terça-feira, 28 de outubro de 2014

Opinião do dia – Aloysio Nunes Ferreira

"Não tem por que diminuir a intensidade da oposição. Ela (Dilma) não tem direito à lua de mel que todo governante recém-eleito tem quando tem novo mandato.

Nós vamos trabalhar para cobrar aquilo que ela prometeu (na campanha), para revelar aquilo que ela escondeu. Ela não terá trégua da nossa parte.

Aloysio Nunes Ferreira, senador (PSDB-SP), em entrevista. O Estado de S. Paulo, 28 de outubro de 2014.

Congresso já reage a proposta de plebiscito

• Líderes aliados e da oposição dizem que reforma política é prerrogativa parlamentar

Fernanda Krakovics, Isabel Braga,Tiago Dantas e Germano Oliveira – O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - A ideia da presidente Dilma Rousseff de dar a largada em seu segundo mandato com um plebiscito para a mudança do sistema político já enfrenta reação do Congresso, a começar por partidos da base aliada do governo, entre eles o PMDB. Tanto na Câmara, como no Senado, os líderes peemedebistas defendem a reforma política, mas insistem que a tarefa é do Congresso Nacional e que o ideal é submeter as propostas a um referendo popular, pela complexidade do tema.

Dilma propôs na campanha o fim do financiamento empresarial de campanhas e das coligações partidárias nas eleições proporcionais, a tipificação do caixa dois em crime eleitoral e a realização de um plebiscito para a mudança do sistema político. Além destes temas, a presidente enviou uma mensagem ao Congresso propondo cinco pontos a serem submetidos à consulta popular: forma de financiamento das campanhas eleitorais; definição do sistema eleitoral, se voto proporcional ou distrital; manutenção ou não de coligações proporcionais; continuidade ou não da suplência de senador; e fim ou não do voto secreto no Congresso. Esse último ponto foi aprovado por deputados e senadores, que acabaram com o voto secreto para cassação de mandato. O plebiscito foi engavetado.

Ontem, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) divulgou nota defendendo a reforma política, mas não por meio de plebiscito. "O melhor caminho é o Congresso Nacional aprovar a reforma - caso contrário poderá pagar caro pela omissão - e submetê-la a um referendo popular, como fizemos com a proibição de venda de armas e munições", defendeu Renan.

O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), diz que aguarda para ver quais perguntas Dilma fará, mas destaca que os novos parlamentares eleitos têm tanta legitimidade como ela.

- A presidente quer substituir o Congresso e propor o plebiscito, mas é bom lembrar que o Congresso foi eleito agora e é tão legítimo para legislar quanto ela é para governar - afirmou Cunha, que também defende o referendo popular e a aprovação de uma reforma política antes de setembro do próximo ano: - A reforma política é urgente. Ninguém aguenta mais a eleição do jeito que está, cara demais. Temos que conter a proliferação de partidos.

O deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), que participou ativamente do grupo de reforma política da Casa, diz que propor plebiscito sobre reforma política é algo inviável.

- É impossível, é demagógico, é manifestação de ignorância no sentido lato. Como submeter a proposta de voto distrital, distrital misto, proporcional, etc, à população? A divisão que existe no Congresso estará presente na sociedade. É um assunto complexo e longe do cotidiano das pessoas. Cabe ao Congresso encontrar propostas e submetê-las em referendo - disse Pestana.

Eleito senador por Goiás, Ronaldo Caiado (DEM) também critica a proposta de Dilma, classificando-a de "gesto de enganação".
- O que me chamou a atenção foi que a reforma política proposta por ela é um engodo, uma farsa. Não sinaliza com nada concreto e só inviabiliza o processo verdadeiro para que consigamos aprovar a matéria -argumentou Caiado.

