sábado, 30 de setembro de 2023

Cristovam Buarque - Dar o exemplo

Revista Veja

Lula trouxe o Brasil de volta ao mundo, mas só discurso não basta

Na recente reunião do G20, o presidente Lula apresentou três eixos para o mundo: desenvolvimento sustentável, reforma das instituições de governança global e inclusão social com combate à desigualdade. Na semana seguinte, na ONU, reafirmou a necessidade desse esforço internacional. Graças à sua história pessoal, às características do Brasil e ao vazio de outras lideranças, nesses nove meses de governo Lula se afirmou como o líder mundial na luta contra a desigualdade social. Essa liderança será consolidada quando, além do discurso, ele mostrar que é capaz de conduzir o país na direção do que defende para o planeta.

Mas, quando ouvem o discurso contra a desigualdade, os demais presidentes olham para Lula sabendo que somos campeões em concentração de renda, nosso IDH está na 87ª posição, que esse quadro social não mudou ao longo das últimas décadas. Têm conhecimento de que a última edição do Estudo Internacional de Progresso em Leitura (Pirls) mostra os alunos brasileiros no 4º ano com média equiparada à pior pontuação entre todos os países. Sabem que essa péssima média esconde a tragédia da desigualdade conforme a classe social da criança. Eles são informados de que sucessivos governos das últimas décadas não tentaram corrigir essa realidade; e, por experiência histórica em seus países, sabem que a educação de base com qualidade para todos é o caminho para superar a pobreza e a desigualdade.

Luiz Gonzaga Beluzzo - O passado presente

Revista CartaCapital

A eterna repulsa dos endinheirados aos pobres e ao Estado

Nos idos de 1983, o senador Roberto Campos, avô do nosso Campos Neto, prolatou suas sabedorias na Ordem dos Economistas do Estado de São Paulo. Entre outras pérolas do conhecimento, afirmou que o Brasil “é uma sociedade criptossocialista, apesar do sistema privado teoricamente praticado no País”. Então parlamentar mato-grossense, o vovô Campos fundava sua escatológica denúncia na constatação de que o governo, no Brasil, era responsável por em torno de 45% do dispêndio total e 60% dos gastos em investimento.

Se aceitarmos os critérios do ilustre senador, vamos chegar à conclusão de que não só o Brasil, como a totalidade dos países do Ocidente, passou-se para o outro lado, sem se dar conta do que estava ocorrendo. Éramos todos socialistas e não sabíamos.

Alvaro Costa e Silva - Mourão, o sabe tudo

Folha de S. Paulo

Para Mourão, tramar um golpe é mero blá-blá-blá

General da reserva, ex-vice-presidente e atual senador, Hamilton Mourão anda deitando cátedra sobre direito penal. À plebe ignara ele ensinou que não há gravidade quando o presidente da República, que se candidatou à reeleição e perdeu, convoca uma reunião com os chefes das Forças Armadas e, apresentando uma minuta adrede preparada, propõe um golpe de Estado, com novas eleições e prisão de adversários.

"É um mero blá-blá-blá", ilustrou o professor Mourão. Deu um exemplo: "Vão dizer que uma tentativa de homicídio tem que ser punida, mas uma investida de golpe é diferente de homicídio. No caso de quase assassinato, eu te dou um tiro e erro. Uma tentativa de golpe seria o quê?". A tese seduziu grupos bolsonaristas, que passaram a divulgá-la nas redes, deixando de chamar o general de melancia.

Dora Kramer - Só rindo... Ou chorando

Folha de S. Paulo

Otimismo do ministro Padilha contrasta com o realismo voraz das onças do Congresso

O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) aparece em público sempre muito alegre e otimista. Diz que está tudo ótimo mesmo quando está tudo péssimo. Exibe sorriso permanente, faz piada com as dificuldades que enfrenta na cadeira a partir da qual busca domar as onças vizinhas na praça dos Três Poderes. Pois é, em determinadas situações, só rindo. Ou chorando.

Nesta semana, acossado em pleno Palácio do Planalto por parlamentares com cobrança para entrega de lotes na Funasa, levou o constrangimento meio à brinca, meio à vera: "Vocês não imaginam o que fazem comigo a portas fechadas".

A julgar pelo que dizem a portas abertas, é possível, sim, imaginar. No cerco a Padilha no "after" de cerimônia oficial, suas altezas felinas foram bastante explícitas na ameaça de derrubar a ministra da Saúde caso não tivessem seus apetites saciados. Isso uma semana depois de o presidente da Câmara proclamar-se dono da Caixa Econômica Federal e de suas 12 vice-presidências.

