O Globo
A ideia foi colocar um companheiro numa boa
posição, mesmo ele não tendo o currículo e a expertise para o cargo
Numa boa: se era para colocar o economista
Marcio Pochmann no governo, a presidência do IBGE foi
uma saída de pouco dano. Lá, o potencial de estragos é menor, quase nada.
Com todo o respeito que o IBGE merece, o
fato é que lá não se formula nem se pratica política econômica. Trata-se de um
órgão que pesquisa e elabora dados. Mede e calcula população, inflação,
emprego, desemprego e renda, o Produto Interno Bruto, contas nacionais.
Mais: o IBGE tem tradição e estruturas
consolidadas, além de um corpo técnico profissional e gabaritado.
Algumas pessoas levantaram hipóteses de manipulação dos dados, de modo a criar uma imagem mais favorável do país, beneficiando a propaganda do governo.
Por exemplo: martelar os índices de inflação,
“produzir” números bem baixinhos, circunstância que favorece o governo de
diversas maneiras. Ajudaria a pressionar o Banco Central para uma redução mais
acentuada da taxa básica de juros.
Cristina Kirchner fez isso na Argentina.
Maduro ainda faz na Venezuela. Aqui mesmo, já houve pressões sobre o IBGE; isso
nos anos 80, governo Sarney, para mudar os métodos de cálculo da inflação. Não
deu certo. Houve reações políticas e sociais, permitidas pelo ambiente
democrático.
Mas, no tempo da ditadura, houve manipulação.
Ao final do governo Médici, em 1974, o então todo-poderoso ministro da Fazenda,
Delfim Netto, exibia crescimento econômico de milagre, com inflação moderada
para a época, 12% ao ano, isso para 1973.
Muita gente desconfiava, mas como reclamar
na ditadura?
Só de dentro do regime. Foi o que aconteceu
no governo Geisel. Nomeado ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, entre
suas primeiras medidas, providenciou uma revisão da inflação de 1973: não havia
sido de 12%, mas de 26,6%, um salto e tanto.
Não foi propriamente uma falsificação, mas
um truque. Para conter as óbvias pressões inflacionárias, Delfim havia imposto
um controle de preços. A Fazenda fixava os preços, digamos, oficiais, dos
principais produtos.
E como sempre acontece nessas circunstâncias,
o mercado continua funcionando. Ou seja, havia o preço da tabela e o real,
maior, claro. O truque: considerar, na medida da inflação, os preços oficiais.
Ocorre que se mediam também os preços
reais, que ficavam no armário. Simonsen mandou abrir, e a inflação de verdade
era mais que o dobro da oficial.
Seguiu-se um debate entre os dois
economistas, mas ficou claro, especialmente para a população, que 26% era o
número. O Banco Mundial também fez uma revisão dos dados brasileiros e chegou a
uma inflação de 22,5% para 1973. Era por aí.
Qual a chance de acontecer de novo?
Zero.
Imagine que o presidente do IBGE tente
interferir na coleta de preços e cálculo do índice. Em menos de um dia o caso
estará na imprensa. Será vazado por funcionários do instituto, zelosos de seu
trabalho e sua moral.
Além disso, os índices do IBGE são
acompanhados com lupa por centenas de analistas. Há economistas de banco cujo
trabalho é adivinhar os números.
Nas consultorias, equipes especializadas
até fazem coleta de preços essenciais, além de seguir o detalhe das pesquisas
do IBGE, de modo a antecipar cenários para seus clientes.
Basta acompanhar o noticiário. Na véspera
da divulgação de qualquer indicador importante, jornais e sites trazem as
estimativas do mercado. E sempre bate, não na mosca, mas no alvo.
Tudo considerado, o mercado, os analistas,
os jornalistas perceberão qualquer tentativa de manipulação.
Quer dizer, então, que a escolha de
Pochmann para o IBGE não tem importância alguma?
Tem. Trata-se de um mau sinal. Indica que a
ideia foi colocar um companheiro numa boa posição, mesmo ele não tendo o
currículo e a expertise para o cargo.
Ele não interferirá na gestão da política
econômica, como sugeriram pessoas ligadas à ministra Simone Tebet e
ao ministro Fernando
Haddad. Algo do tipo, deixa pra lá, mal não fará.
Mas pode fazer algum estrago administrativo
ou técnico num órgão tão importante.
Mede-se um governo pelo que faz e pelo que
não faz. Não mexer no IBGE seria melhor.
Sobretudo porque a mexida sugere que podem
existir coisas piores em andamento.
2 comentários:
Perfeito
PODE ATÉ SER O SUCESSO DE NEGÓCIOS BANCÁRIOS QUE A MÍDIA APREGOA, BEM COMO O MECANISMO PREDILETO DE ACESSO ÀS CONTAS ALHEIAS E ÀS MOVIMENTAÇÕES FINANCEIRAS POUCO SAUDÁVEIS DA BANDIDAGEM.
CERTO É QUE A TRANSFERÊNCIA EM POUCOS DIAS DE 17 MILHÕES PARA A CONTA DO BOZO SÓ CONFIRMA:
MARCIO POCHMANN NUNCA ESTEVE ERRADO EM SUAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PIX.
NÃO MESMO!
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