quinta-feira, 10 de novembro de 2011

OPINIÃO DO DIA – Ricardo Noblat: apodreceu.

"Uma vez denunciados pela imprensa, Dilma livrou-se em 11 meses de governo de cinco ministros suspeitos de envolvimento com irregularidades. Tem um sexto aí na bica. Em qualquer outro lugar já se teria dito com todas as letras e a ênfase necessária que o governo apodreceu. Pois, sim. Apodreceu."

Ricardo Noblat. Mau cheiro. O Globo, 7 /11/2011

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www.politicademocratica.com.br/editoriais.html

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Chefe do tráfico da Rocinha é preso pelo Batalhão de Choque na Lagoa
Dilma exige retratação e Lupi pede desculpas
Ficha Limpa com ressalvas
Tolerância zero com motorista que beber

FOLHA DE S. PAULO
Mercados fazem pressão para Berlusconi sair logo
Senado aprova projeto que endurece a Lei Seca
473 empresas são suspeitas de sonegar R$1,5 bi
Tribunal dá sinal verde para hidrelétrica de Belo Monte

O ESTADO DE S. PAULO
Senado aprova exigência de 'álcool zero' para dirigir
Lupi é enquadrado por Dilma após dizer que só sai 'à bala'
Anúncio de Berlusconi não reduz tensão e bolsas caem
Panamericano teve carteiras recusadas pelo Banco do Brasil

VALOR ECONÔMICO
Socorro à Itália pode exigir € 700 bi
Contornos da reforma ministerial
EUA projetam Brasil líder em soja, mas previsão é duvidosa
País vai à OMC contra europeus

CORREIO BRAZILIENSE
Tolerância zero para quem bebe e dirige
A farra dos aliados de Lupi
Farsa: Vídeo seria obra de irmão de deputada

ESTADO DE MINAS
Álcool e direção : tolerância zero
Aliados são favorecidos com verbas
Supremo adia decisão sobre a Lei Ficha Limpa

ZERO HORA (RS)
Senado aprova pena maior para quem dirigir após beber

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Tolerância zero para quem bebe e dirige

Dilma exige retratação e Lupi pede desculpas

Mas Palácio do Planalto já dá como certa saída do ministro do Trabalho na reforma

Após afirmar na véspera que só sairia "à bala" e que a presidente Dilma não o demitiria, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, foi obrigado a se desdizer. Irritada com as declarações, Dilma mandou a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, dar um recado a Lupi, cuja pasta é alvo de denúncias de corrupção: quem nomeia e demite é a presidente, que exigiu uma retratação. "Me empolguei, sou humano", admitiu ele mais tarde. O PDT também recuou da ameaça de sair da base aliada, se ele cair o Mas, no Planalto, a saída de Lupi, na reforma ministerial do ano que vem, é dada como certa.

Após a bravata, desculpas

Dilma exige retratação e Lupi diz que não quis desautorizá-la, mas sua saída está decidida

Maria Lima, Gerson Camarotti, Geralda Doca e Luiza Damé

Asegurança e a galhofa da véspera, quando o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, desafiou a presidente Dilma Rousseff e disse que duvidava de sua demissão, e que só sairia "abatido à bala", foram substituídas ontem pela humildade. As declarações do ministro, com apoio do seu partido, o PDT, causaram enorme mal-estar no governo. Dilma exigiu uma retratação pública de Lupi. Após levar uma reprimenda da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que o chamou ao Palácio do Planalto para repassar recado da presidente de que quem demite na Esplanada é ela, Lupi fez um mea culpa. E o PDT amenizou a ameaça de deixar o governo, se o ministro cair.

Mesmo com a retratação, o destino de Lupi já foi selado: segundo interlocutores de Dilma, ele sairá do governo no início do ano que vem, quando será feita a primeira reforma ministerial do governo. Nas palavras desse interlocutor, o desempenho de Lupi já era considerado sofrível antes das denúncias envolvendo a pasta: falta de fiscalização de centenas de convênios e suspeitas de cobrança de propina de funcionários. Tanto que o Planalto esvaziara as funções do Ministério Trabalho.

As bravatas de anteontem irritaram profundamente a presidente, mas a prioridade de Dilma e do governo no momento era a aprovação, ontem na Câmara, da emenda que prorroga a Desvinculação de Receitas da União (DRU).

Gleisi repassou o recado a Lupi em reunião reservada, antes de um encontro já marcado com o ministro para tratar da implantação do ponto eletrônico na Esplanada dos Ministérios. Ela deixou claro que Dilma considerou um exagero e que houve excesso em suas declarações.

- Todos os ministros deste governo sabem que quem nomeia e quem demite é a presidenta da República - disse Gleisi a Lupi, segundo interlocutores do Planalto.

Lupi afirma que se empolgou

Antes dessa conversa, Lupi já baixara o tom, dizendo que não quis desafiar a presidente, mas desafiar "a onda de denuncismo no país". À tarde, ao GLOBO, ele admitiu que errou na véspera. Justificou-se, dizendo que se empolgou e que, diante das "pancadas" que tem levado, exagerou no tom. Mas, em nenhum momento, disse que quis enfrentar a presidente.

- Me empolguei. Sou humano - disse o ministro, acrescentando que podem vasculhar sua vida.
Mesmo quando disse, ainda de manhã, que não desafiara a presidente mas o denuncismo, Lupi voltou a se precipitar, ao considerar o caso superado. Afirmou que já tinha dado as respostas e apresentado os documentos necessários, que o procurador-geral da República já havia se pronunciado e que, agora, iria trabalhar. Ao ser questionado se era a "bola da vez", mostrou segurança:

- Só se for a bola sete, que é a bola que dá a vitória.

Os líderes do PDT também baixaram o tom. Líder na Câmara, Giovanni Queiroz (PA) tentou minimizar as declarações de Lupi e as suas próprias - na véspera, dissera que o partido sairia do governo, se Lupi caísse. Ontem, disse que isso só aconteceria se a demissão de Lupi ocorresse por pressão política, sem culpa comprovada.

- O que quis dizer é que não aceitamos demissão de Lupi por pressão política. Mas, se ele tiver culpa no cartório, aí não tem nem o que discutir. Como confiamos nele e acreditamos que isso não vai acontecer, houve a solidariedade do partido a ele no caso de uma injustiça - disse Queiroz.

A direção do PDT divulgou nota negando que as declarações de Lupi fossem uma ameaça a Dilma. O texto é assinado ainda pelo presidente em exercício do partido, o deputado cearense André Figueiredo, e pelo líder no Senado, o rondoniense Acir Gurgacz. Na nota, os dirigentes do PDT dizem que Lupi "sabe que cabe à presidente da República, única e exclusivamente, nomear e exonerar, a qualquer período, seus ministros colaboradores".

As bravatas de Lupi desafiando a autoridade de Dilma alimentaram os ataques da oposição no Senado. O senador tucano Mario Couto (PA), da tribuna, afirmou:

- Agora, quero ver Dilma, com um desafio desse tamanho, se Vossa Excelência tem pulso ou não tem! Onde estão chegando os ministros corruptos deste país! Ponha na rua hoje! Demita esse safado hoje, senhora presidente! - desafiou o senador .

Já o líder do DEM, senador Demóstenes Torres (GO), ironizou:

- À medida que Dilma não reagiu, aceitou a chantagem. Por muito menos o Jobim caiu. O Lupi disse que só sai à bala, mas ele não aguenta um traque.

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) também desaprovou a conduta do ministro:

- Cada um se expressa de uma forma. Sem querer criticar, acho que houve excesso de verbalização. Nenhum ministro, sob acusação, se encontra confortável.

FONTE: O GLOBO

Declarações que irritaram Dilma

Ao afirmar, anteontem, que só deixaria o governo se fosse "abatido à bala" e que "duvida que ela (Dilma Rousseff) faça (a demissão)", o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, provocou a ira da presidente Dilma.

As declarações, que causaram mal-estar, foram dadas depois da reunião que Lupi, presidente licenciado do PDT, teve com as bancadas do partido na Câmara e no Senado. Ontem, Gleisi Hoffmann, ministra da Casa Civil, o chamou ao Planalto. Ela cumpria um pedido da presidente Dilma, que mandou avisar que o ministro se excedeu e que deveria se retratar. Lupi, então, disse que se "empolgou": "Me empolguei. Sou humano".

ANTEONTEM: "Para me tirar, só abatido à bala. Eu duvido que ela (Dilma) faça (a demissão). Eu tenho a consciência tranquila. Ela me conhece bem, te garanto que não acontecerá. Eu tenho o santo forte, vou carregar o caixão de muita gente que quer ver o meu carregado. Esse é um caso diferente", disse ele, que disse ainda: "Para desconforto de vocês, vão me ver aqui ano que vem, em 2012. Pela relação que tenho com a Dilma não saio daqui nem na reforma (ministerial, prevista para janeiro). Acho pouco provável. Se acontecer, o PDT vai analisar sua relação com o governo".

