Valor Econômico
Solução para depósitos voluntários é
importante para evitar que planejada liberação de compulsórios não provoque um
aumento da dívida bruta
Principal indicador da solvência do setor
público, a dívida bruta do governo geral é menor do que aparenta nas
estatísticas oficiais. O Banco Central tentou corrigir o problema com a criação
dos depósitos voluntários remunerados dos bancos, mas o sistema não funcionou
como esperado. Agora, trabalha para melhorar a regulamentação, com o envio de
um novo projeto de lei ao Congresso Nacional.
O assunto é relevante também para permitir que, no ano que vem, quando estiver em plena operação o nosso sistema de assistência de liquidez, o Banco Central possa fazer uma redução estrutural dos depósitos compulsórios - que são elevados no Brasil e representam um dos pesos nos “spreads” do crédito bancário.
É muito comum os economistas dizerem que a
dívida bruta do governo geral do Brasil é muito alta, comparada com a dos
demais países emergentes. E realmente é. Pelo dado mais recente, relativo a
abril, o débito público, por esse conceito, chegou a elevados 73,2% do Produto
Interno Buto (PIB). Em média, os países emergentes, excluindo a China, têm uma
dívida bruta de 56,2% do PIB, segundo dados do Monitor Fiscal do Fundo
Monetário Internacional (FMI) relativos a posição de dezembro de 2022.
Esse é o dado que tem maior visibilidade
perante os investidores, e influencia muito os prêmios de risco cobrados para
conceder empréstimos ao governo brasileiro. Mas ocorre que, no caso do Brasil,
há um aspecto que nos diferencia de uma boa parte dos países emergentes. Uma
boa parte da dívida bruta foi formada há cerca de 15 anos para adquirir dólares
para as nossas reservas internacionais. Não deixa de ser uma dívida do governo,
mas de outro lado o Banco Central tem um ativo de altíssima liquidez - as
reservas internacionais. Por isso, o natural seria que as reservas
internacionais fossem abatidas da dívida bruta.
Em termos práticos, o volume de reservas
internacionais, quando contabilizadas em reais, representam um ativo de R$
1,638 trilhão, ou 16,1% do PIB. Se as reservas fossem abatidas da dívida bruta,
que em reais chega a R$ 7,457 trilhões, o endividamento brasileiro cairia.
Passaria a representar algo como 57% do PIB. Ainda alto, porém bem mais próximo
da média dos emergentes.
Até por volta de 2011, essa particularidade
brasileira era levada em conta por uma boa parte dos investidores, que olhavam
sobretudo a dívida líquida como indicador de solvência. A dívida líquida exclui
exatamente os ativos do governo, como as reservas e outros fundos. Hoje, a
dívida líquida está em 57% do PIB.
Mas a dívida líquida foi desmoralizada no
governo Dilma, quando o Tesouro fez a injeção de títulos públicos nos bancos
federais. Esses papéis eram abatidos da dívida bruta para fins de cálculo da
dívida líquida. No fim, se mostraram um bom ativo: a dívida bruta deixou de
subir com maior velocidade nos últimos anos justamente porque os bancos
públicos quitaram as dívidas com o Tesouro Nacional.
E como os depósitos voluntários entram na
história? A dívida que o Banco Central criou para comprar as reservas foi feita
com as chamadas operações compromissadas. São operações monetárias para enxugar
o excesso de liquidez na economia que são lastreadas por títulos públicos. Os
depósitos voluntários são outra forma de o Banco Central enxugar o excesso de
liquidez na economia, mas não têm o lastro em títulos públicos. Assim, não
afetam a estatística oficiais da dívida bruta.
Dessa forma, para reduzir a dívida bruta,
seria preciso substituir as operações compromissadas por depósitos voluntários.
Mas, desde que foram criados, em 2021, os depósitos voluntários foram capazes
de substituir apenas uma parcela das operações compromissadas. Pelo dado mais
recente, de abril, somavam R$ 96 bilhões, ou 0,9% do PIB.
Os depósitos compulsórios não cresceram
mais porque eles podem ser feitos apenas pelos bancos. Os bancos, por sua vez,
são detentores finais de apenas uma parcela das compromissadas. A maior parte
das operações é feita para clientes, sobretudo os fundos de investimento. As
operações compromissadas, em abril, somaram o equivalente a 10,6% do PIB, e o
Banco Central tem valor correspondente a 21,8% do PIB em títulos federais para
lastrear esse tipo de operação.
Os bancos fazem depósitos voluntários
apenas com o seu caixa, que equivale a cerca de 1% do PIB. Já os fundos não
podem fazer depósitos voluntários diretamente no BC porque não têm conta na
autoridade monetária. Por isso, têm que fazer a operação por meio dos bancos, o
que significa correr o risco dessas instituições financeiras.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE), relator
do projeto que criou o depósito voluntário, cobrou do presidente do Banco
Central, Roberto Campos Neto, em audiência pública em abril, o encaminhamento
de uma solução do problema. Campos Neto se comprometeu a encaminhar em breve. A
alternativa ainda não é pública, mas em outros países o problema foi
solucionado concedendo aos fundos de investimento acesso direto ao balanço do
Banco Central.
A solução é importante também para evitar
que a liberação de compulsórios - que hoje somam R$ 314 bilhões no deposito a
prazo, por exemplo - que o Banco Central quer fazer em 2024 não provoque um
aumento da dívida bruta.
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