Demétrio Magnoli - Um Congresso de 11

Folha de S. Paulo

Ao celebrar avanço de juízes sobre pautas do Legislativo, progressistas sacrificam futuro

O longo voto de Rosa Weber pela descriminalização do aborto apresenta-se, quase inteiramente, como um discurso parlamentar. A agenda definida pela magistrada para o Supremo –drogas, marco temporal, aborto– forma uma pauta de deliberações apropriada ao Poder Legislativo. Por aqui, o STF produz legislação enquanto o Congresso dedica-se a distribuir verbas de emendas a clientelas eleitorais e a indicar ministros ou diretores de estatais.

A alegação dos juízes supremos de que apenas interpretam a Constituição não resiste nem mesmo a um escrutínio superficial. Interpretar a Constituição é derrubar o que não pode ser feito; legislar é decidir regras positivas sobre o que deve ser feito. Weber determinou o período de aborto descriminalizado (12 semanas), os magistrados procuram consenso interno sobre o peso exato da maconha de uso pessoal, Fachin elabora regras específicas para atribuição de terras aos indígenas.

Rodrigo Zeidan* - Lula e o acordo entre Mercosul e União Europeia

Folha de S. Paulo

França faz exigências ambientais e Lula quer 'proteger' a indústria nacional

Parece que é hora da verdade. Vai sair o acordo entre Mercosul e União Europeia? O presidente paraguaio, Santiago Peña, deu um ultimato aos europeus: se o acordo não sair até o dia 6 de dezembro, quando Lula lhe entrega a presidência rotativa do Mercosul, o bloco vai encerrar as negociações.

Com o decoupling (dissociação) de economias como as americanas e europeias e a China, as cadeias globais de valor estão se rearranjando pelo mundo. A União Europeia é o maior investidor nas economias sul-americanas. Seria hora de estimular investimentos para revitalização da nossa indústria. Infelizmente, a chance de isso acontecer é mínima. As lideranças políticas regionais ignoram a integração comercial com o resto do mundo. No Brasil, estamos ainda presos no modelo de substituição de importações, um desastre há décadas.

Ricardo Rangel - Os desafios de Luis Roberto Barroso no STF

Revista Veja

Como o presidente mais liberal que o Supremo já teve lidará com o Congresso mais retógrado que o Brasil já elegeu?

Luis Roberto Barroso assume a presidência do Supremo Tribunal Federal em um momento de crise entre o Congresso e o tribunal.

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, botou pra votar, e aprovou, o marco temporal das terras indígenas à revelia de declaração prévia do Supremo de que ele seria inconstitucional. Já adiantou que pretende apresentar projeto de lei para considerar crime a posse de toda e qualquer quantidade de maconha — a despeito de que o STF está na iminência de decidir sobre o assunto. E, enquanto o Supremo discute a descriminalização do aborto, o Congresso se movimenta para aprovar contra ele leis ainda mais duras.

Eduardo Affonso - Lula é uma ideia

O Globo

Presidente é, ao mesmo tempo, o rei que ostenta a roupa nova e o menino que aponta que o rei está nu

Houve certa incompreensão quando, naquele longínquo abril de 2018, o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou:

— Não sou mais um ser humano. Sou uma ideia. Uma ideia misturada com a ideia de vocês.

O tom parecia ser de empáfia — reforçado, talvez, pelo hábito que Lula tem de referir a si mesmo na terceira pessoa.

Como ensinou um sábio alagoano, o tempo é o senhor da razão. Hoje é possível entender o porquê do ileísmo, que nada tem de imodéstia. É que Lula são dois. Como nos casos de TDI (transtorno dissociativo de identidade), ora estamos diante de um, ora de outro. Por terem ambos o mesmo nome, quando Lula diz “O Lula”, tanto pode ser o Lula-ideia falando do Lula-pessoa-física (doravante, Lula-PF, para economizar caracteres) quanto o contrário.

Carlos Alberto Sardenberg - E se o detento não for o culpado?

O Globo

Toda grande empresa brasileira está no Carf. Toda grande empresa tem litígios com a Receita

É assim: a empresa recebe uma autuação da Receita Federal, cobrando impostos, multa e juros. O advogado da empresa acha que a cobrança é indevida e resolve contestar.

Primeiro, reclama na auditoria que emitiu a notificação; perdendo, o que acontece quase sempre, vai para a instância superior, ainda dentro da Receita Federal. Perde de novo. Aí, antes de entrar na Justiça, a empresa pode tentar o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), criado justamente para reduzir a judicialização excessiva.

Pablo Ortellado -Crítica implica com filme conservador

O Globo

Mario Frias, Damares Alves e Eduardo Bolsonaro se mobilizaram para divulgar 'Som da liberdade'

Depois de muita polêmica nos Estados Unidos, estreou no Brasil na quinta-feira passada “Som da liberdade”, do diretor mexicano Alejandro Monteverde. O thriller sobre um ex-agente que se dedica a resgatar crianças sequestradas em redes internacionais de abuso sexual infantil não é apenas um filme independente de sucesso. Foi lançado por meio de uma campanha política conservadora, e sua estratégia de promoção — meio comercial, meio militante — despertou reação muito negativa da crítica.