"Então, vai em frente" (Segundo Lupi, Dilma teria dito isso depois de perguntar se ele iria até o fim). "E eu vou em frente, porque fui forjado na luta".

ONTEM: "Estou desafiando a onda de denuncismo que o Brasil virou. Eu estou desafiando a gente macular a honra das pessoas sem direito de defesa. Estou desafiando aqueles que mentem. Estou desafiando aqueles que usam da mentira um instrumento para acabar com a reputação das pessoas", ao tentar amenizar as declarações dadas anteontem.

"Me empolguei. Sou humano", depois de ser chamado pela ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, ao Planalto.

FONTE: O GLOBO

Pedetistas históricos querem investigação

Cinco ex-deputados federais se mostram contra o apoio do partido ao ministro

Maria Lima

BRASÍLIA. Indignados com a decisão da cúpula do PDT de apoiar o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, pedetistas históricos fizeram um movimento ontem em Brasília para marcar posição contrária e protestar contra o que chamaram de "usurpação" dos ideais brizolistas. Cinco ex-deputados federais, liderados por Vivaldo Barbosa e José Mauricio, do Rio, entregaram uma petição ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e ao ministro da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage, pedindo agilidade na conclusão das investigações sobre desvios em convênios da gestão Lupi no ministério.

Eles integram o recém criado Movimento de Resistência Leonel Brizola e dizem querer diferenciar o PDT das ações de Lupi. Segundo eles, o PDT tem história e tradição e, por isso, é preciso separar as responsabilidades do ministério e do partido. Os pedetistas históricos acusam Lupi de ter esfacelado o PDT, extinguindo diretórios e usando as comissões provisórias para manipular os dirigentes regionais da sigla.

- Queremos delimitar responsabilidades e fronteiras comportamentais. Essas bravatas do Lupi são próprias dele, para esconder suas fragilidades e debilidades. A nível nacional, o PDT é um partido cartorial, manietado por ele, para não ser fiscalizado. Nós, da base, vamos lutar para que o partido se democratize. Sob a direção de Lupi, foi totalmente esfacelado - disse o ex-deputado federal por cinco mandatos, José Maurício.

Vivaldo é um dos que assinam a petição. Entre os signatários estão José Mauricio, Carlos Alberto Caó, o deputado estadual Paulo Ramos, Fernando Bandeira, João Leonel, Maria Helena Santos, Vinicius Ornelas e Hélio Pinho.

- O ministro não age dentro dos princípios do brizolismo e do trabalhismo. O ministro Hage nos disse que tem muita sensibilidade e compreensão pelo nosso apelo - disse Vivaldo.

FONTE: O GLOBO

PT e aliados evitam ida de Agnelo ao Congresso

Por dez votos a seis, petistas impedem convite para que governador do DF preste esclarecimentos sobre denúncias

Isabel Braga

BRASÍLIA. Com o apoio dos partidos da base aliada, o PT conseguiu evitar ontem, por dez votos a seis, a aprovação do convite para que o governador petista do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, comparecesse à Câmara dos Deputados. Três requerimentos pediam a presença de Agnelo na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Casa, para dar explicações sobre denúncias de corrupção contra ele, na época em que exerceu os cargos de ministro do Esporte e de diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Além de irregularidades no programa Segundo Tempo, do Esporte, Agnelo também está sendo acusado de ter recebido dinheiro de Daniel Almeida Tavares, funcionário do Laboratório União Química, para conceder certificado de Boas Práticas de Produção à empresa, quando era diretor da Anvisa. No mesmo dia em que Daniel depositou R$5 mil na conta de Agnelo, o certificado foi liberado.

PT promove churrasco para aniversário de Agnelo

A Anvisa abriu auditoria para investigar a denúncia. Agnelo nega ter praticado tráfico de influência. Em nota, diz que fez um empréstimo a Daniel. Ontem à noite, o PT organizou uma festa para celebrar o aniversário de 53 anos do governador. A celebração, com ar de desagravo, seria numa churrascaria, com adesão a R$50.

Para impedir a ida de Agnelo à Câmara, os petistas argumentaram que cabe à Câmara Legislativa do DF fiscalizar, convocar e cobrar explicações do governador da capital. Apesar de envolver verbas federais e dizer respeito a ações que teriam sido supostamente praticadas quando Agnelo era ministro do Esporte e diretor da Anvisa, neste momento, frisaram deputados do PT, ele é governador, e a competência é da Câmara Legislativa.

- Aqui não é o foro. Cabe à Câmara Legislativa fazer a convocação para que ele preste esclarecimentos. Vários assessores do Ministério do Esporte envolvidos na suposta denúncia já foram ouvidos aqui - afirmou o deputado Odair Cunha (PT-MG).

Petistas que integram a comissão permaneceram o tempo todo na sessão para evitar qualquer surpresa. O líder do PT na Câmara, Paulo Teixeira (SP), também compareceu. Em longo debate, de quase duas horas, a oposição bateu no governador do DF e criticou a atitude dos petistas e governistas de não permitir a aprovação do convite para que ele se explique. O caso do ex-governador José Roberto Arruda foi citado por deputados do DEM, que deixou o governo após denúncias de corrupção.

- O Agnelo tem que vir se explicar, sim. Montou agora essa versão do empréstimo depois que as deputadas divulgaram o vídeo. Não é possível que não possamos ouvir as explicações aqui - criticou o deputado Onix Lorenzoni (DEM-RS), um dos que apresentou convite para a ida de Agnelo à comissão.

O tucano Fernando Francischini (PR) também ficou indignado:

- As denúncias de corrupção envolvem verbas federais. A competência é do Congresso, sim - disse o tucano.

Além de petistas, outros deputados da base aliada também criticaram os oposicionistas.

- Vamos ficar trazendo governador aqui? Quem sabe o (Geraldo) Alckmin? O de Minas Gerais? Vamos transformar essa comissão numa CPI estadual? Não tem cabimento, e o PMDB votará contra - avisou o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Desde ontem, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) e Francischini coletam assinaturas para a instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito para apurar as denúncias de irregularidades no Programa Segundo Tempo, do Ministério do Esporte. As denúncias derrubaram o ministro Orlando Silva. Na comissão existem ainda requerimentos para a realização de audiências públicas para debater as irregularidades neste programa.

O PSDB e o DEM entraram ontem, na Câmara Legislativa do Distrito Federal, com pedido de impeachment de Agnelo. Os dois partidos apresentaram quatro pedidos: um do PSDB, outro do DEM e mais dois dos presidentes dos diretórios locais no Distrito Federal - Alberto Fraga (DEM) e Raimundo Ribeiro (PSDB). Um quinto pedido de impeachment foi feito pelo advogado Rogério Dias Pereira.

A Polícia Federal enviou à Procuradoria Geral da República o vídeo com depoimento de Daniel Tavares à deputada distrital Celina Leão (PSD). O Ministério Público deve enviar a gravação, com pedido de abertura de inquérito ou de sindicância, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), foro que julga governadores.

FONTE: O GLOBO

À última hora, governo proíbe acesso da imprensa a evento sobre ONGs

Seminário, iniciado ontem, discute relação com entidades não governamentais

Luiza Damé

BRASÍLIA. Em meio a denúncias de irregularidades em convênios dos ministérios do Esporte, do Turismo e do Trabalho, com organizações não governamentais (ONGs), o Palácio do Planalto realiza, a portas fechadas, o seminário internacional "Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil", que reúne, até amanhã, representantes de 60 ONGs. A decisão de fechar o encontro à imprensa foi tomada ontem, poucos minutos antes da abertura do seminário, sem explicações, pelo ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, que coordena o debate.

A rede oficial de televisão do governo federal, NBr, já estava com os equipamentos preparados, no Salão Leste do Planalto, para transmitir a abertura do evento, mas teve de desmontar a estrutura. A Secretaria Geral enviou anteontem release com informações sobre o seminário aos jornalistas que cobrem as atividades no Palácio, sem indicação de que o evento seria fechado.

Além de Carvalho, estavam no seminário os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça) e Jorge Hage (Controladoria Geral da União) e as ministras Miriam Belchior (Planejamento), Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Izabela Teixeira (Meio Ambiente).

Entre os participantes do evento, estão representantes da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) e do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife). Segundo a Secretaria Geral, o governo bancou passagens e hospedagens de 35 representantes de ONGs, como o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

Segundo a Secretaria Geral, foram gastos R$60 mil na organização do seminário, incluindo passagens dos três palestrantes estrangeiros: o americano Doug Rutzen e os colombianos Ruben Fernandez e Adriana Ruiz-Restrepo. Na abertura do evento, foi servido um coquetel aos participantes, que custou R$12 mil, patrocinado pela Fundação Banco do Brasil.