Em entrevista ao Jornal Nacional, ontem à noite, a presidente Dilma voltou a defender a convocação de um plebiscito para a reforma política. Dilma citou a proposta feita pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e movimentos sociais. Segundo ela, os movimentos vão entregar ao Congresso uma proposta para que se faça a consulta popular:

- Esse processo (consulta popular) é essencial para a reforma política. Muitos setores têm como base (da reforma política) a proibição de contribuições empresariais na campanha. A partir da reforma, só seria possível, contribuições privadas individuais; não empresariais. A oposição fala muito em fim da reeleição. Tudo isso tem que ser avaliado pela população.

Durante a entrevista, a presidente foi lembrada que já havia prometido uma consulta popular para reforma política em junho de 2013, após os protestos que ocorreram nas principais cidades do país. Dilma foi questionada o que a levaria a insistir na proposta, embora tenha enfrentado críticas de juristas e congressistas. A presidente argumentou que, no decorrer da campanha, ouviu esse pedido de um "conjunto de segmentos" e que ele representa "um grande clamor da juventude".

- O Congresso vai ter sensibilidade para perceber que isso (consulta popular) é uma onda que avança. Se não estou enganada, (os movimentos sociais) captaram mais de cinco milhões de assinaturas.

O presidente nacional do PT, Rui Falcão, disse ontem que o Congresso, sem a pressão da sociedade, não conseguirá realizar a reforma política como propõe a presidente e o próprio partido.

- A movimentação muito forte, que surgiu nas últimas semanas, assim como aquelas manifestações de junho do ano passado, precisam estar na ordem do dia. E nós, como partido que tem relações com os movimentos sociais, só vamos obter a reforma política com essas mobilizações. Só pelo Congresso Nacional, seja na configuração atual, seja na futura, será praticamente impossível - disse Falcão, em entrevista coletiva para analisar a quarta vitória consecutiva do partido para presidente da República.

Ele disse que o PT defende a reforma política a após um plebiscito para convocar uma constituinte exclusiva que trate das reformas.

- Já existe uma proposta da presidente Dilma no Congresso Nacional com 189 assinaturas para que possa ser elaborado o decreto legislativo que convoque o plebiscito. Uma das questões que estão sendo propostas pelos movimentos sociais, e não pelo governo, é se você concorda ou não com uma constituinte exclusiva para fazer a reforma política. Mas tudo isso é passível de diálogo com o Congresso Nacional. Você pode fazer um plebiscito que não preveja a convocação de constituinte. Você pode submeter determinados temas a plebiscito. Tudo isso é objeto de debate. A presidente disse ontem (anteontem) que quer dialogar muito com a sociedade. Creio também que sobre a reforma política ela vai dialogar.

Após protestos, plebiscito vira mantra de Dilma

• Proposta de Dilma de uma consulta popular para a realização da reforma política se tornou recorrente depois das grandes marchas de 2013

Roldão Arruda, Valmar Hupsel Filho, Alexandra Martins - O Estado de S. Paulo

Ao apresentar como proposta central do seu discurso de vitória a questão da reforma política, a presidente Dilma Rousseff voltou a pôr em evidência uma de suas principais preocupações desde as grandes marchas que aconteceram nas ruas do País em junho de 2013. Quando sua popularidade e os índices de aprovação despencaram, Dilma reagiu com a proposta de um plebiscito que autorizasse a convocação de uma assembleia constituinte destinada especificamente a fazer a reforma.

A ideia foi criticada, a presidente recuou, mas desde então volta ao assunto sempre que tem oportunidade. No discurso de domingo disse: "Meu compromisso, como ficou claro durante toda a campanha, é deflagrar essa reforma, que é responsabilidade constitucional do Congresso, e que deve mobilizar toda a sociedade em plebiscito, que deve ser realizado por meio de uma consulta popular".

Uma vez que não apresentou programa de governo na campanha, Dilma não deu detalhes de sua proposta. Ela estava presente, no entanto, desde o primeiro momento. Na convenção em que o PT oficializou sua candidatura, em junho, Dilma defendeu o plebiscito como forma de efetivar a reforma política. O tema também estava presente no esboço de programa que enviou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no mês seguinte.

