Folha de S. Paulo
Para o governo, Congresso é ruim quando veta
imposto e bom quando deixa aumentar gasto
Quanto se vai cobrar de imposto sobre venda de
carros? De carne e
outras comidas? O que vai ser de planos de
saúde? Cada empresa ou ramo de negócios tenta puxar a brasa para sua
sardinha enquanto o Congresso discute a lei que vai definir os detalhes que
darão sentido prático à reforma dos
tributos sobre o consumo, que por enquanto é uma mudança mais
genérica inscrita na Constituição.
Essa disputa já está clara. Deve ficar mais
complicada porque se expande a guerra dos impostos e sobre outros
dinheiros públicos. São dezenas de setores empresariais, com apoio
do Congresso, versus Lula 3; é STF versus Congresso; são estados e municípios
versus governo federal. Etc.
Quanto menor a alíquota do imposto sobre o consumo de um produto ou serviço, maior será a de outros. O conflito em parte é normal. Em parte, é resultado de velhos vícios, a tentativa de cavar favores estatais para beneficiar o próprio negócio, o que ajudou a criar o monstro tributário brasileiro.
A reforma tributária do consumo não tem
relação direta com a guerra geral dos impostos, que ficou mais quente. Mas,
para empresas e pessoas físicas, a despesa com o pacote de impostos é uma só.
No fim das contas, quem pode vai tentar pagar menos ou não pagar mais, não
importa por meio de qual tipo de tributo.
O confronto era previsível, havia anos. Afora
um soluço artificial em 2022, a despesa federal não cabe na receita faz uma
década. Desde 2014, pelo menos, era tanto preciso aumentar a carga tributária
quanto conter despesa.
O governo tem promovido enorme aumento de
gasto, em parte inevitável, pois a miséria andava mais horrível do que de
costume. Bateu palmas para o Congresso quando conseguiu aprovar a emenda
constitucional da transição e outros gastos, umas três centenas
de bilhões desde o início de Lula 3. Tinha também o plano de aumentar impostos,
que desde o início não cobririam o gasto extra, porém. Já havia aí um embrião
de besteira, mas Lula 3 recriou sistemas de reajustes automáticos de despesa
que agravam o problema. Agora, o governo reclama do Congresso, que não aprovou
o pacote inteiro de impostos e, pior, quer mais despesa ou fazer mais favores
com dinheiro público. Mas está tudo errado.
O assunto não é interessante como o vídeo da
cantora Ludmila, que causou comoção e guerra cultural. Mas convém
prestar atenção à guerra dos impostos, causada por crise fiscal. A gente trata
das intrigas políticas desse conflito, "bastidores", mas não nota o
rinoceronte na sala. O nome do bicho é conflito distributivo aberto e agudo,
guerra por dinheiros públicos e privados.
Desde o ano passado, Lula 3 tenta fazer com
que empresas de 17 setores voltem a pagar, na íntegra, imposto sobre folha de
salário (herança de Dilma Rousseff, aliás). Perdeu as batalhas. Foi ao
Supremo para reaver esse dinheiro, assim como aquele da redução da
contribuição para o INSS de mais de 5.300 prefeituras, dádiva do Congresso.
Quer de volta o dinheiro do abatimento de imposto para empresas de eventos,
turismo, esporte, cultura etc., concedido na pandemia (Perse)
e prorrogado pelo Congresso.
Estados
querem perdão de dívida com a União (menos receita para o
governo federal), com apoio do Senado em especial, que também pretende dar
mais dinheiro para ricos servidores Judiciário e Ministério Público. O Rio de
Janeiro foi ao STF para deixar de pagar dívida com a União.
Etc.
O governo prevê de modo otimista que a dívida
pública crescerá até 2027. Outras contas não preveem estabilização da dívida
antes de 2030, em perto de 80% do PIB.
Como se não bastasse, o já pouco
rigoroso arcabouço
fiscal, o teto móvel de gastos de Lula 3, vai implodir em 2026 ou
2027 se não se fizer ao menos remanejamento de despesas previsíveis (em
Previdência, saúde, educação).
A dívida vai aumentar, pois, mesmo em anos de
crescimento da economia, aqueles em que é preciso conter o aumento do passivo.
Se o crescimento do PIB vier a ser menor do que a mediocridade prevista (uns
2,5% ao ano) e/ou as taxas de juros voltarem a subir, o caldo engrossa. É fácil
perceber que, para uma mesma taxa de juros, o pagamento de juros é maior se a
dívida é maior. Se também a taxa subir, pior.
Com dívida maior, mesmo sem crise aguda
imediata, a redução das taxas de juros será menor do que a prevista,
prejudicando o crescimento.
É tudo autodestrutivo.
Um comentário:
Jesus!
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