A produtora do filme, Angel Studios, começou como empresa que oferecia um serviço de filtragem que censurava (silenciava ou pulava) passagens profanas, violentas ou com nudez em conteúdos audiovisuais do streaming. O modelo fracassou depois de ser tragado numa série de processos por violação de direitos autorais. A empresa então se reinventou como produtora de conteúdos religiosos e conservadores, assentada num modelo econômico inovador com dois pilares: financiamento coletivo e compra antecipada de ingressos.

Alvaro Gribel - A história por trás do déficit

O Globo

Piora fiscal este ano era não só esperada, como inevitável. Governo precisa é garantir o reequilíbrio à frente

O setor público registrou déficit de R$ 79 bilhões no acumulado de janeiro a agosto deste ano, o pior resultado para um início de governo desde o início da série. Lula 1 herdou as contas em dia de Fernando Henrique, e apertou ainda mais o cinto sob Palocci. Manteve as contas no azul no segundo mandato, já sob Mantega. A deterioração das contas públicas aconteceu sob Dilma, passou por Temer e Bolsonaro, e voltou a piorar agora, com a recomposição de despesas represadas pelo teto de gastos. A fala do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, na quinta-feira, que passou a fazer campanha pública por aumentos salariais dos servidores do banco, é a prova de que o funcionalismo federal foi sucateado pela regra do teto, que se mostrou extremamente draconiana. A piora fiscal agora, portanto, era não só esperada, como inevitável. O que é preciso é garantir o reequilíbrio à frente.

Marcus Pestana - Privatizações e a mudança do papel do Estado (II)

Já discutimos aqui o papel do Estado no desenvolvimento da sociedade moderna e da economia capitalista, onde adquiriu formas variadas em função das peculiaridades históricas de cada país. Nas últimas décadas do século XX, o estrangulamento fiscal do “Welfare State”, a onda neoliberal liderada por Reagan e Thatcher, a dissolução da URSS e do bloco comunista, a globalização, a internet e a emergência da sociedade pós-industrial desencadearam um novo ciclo em que a “Reforma do Estado” ocupou espaço central.

No Brasil, a consolidação de nosso capitalismo tardio e o processo de industrialização por substituição das importações tiveram o Estado como protagonista para suprir as lacunas deixadas por um ainda débil setor privado.

Também, em nosso país, desencadeou-se, nos anos de 1990, um vigoroso processo de reforma do Estado, impulsionado tanto pela crise fiscal quanto pela necessidade de modernização do modelo de intervenção estatal. Programas de desestatização avançaram com a privatização de empresas estatais, venda de participações, concessões públicas e parcerias público-privadas (PPPs).

Maílson da Nóbrega* - Por que é quase impossível cortar gastos

Valor Econômico

A rigidez orçamentária é o verdadeiro calcanhar de Aquiles do regime fiscal da União

Tem sido comum a demanda por corte de gastos do governo federal. No mercado financeiro, alega-se que a isso é necessário, dado que o novo arcabouço fiscal depende excessivamente da elevação de receitas para cumprir metas de resultado primário e de endividamento. Gente com experiência no governo federal diz o mesmo. Outros argumentam que a reforma administrativa reduzirá despesas da União, o que está longe de ser totalmente verdadeiro.

Teoricamente, o clamor está correto. Vários estudos demonstram que o melhor ajuste fiscal é aquele realizado via despesa, pois pode se concentrar em áreas menos essenciais e poupar dos cortes os investimentos e outros programas fundamentais. A opção pela receita eleva a participação do governo na economia e acarreta alocação menos eficientes dos recursos, o que afeta negativamente a produtividade e o potencial de crescimento.

Claudia Safatle - Chance para pensar em faxina geral nos gastos

Valor Econômico

Para Arminio Fraga, não basta ter um ajuste fiscal que coloque a dívida em trajetória de queda

Quase 80% do gasto no Brasil é com Previdência Social e com a folha de pagamentos dos três níveis de governo e nos três Poderes.

Esse é um dado que chama a atenção por ser fora da curva. Na grande maioria dos países a soma das duas despesas se situa na casa dos 60%.

O gasto com saúde, no Brasil, fica aquém dos 4% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse é outro número que surpreende. É impossível pretender ter um sistema de saúde universal e gratuito com esse padrão de gasto. Apenas para ter uma ideia, no Reino Unido, ele é de 8% do PIB.

Foi avaliando os números fiscais do Brasil que Arminio Fraga concluiu que não basta ter um ajuste fiscal que coloque a dívida em trajetória de queda. E nota-se que ela não está em queda.

