sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Limitar trabalho aos feriados é um contrassenso

O Globo

Ministério do Trabalho deveria cuidar de temas mais importantes, em vez de impor amarras ao que funciona bem

O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, anunciou que editará nova portaria para regulamentar o trabalho aos feriados. Espera-se que o governo desfaça a confusão criada em novembro do ano passado, quando, sem ouvir a sociedade, o ministério decidiu impor novas regras que dificultam a abertura do comércio nos feriados, desagradando a empregadores, empregados e consumidores. Melhor seria não fazer nada. Na melhor das hipóteses, a portaria será mais uma regulação inútil. Na pior, um empecilho para quem mantém negócios que geram empregos.

A portaria de novembro revogava outra, editada pelo governo Jair Bolsonaro em 2021, reduzindo a burocracia para estabelecimentos comerciais funcionarem aos domingos e feriados. Diante da grita do comércio, Marinho adiou a iniciativa e prometeu discuti-la com os afetados. Fez depois o que deveria ter feito antes. De acordo com ele, a portaria de Bolsonaro afrontava a lei, que permite trabalho aos fins de semana, mas exige negociação com sindicatos para os feriados (algumas cidades brasileiras como Rio de Janeiro e São Paulo já estão adaptadas a essa norma).

A decisão açodada do ano passado foi tomada a pedido de sindicatos. Não há problema se eles quiserem levar suas pautas ao governo, especialmente tendo em conta os laços históricos do PT com o movimento sindical. O problema começa quando o Planalto atende às reivindicações sem considerar as consequências.

Mudanças no funcionamento do comércio nos feriados afetam a rotina de milhões de brasileiros, habituados a lojas abertas todos os dias. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) argumentou que as novas regras prejudicariam a atividade econômica e, consequentemente, a criação e manutenção de empregos. A Confederação Nacional do Comércio alertou sobre a insegurança jurídica em curso, tamanha a quantidade de contratos e compromissos assumidos supondo o funcionamento comercial aos domingos e feriados.

A medida foi tão desastrada que, logo depois do anúncio no ano passado, a Câmara dos Deputados aprovou urgência na tramitação de um Projeto de Decreto Legislativo suspendendo os efeitos da portaria e garantindo o funcionamento de 12 setores do mercado varejista durante todos os dias da semana.

O novo texto, que deverá ser publicado depois do carnaval, definirá os setores considerados essenciais, liberados de firmar acordos com os sindicatos para poder funcionar durante os feriados. A lista de exceções, ainda em discussão, deverá incluir cerca de 200 atividades, como farmácias e postos de gasolina. Marinho afirmou que as novas regras são fruto de negociações com sindicatos de trabalhadores e empresários.

O governo tem sido pródigo em apresentar projetos cujo objetivo declarado é acelerar o crescimento do país. É um contrassenso que, apenas para agradar a sindicatos, se imponham amarras a um setor que tem funcionado livremente sem problemas. Certo seria o Ministério do Trabalho se ocupar com questões mais relevantes para os brasileiros. Quanto menos o governo intervir no que está dando certo, melhor.

Milei deveria ceder para preservar seu plano de equilibrar economia argentina

O Globo

Ele já demonstrou disposição em negociar e, a esta altura, seu fracasso é o pior que poderia acontecer ao país

Javier Milei venceu a eleição argentina em novembro com vantagem de 11,4 pontos percentuais sobre o peronista Sergio Massa. Ficou em primeiro lugar em 20 das 23 províncias. Nesta semana, os perdedores — peronistas, em especial da variante kirchnerista, sindicalistas e movimentos sociais — promoveram a primeira greve geral contra os planos do novo presidente. Seria uma lástima se a pressão das ruas resultasse em paralisia nas mudanças necessárias para resgatar o país do fundo do poço. A esta altura, o fracasso de Milei é o pior que poderia acontecer à Argentina.