Segundo a Secretaria Geral, o seminário "marca o início das atividades" do grupo de trabalho criado pela presidente Dilma Rousseff para elaborar uma proposta de marco regulatório das relações entre o governo e as organizações da sociedade.

Dirigente de ONG critica decreto da presidente

O grupo de trabalho foi criado em setembro e terá a participação de sete ministérios e sete entidades da sociedade. O marco regulatório integra a plataforma das ONGs, apresentada na campanha presidencial do ano passado, à qual Dilma aderiu.

Cerca de 90 pessoas participam do seminário, que terá atividades no auditório do anexo 1 do Planalto e na Escola Nacional de Administração Pública.

Para a educadora Vera Marzagão Ribeiro, integrante da diretoria executiva da Abong, o seminário é uma sinal positivo, num momento em que as ONGs se veem envolvidas em denúncias de desvios de recursos públicos em ministérios. Vera fez ressalvas ao decreto de Dilma que suspendeu os convênios com ONGs.

- Jogar a culpa dos problemas nas ONGs é jogar a culpa no ela mais fraco da corrente.

FONTE: O GLOBO

Governo faz nova concessão a ruralistas

Pressão da bancada leva Planalto a flexibilizar recuperação de áreas desmatadas em projeto do Código Florestal

Estudantes protestam, e senadora Kátia Abreu precisa de escolta para deixar a sala em que o código foi discutido

Claudio Angelo

BRASÍLIA - Uma pressão de última hora da bancada ruralista fez o governo recuar em mais um ponto o Código Florestal: a recuperação de áreas de preservação permanente (APPs) em margens de rios.

O senador Luiz Henrique (PMDB-SC), relator do texto nas comissões de Ciência e Tecnologia e de Agricultura, fará emenda flexibilizando a recomposição das APPs em propriedades de quatro a 15 módulos fiscais. A medida do módulo varia, podendo chegar a 100 hectares.

A flexibilização deve isentar o proprietário rural da obrigatoriedade de recompor a área desmatada em propriedade pequenas e médias.

A medida foi definida após ameaça dos ruralistas do Senado de retroceder na regra para a proteção das áreas de preservação permanente em margens de rios definida no relatório de Luiz Henrique.

O texto previa a consolidação de áreas rurais desmatadas até 2008, mas obrigava os proprietários de áreas em margens de rios pequenos a recompor pelo menos 15 metros de mata ciliar. A medida desagradou os ruralistas, que apresentaram duas emendas liberando os desmatadores de recompor essas áreas.

Na terça-feira, em votação do texto-base de Luiz Henrique, a senadora Kátia Abreu (PSD-TO), líder da bancada ruralista, defendeu a continuidade da ocupação das áreas de preservação permanente, conforme a versão do código aprovada na Câmara.

Os ambientalistas, também insatisfeitos com o texto, apoiavam emenda no sentido inverso, que estendia a obrigatoriedade da reposição de mata ciliar para rios com mais de 10 metros de largura.

As três emendas foram retiradas da votação e darão lugar a uma só, de Luiz Henrique, que será incorporada ao relatório do código na Comissão de Meio Ambiente pelo senador Jorge Viana (PT-AC).

Ontem os senadores retiraram quase todos os 20 destaques (propostas de mudança no texto) apresentados. Ficou acertado que as polêmicas restantes no texto serão resolvidas no relatório de Viana.

Da Comissão de Meio Ambiente, o código vai ao plenário e daí volta para a Câmara.

A senadora Kátia Abreu precisou de escolta para sair da sala de discussão do Código Florestal. Mesmo com reforço da segurança do Senado, que no dia anterior agredira um manifestante, estudantes voltaram a protestar.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Oxigênio, do amigo de Lula, deve devolver verba e perder convênio

Ministério do Trabalho encaminhou ofício para a entidade documentar a prestação de serviços ou devolver dinheiro à União

Marta Salomon

BRASÍLIA - Depois de receber R$ 24 milhões dos cofres públicos, a entidade não governamental Oxigênio, dirigida por um amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, corre o risco de ver rompido o mais recente dos contratos com o Ministério do Trabalho. Já com Carlos Lupi sob pressão, o ministério encaminhou ofício para a entidade documentar a prestação de serviços ou devolver o dinheiro à União.

O ofício foi encaminhado à entidade na quinta-feira passada, antevéspera de a Oxigênio aparecer no centro de denúncias de cobrança de propina pela equipe de Lupi, publicadas pela revista Veja. O convênio questionado pelo ministério tem como objetivo a qualificação de 1.000 operadores de telemarketing.

Mais do que mostrar agilidade na fiscalização dos repasses a ONGs, o ofício de Lupi indica uma medida tardia. A Oxigênio está sob investigação desde 2006. Em abril deste ano, foi condenada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por favorecimento e prestação indevida de contas em outros convênios com o Ministério do Trabalho para a qualificação profissional.

Além disso, desde janeiro, a Controladoria-Geral da União (CGU) cobra providências do Ministério do Trabalho para irregularidades que vão de pagamentos indevidos ou superfaturados à apresentação de listas de presença assinadas por alunos "que informaram em entrevista que não fizeram os respectivos cursos".

Demora. Documentos obtidos pelo Estado mostram reiteradas cobranças feitas pela CGU, com o registro de demora do Ministério do Trabalho em tomar providências. Para a controladoria, os últimos convênios nem deveriam ter sido assinados, dada a atuação ruim da entidade.

À noite, o Ministério do Trabalho informou que não há registro de que as aulas de telemarketing tivessem começado, apesar do pagamento de R$ 225 mil, liberado em abril. Esse é o último lançamento de repasse de dinheiro público para a Oxigênio.

Em agosto, todas as entidades contratadas pelo Ministério do Trabalho haviam sido cobradas a apresentar informações atualizadas sobre os contratos como exigência para novas liberações de verba. O contato para "esclarecimentos adicionais", segundo o ofício, era Anderson Alexandre dos Santos, então coordenador-geral de qualificação, demitido no sábado por causa das denúncias de pagamento de propina.

Silêncio. Procurados pela reportagem, a presidente da Oxigênio, Marta Del Bello, e o diretor de administração, Francisco Dias Barbosa, resolveram não se manifestar. Barbosa é amigo de Lula da época do Sindicato dos Metalúrgicos.

A amizade de Chicão, como Francisco Dias Barbosa é conhecido, com Lula provocou as primeiras investigações por favorecimento no TCU. Barbosa presidia a Oxigênio, na assinatura dos primeiros convênios com a União.

Foi substituído por Marta, sua sócia também na empresa Petrobio Energias Recicláveis S.A., mas continuou na direção da entidade.

Dados do Portal da Transparência mostram que a liberação de verbas públicas para a Oxigênio aumentou depois da posse de Carlos Lupi no Ministério do Trabalho. Em 2009, a entidade recebeu R$ 11,1 milhões, mais da metade do valor repassado no período de oito anos. Em 2011, a Oxigênio aparece entre as entidades que mais receberam dinheiro público para projetos de qualificação profissional. De janeiro abril, foram pagos mais de R$ 1 milhão, sobretudo para treinamento na área de construção civil.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Cabral aposta futuro em passeata contra divisão dos royalties

Governador desafia Planalto e pede ajuda a rivais para evitar derrota que pode ressuscitar a oposição no Rio

Peemedebista dividirá palanque com possíveis adversários em 2014; políticos protestam contra veto a discursos

Bernardo Mello Franco

SÃO PAULO - Há um ano, o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), parecia destinado a navegar em eterna calmaria.

Ostentava prestígio com o governo Lula e se reelegeu no primeiro turno, com apoio de 16 partidos e dois terços dos votos.

Agora, enfrenta a ameaça da redivisão dos royalties do petróleo, que pode ressuscitar a oposição fluminense e comprometer seu futuro político. Ele promete reunir hoje 100 mil pessoas em passeata para tentar emparedar a presidente Dilma Rousseff.

Cabral diz que o texto aprovado no Senado, com apoio declarado da ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais), tira R$ 1,5 bilhão do Estado e R$ 1,8 bilhão dos municípios do Rio já em 2012.

Sem o trânsito que exibia no Planalto, ele terá que dividir o palanque hoje com três políticos que cobiçam sua cadeira em 2014: os senadores Lindbergh Farias (PT) e Marcelo Crivella (PRB) e o deputado Anthony Garotinho (PR).

O governo decretou ponto facultativo e anunciou passagens grátis em trens e metrô para tentar encher o ato, mas avisou ontem que nenhum político poderá discursar.

O veto irritou os adversários, que em público prometem apoio na luta pelo dinheiro, mas estão preparados para apontar o peemedebista como o único culpado se a derrota do Estado se confirmar.

"Cabral pode entrar para a história como o governador que entregou as riquezas do Rio", afirma Garotinho.

"Com uma derrota, seu governo ficará inviabilizado. O Rio vai quebrar. Embaralha tudo em 2014", diz Crivella.

