O Estado de S. Paulo
O que existe são estratégias militares sem estratégias políticas
Joe Biden exortou Israel a não se deixar
consumir pela raiva trazida pelas atrocidades terroristas do Hamas. E, assim,
evitar “erros” que os Estados Unidos cometeram depois do 11 de Setembro.
Foi um clássico conselho do faça o que eu
digo, mas não faça o que eu fiz. O então senador Joe Biden, que presidia a
Comissão de Relações Exteriores do Senado americano, foi um dos 77 que
autorizaram o presidente George W. Bush a empregar força militar no Iraque. A
invasão de 2003 é considerada um dos maiores desastres estratégicos da história
americana, e o preço é pago até hoje.
O problema é que, no momento atual, não há boas opções nem para os Estados Unidos nem para Israel, a quem Joe Biden literalmente abraçou. Os americanos são vistos na região como cúmplices dos israelenses, sem condições de atuar como “mediador honesto”. Mas se dissociar de Israel está fora de cogitação.
Vetaram a resolução do Conselho de Segurança
da ONU sobre o conflito em Gaza pelo motivo que as grandes potências sempre
seguem: para não terem as mãos amarradas. O texto vetado apresentado pelo
Brasil pedia “pausas humanitárias” e corredores para entrega de ajuda. Esses
dispositivos condicionariam as atuais operações de cerco e bombardeios
israelenses.
O pano de fundo do veto, porém, é muito mais
abrangente. A antecipada reação israelense às atrocidades terroristas do Hamas
levou os Estados Unidos a tentar salvar em regime de urgência o que ainda
possuem de iniciativa no Oriente Médio. A mudança da ordem internacional (o fim
da “pax americana”) é, ao mesmo tempo, causa e consequência da perda de
influência relativa na região, na qual “aliados” seguros, como Turquia, Arábia
Saudita e Egito, hoje têm jogo próprio.
Ocorre que o principal deles, Israel, também
não dispõe de boas opções. O país é muito diferente daquele que os Estados
Unidos defenderam em guerras anteriores. Está profundamente dividido por um governo
irresponsável que é grande culpado pela espécie de “crise de identidade” da
sociedade israelense – que agora “acordou” para seus dilemas essenciais
traumatizada pelo terrorismo do Hamas.
Nas palavras de Lawrence Freedman, o cerco
israelense de Gaza é a tentativa de desenvolver uma estratégia militar para
lidar com o Hamas sem ter uma estratégia política. Os clássicos ensinam que
isso nunca funciona.
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