Antes do fim do ano, Milei anunciou um pacote com mais de 300 medidas para desregulamentar a economia, conhecido como “decretaço”, e enviou ao Congresso a Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos, com 664 artigos e 351 páginas, apelidada “Lei Ônibus”. Mesmo antes da greve, ele dava sinais de estar disposto a recuar em pontos controversos para aprovar as medidas no Congresso.

Ao todo, Milei excluiu 141 artigos da Lei Ônibus, que está na Câmara e precisará passar pelo Senado. Retirou da lista de estatais a ser privatizadas a petrolífera YPF. Anunciou o fim do congelamento de aposentadorias, que voltarão a ser corrigidas trimestralmente. E reduziu de quatro para até dois anos o período em que pretende governar por decreto. É verdade que a amplitude da lei ainda permanece exagerada e que o recurso ao governo por decreto deve ser medida excepcionalíssima em toda democracia. Mesmo assim, ele demonstrou disposição em negociar.

É o preço que ele paga por ter sido eleito sem base parlamentar sólida. Seu partido, A Liberdade Avança, elegeu 37 dos 257 deputados e sete dos 72 senadores. Firmou alianças com forças de centro-direita e conta com apoio de alguns peronistas e parlamentares de outras legendas. Mas precisará ainda negociar muito — e deveria ceder ainda mais na ambição do que pretende alcançar. Além de desistir de governar por decreto, é preciso recuar no autoritário “protocolo contra protestos”, medidas contra manifestações de rua que incluem proibição de piquetes, cobrança aos organizadores dos protestos do custo de mobilização das forças policiais e até a cassação de benefícios sociais de manifestantes presos.

Milei foi catapultado à Casa Rosada por votação maciça contra o peronismo. Sua vitória foi uma resposta desesperada dos argentinos à inépcia de sucessivos governos em debelar a crise econômica endêmica e reverter o empobrecimento crescente. Apesar de seu estilo histriônico, seu pacote se baseia no diagnóstico correto de que o Estado argentino precisa rever gastos e adequá-los à capacidade da sociedade de pagar impostos. Do contrário, a inflação continuará a ajustar as contas da pior maneira. Em vez de enfrentar suas limitações com vigor, a Argentina procura há décadas fugir da realidade. Milei dá a entender ter noção do caminho a percorrer num ajuste necessariamente impopular. Quanto mais o país adiar medidas que o levem a viver dentro de suas possibilidades, mais doloroso será o acerto de contas.

País gasta muito com TJs e bem pouco com proteção ambiental

Valor Econômico

Há gastos em demasia, mal alocados, a um custo financeiro exorbitante

O Estado brasileiro é o que mais gasta com ordem pública e segurança em relação a 53 países avançados e emergentes, selecionados pelo Tesouro para pesquisa. Nem por isso o país está hoje mais seguro - as despesas maiores são feitas nos Tribunais de Justiça (também maiores que as dos demais países). Tanto neles como nos serviços de polícia, a maior fatia dos recursos é consumida em salários e benefícios. O preço a pagar por regalias da elite do serviço público, e pela maior conta de juros da amostra, é que, apesar da urgência, o Brasil é o que menos gasta com proteção ambiental entre todos (dados de 2021). Há gastos em demasia, mal alocados, a um custo financeiro exorbitante.

Os gastos com o Judiciário são uma anomalia há um bom tempo. O teto da administração pública, de R$ 41.650, é massivamente furado com a profusão de verbas indenizatórias e dezenas de penduricalhos. Um projeto que limita os supersalários no setor público foi aprovado pela Câmara em julho de 2021. Ainda assim, ele considera válidos nada menos de 32 tipos de pagamentos como indenizações, direitos adquiridos ou ressarcimentos. O projeto empacou no Senado, onde o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) defende a volta do quinquênio para juízes, procuradores e Defensoria Pública - um aumento de salário de 5% a cada cinco anos.