Lindbergh faz juras de apoio, mas traça um cenário sombrio no caso de Rio e Espírito Santo não conseguirem reverter a perda quando o tema for votado na Câmara.

"O estrago será enorme. Vai fechar prefeitura, posto de saúde, tudo o que você possa imaginar", diz o senador petista, que em 2010 foi obrigado por Lula a abortar sua candidatura a governador para ajudar Cabral.

Em seu último mês no poder, o ex-presidente evocou a amizade com o peemedebista para vetar outro projeto de redistribuição dos royalties aprovado no Congresso.

Os Estados não produtores se rearticularam e conseguiram a simpatia de Dilma. A mudança esfriou a relação entre o Guanabara e o Planalto, que já não era a mesma.

Cabral apostou no confronto. Chegou a dizer, ao jornal "O Globo", que Dilma sofrerá uma "tragédia eleitoral" se não impedir o prejuízo do Rio.

A presidente não gostou do tom de ameaça. Na última ida a Brasília, o governador não conseguiu um encontro separado para tratar do assunto.

Uma semana antes, ele foi recebido e disse que Dilma "levou um susto" ao ouvir quanto o Rio perderia.

ALTERNATIVAS

Colaboradores de Cabral já admitem que a hipótese mais provável é perder na Câmara. Neste caso, restará torcer por um novo veto presidencial ou recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal).

Criticado pelo modo como conduziu o debate, o governador corre o risco de se isolar e ver naufragar o sonho da Vice-Presidência ou mesmo uma volta ao Senado em 2014.

A perda dos royalties comprometeria sua imagem, já desgastada nos últimos meses com a greve dos bombeiros e a revelação de relações próximas com empresários a quem deu isenções fiscais.

Cotado para sua sucessão, o vice-governador Luiz Fernando Pezão diz que os rivais não devem se animar.

"Eles representam o Rio na Câmara e no Senado. Se perdermos, a derrota não será só do governador. Estamos todos no mesmo barco."

Aliados afirmam que Cabral ainda não trabalha com a hipótese de anunciar rompimento com Dilma. Sua assessoria disse que ele não daria entrevista, pedida pela Folha desde o último dia 24.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Cabral faz ato pró-royalties com shows

Servidores municipais e estaduais estão liberados e transporte para o centro será gratuito em protesto sem discurso de políticos hoje no Rio

Sergio Torres

RIO - Funcionários públicos estaduais e municipais não trabalham hoje à tarde no Rio. Quem usar o metrô, as barcas e os ônibus rumo ao centro não pagará passagem a partir das 13h. Artistas populares são anunciados como atrações no palanque. Caravanas interioranas prometem aos passageiros lanche farto, bonés e camisetas. O objetivo das iniciativas é engrossar a manifestação pró-royalties do petróleo organizada pelo governo Sérgio Cabral Filho (PMDB).

Para atrair o maior número possível de pessoas, o governador mandou sua assessoria avisar à população que políticos não discursarão. Como até agora fracassou a mobilização política pela manutenção das cotas atuais dos royalties, o governo decidiu oferecer regalias variadas a quem se dispuser, a partir das 15h, a caminhar pela Avenida Rio Branco da Igreja da Candelária à Praça da Cinelândia, como forma de pressionar o governo da presidente Dilma Rousseff a não mudar a legislação.

A Lei dos Royalties beneficia os Estados produtores (Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo). Em outubro, o Senado aprovou o projeto do deputado Vital do Rêgo (PMDB-PB), que transfere dos produtores para os não produtores parte das quantias pagas pelas empresas que exploram petróleo no Brasil. O projeto vai à votação na Câmara Federal. A tendência é que os deputados acompanhem a decisão dos senadores.

Se isso ocorrer, a última esperança dos Estados produtores será a presidente Dilma, que poderá ou sancionar ou vetar a decisão do Congresso. No caso de haver a sanção presidencial, os governos do Rio e do Espírito Santo já anunciaram que recorrerão ao Supremo Tribunal Federal (STF). Já há ações no STF questionando a resolução do Senado.

Hoje à tarde, na Praça dos Namorados, em Vitória, o governador Renato Casagrande (PSB) também promove manifestação contra a partilha dos royalties entre Estados produtores e não produtores. Amanhã, na vizinha Vila Velha, o senador Magno Malta (PR) organiza um espetáculo de protesto com duplas sertanejas e intérpretes de músicas religiosas.

Artistas, No Rio, a concentração dos manifestantes será em frente à igreja da Candelária a partir das 15h. Não há horário para o início da caminhada de cerca de 1 km em direção à Cinelândia. Os shows deverão começar por volta das 17h30. A lista de artistas mostra a preocupação do governo em agradar a todos os públicos. Ela inclui o cantor pop Lulu Santos, os pagodeiros do conjunto Sorriso Maroto, o grupo gospel Diante do Trono e o funkeiro MC Naldo.

A apresentadora será a atriz Cissa Guimarães. Segundo a assessoria do governo, Fernanda Montenegro lerá um manifesto contra a retirada dos royalties do Rio. Deverão falar entre as músicas a apresentadora infantil Xuxa Meneghel, o arcebispo d. Orani Tempesta, o ex-treinador da seleção brasileira de futebol Carlos Alberto Parreira e o gari Sorriso. Haverá vídeos com declarações pró-royalties dadas por Caetano Veloso, Seu Jorge e jogadores de futebol.

Dos principais municípios do interior, como Macaé e Campos dos Goytacazes (norte fluminense), as prefeituras vão enviar ônibus e vans repletos de manifestantes, com direito a sanduíches, quentinhas e refrigerantes. Cada um deles deverá receber um kit com bandeira, boné e camiseta com os dizeres "Contra a Injustiça - Em Defesa do Rio".

Ainda na lista de presenças no palanque, divulgadas pelo governo fluminense, aparecem a atriz Christiane Torloni, o sambista Nelson Sargento e o comediante Hélio de la Peña.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Para juristas, mudança fere Constituição de 88

Mexer em contratos de campos já licitados contraria direito adquirido e abre brecha para contestação na Justiça, dizem

Danielle Nogueira

O projeto que redistribui os royalties do petróleo esbarra em uma série de polêmicas jurídicas, que vão de desrespeito a princípios constitucionais a rompimento de contratos já firmados. A maior delas é a que envolve a Constituição de 1988, que, na interpretação de juristas ouvidos pelo GLOBO, prevê tratamento diferenciado a estados e municípios produtores a título de "compensação financeira pela exploração" do petróleo.

No artigo 20, parágrafo primeiro da Constituição, está escrito que "é assegurada aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração do petróleo ou gás natural (...) no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva." A controvérsia é que o artigo não veda explicitamente a distribuição de royalties a estados e municípios não-produtores. É nesta brecha que se apoiam os defensores da nova partilha dos royalties, como o senador Vital do Rêgo.

Gustavo Kaercher, coordenador do Grupo de Estudos de Recursos Naturais da Universidade de Brasília (GERN-UnB) e autor de um livro sobre royalties que será lançado este mês, lembra, porém, que toda a discussão dos constitucionalistas foi no sentido de preservar a estrutura distributiva dos royalties que vigorava antes da Carta de 1988. Por ela, estados e municípios não-produtores nada recebiam, a não ser que fossem confrontantes com a região da atividade petrolífera em alto-mar.

- Mudar a distribuição dos royalties fere a intenção dos constituintes - diz Kaercher.

Acordo sobre dívida com União em risco

A segunda polêmica jurídica está relacionada a mudanças na partilha dos royalties de campos já licitados, antes da descoberta do pré-sal. Para os juristas, mexer em acordos passados contraria o chamado direito adquirido e abre brecha para contestação na Justiça. Com as mudanças propostas pelo senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), o Rio (incluindo estado e municípios) deixará de arrecadar mais de R$3 bilhões em 2012, nas contas da secretaria de Fazenda.

- Os contratos passados são imutáveis, pois cria-se uma relação de dependência em relação a essas receitas futuras - diz o advogado especializado em petróleo e gás Giovani Loss, sócio do Mattos Filho Advogados.

No caso do Rio essa relação de dependência tem um agravante. Em 1999, governo estadual e União firmaram contrato para renegociação de dívidas. Por este, o governo federal concedia novo empréstimo ao Rio, e o governo fluminense se comprometia a reservar parte dos royalties que receberia até 2021 para quitar parcelas do crédito renovado. Para 2011, R$1,5 bilhão dos estimados R$6,9 bilhões que o estado vai arrecadar com o petróleo vai para a União, como pagamento do débito.

- O contrato de consolidação e pagamento do débito do Estado do Rio para com a União obriga as duas partes por todo o tempo de sua duração e não pode ser unilateralmente modificado por nenhuma delas - diz o jurista e ex-ministro da Justiça Célio Borja.

