Mexer em contratos de campos já licitados contraria direito adquirido e abre brecha para contestação na Justiça, dizem
Danielle Nogueira
O projeto que redistribui os royalties do petróleo esbarra em uma série de polêmicas jurídicas, que vão de desrespeito a princípios constitucionais a rompimento de contratos já firmados. A maior delas é a que envolve a Constituição de 1988, que, na interpretação de juristas ouvidos pelo GLOBO, prevê tratamento diferenciado a estados e municípios produtores a título de "compensação financeira pela exploração" do petróleo.
No artigo 20, parágrafo primeiro da Constituição, está escrito que "é assegurada aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração do petróleo ou gás natural (...) no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva." A controvérsia é que o artigo não veda explicitamente a distribuição de royalties a estados e municípios não-produtores. É nesta brecha que se apoiam os defensores da nova partilha dos royalties, como o senador Vital do Rêgo.
Gustavo Kaercher, coordenador do Grupo de Estudos de Recursos Naturais da Universidade de Brasília (GERN-UnB) e autor de um livro sobre royalties que será lançado este mês, lembra, porém, que toda a discussão dos constitucionalistas foi no sentido de preservar a estrutura distributiva dos royalties que vigorava antes da Carta de 1988. Por ela, estados e municípios não-produtores nada recebiam, a não ser que fossem confrontantes com a região da atividade petrolífera em alto-mar.
- Mudar a distribuição dos royalties fere a intenção dos constituintes - diz Kaercher.
Acordo sobre dívida com União em risco
A segunda polêmica jurídica está relacionada a mudanças na partilha dos royalties de campos já licitados, antes da descoberta do pré-sal. Para os juristas, mexer em acordos passados contraria o chamado direito adquirido e abre brecha para contestação na Justiça. Com as mudanças propostas pelo senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), o Rio (incluindo estado e municípios) deixará de arrecadar mais de R$3 bilhões em 2012, nas contas da secretaria de Fazenda.
- Os contratos passados são imutáveis, pois cria-se uma relação de dependência em relação a essas receitas futuras - diz o advogado especializado em petróleo e gás Giovani Loss, sócio do Mattos Filho Advogados.
No caso do Rio essa relação de dependência tem um agravante. Em 1999, governo estadual e União firmaram contrato para renegociação de dívidas. Por este, o governo federal concedia novo empréstimo ao Rio, e o governo fluminense se comprometia a reservar parte dos royalties que receberia até 2021 para quitar parcelas do crédito renovado. Para 2011, R$1,5 bilhão dos estimados R$6,9 bilhões que o estado vai arrecadar com o petróleo vai para a União, como pagamento do débito.
- O contrato de consolidação e pagamento do débito do Estado do Rio para com a União obriga as duas partes por todo o tempo de sua duração e não pode ser unilateralmente modificado por nenhuma delas - diz o jurista e ex-ministro da Justiça Célio Borja.
FONTE: O GLOBO
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