Os Tribunais de Justiça têm despesas equivalentes a 1,61% do PIB (dado de 2021). Os países ricos dispendem 0,3% do PIB com eles e os emergentes, 0,5%. A média é de 0,4% do PIB. Os dados do Tesouro permitem comparações que dão ideia da dimensão das despesas dos TJs. O Estado gasta mais com eles do que tudo que gasta com habitação e serviços comunitários (1,23% do PIB). Os gastos dos tribunais correspondem ainda a mais de dez vezes os feitos em iluminação pública (0,11% do PIB), mais de três vezes os direcionados à proteção ambiental (0,43%) e são maiores que as despesas totais com serviços ambulatoriais para a população em todo o país. Já os gastos prisionais, de 0,2% do PIB, estão praticamente em linha com a média dos países ricos e emergentes. A qualidade dos serviços prestados não foi avaliada. Mas é fato que a Justiça brasileira é morosa e que as prisões são inumanos depósitos de seres e escolas do crime.

Os governos federal, estaduais e municipais gastaram em 2022 45,9% do PIB - ou R$ 4,63 trilhões - para se manter e prestar serviços de baixa qualidade. O governo central, com R$ 3,4 trilhões, é responsável por 73,6% das despesas. A despesa total brasileira, em 2021, de 42,7% do PIB, foi muito superior aos 35,2% dos países emergentes. Os gastos com juros e despesas financeiras atingiram 7,92% do PIB, a maior entre os países selecionados. Com dívida alta, juros altos e déficit primário, os recursos são escassos. Despesas maiores em um setor serão compensadas por menores em outros, um jogo arbitrado pelo orçamento e por interesses políticos.

A maior despesa do Estado brasileiro é com a proteção social, de 16,7% do PIB em 2022 (R$ 1,67 trilhões), uma rubrica que inclui aposentadorias, pensões, auxílio desemprego e programas de transferência de renda, como o Bolsa Família. A média dos países avaliados, com dados de 2021, foi de 13,8% ante 16,27% do Brasil e 16,18% dos países ricos. Chamam a atenção as despesas com pensões, de 2,9% do PIB, cinco vezes a média dos países (0,6% do PIB) ou mais de três vezes a média dos países ricos (0,8%).

Educação (5,2% do PIB) e Saúde (4,9%) são as despesas a seguir mais relevantes, excluindo juros. A evolução dessas rubricas entre 2010 e 2022, sempre em relação ao PIB, mostra que foi equivocada a gritaria da oposição ao teto de gastos quanto à redução das despesas - que não houve. Ambas se mantiveram no nível em que se encontravam em 2016, com ligeiro aumento no caso da Saúde. O Brasil gastou mais em 2021 (5,1%) do que os emergentes, mas ficou abaixo da média dos países (6,13%) e bem abaixo dos países ricos (7,32%).

A situação é um pouco pior na Educação. Naquele ano, as despesas brasileiras (4,49%) eram menores que a dos países da América Latina (Costa Rica, Guatemala, El Salvador), que a média dos países (4,76%) e que a dos países ricos (5,03%). Não há muita diferença na comparação com a média e os países ricos no montante de verbas para a educação infantil e fundamental 1, que se torna maior no fundamental II e ensino médio. No entanto, os gastos com educação superior (1,1%) são muito maiores que os dos demais países, distorção já apontada por educadores brasileiros.

O Brasil dá baixíssima prioridade orçamentária à preservação ambiental, o menor gasto do Estado depois de cultura e lazer. De 0,67% do PIB em 2010, as verbas foram reduzidas ainda em governos petistas e culminaram em 0,48% do PIB com Bolsonaro (R$ 48,7 bilhões). O Brasil fica atrás dos países emergentes, da média dos países e dos países ricos em gastos ambientais. Bate todos eles, no entanto, na proteção da biodiversidade.

Acabar com os privilégios do “andar de cima”, como mencionou o ministro Fernando Haddad, e rediscutir as prioridades dos gastos são a única maneira de corrigir as flagrantes distorções, entre as quais verbas irrisórias para a proteção ambiental são um exemplo gritante.