FONTE: O GLOBO

Anúncio de Berlusconi não reduz tensão e bolsas caem

A demissão anunciada do primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, não reduziu ontem a desconfiança dos investidores. Os títulos da dívida soberana do país foram refinanciados com juros recordes de 7,48% e as bolsas europeias fecharam em queda. Na Grécia, fracassam tentativas de formação de governo de união

Saída de Berlusconi não acalma mercado

Renúncia do premiê italiano, prometida para 18 de novembro, não alivia pressão de investidores; ágio por títulos da dívida chega a 7,48%

Andrei Netto

PARIS - A demissão anunciada do primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, não reduziu ontem a desconfiança dos investidores em relação aos títulos da dívida soberana do país.

No dia em que Il Cavaliere anunciou sua renúncia, as obrigações italianas com validade de dez anos foram refinanciadas nos mercados com juros de 7,48% - recorde considerado insustentável em longo prazo. Nas bolsas, a crise da Europa não para de provocar perdas: em Milão, a queda chegou a 3,78%.

A tensão nos mercados contrariou o discurso de analistas políticos e econômicos, que apostavam na redução da pressão dos investidores depois da saída de Berlusconi - apontado na União Europeia como a maior fonte de crise na Itália.

A realidade, entretanto, se mostrou diferente. Depois de terem fechado em 6,8% na noite de terça-feira, os juros cobrados pelos bônus do Tesouro italiano com validade de dez anos chegaram a 7,6% ao meio-dia, recuando a 7,48% ao fim das transações, mesmo com a intervenção do Banco Central Europeu (BCE), que voltou a comprar bônus, sem evitar a elevação.

A neurose em relação aos riscos provocados pelo eventual contágio da crise das dívidas pela Itália também derrubou as bolsas de todo o continente. Em Milão, as ações de bancos como o Unicredit caíram quase 7%. Em Frankfurt, o índice DAX fechou em queda de 2,21%, enquanto em Paris e Londres os recuos foram de 2,17% e 1,92%.

Além da crise política provocada pela renúncia de Berlusconi, marcada para 18 de novembro, após a aprovação da nova lei orçamentária, o pessimismo foi causado pela informação de que um socorro à Itália poderia custar ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef) e ao Fundo Monetário Internacional (FMI) € 1,4 trilhão - dinheiro que os fundos não têm.

De acordo com Gary Jenkins, da consultoria Evolution Securities, de Londres, o cálculo é baseado nos custos dos pacotes da Grécia, da Irlanda e de Portugal, além dos programas de compra de dívidas do BCE - tudo somando € 512 bilhões. "Então se deve multiplicar por 2,7 para estimar o custo do socorro da Itália."

Diante da reação dos mercados, a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, demonstrou sua preocupação em visita à China. "Se nós não agirmos juntos, a economia mundial corre o risco de uma espiral de incerteza e instabilidade financeira", afirmou a executiva, advertindo: "A economia do planeta entrou em uma fase perigosa e incerta".

Uma das fontes de preocupação na Itália é a falta de definição sobre o sucessor de Berlusconi. Angelino Afano, jurista, dirigente do Partido da Liberdade (PDL) e fiel do premiê demissionário; Mario Monti, ex-comissário europeu e nomeado ontem senador vitalício; Giuliano Amato, ex-primeiro-ministro entre 1992 e 1993 e entre 2000 e 2001; e Gianni Letta, secretário de Estado e membro do gabinete de Berlusconi, são os favoritos. Mas até a noite de ontem nenhuma definição havia sido encaminhada.

Credibilidade. A situação levou o presidente, Giorgio Napolitano, a pedir agilidade aos líderes políticos, ressaltando que o país precisa recuperar "a credibilidade e a confiança" como país "para nos tirar desse perigoso jogo que pressiona nossa dívida pública e as condições de nossos bancos nos mercados."

Embora a Itália apresente orçamentos equilibrados há 16 anos, sua dívida chega a 121% - ou € 1,9 trilhão. Os dois planos de austeridade anunciados até aqui por Berlusconi, o primeiro em julho, de € 47,5 bilhões, e um segundo em setembro, de € 54,2 bilhões, não foram suficientes para acalmar os investidores.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Cesaria Evora - Belga

A democracia da competência :: José Serra

É preciso profissionalizar o Estado brasileiro. Para isso é necessária a tal "vontade política", que é a disposição para mudar o que está errado. Mas só ela não basta: é preciso também criar as condições da profissionalização. Começo relatando um caso e chego a uma proposta que, entendo, contribuiria para modernizar o País e democratizar as relações entre Estado e sociedade à medida que estimularia a competência no serviço público e dificultaria os assaltos ao erário.

Quando eu era ministro da Saúde, recebi um senador, homem sério e combativo.

"Serra, como você sabe, o cargo de coordenador da Funasa no meu Estado está vago. Eu queria lhe sugerir um grande técnico, correto e com experiência".

"Olha, não posso nomear alguém por esse caminho. Há os governadores, senadores, grupos de deputados... Se eu atender a um, vou ter de atender aos outros, que nem sempre trariam bons nomes como o seu. Além disso, eu não posso pôr alguém num cargo importante que dependa de um político".

"O cara é muito bom!"

"Acredito! Mas não me diga quem é. Deixe que o Mauro Ricardo (então presidente da Funasa) me apresente a lista de nomes que está levantando. Se o seu técnico for bom como você diz, vai ser o escolhido".

Esse diálogo ocorreu de verdade e o senador, até hoje meu amigo, compreendeu. A Funasa é a Fundação Nacional de Saúde, responsável, durante minha gestão, pelas ações de prevenção e controle de doenças, de saneamento básico e ambiental e de assistência à saúde dos povos indígenas. Seu papel é importante na grande maioria dos Estados. Era, havia anos, vítima de uma forma peculiar de preenchimento das gerências regionais. O grupo político ligado ao governo federal que perdia a eleição local recebia, como consolo, a chefia do órgão no Estado. Isso criava conflitos políticos e de coordenação entre a Funasa, a secretaria estadual e as secretarias municipais de Saúde. Nem sempre o Ministério da Saúde mandava na Funasa do Estado. E o que dizer, então, da malversação de dinheiro público?

Além de não aceitar mais indicações, prestigiar servidores experientes e promover frequentes auditorias, tomamos uma providência inédita: dois decretos do presidente Fernando Henrique Cardoso exigindo que os gerentes regionais fossem servidores do Ministério da Saúde com nível superior, ocupassem cargo em comissão ou função de confiança por mais de cinco anos e tivessem, no mínimo, dois anos de chefia. Assim, o profissionalismo foi vencendo o clientelismo. A Funasa mudou de cara e melhorou muito seu desempenho.

Sabem qual foi uma das primeiras providências do governo do PT, já em março de 2003? A revogação dos dispositivos dos decretos que vedavam o uso político da instituição. Afinal, era preciso acomodar os membros do próprio partido e dos aliados - pessoas, na sua maioria, estranhas ao serviço público e ineptas técnica e gerencialmente. Assim, a Funasa virou o lugar geométrico dos escândalos mais visíveis na área da Saúde. Houve fraudes até no atendimento à saúde indígena. Mas, em vez de retomar o controle do órgão, o governo atual decidiu retirar de seu âmbito a área de epidemiologia e controle de doenças e da saúde indígena. Em nove anos, assistiu-se à alta rotatividade do loteamento de seus cargos e à destruição de uma instituição responsável por grandes avanços na saúde pública brasileira.

Outras experiências dramáticas na área da Saúde foram os loteamentos políticos de duas instituições que criamos: a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Agência Nacional de Saúde, voltada para a regulação dos seguros e planos de saúde. O Senado referendou a indicação, pelo Executivo, de diretores com perfil técnico e gerencial. Na época, ninguém procurou o Ministério da Saúde ou a Casa Civil para sugerir nomes para as duas agências. Não havia mercado de indicações.

O poder de um diretor de agência é imenso, pois desfruta estabilidade durante seu mandato. Mas o governo Lula mudou o padrão e várias diretorias foram sendo preenchidas por "representantes" de partidos. O caso talvez mais simbólico de nomeação esdrúxula foi o do atual e controvertido governador de Brasília, Agnelo Queiroz. Depois que perdeu a eleição para o Senado em 2006, descolou um cargo na diretoria da Anvisa, até se candidatar ao governo, em 2010.

É preciso acabar com o loteamento dos cargos de livre nomeação, os chamados cargos em comissão - que, na administração federal direta, chegam a 24 mil. A solução não consiste em substituir esses cargos em comissão por cargos concursados, que criariam uma rigidez excessiva, nem apenas em reduzir o seu número, o que, aliás, precisa ser feito.

O meio mais adequado seria o da certificação, como fez a Funasa no governo FHC, fixando requisitos mínimos para os ocupantes de todos os cargos de livre provimento. Por exemplo, os cargos gerenciais de nível operacional deveriam ser reservados a funcionários de carreira do próprio órgão e, entre eles, os mais preparados. Além de valorizar os servidores públicos, isso garantiria que as mudanças de governo não afetassem o dia a dia da administração.