Rogério F. Werneck - Crônica de um esgarçamento fiscal

O Globo

Governo aposta que poderá continuar esticando a corda da irresponsabilidade fiscal

Já há material de sobra para se começar a escrever o que promete ser uma longa crônica do preocupante esgarçamento do quadro fiscal que vem tendo lugar no país.

A história remonta ao final de março, quando o governo delineou sua proposta de um novo arcabouço fiscal, com que pretendia se livrar dos rigores do teto de gastos. Prometia conter o déficit primário em 0,5% do PIB, em 2023, zerá-lo, em 2024, e gerar superávits primários de 0,5% e 1% do PIB, respectivamente, em 2025 e 2026.

No frigir dos ovos, uma promessa pífia de um superávit primário acumulado de não mais que 1% do PIB ao longo de todo um mandato presidencial.

Passados não mais que seis meses, o que hoje se constata é que mesmo essa promessa tão pífia parece a cada dia menos crível. Não duraram muito as fantasias de que o governo gastaria bem menos do que lhe permitia o limite ampliado para dispêndio primário que conseguira assegurar com a provação da PEC da Transição.

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

A oportunidade de Barroso no comando do STF

O Globo

Novo presidente poderá contribuir para resgate da normalidade institucional e Judiciário mais ágil

O ministro Luís Roberto Barroso assume a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) diante de um ambiente político bem menos conflagrado que o encontrado pela antecessora, Rosa Weber. Durante a gestão de Rosa, o país passou pela eleição mais polarizada de sua História recente, o STF foi alvo dos ataques do 8 de Janeiro, e a democracia brasileira resistiu em boa parte graças à ação do próprio Supremo perante a ameaça golpista. Esse momento — ainda bem — passou. Agora cabe a Barroso, afastada a ameaça antidemocrática, aproveitar o clima mais sereno para continuar, em sua gestão, a promover o resgate da normalidade institucional.

Em seu discurso de posse, ele demonstrou entender a missão e adotou um tom conciliador ao tratar dos temas que hoje polarizam a sociedade. “O combate eficiente à criminalidade não é incompatível com o respeito aos direitos humanos. O enfrentamento à corrupção não é incompatível com o devido processo legal”, afirmou. “Estamos todos no mesmo barco e precisamos trabalhar para evitar tempestades e conduzi-lo a porto seguro. Se ele naufragar, o naufrágio é de todos.”

Poesia | Fernando Pessoa - Tudo é encontrar qualquer coisa

 

Música | Joyce Moreno - Aqui, Daqui (Aldir Blanc Inédito)

 

sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Fernando Abrucio* - Como sair do dilema do emendismo

Eu & /Valor Econômico

A hora é de pensar como articular as verbas do orçamento com os programas e políticas públicas

Uma das maiores qualidades na política é encontrar interesses comuns onde há impasses e divergências. Em termos intertemporais, é muito difícil manter-se no poder em sociedades complexas sem buscar negociação e cooperação, sem que isso signifique perder a autonomia relativa de seu grupo político ou Poder institucional. Esse preâmbulo conceitual tem uma só finalidade: pensar em como sair do dilema central das relações entre o Executivo e o Congresso Nacional, referente à ampliação das emendas parlamentares.

O aumento da capacidade de gastar mais com emendas parlamentares é um fenômeno que começou em meados da década passada, com reformas legais e a partir, primeiramente, da liderança de Eduardo Cunha. Depois esse processo foi aprofundado principalmente pela ação de Arthur Lira, culminando na criação daquilo que foi chamado de Orçamento Secreto. Mesmo com a decisão do STF considerando inconstitucional esse último formato, o valor que os deputados e senadores terão direito com emendas será, no mínimo, de R$ 40 bilhões em 2024 - e, registre-se, grande parte desse dinheiro é transferido ainda com pouca transparência.

José de Souza Martins* - A anomalia da religião na política

Eu & / Valor Econômico

Há no Congresso uma bancada da Bíblia, empenhada no enquadramento dos outros em valores de sua crença em vez de enquadrar-se nos preceitos e valores da Constituição que legitima sua diferença

Neste momento, onde estão as vozes que falam pelo povo brasileiro e nos dizem o que ele se tornou, com os transtornos políticos dos últimos tempos e a ação de grupos reacionários que se empenham em criar um estado de baderna e de desorganização social e política para assegurar seu poder de toscos e incivilizados?

Entre 2003 e 2022, o lugar de referência da fala política brasileira deslocou-se de cenário. Passou lenta e ocultamente das classes sociais e subclasses para as corporações de interesses antissociais. Basicamente porque a mudança do lugar da fala foi também mudança do ator que fala.

Aqui, desde os anos da ditadura militar, a rua tornara-se o lugar de expressão dos que tinham o que falar mas não tinham lugares de dizer. Isso tem expressado a desigualdade da representação política e o decorrente fato de que nem todos estavam ou estão representados nas instituições destinadas a isso.