Forte e ressentido

Folha de S. Paulo

Projeção de novo governo Trump preocupa; deterioração geopolítica teria impulso

A principal anomalia da eleição presidencial dos Estados Unidos em 2016 não foi a vitória de Donald Trump. O triunfo de um candidato republicano, naquele sistema bipartidário altamente competitivo, não constitui surpresa nenhuma.

O fato incomum ocorreu alguns meses antes do pleito, quando um empresário desaforado, sem credenciais, trajetória nem compromissos na política partidária, atropelou nas primárias todo o establishment da agremiação de Lincoln, Eisenhower e Bush para sagrar-se candidato pela legenda.

O acontecimento marcou a entrada do populismo de direita na disputa frontal pelo poder na maior potência econômica e militar do planeta, berço da democracia moderna. Na Casa Branca, Trump praticou a cartilha iliberal e promoveu confusão, atritos e instabilidade.

Despediu-se do governo recusando-se a admitir a derrota nas urnas, dando azo a teorias conspiratórias e incitando uma multidão a tentar reverter à força o resultado. O Congresso foi depredado, e se seguiu uma dura reação judicial, que não poupou o ex-presidente.

Dezenas de acusações e três anos depois, Trump está prestes a tornar-se de novo o presidenciável republicano. O provável êxito nas prévias contrariaria mais uma vez o hábito nos EUA, onde o retiro da política costuma ser o destino de presidentes que perdem a reeleição.

Mais que filiações a ideias ou a plataformas, uma conexão emocional quase religiosa com o líder caracteriza o populismo. A impressão é que Donald Trump pode dizer e fazer tudo, e seu contrário, que ainda assim continuaria altamente popular para cerca de metade do eleitorado norte-americano.

Vencer as primárias republicanas não confere ao empresário exótico um bilhete garantido para retornar à Presidência. A metade dos eleitores que não o idolatra em geral também o rejeita fortemente.

Por isso, apesar da impopularidade de seu provável adversário, o presidente democrata Joe Biden, a eleição de novembro tende a ser tão disputada quanto as anteriores, que foram definidas por margens estreitas em estados-chave para o sistema indireto de escolha.

Ainda assim, é preocupante a possibilidade, agora mais concreta, de um segundo mandato para uma figura como Trump —que não esconde de ninguém o seu ressentimento nem o desejo de se vingar de agências governamentais e instituições que tolheram as suas investidas cesaristas.

A deterioração geopolítica dos últimos anos ganharia um impulso poderoso, para citar um dos efeitos indesejáveis de um segundo capítulo da aventura trumpista. Líderes autocratas, populistas e extremistas de todo o planeta teriam um aliado na Casa Branca.

A arena da educação

Folha de S. Paulo

Usar o setor para disputa ideológica é desserviço de governantes e parlamentares

Como se já não enfrentasse problemas suficientes, a educação se tornou nos últimos anos arena para embates ideológicos no ambiente polarizado da política brasileira. No mais recente episódio, as bancadas ruralista e evangélica se mobilizam contra o Plano Nacional de Educação do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O PNE é um projeto decenal que organiza políticas para o ensino em articulação com os entes federativos. É elaborado pelo Executivo após debates na Conferência Nacional de Educação (Conae) e, depois, submetido ao Congresso.

Encerra-se neste ano o PNE em vigor, aprovado sob Dilma Rousseff (PT) —e marcado, aliás, pela meta demagógica e irrealizável de elevar o gasto público no ensino a 10% do PIB. Assim, a Conae, convocada pelo governo, deverá ser realizada entre 28 e 30 de janeiro.

Parlamentares ligados a setores conservadores pedem o adiamento da conferência, alegando que o documento oficial que a apresenta tem viés político.

O motivo do alarido são referências do texto a temas como diversidade de gênero e religião, pessoas LGBTQIA+ e meio ambiente, além de críticas a pautas como militarização de escolas e "homeschooling" (ensino em casa).