Para os cargos de direção de maior nível hierárquico seria admitida a contratação de pessoas externas ao serviço público, mas com exigências de formação profissional compatível e experiência anterior em cargos gerenciais.

Enfim, haveria uma matriz de dupla entrada, relativamente ampla, de cargos e requisitos. Essas regras seriam aplicadas mesmo nos casos de provimento não tão livre (pois exigem aprovação do Senado), como os das agências reguladoras.

As novas normas, estendidas a Estados e municípios e implantadas de forma gradual, dinamizariam e melhorariam o sentido de muitos cursos técnicos e universitários que não oferecem bons lugares no mercado de trabalho. Os cursos voltados para a administração pública passariam a ser mais do que a bola da vez: fariam parte da profissionalização do Estado brasileiro, ou seja, da melhoria na prestação de serviços a quem, de fato, paga a conta: o povo.

José Serra, ex-prefeito e ex-governador de São Paulo

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sintonizado :: Merval Pereira

O ministro Luiz Fux, que foi o voto decisivo para impedir que a Lei da Ficha Limpa entrasse em vigor já na eleição do ano passado, frustrando o anseio majoritário da sociedade, ontem, como relator de processos relacionados a sua aplicação, mostrou-se claramente preocupado em estar sintonizado com a opinião pública.

A tal ponto que, ao fim de seu voto, declarou que a decisão do Supremo sobre a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa significará uma verdadeira reforma política.

Ele já havia analisado em seu voto a "séria crise no sistema representativo brasileiro", atribuindo a ela a cada vez maior judicialização do processo eleitoral".

Para justificar sua visão favorável aos novos critérios de inelegibilidade, Fux utilizou-se, além de análises técnicas, do anseio do cidadão que gerou a Lei da Ficha Limpa através de uma mobilização popular:

"Para o cidadão hoje, parece claro que a probidade é fundamental para o exercício da função pública, e que a corrupção é um entrave ao desenvolvimento do país", afirmou.

A presunção de inocência, por exemplo, um dos argumentos dos que defendem que a inelegibilidade só pode se dar depois de esgotados todos os recursos no sistema judicial, foi dissecada pelo relator, que mostrou que sua origem não tem qualquer relação com o princípio eleitoral, e alertou que o Supremo Tribunal Federal não deveria desconsiderar "o descompasso entre a interpretação da presunção de inocência no âmbito eleitoral e a fortíssima opinião popular".

Para ele, "a sociedade civil identifica-se com a Constituição, mesmo para criticar as decisões do Supremo".

Na interpretação do ministro Luiz Fux, a exigência de uma condenação transitada em julgado para a inelegibilidade "aniquilaria a exigência de moralidade contida no Artigo 14 da Constituição".

Para ele, "ao lado da moralidade está a própria democracia". Ao defender que a norma legal da inelegibilidade tem que ir "além da condenação definitiva, incluindo os fatos pregressos anteriores à lei", o ministro Fux alertou que "ou bem se realinha o princípio da presunção de inocência, pelo menos no âmbito eleitoral, aos anseios da sociedade, ou desmoraliza-se a Constituição".

Mesmo considerando que o STF não pode renunciar a seu papel de Corte "contramajoritária e defensora da Constituição", Fux admitiu, no entanto, que "a própria reação democrática depende, em alguma medida, da resposta popular".

Dentro desse critério de independência, ele considerou improcedente a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade 4578, mas parcialmente procedentes as Ações Diretas de Constitucionalidade 29 e 30, acatando algumas contestações ao texto original da lei aprovada pelo Congresso.

Considerou inconstitucional, por exemplo, a inelegibilidade por renúncia após simples petição, e também o prazo de oito anos de inelegibilidade após o cumprimento da pena.

O fato é que o espírito da legislação que foi enviada ao Congresso através de uma iniciativa popular, figura criada na Constituinte de 1988, tem sido respeitado tanto no Congresso quanto agora no Judiciário, apesar de todas as tentativas de alterar-lhe a configuração.

O espírito da lei tem base na pergunta: por que uma pessoa é impedida de fazer concurso público se tiver antecedentes criminais de alguma espécie, mesmo sem trânsito em julgado, e pode se candidatar e assumir um mandato eletivo?

O voto do relator, ministro Luiz Fux, desfez a ideia de que o Supremo caminhava para desfigurar a lei. O próprio Fux, logo no início do voto, fez questão de ressaltar: "Em decisão anterior, este Tribunal julgou inconstitucional a entrada em vigor da chamada Lei da Ficha Limpa no mesmo ano em que foi promulgada. A situação aqui é completamente diversa".

A base do voto do relator foi de que a Lei Complementar não viola o princípio constitucional, pois não retroage. "Não produz efeito sobre situações pretéritas, o que seria retroatividade autêntica", salientou Fux, para explicar que se tratava de "restrospectividade", quando há efeitos futuros de uma modificação da norma.

No seu entendimento, a situação jurídica da pessoa, como a condenação por colegiado, "é um fato pretérito que terá efeito futuro".

Fux defendeu que o indivíduo que pretende concorrer a cargo eletivo "deve aderir ao regime jurídico eleitoral", e não há um direito adquirido de concorrer: "A Lei da Ficha Limpa é apenas um novo fator de inelegibilidade sem aumentar em nada as penas aplicadas anteriormente ao cidadão".

Ele, porém, mostrou-se cauteloso com alguns aspectos da legislação, como o que prevê a inelegibilidade para oito anos além do fim da pena imposta por condenação definitiva.

"Nesse caso, o indivíduo ficaria inelegível entre a condenação em segunda instância e a condenação final, privado dos direitos políticos pelo tempo da pena e inelegível por mais oito anos." O que, segundo ele, "afronta" limites estabelecidos na Constituição e "pode se configurar como equivalente à cassação dos direitos políticos".

Fux propôs que se abata do prazo de oito anos posterior à pena o período de inelegibilidade entre a condenação em segunda instância (decisão colegiada) e o trânsito em julgado.

Também a inelegibilidade de detentor de cargo eletivo que renuncie, desde a apresentação de petição, foi considerada inconstitucional por Fux, embora considere ser "salutar e necessário" que, no Direito eleitoral, seja impedido o abuso do direito de renúncia, para não dar guarita "ao mandatário que, de má fé, renuncie ao seu cargo para escapar de julgamento".

O relator considerou um exagero da lei considerar que uma "mera petição" possa determinar o início da inelegibilidade, e propôs que a renúncia implique a inelegibilidade somente quando o processo de cassação já estiver instaurado.

Tudo indica que a maioria do Supremo seguirá o voto do relator, mesmo que com eventuais divergências, mantendo o espírito da Lei da Ficha Limpa, que entrará em vigor já para a eleição municipal de 2012.

FONTE: O GLOBO

O ministro pesadão :: Eliane Cantanhêde

Deu um branco no ministro do Trabalho, Carlos Lupi, que foi orientado por Dilma a desafiar a imprensa e acabou por desafiar a própria presidente da República.

Onde já se viu ministro dizer o que Lupi disse? Lembrando: "Duvido que Dilma me tire. Nem na reforma. Só saio abatido a bala e uma bala forte, porque sou pesadão". Enquanto isso, o líder do PDT ameaçava: "Se Lupi sair, o partido também sai".

Ao ser pego com a boca na botija, Antonio Palocci assumiu o gênero "abatido" e contou com a sorte e a simpatia das elites para se manter. Caiu. Alfredo Nascimento quase chorou quando puseram sua família no meio. Caiu. Wagner Rossi fugiu correndo.

Caiu. Pedro Novais balbuciou qualquer coisa. Caiu. Orlando Silva lutou bravamente, clamou inocência, manteve a autoestima e a voz firme até o fim. Caiu.

Assim, Lupi tentou inaugurar uma nova temporada de ministros na mira. Em vez de ficar na defesa, partiu para o ataque. Mas escolheu o alvo errado e pode morrer pela boca.

Dilma, Gleisi, Ideli e "o bendito é o fruto" Gilberto Carvalho estão exaustos do roteiro que começa com denúncia na imprensa, segue com esperneio do ministro e acaba na queda. Queriam deixar Lupi para lá e esperar janeiro para aproveitar a desincompatibilização de ministros-candidatos, agradecer muito os préstimos dele e anunciar o novo ministro do Trabalho.

Assim, sem demissões e novos traumas.

Mas, se Lupi passa a confrontar a presidente da República em público, não consegue unir a própria bancada e tem de engolir nota de brizolistas históricos, a situação dele pode se deteriorar. O melhor que tem a fazer é ficar quieto e calado.

