Folha de S. Paulo
Se STF agisse com coerência na discussão das
drogas, entraria em rota de colisão com o Legislativo
Num mundo em que a lógica fosse a marca
do STF,
uma crise entre Poderes já estaria contratada.
O Supremo está a um
voto de formar maioria para declarar inconstitucional o artigo
28 da Lei
Antidrogas.
O referido artigo determina as penas para a posse de entorpecentes para uso próprio. Espera-se também que a corte estabeleça marcos objetivos para distinguir usuários de traficantes.
Numa primeira violação à lógica, o STF,
embora tenha decidido aplicar repercussão geral ao caso, resolveu também
torná-lo menos geral, restringindo os debates à maconha. Não consigo vislumbrar
nenhum raciocínio jurídico coerente que permita concluir que o artigo 28 é
inconstitucional em relação à maconha, mas constitucional em relação a
outras drogas.
Seja como for, os senadores não gostaram nem
dessa versão atenuada e avançam na
aprovação de uma proposta de emenda constitucional (PEC) que
criminaliza a posse de qualquer quantidade de droga ilícita.
O problema é que, se a corte máxima decidir
mesmo que o artigo 28 é inconstitucional, ela o fará com base no artigo 5º da
Carta, considerado uma cláusula pétrea. Isso significa, pelo art. 60, §4°, IV
do mesmo diploma, que o conteúdo da PEC não poderia ser objeto nem de
deliberação. A criminalização representaria uma restrição de direitos
individuais, que estão protegidos da ação do legislador ordinário. O STF,
quando provocado, não teria alternativa lógica que não a de invalidar a PEC. É
claro que o Legislativo reclamaria e teríamos uma situação que poderia evoluir
para crise.
Não creio que chegaremos a tanto. Até Lula se
pôs em campo para abafar as coisas. Eu não ficaria surpreso se a matéria sumir
da pauta do Supremo. Mas, se chegássemos, seria o Legislativo que estaria
violando a lógica. Foi o Parlamento, afinal, que aprovou e promulgou a Carta de 1988,
que indubitavelmente dá ao STF a última palavra para decidir o que é e o que
não é constitucional.
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