Por Bruna Lessa / O Globo
Levantamento integra informações da Receita
Federal e da PNADC para medir a desigualdade de renda e patrimônio no país
A parcela equivalente ao 1% mais rico da
população deteve 37,3% da riqueza declarada à Receita Federal em 2023, apontou
relatório divulgado nesta segunda-feira pela Secretaria de Política Econômica
(SPE) do Ministério da Fazenda. O estudo consolida informações do Imposto de
Renda da Pessoa Física (IRPF) e combina esses dados com pesquisas domiciliares
para medir a distribuição de renda e patrimônio no país.
De acordo com o relatório, quando se observa
somente a riqueza declarada ao IRPF, a concentração é ainda mais acentuada do
que na renda. Entre os 10% mais ricos, a fatia chega a 64,2% do total do
patrimônio informado pelos contribuintes. Já os 5% mais ricos concentram 54,7%.
Esses números, segundo a SPE, ainda podem subestimar a desigualdade real. Isso porque o estudo classifica os grupos a partir da renda declarada — e não do patrimônio acumulado —, o que pode deslocar parte dos contribuintes com grande volume de bens, mas baixa renda tributável, para faixas inferiores da distribuição.
O relatório compara os dados do Imposto de
Renda com os resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua
(PNADC). A principal diferença aparece nas camadas mais ricas da população.
Enquanto a PNADC estima que o 0,1% mais rico
detenha cerca de 2,9% da renda nacional, os dados do IRPF mostram que, nas
declarações entregues à Receita Federal, esse grupo concentra 12,5% da renda
total — quase quatro vezes mais.
Segundo a SPE, esse contraste ocorre porque
pesquisas domiciliares:
Dificilmente alcança pessoas de renda muito
alta;
Dependem de respostas informadas pelos
entrevistados;
Não capturam lucros, dividendos e ganhos de
capital com a mesma precisão das declarações à Receita.
No IRPF, ao contrário, rendimentos
financeiros, ganhos de capital e lucros distribuídos aparecem de forma
detalhada.
Alíquota efetiva cai entre os mais ricos
Além da distribuição de renda e da riqueza, o
relatório analisa como o Imposto de Renda efetivamente incide sobre cada faixa.
O estudo aponta que, embora a tabela do IR seja progressiva — ou seja, cobra
percentuais maiores conforme a renda aumenta —, essa progressividade se perde
no topo da distribuição.
A alíquota efetiva média (o percentual que o
contribuinte realmente paga sobre toda sua renda) sobe até determinada faixa,
mas volta a cair entre os muito ricos. No grupo do 0,01% mais rico, a alíquota
efetiva média é 4,6% menor que a de contribuintes de renda média.
A queda ocorre porque:
Parte relevante da renda do topo é formada
por lucros e dividendos, hoje insetos;
Aplicações financeiras e ganhos de capital
são tributados de forma exclusiva, com alíquotas mais baixas;
Despesas dedutíveis e regimes especiais
reduzem a base de cálculo.
Assim, mesmo com rendas elevadas, a parcela
do imposto pago em relação ao total recebido diminui no topo.
Composição da renda explica a queda da
tributação
O documento destrincha a origem dos
rendimentos entre os mais ricos. Nos 0,1% superiores, a renda é composta por:
5,8% de rendimentos tributáveis;
43,1% de rendimentos de tributação
exclusiva/definitiva;
51,1% de rendimentos isentos.
No 0,01% mais rico, a fatia de renda tributável
é ainda menor, 2,3%, enquanto rendimentos exclusivos chegam a 55,8% e os
isentos a 41,9%. A SPE destaca que esse padrão afeta a progressividade do
sistema, porque a maior parte dos ganhos desse grupo não passa pela tabela
tradicional do IRPF.
Composição do patrimônio brasileiro
Os dados do IRPF também permitem detalhar
como os bens e ativos dos contribuintes se distribuem:
50,2% são bens financeiros (como aplicações e
investimentos);
36,7% são imóveis;
6,7% são “outros bens e direitos”;
6,4% correspondem a bens móveis, como
veículos.
Bens financeiros estão ainda mais
concentrados entre os mais ricos e influenciam tanto a desigualdade patrimonial
quanto a geração de rendimentos isentos ou tributados fora da tabela
progressiva.
Mulheres têm menos patrimônio e pagam
proporcionalmente mais IR
O relatório também destaca diferenças
relevantes entre homens e mulheres. As mulheres:
Representam 44,1% dos declarantes do IRPF;
Respondem por 38% da renda total;
Possuem patrimônio médio 46,9% inferior ao
dos homens.
Como têm maior proporção de renda tributável
e menos rendimentos isentos, as mulheres acabam, em média, pagando
proporcionalmente mais Imposto de Renda do que os homens, mesmo quanto têm
renda semelhantes.
Desigualdade racial aparece com força no topo
da distribuição
Outro recorte do relatório combina dos dados
do IRPF com informações da PNADC para estimar a distribuição racial entre
diferentes faixas de renda e patrimônio. Segundo a SPE:
Brancos representam 78,6% do grupo do 1% mais
rico;
Pretos e pardos somam apenas 3,1% desse
grupo;
No extremo oposto da pirâmide, mulheres negras representam a maior parcela entre os 10% mais pobres.

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