E o governador Agnelo Queiroz? A situação dele é dramática, mas tende a se arrastar dolorosamente ainda por muito tempo. A não ser, claro, que apareça uma nova "bala". E nem precisa ser tão forte, porque ele não é "pesadão" como o ministro.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O sétimo selo:: Dora Kramer

O Palácio do Planalto não quer ver, amanhã ou depois, as manchetes relatando a queda do "sétimo ministro em menos de um ano de governo", compreende-se.

De fato não deve ser agradável assistir "à imprensa derrubando ministros de 15 em 15 dias", como disse o secretário-geral da Presidência que, aos primeiros acordes do último (no sentido de ser o mais recente) escândalo da Esplanada, declarou-se "cansado" de tanto administrar crises na equipe.

Admirável a franqueza de Gilberto Carvalho: admite que os ministros só perderam os respectivos lugares porque foram expostos ao público e reconhece que tudo tem um limite. Até a intolerância com o "malfeito".

Na verdade isso já estava mais ou menos claro devido ao desconforto governista diante do entusiasmo geral com a dita "faxina". Apenas ninguém "de dentro", tão próximo ao cotidiano da presidente, havia transferido de papel passado a autoridade dela para a imprensa.

Uma visão equivocada, pois os meios de comunicação só acabaram assumindo o lugar de protagonista porque o governo preferiu ficar de coadjuvante na história, olhando a banda passar enquanto esse problema de convênios fraudulentos seja com ONGs, prefeituras ou sindicatos só se acumulava ao longo dos últimos anos.

Agora vem um decreto tratando como excepcionalidade o que deveria ser a mais básica das regras. Aliás, resumida com muita propriedade dias atrás pela presidente da organização Parceiros Voluntários, Maria Elena Pereira Johannpeter: "Quem dá o dinheiro deve fiscalizar e controlar sua aplicação, com padrões técnicos".

É isso. O decreto recentemente assinado pela presidente Dilma Rousseff determinando uma devassa nos contratos com ONGs, impondo a responsabilidade aos ministros e ordenando que haja avaliação técnica para concessão de recursos e fiscalização para a execução dos convênios, equivale a uma confissão de que o vale qualquer coisa era a lei.

Admite-se que o ministro da área não tenha responsabilidade direta? Que não sejam seguidos pareceres técnicos? Que não se fiscalizem nem por amostragem os contratos? Que, desculpe o leitor o lugar comum, um ministério seja algo comparável ao que o vulgo chama de casa da mãe Joana?

Pois pelo visto ao governo tudo isso parecia normal. Ou, ainda, digno da mais absoluta proteção e preservação.

Agora, em face ao que aparece aos borbotões, é de se perguntar a quais interesses o governo federal atendia quando mobilizou sua maioria no Congresso para, a partir de outubro de 2007 e por três anos, até 2010, obstruir os trabalhos de uma comissão de inquérito criada para investigar em que bases se davam as atividades das ONGs com a administração pública.

Presidida por um senador do DEM e relatada por outro do PC do B, a CPI acabou sem votação de relatório, fez algumas sugestões, não investigou irregularidades e passou ao largo dos problemas que agora tanto têm contribuído para que o secretário-geral da Presidência se sinta extenuado com tantas crises.

Bala com bala. Sorriso largo, semblante confiante - não necessariamente confiável - e a impertinência na ponta da língua, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, se exibe como a imagem invertida da realidade que se desmantela à sua volta.

Faz pose de valente como alguns que o antecederam na crista da onda de escândalos, mas dispõe de um diferencial. O linguajar, "abatido à bala", mais afeito a delegacias de polícia que a gabinetes ministeriais.

Na atual conjuntura, seria de acrescentar: ou vice-versa.

À deriva. Tanto bom combate aí à disposição, à espera de quem abrace algum, e a estudantada de um lado fazendo má-criação em prol da droga, do privilégio e da desordem, e de outro, aninhada no colo do Estado.

E a maioria, desorganizada, desmobilizada, calada. Há que haver uma virada ou nessa batida a juventude caminha para se assumir social e politicamente improdutiva.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Poucos no Congresso mas milhares nas ruas:: Raquel Ulhôa

Artistas, políticos, aposentados, servidores públicos e, enfim, moradores do Rio de Janeiro em geral são convidados do governador Sérgio Cabral para a manifestação de hoje, em protesto contra o projeto em tramitação no Congresso que levará à perda de receita do Estado e seus municípios com a exploração do petróleo.

Cabral espera reunir cem mil pessoas. A concentração será na Candelária, de onde partirá passeata pelas ruas do centro da cidade. O único aliado do Rio, nesse caso, é o Espírito Santo, segundo maior Estado produtor (ou confrontante com campos no mar), outro perdedor com as novas regras. O governador Renato Casagrande também planejou uma grande mobilização popular em Vitória.

Sem votos suficientes para derrubar o projeto, Rio e Espírito Santo querem conquistar o apoio de Dilma Rousseff. A presidente andou afastada do processo, deixando o terreno livre para o avanço da demagogia. No início das negociações, determinou que a equipe econômica participasse das conversas apenas para defender os interesses da União. Os Estados que se entendessem.

Governo parece não ter pressa em novas licitações

Na falta de um articulador com poder morador, deputados e senadores de Estados não produtores de petróleo - que querem ampliar sua fatia na remuneração do petróleo (recursos resultantes do pagamento de royalties e participação especial) já em 2012 - ditaram as regras da nova repartição do dinheiro.

Eles partiram de estimativas de arrecadação com petróleo, até 2020, que são contestadas por representantes do Rio e do Espírito Santo. Alguns parlamentares de outros Estados também questionam os números, mas se negam a fazer críticas em público, por causa da patrulha das bases.

De acordo com interlocutores do Planalto, Dilma teria se assustado com a arrecadação prevista na proposta, depois da aprovação. Desconfiada, ela teria determinado à sua equipe que os cálculos fossem refeitos. A expectativa agora é de uma intermediação mais firme do governo, até porque a questão da remuneração do petróleo é apenas um dos problemas relacionados à divisão das receitas entre os Estados em tramitação no Congresso.

Há a negociação das dívidas, as disputas envolvendo cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) na origem ou no destino e a pendência sobre uma nova regra de rateio do Fundo de Participação dos Estados (FPE), que precisa ser decidida até o final de 2012, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Uma negociação em bloco dessas questões federativas poderia ser mais eficiente.

Enquanto isso não acontece, cada um protesta como pode e recomenda a circunstância. Na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem era próximo, Cabral chegou a chorar em público, quando houve a primeira tentativa de reduzir a receita que os Estados produtores já recebem com o petróleo, proveniente dos campos já explorados. O governador acusou o Congresso de estar querendo "roubar" o Rio.

Lula acabou vetando o dispositivo aprovado - proposta do então deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) e outros, hoje simplesmente lembrada como "Emenda Ibsen" (embora tenha sido alterada no Senado por emenda de Pedro Simon, também do PMDB do Rio Grande do Sul).

Com Dilma Rousseff, a conversa é outra. Em vez de lágrimas, pressão política em defesa dos direitos ameaçados. Uma pressão que, na foto, une adversários como Cabral e o deputado e ex-governador Anthony Garotinho (PR).

Chama a atenção o fato de o governo ter, aparentemente, perdido o interesse por uma solução rápida. Depois de vetar a "Emenda Ibsen", Lula enviou ao Congresso projeto tratando apenas da repartição do dinheiro futuro, da exploração do pré-sal.

O Ministério de Minas e Energia dizia haver pressa na definição, porque dessa regra dependia a licitação dos futuros campos pelo novo modelo de exploração - o da partilha de produção. A proposta de Lula não foi votada até hoje. Nenhum leilão do modelo de partilha de produção foi realizado, e ninguém parece ter pressa.

O argumento atual é que o governo quer resolver a prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU) para, depois, cuidar dos royalties. Mas parlamentares governistas dizem que o governo quer mesmo é adiar a decisão sobre as novas regras dos recursos do petróleo, porque a Petrobras não tem dinheiro para investir na (complicada) exploração do pré-sal. O modelo de partilha, pelo qual a empresa é obrigada a ter no mínimo 30% de participação nos convênios e ser operadora única, engessa a Petrobras.

A intenção do Planalto, portanto, seria deixar nova confusão acontecer. Havendo aprovação, Dilma pode vetar ou simplesmente esperar que os Estados produtores recorram ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Tudo indica que a decisão do Congresso Nacional sobre a divisão dos recursos do petróleo deve ficar para 2012. Prato cheio para a campanha eleitoral. Como o dinheiro do petróleo na camada pré-sal ainda é apenas uma promessa, os prefeitos querem fatiar logo os recursos já esperados pelos caixas do Rio de Janeiro e do Espírito Santo.

E mesmo os parlamentares dos demais Estados que duvidam desse bilhete premiado não terão coragem de votar contra suas bases. Sem uma intervenção moderadora, a vitória política dos não produtores é esperada, mas o risco de a regra ser mais uma vez inviável, é grande.