O arrazoado oficial é extenso, com 178 páginas, e no geral sóbrio. Mas há trechos que de fato descambam para o confronto político.

Afirma-se que diversidade e direitos humanos "sofrem ataques violentos de forças midiáticas, parlamentares, ruralistas, políticas, jurídicas e conservadoras" e que machismo, racismo e sexismo são norma de projetos do Congresso. Chama-se o impeachment de Dilma Rousseff (PT) de golpe e denunciam-se "políticas educacionais de base ultraconservadora".

É inegável que a educação passou por gestão desastrosa sob Jair Bolsonaro (PL), quando foi tratada à base de obsessões ideológicas. No entanto o governo Lula partidariza tema que exige abordagem técnica —e fornece um cavalo de batalha para ataques sensacionalistas do bolsonarismo.

Considerando que o PNE precisa ser votado por um Congresso onde não dispõe de maioria confortável, a administração petista age de modo insensato ao acirrar disputas com politização rasteira.

Já os parlamentares deveriam cumprir seu papel e debater politicas púbicas com método e evidências, em vez de fazerem birra por ideologia ou oportunismo.

O PT tem horror aos fatos

O Estado de S. Paulo

Ao lançar suspeitas infundadas sobre a idoneidade do jornalismo profissional, o chefe da Secom, Paulo Pimenta, deixa claro que só está onde está para servir de arauto da mitologia petista

O ministro-chefe da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República, Paulo Pimenta (PT-RS), foi às redes sociais há poucos dias para lançar suspeitas infundadas sobre a idoneidade do jornalismo profissional. O sr. Pimenta não gostou da cobertura da imprensa sobre os novos investimentos anunciados pelo presidente Lula da Silva na Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, um dos epítomes da incúria e da corrupção desbragada que marcaram indelevelmente os governos lulopetistas. Segundo o chefe da Secom, empresas da “grande mídia corporativa” estariam agindo em “sincronia e articulação” – eufemismo nada sutil para conluio – com o objetivo de “blindar o fracasso das privatizações”, seja lá o que isso signifique, e sabotar a “tentativa soberana do Brasil de retomar o controle de sua política energética, em especial na área de petróleo e gás”.

A mitologia petista, deve-se reconhecer, faz um tremendo sucesso nas redes sociais, um ambiente no qual as afinidades tribais valem muito mais do que a verdade factual. Porém, por mais tentador que seja pregar para convertidos, o ministro Paulo Pimenta poderia ao menos fingir que se comporta com algum grau de espírito público e respeito à institucionalidade no exercício do cargo. Afinal, convém recordar, a comunicação governamental deve se dirigir a todos os cidadãos, e não apenas aos que se ajoelham sob o altar da seita lulopetista. Ademais, no rol de competências da Secom, bem delimitado no art. 1.º do Anexo I do Decreto n.º 11.362/2023, não está servir de dublê de analista político nem tampouco atuar como ombudsman do jornalismo profissional.

Contudo, se o chefe da Secom deseja ensinar como a imprensa deve realizar o seu trabalho e especular sobre quais seriam seus objetivos ao publicar informações de interesse público, que então peça exoneração do cargo, reassuma seu mandato de deputado federal e ocupe a tribuna da Câmara para vocalizar suas aleivosias num local mais apropriado. Naturalmente, nada disso vai acontecer. O ministro Paulo Pimenta, e não só ele, conta com a benevolência de seu chefe diante dessa extrapolação de atribuições. O País atravessa uma preocupante fase em que noções como republicanismo, impessoalidade na administração pública e papéis e responsabilidades de servidores parecem ter se tornado obsoletas.

Só uma mente muito fértil ou malintencionada, daquelas suscetíveis às teorias da conspiração, é capaz de conceber a ideia de que, de tempos em tempos, haveria uma grande articulação a portas fechadas entre veículos jornalísticos com o único propósito de desestabilizar um governo, seja qual for. Ora, se a imprensa independente age em “sincronia e articulação” nas críticas pontuais à retomada dos investimentos na Refinaria Abreu e Lima, isso não é outra coisa senão um sinal inequívoco de que jornalistas dignos da profissão têm memória e essa imprensa está cumprindo sua função primordial de ser guardiã da verdade factual, levando à sociedade informações de seu interesse a tempo certo.