No texto, a presidente disse que a reforma deve servir para "melhorar a representatividade política, aprimorar o sistema eleitoral, tornar a política mais transparente". Ela também mencionou especificamente a questão das "regras claras de financiamento".

Na agenda. Nos debates entre candidatos, Dilma não teve muita chance de falar sobre o assunto. Mas não o esqueceu. No primeiro turno, no encontro entre os candidatos, promovido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, ela disse: "Numa democracia, partidos são essenciais. Mas precisamos sistematicamente submetê-los ao voto popular. Quando partidos não existem, poderosos mandam por trás da cena".

No segundo turno a reforma política só foi discutida de maneira razoavelmente significativa no debate promovido pela Rede Globo, no dia 24. Aécio Neves (PSDB) questionou a então candidata petista sobre o assunto e defendeu o fim da reeleição, proposta que constava de seu programa de governo.

Dilma respondeu que o tema central da reforma deve ser o fim do financiamento das campanhas por empresas. "Isso que é uma vergonha", afirmou. Na mesma ocasião, também defendeu a paridade homens e mulheres nas cadeiras do Congresso, o fim das coligações e dois turnos na eleição proporcional.

Todas essas propostas já são defendidas pela Ordem dos Advogados do Brasil e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Com centenas de outras organizações não governamentais, essas duas instituições estão coletando assinaturas em todo o País para um projeto de lei de iniciativa popular destinando a fazer mudanças pontuais na legislação eleitoral.

Paralelamente, um conjunto de movimentos sociais e organizações sindicais, entre os quais se alinham a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o Movimento dos Sem Terra, defendem a proposta de uma constituinte exclusiva para a reforma. No meio da campanha, no dia 13 de outubro, representantes desse movimento se reuniram com Dilma para lhe entregar o resultado de um plebiscito simbólico organizado no dia 7 de setembro, no qual, de um total de 7,7 milhões de votantes, 7,5 milhões apoiaram a constituinte exclusiva. "Vocês defendem uma tese na qual acredito", disse Dilma na ocasião.

No domingo, Dilma voltou ao tema, que pode ser uma das maiores batalhas políticas do segundo mandato.

Renan e Eunício divergem de Dilma e defendem reforma política por referendo

• Presidente do Senado e líder do PMDB na Casa falaram sobre mecanismo para trazer mudanças nas instituições políticas do País diferente do plebiscito proposto por Dilma

Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Caciques do PMDB do Senado decidiram contrariar a intenção da presidente reeleita Dilma Rousseff (PT) de defender como prioridade para um novo mandato a votação de uma reforma política com a realização de um plebiscito. O líder do PMDB do Senado, Eunício Oliveira (CE), e o presidente da Casa, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmaram nesta segunda-feira, 27, serem favoráveis à aprovação da reforma, mas por meio de um referendo.

"O Congresso pode fazer a reforma e, ao fazê-la, tem 30 dias para aprovar um referendo",
afirmou o líder do PMDB, em entrevista ao Broadcast Político, serviço em tempo real daAgência Estado para quem não é preciso esperar o novo Congresso tomar posse, em fevereiro de 2015, para se discutir e votar as eventuais mudanças. "Quem define eleição no Brasil são as resoluções eleitorais e as pesquisas, não são as leis", criticou ele, ao destacar que, na sua defesa de uma reforma política, expressa o sentimento da maioria da bancada do Senado.

No plebiscito, primeiro é realizada uma consulta popular que vai opinar sobre quais temas da reforma o Congresso terá de abordar. No referendo, por sua vez, os deputados e senadores aprovam as mudanças e depois a população é consultada para saber se as aceita ou não.

Derrotado nas eleições ao governo do Ceará no domingo, 26, após vencer no primeiro turno, Eunício Oliveira defendeu a aprovação de uma profunda reforma que aborde dois principais pontos. A primeira sugestão dele é impedir a divulgação de pesquisas de intenção de voto a menos de 20 dias da votação. O segundo ponto é proibir a fixação de regras por meio resoluções ou portarias da Justiça Eleitoral - tais normas seriam firmadas apenas por lei aprovada pelo Congresso, que teria de ser referendada para vigorar.