VALOR ECONÔMICO

Europa, salve-se quem puder:: Vinicius Torres Freire

Secessão na zona do euro começa a entrar em debate; mais bancos passam a fugir da dívida pública italiana

O impensável tornou-se uma hipótese: o euro pode ter entrado em fase de liquidação. Desde ontem, a mídia financeira na Europa passou a noticiar rumores de que o núcleo rico e/ou menos endividado da eurozona pensa na secessão monetária. Ou seja, em se livrar de alguns países-problema, como a Grécia.

Como amputar países-membros? Qual utilidade imediata de tal medida? Mistério. Mas a boataria é ruidosa e confirmada por diplomatas em Bruxelas, Paris e Lisboa.

Faz uns dois meses, surgira uma conversa sobre "euro norte" e "euro sul". O "sul" seria o cercado onde seria posta a Europa do Mediterrâneo, afora a França, e Portugal.

A história não foi levada a sério, dadas as intenções manifestas da Alemanha de manter intacta a zona do euro, o que, em outras palavras, indicava a crença alemã de que conseguiria enquadrar a Grécia e de que a terapia daria resultado.

Mas o pacote de "socorro" (socorro!) à Grécia mal durou de julho a outubro. Os donos do dinheiro grosso, os "mercados", não acreditaram nem que a União Europeia conseguiria arrumar € 1 trilhão para bancar os países semiquebrados nem que o "perdão" da dívida grega daria certo (se é que os "mercados" aceitariam de fato perder mais ou menos metade do dinheiro enterrado na Grécia). Tal descrença e Silvio Berlusconi empurraram a Itália para o abismo. Salvar a Itália, se é que possível, custaria tanto que a impensável secessão do euro entrou no radar.

Antes disso, os líderes de União Europeia, Alemanha, França e o Banco Central Europeu tentam as últimas cartadas: ou seja, intervenção nos governos grego e italiano.

A Comissão Europeia deu um ultimato aos parlamentares gregos, exigindo compromisso com o pacote de julho, sem o que a Grécia não verá a cor da nova parcela do empréstimo. Além do mais, a União Europeia tentou nomear um interventor como premiê, Lucas Papademos, ex-vice presidente do BCE.

No caso da Itália, "sugerem" sem sutileza que o país desista de fazer eleições tão cedo ou antes de se comprometer com o pacote de "reformas" prometido por Berlusconi (privatizações, liberalização do mercado de trabalho, reforma previdenciária etc).
Além disso, tentaram empurrar outro eurotecnocrata para o posto de premiê. Trata-se do ultraliberal Mario Monti, comissário europeu para duas pastas econômicas menores entre 1995-2004.

Ao que parece, os líderes da eurozona talvez consigam fazer gregos e italianos engolir as "reformas", mas não vão nomear os interventores que desejavam. De qualquer modo, vai funcionar?

Apesar de hiperendividada, a Itália não é um caso financeiro perdido, pelo menos não no curto prazo. Mas a inépcia europeia no tratamento da Grécia levou o mercado a fugir da Itália também. O problema italiano agora não é bem o custo alto (os tais 7%) que teria de pagar para refinanciar sua dívida (não está tendo de pagar isso, agora).

Importa mais o impacto dessa desconfiança da dívida italiana sobre a banca. Bancos usam a dívida soberana (do governo da Itália) como garantia para empréstimos que tomam. Se a dívida vale menos, pegam menos dinheiro. Logo, ficam menos dispostos a comprar dívida do governo italiano (a emprestar).

É uma espiral da morte.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Tragédia italiana:: Míriam Leitão

A Itália é grande, deve muito, há muito tempo, e tem vencimentos pesados de curto prazo. A Itália está em crise política e já passou por uma ampla reforma política, mas tudo o que conseguiu foi dar o poder a uma figura grotesca como Berlusconi. A crise da dívida abate um país do G-7; não se poderá, a partir de agora, dizer que é problema na "periferia" da Zona do Euro.

Na preparação para a formação da Zona do Euro e da União Europeia estabeleceram-se parâmetros que não foram seguidos pela maioria dos países, mas alguns se esforçaram. A Irlanda é um caso triste porque sua dívida era de 130% do PIB e durante quase duas décadas o país lutou para derrubar esse percentual. Levou-a a 30% do PIB. E perdeu esse ajuste em dois anos. No ano passado, pelos dados da Eurostat, a dívida do país chegou a 95%.

Já a Itália derrubou ligeiramente esse percentual, mas ficou 20 anos com a dívida em torno de 100% do PIB e, com a crise, subiu um pouco. A Irlanda fez o ajuste e cresceu de forma sustentada de 1995 a 2007 numa média de 6% ao ano. Era considerada o caso exemplar. Até que tudo desandou no estouro da bolha imobiliária, numa gigantesca crise bancária que derrubou o PIB em 8% em 2008 e produziu déficits públicos enormes. No ano passado o déficit bateu na inacreditável marca de 31%. O governo irlandês gastou para resgatar os bancos e se afundou na desconfiança dos bancos que exigiram cada vez mais juros. Pediu o resgate quando os juros bateram em 7%.

Ontem os juros exigidos da Itália bateram em 7,4%. A travessia do 7% sempre foi o ponto de não retorno: Grécia, Irlanda e Portugal pediram resgate quando se chegou nesse nível. Mas há um tempo entre a travessia desse número, considerado a marca no chão para o início da zona de resgate, até o momento em que o socorro chega. A Grécia chegou em 7% de juros em abril de 2010, mas eles subiram até 12%, quando então iniciou-se o programa de ajuda. A Irlanda atingiu o 7% em novembro de 2010 e os juros continuaram subindo até 9%. Portugal atravessou a linha em novembro de 2010 e foi socorrida em maio de 2011. Mas a grande dúvida em relação à Itália é se ela pode ser resgatada.

A dívida de 1,9 trilhão é o dobro do que seria o Fundo de Estabilização Europeu ampliado. O Banco Central Europeu pode ser engolfado por essa dívida. O BCE não pode emprestar diretamente aos países, mas tem ajudado através de compra de bônus, mas se o banco central da região for comprar bônus na quantia necessária ele arruína o próprio balanço.

O cálculo da consultoria inglesa Capital Economics é que seriam necessários gigantescos 650 bilhões para tirar a Itália do mercado pelos próximos três anos para um ajuste nas contas do país. Poderia chegar a
700 bilhões se for feita alguma capitalização nos bancos. De onde pode sair tanto dinheiro? Nem o BCE nem o Fundo de Estabilização têm esse dinheiro. E esse é o ponto da consultoria: a Itália não apenas é grande demais para quebrar, mas pode ser grande demais para ser resgatada.

Tudo é diferente entre a Irlanda e a Itália. Um país é pequeno, dependente de exportação, tinha fama de ter feito o dever de casa e parecia ser um exemplo. O outro é grande, tem uma economia sofisticada e diversificada, não tinha feito o dever de casa na dívida, mas o mercado achava que não havia problema porque, afinal, é a oitava economia do mundo. A Irlanda foi resgatada pelo Fundo de Estabilização Europeu, BCE e FMI, e hoje está vivendo um período de maior tranquilidade comparativamente ao período do olho do furacão. A Itália é grande demais para receber o mesmo tratamento de um programa desenhado para evitar que ela tenha que ir ao mercado.

A Grécia ontem anunciou ter chegado a um acordo para formar um novo governo, mas depois se viu que o primeiro-ministro, George Papandreau, havia se precipitado: o país continua sem governo à vista. Os gregos têm uma história diferente dos italianos, acharam que ao entrar na Zona do Euro, e por terem tido queda no custo de financiamento da dívida, haviam ficado ricos. Isso se somou à manipulação de indicadores fiscais e de dívida. Papandreau errou na condução da crise, mas, quando assumiu, a fraude contábil tinha sido cometida pelo governo conservador que o antecedeu.

Meses atrás, as autoridades europeias achavam que havia uma crise de liquidez em alguns países e uma crise de solvência na Grécia. Imaginaram a solução de isolar a Grécia, negociar um calote com os bancos, emprestar o suficiente para rolar a dívida de curto prazo para que o país fizesse um ajuste e conseguisse reconquistar a confiança do mercado.

Hoje já se sabe que: o calote de 20% na dívida foi para 50%, a ajuda não deu certo, a crise política se agravou, o governo caiu, e o mercado continua olhando a Grécia como pária e a população vai enfurecida às ruas a cada vez que uma parte do programa de ajuste é votada.

Para os gregos a única vantagem é que agora já não é mais uma crise deles. Hoje é a gigante Itália que vive a mesma tragédia: crise política, desconfiança, aumento dos juros para rolar a dívida. E a Europa está emparedada. A pedra do dominó que está em queda agora é grande demais e não há solução à vista.

FONTE: O GLOBO