Como a fênix, Lula pode ter renascido das cinzas para voltar à Presidência da República depois de todos os reveses políticos e jurídicos pelos quais passou nos últimos anos. Mas isso não muda os fatos nem reescreve a história do País. Seu triunfo eleitoral não tem o condão de criar uma nova “realidade”. Os erros e os crimes cometidos durante os governos de Lula e Dilma Rousseff no setor de óleo e gás, que arruinaram a Petrobras em nome de delirantes projetos desenvolvimentistas e de imperativos eleitorais e corruptos, não se apagam pela força da vontade ou do discurso do chefe da Secom.

As diatribes do ministro Paulo Pimenta, reverberadas pela presidente de seu partido, a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), são típicas de quem não se conforma em ver decisões de governo serem escrutinadas pela imprensa profissional e independente. Ou seja, de quem não nutre simpatia por um pilar fundamental da democracia.

Alertas de desequilíbrio fiscal

O Estado de S. Paulo

Cerca de 90% das prefeituras paulistas foram advertidas pelo Tribunal de Contas do Estado, sinal preocupante dos maiores PIBs para o País e seus mais de 5 mil municípios

Algo está muito errado quando quase 90% dos 644 municípios paulistas recebem do Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) alertas de desenquadramento fiscal e indícios de irregularidades na gestão orçamentária, como foi relatado em recente reportagem do Estadão sobre as contas de 2023. O quadro parece ainda pior quando se constata que, das oito cidades onde foram identificados os maiores níveis de comprometimento da receita com despesas correntes, seis estão na lista das dez maiores economias de São Paulo, o Estado mais rico do País.

E como nada é tão ruim que não possa piorar, o portal do TCE-SP mostra que essa é uma situação recorrente. Das 567 prefeituras que apresentavam indícios de irregularidades em relação ao cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de acordo com o relatório bimestral divulgado em dezembro do ano passado, 556 eram reincidentes. Somente 11 municípios, ou seja, menos de 2% do total, estavam em situação regular, sem necessidade de publicação de nenhum alerta.

Ora, mesmo considerando que obrigações constitucionais, como as despesas obrigatórias com Saúde e Educação, muitas vezes engessam os já escassos orçamentos municipais, é inequívoco o sinal emitido pelo TCE-SP de que há uma dificuldade grave e generalizada de administração nas prefeituras paulistas. Não são poucas as cidades que receberam, ao longo de 2023, mais de 20 avisos e encontram-se em alerta vermelho.

Com 99,33% de suas receitas comprometidas com despesas correntes, São José dos Campos, que figura em primeiro lugar na lista de cidades em situação irregular, é uma dessas cidades. O município tem o nono maior PIB entre as cidades paulistas e, no entanto, recebeu 20 avisos, ao longo do ano passado, de que o comprometimento da receita com despesas correntes havia passado de 85%.

O caso é apenas um exemplo a ilustrar a situação preocupante dos entes subnacionais. Poderia ser citado Guarulhos, o terceiro maior PIB paulistano (atrás somente da capital e de Osasco), que também foi advertido sobre irregularidades. Por isso é plausível deduzir que, se a conjuntura atual é essa em cidades relativamente abastadas, a situação deve estar bem pior na maioria dos municípios brasileiros, boa parte dos quais incapaz de andar com as próprias pernas.

O bom senso não permite imaginar que a quase totalidade das cidades paulistas esteja a ponto de ter suas contas reprovadas e de ver seus prefeitos acusados de improbidade administrativa e crime de responsabilidade, como prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas o quadro não permite condescendência, especialmente quando se recorda que um dos fatores que mais pesaram na alta inflacionária dos anos 80 foi justamente a precariedade das contas estaduais.

