Valor Econômico
Desolada, uma mulher contou à comitiva
presidencial que visitava os flagelados no Rio Grande do Sul os dramas que
enfrentava com o filho. Era dia 15 de maio. O abrigo onde estavam instalados em
São Leopoldo abrigava 1.500 pessoas atingidas pela catástrofe climática que
devastou o Estado.
“Ele fica pedindo os brinquedos, não está
entendendo porque eu não estou dando os brinquedos dele”, lamentou, devastada,
acrescentando que o garoto também não parava de perguntar se realmente procedia
o que um amiguinho dizia. “É verdade que a escola foi levada pela água?”,
repetia ele à mãe, que não sabia o que responder.
Àquela altura, não havia mesmo como prever quando voltariam para casa. Nem o retorno às aulas.
Como mostrou o Valor em seu site
nessa terça-feira (28), cerca de duas semanas depois São Leopoldo ainda tem
muitas ruas alagadas e casas abandonadas. Montanhas de lixo se acumulam nas
ruas, entre destroços e móveis inutilizados. Sua população, assim como milhares
de habitantes de outras cidades gaúchas, precisará de ainda mais força nessa
nova fase.
Integrante da comitiva que foi ao Sul, o
ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome,
Wellington Dias, retornou a Brasília com relatos como aquele na bagagem. Para
ele, realizada a ajuda emergencial, os esforços agora precisam se voltar para a
saúde mental da população e a economia do Estado.
Uma de suas recentes medidas foi procurar o
Conselho Federal de Psicologia e a entidade que reúne os psiquiatras do Brasil,
com o objetivo de realizar um trabalho conjunto. Na avaliação de integrantes do
governo Lula, a experiência da pandemia demonstra que deve-se estar muito
atento ao período posterior ao trigésimo dia de grandes calamidades. É
justamente o momento que começará a ser enfrentado a partir de agora no Rio
Grande do Sul.
Quanto à economia, espera-se uma queda
abrupta do Produto Interno Bruto (PIB) gaúcho em um primeiro momento. O
ministro defende que a administração federal e a gestão estadual adotem uma
estratégia conjunta para reconstruir o Estado. Uma ideia envolve a injeção de
grandes investimentos nas áreas devastadas em projetos estratégicos, de forma a
promover o emprego da população local.
Segundo o ministro, isso já está sendo
tratado entre a equipe econômica e o governo local. Diferentemente do que
ocorreu na pandemia, quando o Estado auxiliou o cidadão para que ele não saísse
de casa, neste caso seria uma forma de dar novo dinamismo à economia via
trabalho e renda.
Cinco dias depois da visita a São Leopoldo,
Lula afirmou algo nesse contexto. Segundo o presidente, em vez de ficar
lamentando, era necessário “ir para cima” e assegurar que o Rio Grande do Sul
será recuperado e não faltarão recursos para ajudar o Estado. E destacou: essa
é uma possibilidade fazer a economia brasileira crescer mais ainda.
Será um desafio considerável. O Estado
responde por cerca de 6% do PIB do país, mas já não vivia os seus melhores
momentos antes da tragédia.
Após crescer 7,3% em 2021 sobre uma base
deprimida do ano anterior, a economia gaúcha desacelerou em 2022 e avançou
1,1%. Destaque positivo para os setores da construção e serviços.
A agricultura impactara negativamente a
atividade local naquele ano, enquanto a produção industrial também havia
arrefecido. O nível de utilização da capacidade instalada teve média de 81,6%
no ano, ligeiramente abaixo da observada no ano anterior. O último dado
disponível da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs),
de fevereiro de 2024, apurou 80,1% de utilização da capacidade instalada.
Em 2023, de acordo com o governo estadual, o
PIB gaúcho cresceu 1,7%. Ou seja, abaixo da taxa nacional, de 2,9%. Por
atividade econômica, a agropecuária havia se recuperado e os serviços iam
relativamente bem, mas a indústria registrou retração de 4,0%. O setor deve
receber atenção especial das próximas medidas do governo federal.
Em “Formação Econômica do Brasil”, Celso
Furtado detalha o desenvolvimento da economia gaúcha desde o impulso inicial da
região devido à criação de gado até a chegada do trabalhador europeu, que
movimentou a atividade local. Citando especificamente São Leopoldo, aliás,
Furtado escreveu na obra algumas linhas que podem servir de alerta ao descrever
o esforço do governo imperial de subsidiar o desenvolvimento local com obras
que, em suas palavras, se prolongavam algumas vezes de forma absurda. “E quase
sempre, quando, após os vultuosos gastos, se deixava a colônia entregue a suas
próprias forças, ela tendia a definhar, involuindo em simples economia de
subsistência”, pontuou Celso Furtado, primeiro ministro do Planejamento do
Brasil.
O poder público reagiu rápido e,
corretamente, vai direcionar volumosos recursos para viabilizar a reconstrução
do Estado. Mas é fundamental que isso ocorra de maneira a adaptar a região para
a nova realidade climática e, também, dar novo impulso à economia local de
forma estruturada. Erros cometidos por lá no passado não podem ser repetidos
desta vez.
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