Mais cedo, o presidente do Senado divulgou nota em que também discordou de Dilma e defende a necessidade de se aprovar uma reforma política por meio de referendo. "Entendo, entretanto, que o melhor caminho é o Congresso Nacional aprovar a reforma - caso contrário poderá pagar caro pela omissão - e submetê-la a um referendo popular, como fizemos na proibição de venda de armas e munições", destacou.

A discussão sobre a melhor forma para se aprovar uma mudança nas regras do jogo político-eleitorais - se plebiscito, como quer Dilma, ou referendo, como defendem os peemedebistas - já opôs a presidente e integrantes da cúpula do PMDB em meados do ano passado, após os protestos que tomaram conta do País. Em julho passado, a ideia de fazer um plebiscito foi abortada com a ajuda do PMDB. Os líderes partidários usaram como álibi a falta de tempo para se organizar para fazer a consulta popular para valer para as eleições de 2014.

Líderes do PP e PSD se dividem sobre reforma política prometida por Dilma

• Decisão sobre plebiscito ou referendo para possibilitar a mudanças políticas é alvo de discussões

Daiene Cardoso e Ricardo Dela Coletta - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Líderes da atual base do governo na Câmara se dividiram quanto à promessa da presidente reeleita Dilma Rousseff de encampar a reforma política por meio de plebiscito popular. O tema foi a principal bandeira levantada por Dilma em seu discurso de vitória, no domingo, em um hotel em Brasília.

O líder do PP na Câmara dos Deputados, Eduardo da Fonte (PE), disse que o partido ainda discute se a reforma política deve ser feita com plebiscito ou referendo. "Vai ter de se discutir bastante isso", disse.

O parlamentar lembrou que a reforma política foi um tema defendido tanto por Dilma quanto pelo candidato do PSDB, senador Aécio Neves, e que este é o momento apropriado para debater o assunto. "Não pode esperar para o segundo ou terceiro ano de governo, tem de ser no primeiro ano", defendeu.

Eduardo da Fonte disse que o texto da reforma "não pode ser redigido por A ou B" e deve sair do Congresso Nacional.

Já o líder do PSD, deputado Moreira Mendes (RO), criticou a proposta de plebiscito. "Isso é jogar o jogo deles. É o caminho para mudar a democracia representativa pela participativa", afirmou o parlamentar, que disputou uma vaga ao Senado neste ano, mas não foi eleito.

Reforma política e regulação da mídia serão prioridades, diz Falcão

• Presidente do PT afirmou que é necessário mobilização da sociedade para se ter mudanças no sistema político e que regulamentação se dirige a veículos de radiofusão

Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - O presidente nacional do PT, Rui Falcão, afirmou que o novo governo da presidente reeleita Dilma Rousseff (PT) terá como prioridades a reforma política e a "regulação do sistema democrático da mídia". "Vamos continuar insistindo para a regulação da mídia; é uma das mais importantes ao lado da reforma política", disse, durante coletiva na capital paulista.

Ele afirmou que a proposta para democratização da mídia se dirige a veículos de radiodifusão e não inclui jornais e revistas e reforçou que não tem a intenção de censurar veículos. "Sobre a democratização dos meios de comunicação, que não afeta a mídia impressa, a Constituição prevê em seu artigo 220 a mais ampla liberdade de expressão do pensamento. Agora, o mesmo item que trata da comunicação social proíbe a existência de oligopólios e monopólios na comunicação", disse. "Vamos continuar insistindo para regulamentar a Constituição".

Falcão citou a Inglaterra para justificar a existência de agências reguladoras e defendeu a reforma da mídia. "Considero a mais importante depois da reforma política. Espero que nosso governo junto com o Congresso possa avançar nessa direção, assim como a maioria dos países democráticos têm agencias reguladoras, como a Inglaterra."