Em vigor desde 2000, criada justamente para ajudar a disciplinar a administração de recursos públicos e manter a estabilidade da economia duramente conquistada, a Lei de Responsabilidade Fiscal obriga os Tribunais de Contas a emitirem periodicamente relatórios com alertas específicos quando verificadas situações que possam levar a desequilíbrios, tais como descumprimento de metas fiscais, gasto excessivo com pessoal e comprometimento financeiro inadequado.

Uma boa política fiscal é aquela que, ao final das contas, consegue equilibrar minimamente gastos e arrecadação e que contribui para reduzir desigualdades econômicas entre setores e entre cidadãos. A estabilidade conduzida por uma gestão fiscal eficiente, além de controlar a inflação, protege contra a recessão e o desemprego. O exemplo fiscal deve vir de cima, do governo federal, e se espalhar pelos demais entes federativos.

Não é o que o País vem presenciando. União, Estados e municípios flertam perigosamente com práticas sabidamente reprováveis, como o aumento imprudente de despesas. Ou, de outro lado, apelando a medidas populistas que contribuem para esvaziar os cofres públicos.

Em que pesem as questões particulares de cada município, não há como encarar situações em que o déficit fiscal se espalha de forma indiscriminada por administrações tão distintas sem considerar que há um problema estrutural que pede solução duradoura.

Às favas a boa governança

O Estado de S. Paulo

Nova indicação política para a Petrobras confirma desprezo do governo por boa gestão

A indicação do advogado Renato Galuppo para substituir Efrain Cruz como um dos representantes da União no Conselho de Administração da Petrobras ratifica o juízo torto do governo segundo o qual a ideologia lulopetista está acima de qualquer critério de boa governança. Galuppo foi um dos nomes rejeitados no início do ano passado na averiguação interna da companhia por descumprir normas tanto do estatuto quanto da Lei das Estatais.

Efrain Cruz, recentemente exonerado da secretaria executiva do Ministério das Minas e Energia (MME), também havia sido reprovado na análise curricular do comitê interno, assim como outros nomes indicados pela União. Para manter as nomeações, o governo Lula da Silva contou com a ajuda providencial de uma liminar do então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, suspendendo restrições da Lei das Estatais que impedem dirigentes políticos e titulares de cargos públicos no alto comando de empresas sob controle da União.

Lewandowski se prepara para assumir o Ministério da Justiça, e sua decisão liminar até hoje não foi submetida à apreciação dos demais ministros do STF, razão pela qual os indicados do governo Lula exercem sem empecilhos os cargos para os quais foram convocados. Cruz, um nome ligado ao Centrão, renunciou ao Conselho depois da exoneração no MME e está sob investigação por indícios de irregularidades quando dirigiu a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

No ano passado, o estatuto da Petrobras foi modificado para facilitar as indicações políticas na empresa. E assim o governo segue em sua marcha para quebrar a blindagem de governança erguida em torno da empresa depois do escândalo do “petrolão”, ocorrido nos governos de Lula e Dilma Rousseff.

A interferência na Petrobras durante as gestões petistas alcançou um nível tão alto que pôs em risco a própria sobrevivência da empresa. O fortalecimento das normas de gestão foi a forma encontrada para garantir qualidade técnica e expertise de diretores e conselheiros e criar obstáculos ao uso político da companhia.

Galuppo, advogado com atuação jurídica na Câmara, foi barrado no ano passado por ser filiado ao Cidadania e por não ter nenhuma experiência em uma empresa do porte e setor de atuação da Petrobras. Agora, não deve encontrar maiores dificuldades em se manter no Conselho, presidido por Pietro Mendes, que também havia sido considerado inelegível na avaliação do comitê interno da Petrobras, no ano passado, principalmente pelo conflito de interesses que representa em razão do cargo de secretário de Petróleo que ocupa no MME.

