O Estado de S. Paulo
Se todos os gastos previstos saírem do papel,
o ajuste exigido a partir de 2027 terá de ser muito maior
O cenário para o risco fiscal do Brasil em 2026, ano da eleição presidencial, é o seguinte: os investidores vão seguir aceitando desaforos nas contas públicas, com o governo jogando “lixo” para debaixo do tapete, ou seja, manobrando para colocar gastos extras para fora dos limites fixados no arcabouço fiscal, enquanto sonham com um robusto ajuste a partir de 2027.
É o que se deduz dos juros reais de 7,3% que o governo está pagando pelos títulos públicos com prazo de dez anos. Nessa taxa, já está precificada pelos investidores muita notícia ruim na área fiscal, com a expectativa de aceleração na trajetória da dívida pública. O problema é que há um risco concreto para surpresas negativas, o que poderá fazer com que os juros reais de dez anos retornem, em 2026, aos patamares exorbitantes do início deste ano, quando a taxa desses papéis chegou perto de 8%.
E o que está precificado para 2026? Uma
continuação do que se viu neste ano. O governo deve atingir o limite inferior
de tolerância da meta fiscal, fazendo de tudo para aumentar a arrecadação de
impostos e, ao mesmo tempo, conseguindo a permissão do Congresso ou do
Judiciário para novas exceções de despesas extras aos limites da regra fiscal.
Neste ano, foi assim com gastos das Forças Armadas, do ressarcimento das
fraudes com o INSS e das medidas de socorro às empresas afetadas pelo tarifaço
dos EUA. Sem falar da fatura com os precatórios.
Em 2025, a meta permite um déficit de até
0,25% do
PIB, mas os analistas projetam um rombo de
0,5%. Em 2026, a meta é de superávit primário de 0,25%, com uma banda inferior
de resultado zero, mas o mercado prevê déficit de 0,6%. Ao seguir colocando
qualquer despesa extra fora dos limites de gastos, o governo não precisaria
mudar a meta de 2026, o que seria um trauma no ano de eleição. No pior dos
cenários, a meta seria simplesmente descumprida, o que acionaria gatilhos
previstos no arcabouço, mas essas restrições serão problemas de quem estiver no
governo em 2027.
Esse cenário mudou de figura quando o Senado
aprovou o projeto de lei que permite a aposentadoria diferenciada para agentes
comunitários de saúde e de combate às endemias, num custo de, pelo menos, R$ 20
bilhões em dez anos. O texto agora vai para a Câmara. Há também a intenção do
presidente Lula de aprovar a tarifa zero para o transporte público. Se tudo
isso passar, o ajuste exigido a partir de 2027 será muito maior do que o
estimado hoje. Não é só mais um gasto extra e temporário. Não vai dar para
fazer vista grossa. O juro real precisará subir.

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