O presidente do PT afirmou ainda que o projeto apresentado pelo ex-ministro Franklin Martins pode ser "um bom ponto de partida" para que o processo de reforma da mídia seja discutido.
Falcão afirmou que a dificuldade de conseguir mudanças na mídia por meio do Legislativo se deve ao fato de muitos parlamentares possuírem concessões de rádio e TV. "Um dos pontos é não permitir é que aqueles que concedem possam conceder para si mesmos", disse, ressaltando que, para isso, será preciso criar um mandato de transição.

Ele disse também que a reforma política está "na ordem do dia" e que é preciso uma mobilização da sociedade para que ela aconteça. "Só vamos obter com mobilizações", disse. "Pelo Congresso é praticamente impossível", afirmou, destacando que já existe uma proposta da presidente Dilma com 189 assinaturas para que possa ser elaborado o plebiscito da reforma política. "Dilma quer dialogar muito sobre a reforma política".

PMDB resiste à proposta de Dilma para reforma política

• Dirigente petista Rui Falcão afirma que será preciso mobilização social para levar ideia adiante

• Presidente defende consulta popular, mas partido aliado acha que a decisão deve ficar com o Poder Legislativo

Gabriela Guerreiro, Márcio Falcão e Ranier Bragon - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Uma das principais bandeiras do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, a sugestão de realizar um plebiscito para discutir uma reforma no sistema político já enfrenta resistência na cúpula do PMDB, maior aliado da petista no Congresso.

Os peemedebistas defendem uma reforma produzida por deputados e senadores, que, depois, passe por um referendo dos eleitores.

Em seu discurso após ser reeleita, Dilma propôs um plebiscito para que os brasileiros decidam o conteúdo da reforma. Depois, o Congresso elaboraria as mudanças.

As ressalvas começaram a surgir nesta segunda (27). Em nota, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) disse caber ao Legislativo a decisão sobre os pontos de mudança --uma vez que não há consenso sobre o que deve ser alterado nem mesmo entre congressistas.

"Entendo que o melhor caminho é o Congresso Nacional aprovar a reforma --caso contrário poderá pagar caro pela omissão-- e submetê-la a um referendo popular".

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), afirmou que a reforma política é necessária.

"Vou conversar um pouco mais, mas a tese predominante é do referendo", afirmou.
O deputado Eduardo Cunha (RJ), líder da bancada do PMDB e um dos que devem postular a presidência da Câmara a partir de 2015, também sinalizou ser contra.

"Não refuto nada previamente, tem que ver qual será exatamente a proposta, mas se for apenas uma tentativa de substituir o Parlamento por consultas populares, dificilmente será acolhida".

A ameaça de rejeição da cúpula do PMDB sinaliza que Dilma terá que reconstruir pontes com seus principais aliados no novo Congresso para não enfrentar dificuldades em matérias essenciais.

O PT avalia que recompor a base na Câmara é prioridade. Apesar de ter maioria na Câmara e no Senado, em seu primeiro mandato Dilma foi alvo de rebelião liderada pelo PMDB --o que pode voltar a ocorrer em 2015.

Nesta segunda, o presidente do PT, Rui Falcão, reconheceu as dificuldades para aprovar uma reforma política.

"Só vamos obter reforma política através de plebiscito com essas mobilizações [de movimentos sociais]. Só pelo Congresso, seja com a atual configuração, seja na futura, é praticamente impossível". Segundo ele, a reforma política e regulação dos meios de comunicação são prioridades.

Maior interlocutor do Planalto com o PMDB, o vice-presidente, Michel Temer, deve aproveitar uma reunião do partido sobre o balanço das eleições nas próximas semanas para elaborar um diagnóstico sobre a reforma, que será levado depois à Dilma.

Nas últimas discussões no Congresso, o PMDB defendeu temas incômodos e que são rejeitados pelo PT, como o fim da reeleição e o financiamento privado de campanhas.