É dessa maneira, minando por dentro a governança da Petrobras, que Lula pretende converter a empresa em agente de sua agenda política, tal como fez seu antecessor e antípoda, Jair Bolsonaro – que também insistiu na indicação de dois conselheiros que haviam sido rejeitados pelo Comitê de Pessoas da companhia por conflito de interesse. A governança da Petrobras nunca foi relevante nem para Bolsonaro nem para Lula, desde sempre interessados somente em usá-la para seus projetos de poder.

O autocuidado e o câncer de mama

Correio Braziliense

Em 2023, foram realizados pela Fundação Instituto de Pesquisa e Estudo de Diagnóstico por Imagem (Fidi) quase 195 mil exames de mamografias. Esse número corresponde a um aumento de 10,12% quando comparado a 2022, e 43,69% se comparado a 2021

O termo autocuidado está muito em voga, especialmente no princípio do ano. Em 2023, foram realizados pela Fundação Instituto de Pesquisa e Estudo de Diagnóstico por Imagem (Fidi) quase 195 mil exames de mamografias. Esse número corresponde a um aumento de 10,12% quando comparado a 2022, e 43,69% se comparado a 2021. O Dia Nacional da Mamografia, neste 5 de fevereiro, pretende justamente reforçar a importância do procedimento para a redução de casos de câncer.

Ao longo dos anos, o exame evoluiu muito, com imagens cada vez mais nítidas e resultados precisos. No entanto, muitas mulheres ainda se queixam de dores durante o procedimento, devido à pressão que o equipamento produz sobre os seios. Além de detectar precocemente os sinais de câncer de mama em mulheres assintomáticas — mamografia de rastreamento — que não apresentam sintomas evidentes, ele também pode ser solicitado quando há sintomas ou achados suspeitos identificados em exames anteriores — mamografia diagnóstica.

Esses sintomas podem incluir dor mamária, nódulos palpáveis, alterações na pele ou descarga mamilar (uma espécie de secreção) e independem de afetar apenas mulheres acima de 40 anos. No entanto, apenas 4,25% das mamografias realizadas foram diagnósticas, o que demonstra que a busca pelo procedimento em quem apresenta sintomas ainda é extremamente baixa.

Para o triênio 2023-2025, o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional de Câncer (INCa) estimam que ocorrerão mais de 74 mil novos casos de câncer de mama, o segundo mais frequente no Brasil, o que em números absolutos corresponde a 2,3 milhões de casos, representando 24,5% do total de cânceres. Um fator que corrobora este alerta é um estudo realizado em 204 países e publicado pela revista científica BMJ Oncology, segundo o qual os casos de câncer entre pessoas com menos de 50 anos aumentaram 79% nas últimas três décadas e aqui estão incluídas mulheres acima dos 40 anos.

Outra questão que muitas mulheres desconhecem é que, em parte dos casos, é fundamental fazer, concomitantemente, o exame de ultrassom das mamas. Embora alguns especialistas não vejam a necessidade desse segundo exame, há uma classe de médicos que defende que somente a ultrassonografia dos seios é capaz de avaliar nódulos palpáveis não vistos na mamografia, assim como o conteúdo dos nódulos e a consistência — se são sólidos, se são cistos ou até nódulos sólidos císticos.

O ultrassom das mamas avalia nódulos em gestantes e também é indicado para pacientes que buscam colocar próteses de silicone ou para detecção de câncer de mama em homens. Mais importante é dizer que, de forma alguma, um procedimento substitui o outro.

Para evitar números cada vez mais alarmantes sobre a curva do câncer de mama em mulheres no Brasil, é primordial realizar o exame precoce de mamografia. É ele que auxilia a detectar a doença ainda em estágios iniciais, evitando, assim, que a descoberta de uma lesão venha apenas em fases mais avançadas. Pesquisas indicam que, quando o câncer de mama é diagnosticado em fase inicial, as chances de cura chegam a 95%. Portanto, nada mais assertivo que o autocuidado, melhor ainda se for iniciado no começo do ano.

 

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