As
eleições municipais, que irão acontecer
em outubro próximo, colocam em disputa
as concepções de governar e de se relacionar de cada um de nós com o lugar em
que vivemos, desafiando a construção de novas formas e meios de fazer política,
diante das nossas urgências, em função das distintas realidades econômica, social e ambiental,
agravadas com a crise climática em curso - sintoma da insustentabilidade do
mundo em que vivemos, vivida atualmente
de forma angustiante e trágica por toda a sociedade brasileira.
Os
resultados das últimas eleições municipais de 2020 registraram um nível de
abstenção recorde de 23%, segundo o Tribunal Superior Eleitoral, refletindo no
nível de participação do eleitorado de apenas 41%, junto ao nível de
insatisfação que foi de 31% da população.
Ao mesmo tempo, constatou-se, nos pleitos municipais de 2020, um maior protagonismo dos movimentos sociais em defesa de uma efetiva participação política das mulheres, dos afrodescendentes, dos indígenas, LGBT+, discutindo as questões específicas da sociedade, renovando as Câmaras Municipais e Prefeituras dos médios e grandes municípios, trazendo novas lideranças, representando a voz rouca dos excluídos da sociedade para a disputa e o exercício do poder municipal. Há ainda que se destacar a eleição de lideranças religiosas, particularmente evangélicas, o que já vem ocorrendo no Brasil, nas últimas décadas.
A
Construção de uma Gestão Municipal Democrática e Sustentável
As
atuais políticas socias, econômicas e ambientais não atendem às demandas da
maioria da população dos municípios
brasileiros, excluídas do bem estar da sociedade contemporânea.
Quais
seriam os fundamentos de uma gestão municipal democrática e sustentável?
Os
futuros prefeitos e vereadores, a serem eleitos em outubro de 2024, vão
enfrentar, desde o primeiro dia dos seus mandatos, a difícil realidade de uma
parcela majoritária da população dos municípios brasileiros, que vive de uma
maneira insustentável: em condições precárias de moradia, trabalho, segurança,
educação, saúde, saneamento e mobilidade urbana.
Os
novos vereadores e prefeitos eleitos, em outubro próximo, desde a campanha
eleitoral, devem estar comprometidos com o enfrentamento sistemático destes graves problemas sociais, econômicos e
ambientais, atingindo sobremaneira os mais vulneráveis da sociedade.
Os
resultados eleitorais das últimas eleições municipais no Brasil apontaram para
o fortalecimento do centro político, com o enfraquecimento dos extremos, tanto
à esquerda, quanto à direita – apesar da alta popularidade do presidente
Bolsonaro. As populações dos municípios sinalizaram que a polarização política
não resolve as dificuldades cotidianas da cidadania. Muitas vezes, agrava,
quando se repetem na realidade municipal as polarizações políticas nacionais,
que não ajudam a enfrentar os reais problemas do município.
Portanto,
a sinalização da sociedade nas eleições municipais de 2020 foi clara: o Brasil
bipolar, dos extremos, não conseguiu e não tem conseguido construir soluções
para os complexos desafios da sociedade brasileira, nem a nível nacional, muito
menos em escala municipal. Os desafios econômicos, sociais e ambientais
históricos e atuais da sociedade brasileira devem ser enfrentados de uma
maneira propositiva, ampliando a capacidade de diálogo e de construção de
pactos políticos, econômicos, sociais e ambientais que avance e consolide a
democracia, no caminho de transformação da injusta realidade brasileira.
Nesta
perspectiva, a cidadania cumpre um papel mais que relevante nas eleições
municipais. Pode e deve participar de uma maneira proativa para mudar a nossa
trágica realidade econômica, social e ambiental, desnudada com a pandemia e que
continua a nos envergonhar como sociedade brasileira.
Assim,
cada vez mais, nas redes sociais e nas ruas, a cidadania pode e deve construir
novas relações com a municipalidade, buscando interferir no processo de
construção de políticas públicas para uma governança que se quer democrática,
realizadora das mudanças necessárias, a serem pactuadas para a construção da
almejada sustentabilidade política, econômica, social e ambiental, em cada
município brasileiro.
A
criação de mecanismos institucionais de acompanhar e avaliar as relações entre
o Executivo, o Legislativo, o Judiciário e a sociedade municipal em geral
desafiam a cidadania e o poder público à construção de novas relações entre os
atores políticos, econômicos, sociais e ambientais do município, na busca da
desejada gestão municipal sustentável, no caminho de um novo pacto federativo,
inclusivo e democrático. Considerando sempre a necessidade de uma visão
sistêmica no processo de construção das políticas públicas municipais, onde a
educação, a ciência e a tecnologia, a saúde, o saneamento, a habitação, a inclusão
digital, o combate à corrupção, o trabalho e a renda devem ter um papel de destaque.
A
governança democrática municipal deve ter como fundamentos a transparência e o
diálogo permanente com a sociedade, apontando a viabilidade e as dificuldades de implementação das políticas públicas
aprovadas para o município. Deve-se considerar ainda que uma gestão municipal,
que se pretende democrática, deve ter prioridades, através de diálogo
permanente entre os que governam e a sociedade, que garanta a implementação de políticas públicas voltadas
para a sustentabilidade municipal, articuladas às políticas regionais,
estaduais e federais, construindo pactos de cooperação entre o Estado, o
Mercado e a Sociedade Civil, através de redes regionais, nacionais e
internacionais, com foco na melhoria do bem-estar da sociedade.
Neste
contexto, todos estão desafiados, no processo político eleitoral em curso: os
atuais candidatos, os prefeitos e vereadores eleitos nas próximas eleições
municipais, em diálogo com a sociedade, a ter uma efetiva participação na
construção e na implementação de políticas públicas municipais para os próximos
quatro anos, em cada município brasileiro, colaborando com o processo de
avaliação permanente dessas políticas, buscando atender as demandas municipais,
em sintonia com as outras políticas públicas regionais e nacionais, no caminho
da sustentabilidade econômica, social e ambiental de cada município brasileiro.
Estes
são os nossos dilemas a serem superados para o avanço da democracia brasileira,
com a inclusão dessas populações municipais no processo de construção de
políticas públicas sustentáveis, significando a vida das pessoas em cada
município do Brasil.
Assim,
o exercício pleno da cidadania, com a participação proativa da sociedade, é o
caminho que vai criar as condições para uma efetiva transformação da realidade
política, econômica, social e ambiental de cada município brasileiro.
*Professor
da UFBA e da Diretoria do Instituto Politécnico da Bahia
Um comentário:
Diante de uma crise climática cada vez mais evidente, Gurgel defende, de forma lúcida, o diálogo entre os diversos atores, para além das diferenças e, sobretudo, das polarizações crescentes. Ele nos lembra que a saúde planetária deve estar acima de ideologias, seja à esquerda ou à direita. A proposta de uma agenda de políticas públicas para a sustentabilidade, integrando Estado, Sociedade Civil e Mercado, sugere uma revisita a um clássico da canção mineira, pela harmonia e consciência coletiva: 'Vamos precisar de todo mundo
Um mais um é sempre mais que dois
Pra melhor juntar as nossas forças' (Beto Guedes)"
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