Em 2013, o PMDB ajudou a enterrar a primeira proposta lançada por Dilma de plebiscito para a reforma, que surgiu como resposta aos protestos de junho. Apenas PT e PC do B apoiaram o texto.
Pressionada, a petista sugeriu um plebiscito para discutir mudanças no financiamento de campanhas e no sistema de votação, o fim dos suplentes no Senado, do voto secreto no Congresso e das coligações partidárias para eleições de parlamentares.

A ideia esbarrou em dois pontos básicos: nas reações de políticos que entenderam que a presidente atropelou o Congresso e na avaliação de que não haveria tempo hábil para elaborar o plebiscito.

Proposta de reforma política não é a mesma defendida pelo PT

• Presidente encampa ideia de CNBB, OAB e movimento de combate à corrupção

Thiago Herdy – O Globo

SÃO PAULO - A presidente reeleita Dilma Rousseff sinalizou apoio a uma proposta de reforma política diferente da defendida pelo seu próprio partido. O PT e um grupo de quase 500 organizações da sociedade civil ligadas a ele defendem a realização de um plebiscito para decidir sobre o chamamento de uma Assembleia Constituinte Exclusiva para discutir formatos de financiamento, votação e distribuição de vagas.

A proposta encampada por Dilma no último debate antes das eleições é a defendida por outro grupo de entidades, capitaneadas pela CNBB, OAB Nacional e o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que não prevê plebiscito para convocação de Constituinte, mas alterações nas leis eleitoral e de partidos, em estratégia semelhante à que resultou na aprovação da Lei da Ficha Limpa.

- Se a conjuntura demonstrar que não teremos reforma política sem referendo ou plebiscito, estamos de acordo que se faça. Mas achamos desnecessária e arriscada a convocação de Constituinte - afirma o presidente da OAB Nacional, Marcus Vinicius Furtado Coêlho.

Embora diferentes na principal estratégia, as propostas do PT e de OAB, CNBB e MCCE guardam semelhanças, como a substituição do financiamento empresarial pelo financiamento público e de pessoa física, como forma de diminuir o poder econômico sobre as eleições. Em vídeo gravado em site do projeto petista, o ex-presidente Lula defende a paridade de gênero na seleção de candidatos, que também está no projeto da OAB, da CNBB e do MCCE.

A proposta que Dilma disse apoiar prevê eleições proporcionais em dois turnos: no primeiro turno o voto seria dado ao partido, atendendo à plataforma política e a uma lista preordenada de candidatos. No segundo turno, o voto seria dado ao candidato. Iriam à segunda etapa apenas os candidatos equivalentes ao dobro das vagas obtidas por cada partido. Assim, o partido que obtivesse cinco vagas no parlamento, disputaria o segundo turno com os dez primeiros nomes de sua lista de candidatos, por exemplo, cabendo ao eleitor dar a palavra final sobre quais serão os eleitos.

- O atual movimento político está desgastado, campanhas milionárias afastam o eleitor de seus representantes. É preciso pensar um novo modelo. Hoje, o eleitor vota em um candidato, e seu voto contribui para eleger outros candidatos que ele não sabia que estava elegendo. Isso está na raiz do problema da representatividade - afirma o presidente da OAB Nacional.

O cientista político da Universidade de Brasília David Fleischer acredita que toda discussão sobre a reforma política deve se dar no âmbito do Congresso, e não por meio de plebiscito.

- Isso vai tumultuar o processo, tumultuar o ambiente, já tentaram duas vezes no Congresso e foram derrotados - analisa.

Fleischer avalia que Dilma terá dificuldades para defender sua proposta, em função da força dada ao PMDB, "que não quer mais do mesmo, quer mais, e ponto", em sua avaliação.

- Se Eduardo Cunha (PMDB) for, de fato, o presidente da Câmara, sai de baixo, que Dilma não consegue nada - opina.

Fleischer acredita que o formato ideal para discussão do tema seria a formação de uma comissão mista, com representantes da Câmara dos Deputados e do Senado, e participação de diferentes partidos.