Maria Hermínia Tavares* - A ultradireita e seu público

Folha de S. Paulo

Governo evita choque frontal, enquanto esquerda e progressistas recorrem ao STF

Fossem outros os tempos, "O Som da Liberdade" mereceria a mesma atenção concedida aos filmes B das plataformas de streaming, nos quais o bem vence o mal depois de peripécias vividas por atores canastrões.

No caso, o bem é encarnado por um agente do Departamento de Segurança Interna norte-americano, branco, olhos azuis, mulher compreensiva e prole numerosa, que se arrisca pela selva colombiana para salvar duas crianças –latinas– sequestradas por traficantes de pessoas, entre eles uma negra, que as vendem a pedófilos, um deles líder da guerrilha comunista.

Mas os tempos são de embates ideológicos: assim, tanto nos Estados Unidos, onde a película foi produzida, quanto aqui, a ultradireita promoveu o filme a arma na sua guerra santa contra o comunismo ateu. A família Bolsonaro e os seus agregados festejaram e deitaram falatório quando a, digamos, obra, estreou em Brasília. O "Brasil Paralelo", usina de cultura de massa direitista, dela faz propaganda em seu site, oferecendo ingresso grátis a seus assinantes.

Marcos Augusto Gonçalves - Lula acerta ao ver desigualdade como ameaça à democracia

Folha de S. Paulo

Na ONU, presidente foi ao cerne das ameaças à democracia ocidental

"O mundo está cada vez mais desigual. Os dez maiores bilionários possuem mais riqueza que os 40% mais pobres da humanidade", disse o presidente Lula em seu recente discurso na Assembleia-Geral da ONU, quando enfatizou a ameaça que a crescente desigualdade, em escala global e nacional, representa para a democracia.

O aprofundamento da "dissonância entre o mercado e a rua", tema imperativo de nosso tempo, vai atingindo, se é que não atingiu, um ponto de não retorno. Estamos num cenário em que uma casta altamente acumuladora de poder econômico e político vive em sua bolha Maria Antonieta, de costas para os que disputam senhas para a fila quilométrica que talvez chegue ao portão da festa.

Essas assimetrias projetam-se sobre diversos aspectos da experiência social e política, entre os quais o futuro dos regimes democráticos ocidentais, cuja estabilidade e ambições universalistas vão sendo sabotadas em casa e em seus quintais. As revelações que se acumulam sobre as tramoias golpistas do bolsonarismo não nos deixam esquecer o terreno minado em que pisamos.

Vinicius Torres Freire - Em um ano, governo perde dinheiro que dá para pagar metade do Bolsa Família

Folha de S. Paulo

Arrecadação federal piora e contas públicas dependem ainda mais de pacote de impostos

Depois de umas semanas de estranhamento, Fernando Haddad parece ter acertado com Arthur Lira pelo menos a votação de mais impostos sobre ricos (fundos exclusivos e offshores), na semana que vem. Talvez não venha tanto imposto quanto quer o ministro da Fazenda; nem é grande dinheiro. Mas é alguma coisa, ainda mais tendo em vista o péssimo ambiente no Congresso e a situação das contas do governo, que azedam a cada mês.

Lira, o presidente da Câmara, é um dos responsáveis pela operação tartaruga, obstruções, greves e revoltas parlamentares que andam atrapalhando as tramitações de projetos importantes. A coisa anda emperrada também porque Luiz Inácio Lula da Silva tem dito que vai ceder cargos gordos quando lhe der na telha.

Luiz Carlos Azedo - Barroso assume o STF com foco nos direitos das minorias

Correio Braziliense

Para o novo presidente do Supremo, as instituições, a sociedade civil, a imprensa, o Congresso Nacional e, “na hora decisiva”, as Forças Armadas barraram o golpismo

Aprovado a toque de caixa pelo Senado, o marco temporal das terras indígenas foi um sinal de que vem aí uma grande queda de braço entre os líderes do Congresso, que são conservadores ou mesmo reacionários, e o novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, que tomou posse nesta quinta-feira, em cerimônia na qual era visível o constrangimento com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O ministro Edson Fachin é o novo vice. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está se preparando para uma cirurgia, compareceu à posse de máscara.

Barroso foi enfático no discurso quanto aos direitos das minorias. Defendeu a paridade de gênero nos tribunais e maior diversidade racial na composição das Cortes. O ministro sempre pregou que os direitos dos indígenas e da comunidade LGBTQIA são uma questão de humanidade, não de progressismo.

Barroso destacou que o momento é de pacificação, depois de derrotado o golpismo. “O país não é feito de nós e eles. Somos um só povo”, afirmou. O novo presidente do Supremo não vê incompatibilidade entre o agronegócio e a preservação ambiental, que é um dos focos de tensão entre a Corte e o Congresso. Mantém seu entendimento de que o combate à corrupção, com o devido processo legal, continua sendo uma prioridade. Mas compreende que as instituições republicanas devem fazer um pacto de solidariedade para evitar o naufrágio da democracia.

