “Os resultados são claros. O ethos de um país importa – as pessoas são confiáveis, generosas e mutuamente cooperativas? As instituições importam – as pessoas são livres para tomar decisões vitais importantes? E as condições materiais importam – tanto a renda quanto a saúde.”

Assim, em primeiro lugar, os governos devem minimizar a desgraça, seja garantindo condições básicas, como os direitos humanos, seja promovendo condições de desenvolvimento, como os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU. Em segundo lugar, devem fomentar instituições, normas e valores aptos a maximizar a coesão cívica e política. A eficácia de um Estado depende, primeiro, da capacidade de garantir paz e segurança, sem repressão; depois, de suas capacidades fiscais (as condições do crescimento econômico), coletivas (entrega de serviços) e legais (aplicação da lei sem distinção). Ante clivagens de classes, culturas regionais, religiões e etnias, o Estado “deve encontrar modos de conduzir os cidadãos em conjunto a reconhecer interesses comuns e reconciliar prioridades conflitantes”.

A importância da coesão social ficou evidente no último triênio. Mesmo em meio a pesadas crises – a pandemia, a guerra, a inflação –, as percepções sobre o bem-estar permaneceram no mesmo patamar de 2017-19. Isso porque se as crises impõem custos, também expõem e mesmo despertam um senso de conexões compartilhadas. Os pesquisadores apontam exemplos de como a confiança e a cooperação social podem sustentar a felicidade em meio a crises: países que apelaram à coletividade para suprimir a transmissão comunitária tiveram índices mais baixos de mortes e mais altos de bem-estar; em 2020-21, no pico da pandemia, os gestos de altruísmo – doações, voluntariado, ajuda a estranhos – foram um quarto mais comuns do que antes; e em 2022, em amostragens de sete países representativos das seis regiões globais, os relatos de conexões sociais positivas foram duas vezes maiores que os de solidão.

Essas evidências expõem uma associação positiva entre felicidade e solidariedade: o altruísmo melhora o bem-estar subjetivo não só de seus beneficiários, mas dos próprios agentes e mesmo de observadores. Além disso, essa associação se revelou bidirecional: pessoas mais felizes também se empenharam em mais altruísmo.

As evidências parecem confirmar a teoria de Aristóteles de que a felicidade depende de uma composição entre bens externos e virtudes morais: se os primeiros são condição necessária, porém não suficiente, as segundas são essenciais. Segundo sua célebre definição, a eudaimonia (a vida “boa” ou “feliz”) é “a atividade da alma de acordo com a virtude”. Ou seja, uma pessoa ou sociedade se torna (subjetiva e emocionalmente) feliz quando logra ser (objetiva e moralmente) boa. Hoje, como sempre, a conquista da virtude continua a ser, individual e coletivamente, o grande passaporte para a felicidade.

Lei das Estatais protege o governo

O Estado de S. Paulo

Ao atuar contra a quarentena, Lula aumenta o apetite do Centrão por cargos e enfraquece seu governo

O governo de Lula da Silva está disposto a torpedear a Lei das Estatais (Lei 13.303/2016) no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF). Já em dezembro do ano passado, seguindo as orientações da então equipe de transição, a bancada do PT na Câmara dos Deputados apoiou o projeto de flexibilização da Lei das Estatais, que altera, entre outros pontos, a quarentena de quem tenha atuado em campanha eleitoral para assumir cargo de administrador ou conselheiro de empresa pública ou sociedade de economia mista. O prazo atual é de três anos. A proposta, que agora tramita no Senado e também diminui restrições para cargos nas agências reguladoras, reduz a quarentena para 30 dias.

Por sua vez, a Advocacia-Geral da União (AGU), representando a União, manifestou-se no STF pela inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei das Estatais contestados pelo PCdoB na Adin 7331. Segundo a AGU, as restrições estabelecidas em 2016 pelo Congresso violariam “a proporcionalidade e a razoabilidade na medida em que presumem a má-fé dos indivíduos a que se refere”.

Recentemente, o ministro do STF Ricardo Lewandowski proferiu liminar para suspender a quarentena de 36 meses, para diretores e conselheiros de estatais ou empresas de economia mista, de quem atuou “como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”. Segundo o relator da Adin 7331, a proibição deve se restringir “àquelas pessoas que ainda participam de estrutura decisória de partido político ou de trabalho vinculado à organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”. Como se vê, a liminar de Ricardo Lewandowski, que está pendente de análise pelo plenário da Corte, foi ainda mais permissiva que a proposta aprovada pelos deputados.

É um grande equívoco o Poder Judiciário interferir em legislação constitucional, simplesmente porque algum ou mesmo vários ministros do STF possam discordar das restrições aprovadas pelo Congresso. O Poder Legislativo tem competência para definir critérios e condições para os cargos nas estatais e empresas de economia mista.

Mas é também um imenso equívoco – explícita ingenuidade política – o Palácio do Planalto imaginar que sairá fortalecido com o fim ou a diminuição das restrições para políticos em estatais e empresas de economia mista. Essas limitações legais ajudam o governo a pôr limites no apetite dos partidos políticos por cargos públicos. É do interesse do Centrão, e não do Executivo federal, ter mais postos disponíveis na estrutura da administração federal.

Um governo sério só tem a agradecer a existência da Lei das Estatais, uma vez que ela lhe permite fazer indicações técnicas e, assim, implementar suas políticas públicas. Lula e o PT, no entanto, empenham-se em abrir espaço na máquina pública para apadrinhados de partidos fisiológicos. Ao não aprenderem com os erros do passado, atuam diretamente contra o presente e o futuro de seu próprio governo. Eis o custo de se negar a história.

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