O cientista político da Fundação Getulio Vargas Cláudio Couto também diz não ser otimista sobre a possibilidade de prosperar a discussão da reforma política pelo sistema atual, em função do perfil do novo Congresso.

- Se a eleição para presidente tivesse sido acachapante, o governo tivesse obtido a maioria do Congresso, seria diferente. Mas ocorreu o contrário, a diminuição do apoio. Dilma sai da campanha com legitimidade, mas é difícil a proposta prosperar - acredita.

Nova composição do Congresso promete dificuldades à presidente

• Oposição mais sólida, feridas da eleição e Eduardo Cunha são novos desafios

Júnia Gama e Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA - A vitória apertada de Dilma Rousseff nas urnas e a nova composição do Congresso trazem a perspectiva de um mandato ainda mais difícil para a presidente reeleita, que viveu momentos de tensão com deputados e senadores nos seus primeiros quatro anos de governo. Além de enfrentar uma oposição mais sólida, Dilma viverá um novo desafio com os partidos que integram sua base aliada e terá de curar feridas da eleição. Dilma também se vê diante da possibilidade de ter, com Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um comando rebelde na Câmara.

Tanto no Senado quanto na Câmara, Dilma terá de lidar com uma nova correlação de forças que não tende a ser amigável. A eleição de senadores oposicionistas de peso - como os tucanos José Serra, Antonio Anastasia, Tasso Jereissati e Aécio Neves, e Ronaldo Caiado, do DEM - é promessa de uma oposição mais forte e barulhenta.

Além disso, parlamentares "aliados" que se sentiram prejudicados pelo PT nas disputas estaduais, como é o caso do líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira, podem dificultar a vida da presidente. Eunício foi derrotado na disputa ao governo do Ceará pelo petista Camilo Santana e atribui sua derrota ao apoio do ex-presidente Lula ao adversário.

Entre os deputados, a relação estremecida que Eduardo Cunha manteve com Dilma no primeiro mandato irá requerer muita atenção. Para o deputado, as eleições presidenciais mostraram um país rachado, e o PT terá que saber negociar.

- A conciliação para a divisão da sociedade que se viu na eleição se dará no parlamento. Não dá para o partido que venceu as eleições ficar hegemônico - disse Cunha.

O deputado sinaliza que embora continue na base aliada, o PMDB não votará propostas que são contrárias ao que defende, como a criação dos conselhos populares e qualquer proposta de regulação da mídia. Tanto o PT quanto o PMDB saíram das urnas com bancadas significativamente menores na Câmara. O PT sai com 70 deputados, (tinha 88) e o PMDB, com 66 (eram 71).

Dilma também terá que enfrentar uma oposição sedenta por fatos desestabilizadores, como as delações do doleiro Alberto Youssef sobre a Petrobras. O líder do PSDB na Câmara, Antônio Imbassahy (BA), já se reúne com os líderes de outros partidos para tomar as primeiras providências.

- Contamos com o Ministério Público e o juiz Moro, que são independentes. A crise vai cair no colo da presidente. Quando isso chegar a ministros e governadores como vai ser? Haverá uma crise institucional - disse Imbassahy. ( Colaborou Maria Lima e Cristiane Jungblut)

Fusão de partidos em oposição a Dilma

• PSB, PPS e Solidariedade estudam criação de legenda; sem governador, DEM analisa futuro

Sérgio Roxo e Isabel Braga – O Globo

SÃO PAULO e BRASÍLIA - Passada a eleição, o PSB, o PPS e o Solidariedade vão começar a discutir a partir de hoje uma fusão que pode resultar no terceiro maior partido da Câmara, com 59 parlamentares. A nova legenda faria oposição ao governo da presidente Dilma Rousseff e teria como principal objetivo viabilizar uma alternativa política no país à polarização entre PT e PSDB.

O PSB elegeu 34 deputados, o Solidariedade, 15, e o PPS, 10. O PT terá a maior bancada na nova Legislatura, com 70 representantes. O PMDB ficará com 66 no próximo ano. A terceira maior bancada, por enquanto, é do PSDB, com 54 deputados.