Maria Cristina Fernandes - A pacificação emotiva que pauta o novo presidente do Supremo

Valor Econômico

Barroso temperou o discurso com um apelo à união e ao “poder da afetividade”

O ministro Luís Roberto Barroso começou a cumprir com o discurso de posse uma das promessas de sua gestão, melhorar a comunicação para que o Supremo Tribunal Federal seja melhor compreendido pela sociedade. Não poderia ter sido mais claro em relação à pacificação nacional como eixo.

Barroso não se rende ao juridiquês nos votos, não o faria no discurso de posse. O aceno àqueles que apontam excessos no Supremo veio em frases diretas: “É imperativo que o tribunal aja com autocontenção”, “a democracia constitucional é a composição de valores diversos, duas faces da mesma moeda”. “De um lado, soberania popular, eleições livres e governo da maioria. De outro, poder limitado, Estado de direito e respeito aos direitos fundamentais. Um equilíbrio delicado e fundamental.”

César Felício - Barroso não mostra recuo, mas indica pragmatismo

Valor Econômico

Reafirmação do Judiciário como Poder perpassou toda a fala do novo presidente do Supremo

O novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, em seu discurso inicial, fez uma profissão de fé na iniciativa privada, acenou para o agronegócio, ressaltou o compromisso democrático das Forças Armadas e prestou reverência à Câmara e ao Senado. As mensagens para o restabelecimento do diálogo em um momento de crise institucional foram todas dadas, mas não há nenhum sinal de recuo nas posições que deram protagonismo ao Judiciário.

Bruno Boghossian - Barroso vai conduzir o Supremo em cima de uma corda bamba

Folha de S. Paulo

Novo presidente deve enfrentar conflito entre equilíbrio político e suas próprias convicções

Luís Roberto Barroso tem uma visão do Supremo que soa como pesadelo para críticos do chamado "ativismo judicial". Há tempos, ele sustenta que o tribunal deve ser contramajoritário, representativo e iluminista. Em outras palavras, pode se contrapor a decisões de políticos eleitos, atender a demandas sociais quando há omissão desses mesmos políticos e impulsionar avanços civilizatórios que desafiem certos consensos.

O ministro procurou modular o alcance desses princípios ao assumir o comando do STF num momento de particular tensão no entorno do tribunal. O discurso de posse foi uma tentativa de reafirmar os três pilares, acrescentando um complacente passo atrás para evitar um conflito prematuro com o Congresso.

Vera Magalhães - Brasília em clima de 'Succession'

O Globo

A disputa por cadeiras importantes vagas ou por serem abertas na capital federal tem lances abaixo da linha da cintura

Brasília respira sucessões. Múltiplas, imbricadas e com potencial de desarranjar relações e antecipar a mais importante delas, a presidencial de 2026. Como na série americana “Succession”, as disputas por vagas importantes em aberto ou por vagar na capital federal têm lances abaixo da linha da cintura, plantações, fogo amigo e tal grau de ansiedade que compromete até a estratégia de políticos normalmente conhecidos pela frieza.

As mais próximas dessas trocas de guarda são no Supremo Tribunal Federal (STF) e na Procuradoria-Geral da República (PGR), que podem desencadear, ainda, a vacância de ministérios não menos cobiçados. Aquelas em que os conchavos são mais explícitos e que estão mais adiantadas, no entanto, são as disputas pela presidência da Câmara e do Senado, bem mais de um ano antes do fim dos mandatos de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco.

Bernardo Mello Franco - Barroso assume STF com recados ao Congresso e à extrema direita

O Globo

Em discurso de posse, ministro indica que não pretende recuar em pautas progressistas

Dez anos depois de vestir a toga, Luís Roberto Barroso assumiu a presidência do Supremo Tribunal Federal. Terá o desafio de cuidar da Corte sem descuidar das relações com o Congresso e a sociedade.

A cerimônia ocorreu num plenário reconstruído após a intentona golpista de 8 de janeiro. Barroso disse que “as instituições venceram”, mas sabe que a ameaça extremista continua à espreita. O Supremo mal começou a julgar os executores dos ataques à democracia. Falta identificar e punir financiadores e mandantes. Eles foram apeados do Planalto, mas ainda têm força política e econômica.

Na véspera da posse, o Senado abriu mais uma frente de atrito com a Corte. Aprovou projeto que ressuscita o marco temporal, tese anti-indígena derrubada em julgamento na semana passada. A votação mostrou que o Congresso já abandonou a retórica de pacificação nacional. A ordem é peitar o Judiciário para bloquear novos avanços em temas como drogas, aborto e defesa de minorias.

A julgar pelo discurso de posse, Barroso não está disposto a se curvar à pressão conservadora. O ministro elogiou decisões do STF que beneficiaram mulheres, negros, indígenas, casais homoafetivos. Ele prometeu que a Corte continuará a “empurrar a história na direção certa”. A ver se isso significará a retomada de debates paralisados por seus antecessores, como as ações que questionam a validade da Lei da Anistia para torturadores.

Eliane Cantanhêde - Barroso e o ‘nós contra eles’

O Estado de S. Paulo

Novo presidente do STF defende ‘pacificação nacional’, mas quem está em guerra são os três Poderes

O ministro Luís Roberto Barroso assumiu a presidência do Supremo Tribunal Federal pregando pacificação nacional e pluralismo de ideias, o que nos remete ao tiroteio entre Legislativo e Judiciário, com balas perdidas ameaçando o Executivo e suas pautas, principalmente econômicas. Quem, aliás, queria estar na pele do presidente Lula, a quem cabe sancionar ou vetar o projeto parlamentar do marco temporal das terras indígenas? Se vetar, briga com o Congresso. Se sancionar, confronta o Supremo.

Flávia Oliveira - Bahia no caminho do Rio

O Globo

Facções criminosas disputam territórios na Região Metropolitana de Salvador

A crise de segurança pública que ora atormenta a Bahia guarda indesejável semelhança com a trajetória ladeira abaixo do Rio de Janeiro no enfrentamento ao crime organizado. A escalada de violência e morte que assola o estado do Nordeste repete o que o território fluminense experimentou e, sob a política dos confrontos a bala, só resultou em luto. O rastro de sangue não poupou ninguém. Alcançou criminosos, inocentes, agentes da lei. Ainda ontem, dois policiais militares morreram em Salvador; duas semanas antes, um agente federal. Apenas em setembro, os confrontos já deixaram mais de 50 mortos.

No ano passado, informou o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, a Bahia foi o estado brasileiro com maior número de mortes decorrentes de operações. Foram 1.464 óbitos, acima do Rio (1.356), mais que o triplo de São Paulo (419). A letalidade policial é termômetro de política de segurança ancorada na repressão ao varejo de drogas e trocas de tiros em favelas e bairros periféricos, em lugar do investimento em inteligência, que poderia interromper fluxo financeiro, interditar o acesso do crime a armas e drogas, combater a corrupção policial.

Fernando Gabeira - Transição energética em território de milícia

O Estado de S. Paulo

O caso do interior do Rio de Janeiro é quase uma caricatura, porque opõe o atraso da violência a um avanço mundialmente desejado

Uma notícia me impressionou na semana: a milícia está expulsando empresas que produzem energia solar no interior do Rio de Janeiro. As regiões de Itaguaí e Seropédica têm muito sol, são planas, interligadas facilmente à rede, mas o preço cobrado pela milícia torna o negócio inviável.

Temos falado tanto de transição energética, economia verde, conversas típicas do século 21, e esquecemos que o século passado, com todas as suas mazelas, ainda está nos puxando para trás.

Dizer milícia parece delimitar o problema apenas aos limites do Estado do Rio. Isso não é bom, porque o governo federal se acomoda e os outros Estados acham que isso não acontecerá em seus domínios.

Foi assim, no entanto, com as organizações do tráfico de drogas. Ocuparam as áreas mais pobres da cidade e pareciam também um fenômeno típico do Rio. O Estado brasileiro aceitou que lhe fosse roubada a soberania sobre parte de seu território, e o exemplo acabou se expandindo para o Brasil.

Celso Ming - O lado exuberante da economia

O Estado de S. Paulo

Como ensinava nos anos 70 o então ministro Mário Henrique Simonsen, tem picada que mata e tem picada que aleija. A que mata é um forte rombo cambial. A que aleija é a inflação alta. Naqueles tempos, o Brasil foi seriamente ameaçado pelas duas. Hoje, está livre da picada que mata. Mas nem tanto da que aleija por conta dos riscos envolvendo o rombo fiscal.

Mas falemos da exuberante saúde cambial, que muito poderia beneficiar hoje o Brasil, se for bem aproveitada.

Neste ano, as receitas com exportações devem superar as despesas com importações (superávit comercial) em pelo menos US$ 73 bilhões, recorde histórico. Em outra conta, a entrada de Investimentos Estrangeiros no País deve alcançar US$ 80 bilhões. Enquanto isso, o déficit em Transações Correntes, que inclui as outras contas externas menos o fluxo de capitais, será de apenas US$ 43,8 bilhões. A dívida externa bruta é de US$ 332 bilhões, só um dedo mais alta do que as exportações deste ano e menor do que as reservas externas, hoje em US$ 344,1 bilhões. Ou seja, há fartura de dólares, ao contrário do que aconteceu por aqui na década de 1980 e que vai asfixiando a Argentina.

J. B. Pontes - A farra das emendas parlamentares continua

A nossa democracia será sempre um simulacro, caso não haja um grande esforço para qualificar o Parlamento. Grande parte dos atuais parlamentares só atua na defesa dos seus próprios interesses, com o objetivo de aumentar suas próprias riquezas e o poderio político. 

O grande objetivo deles é perpetuar-se no poder e continuar participando do assalto aos cofres públicos. Não têm condições morais e intelectuais para compreender as competências reservadas aos parlamentos – legislar e fiscalizar as ações do governo –, mas são suficientemente “espertos” para engendrar mutretas visando apoderar-se de recursos públicos.

Pesquisa divulgada recentemente pelo Datafolha mostra que somente 16% dos brasileiros ouvidos aprovam o atual Parlamento, enquanto 33% desaprovam a sua atuação. Mas continuamos elegendo corruptos. Nem os governantes, nem o povo, muito menos as instituições responsáveis pela fiscalização e controle da administração pública desconhecem que o atual parlamento é um dos mais corruptos da nossa história. Na mesma pesquisa o governo Lula continua com aprovação de 38%, enquanto a desaprovação cresce para 31% (27% na pesquisa anterior).

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

Diálogo de Lula e Campos Neto faz bem para economia

O Globo

Encontro entre os dois contribui para restabelecer normalidade institucional esperada numa democracia

O encontro entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, marca o restabelecimento da normalidade institucional. Lula parece ter reconhecido a necessidade de respeitar o responsável por uma instituição independente que, até o momento, tem cumprido sua missão. A sociedade brasileira espera que a reunião marque uma virada, encerrando a fase de críticas descabidas a Campos Neto, algumas até de ordem pessoal.

Indicado por Jair Bolsonaro, presidente que promoveu a independência do BC, Campos Neto sempre trabalhou de olhos na missão da instituição, não com base em cálculos políticos. Com os diretores do Comitê de Política Monetária (Copom), começou a subir os juros diante da escalada da inflação que se avizinhava no início de 2021, como efeito da pandemia. Entre as grandes economias, o Brasil foi um dos primeiros a iniciar o ciclo de alta. Em um ano e seis meses, o BC subiu a taxa básica de 2% para 13,75%. Em pleno ano eleitoral, manteve alto o custo do dinheiro, apesar da pressão de bolsonaristas. Contrariou quem defendia uma postura mais leniente com a inflação para aquecer a economia e, assim, favorecer a reeleição de Bolsonaro.

Poesia | Evocação do Recife - Manuel Bandeira

 

Música | Samba do Crioulo Doido - Stanislaw Ponte Preta (Sergio Porto) por Gilberto Bellini

 

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Opinião do dia – Rosa Weber*

“O Supremo Tribunal Federal permanece firme, vigilante e resiliente na defesa dos valores democráticos e pela concretização das promessas civilizatórias da Constituição. A resistência, a resiliência e a solidariedade ficaram estampadas na metáfora da travessia da Praça dos Três Poderes, todos nós de mãos dadas, desviando das pedras, dos vidros, dos cartuchos de bala. Inabalada restou a nossa democracia.”

*Ministra do STF, em discurso de despedida, 27/9/23.

 

Merval Pereira - Desencontros de Poderes

O Globo

Num Congresso de centro-direita, medidas para conter o déficit fiscal são bem-vindas, mas as pautas de valores sociais são sempre difíceis de passar

A delicada convivência de um Executivo de esquerda com um Congresso majoritariamente conservador e um Supremo Tribunal Federal (STF) progressista, ou “iluminista” como gosta de dizer seu futuro presidente, o ministro Luís Roberto Barroso, está ficando a cada dia mais problemática. A composição do ministério, que deveria ser uma representação partidária das forças políticas que venceram as eleições do ano passado, passou a ser uma miscelânea ideológica de difícil compreensão para quem gostaria de ver uma “frente ampla” governando.

Partidos comprometidos com o bolsonarismo até o último dia de governo ganharam força política para indicar ministros e dirigentes de estatais, mesmo continuando a votar contra o governo. A convivência entre estranhos está pautada por acordos congressuais que levam um governo dito de esquerda a não conseguir fazer valer posições suas, como aquela sobre o marco temporal das terras indígenas.

Em troca de não fechar questão contra a tese, permitindo que partidos que fazem parte de sua base no Congresso votassem a favor, o governo garantiu o compromisso de aprovação do arcabouço fiscal. Diferentemente do que aconteceu quando conseguiu o apoio de partidos de direita por meio do mensalão, hoje os “aliados” têm força parlamentar para questionar o Executivo e não se contentam apenas com verbas e cargos. Querem isso e mais defender suas propostas.