Há um entrave, porém, para as negociações: a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que proíbe deputados de outros partidos de migrarem para legendas oriundas de uma fusão. Pela súmula em vigor, somente parlamentar das siglas que se fundiram poderiam mudar de agremiação sem colocarem em risco seus mandatos.

A vitória de Dilma Rousseff, na avaliação do deputado Júlio Delgado, da Executiva do PSB, favorece o projeto de fusão, que já vinha sendo discutido desde o fim do primeiro turno.

- Numa análise preliminar, digo que o resultado da eleição, do jeito que aconteceu, fortalece a tese da fusão diante da necessidade de surgimento de uma nova força política por conta da divisão do país.

O presidente do PSB, Carlos Siqueira, afirma que as negociações, por enquanto, se dão apenas com o PPS.

- É tudo muito inicial ainda.

O presidente do PPS, Roberto Freire, acredita que as regras do TSE podem ser um empecilho.

- Uma alternativa intermediária seria formar um bloco na Câmara - afirmou Freire.

Já o presidente do Solidariedade, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, disse que a fusão começará a ser discutida na reunião de hoje dos partidos de oposição no Congresso.

Com uma bancada eleita de 22 deputados, o DEM também avalia fusão com outras legendas. Segundo o prefeito de Salvador, ACM Neto, a possibilidade de se unir ao PSDB está descartada.

- Estamos iniciando a discussão interna, não há pressa, teremos o tempo necessário para avaliar o cenário e amadurecer a questão. Mas é preciso o partido se movimentar para que ele tenha uma perspectiva de crescimento. O que temos, por enquanto, são algumas premissas, vamos manter um agrupamento de oposição, é preciso identidade de projeto e não vamos nos juntar com qualquer um.

O presidente do partido, senador Agripino Maia, afirmou que uma reunião ainda será marcada para "avaliar melhor os rumos" do DEM. Se as eleições de 2014 revelaram uma oposição fortalecida tanto na disputa presidencial quanto no Congresso, o mesmo não se pode dizer em relação ao principal partido conservador do país: o DEM. Na eleição de 2010, a legenda, que vem perdendo força desde que o PT chegou ao poder, em 2003, elegeu dois governadores, Raimundo Colombo, em Santa Catarina, e Rosalba Ciarlini, no Rio Grande do Norte. Na Câmara, haviam sido eleitos 43 deputados federais e reeleitos dois senadores, ampliando para quatro a bancada do Senado. Quatro anos depois, o partido, que tem origem na Arena e na década de 90 rivalizava com o PMDB como elemento de sustentação do governo Fernando Henrique Cardoso, não conseguiu eleger nenhum governador e viu minguar para 22 sua bancada na Câmara. No Senado, terá, em 2015, cinco senadores, tendo como principal reforço o do ex-deputado, eleito senador, Ronaldo Caiado (GO).

Segundo o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), embora tenha eleito 43 deputados em 2010, no meio deste mandato, o partido perdeu 17 deputados para o novato PSD, o que fez com que sua bancada fosse reduzida a 27 deputados. Para Mendonça Filho, do ponto de vista numérico, a atuação do DEM no próximo Congresso será parecida com a da atual legislatura.

- O cenário é de extrema pulverização na Casa e, embora numericamente menor, somos 22 em uma representação de 28 partidos. Para oposição, onde estaremos em relação ao atual governo, é melhor seis partidos do que dois ou três, a fragmentação é boa. A capacidade de obstrução das votações é maior, podemos fazer mais discursos _ disse o líder do DEM, acrescentando:

- No Senado, somos cinco senadores. Um número bom.

Dilma assumirá novo governo com "graves fragilidades", afirma Freire

Nadja Rocha - Portal do PPS

“Na democracia, o respeito às urnas é fundamental”, disse, nesta segunda-feira (27), o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), ao comentar a vitória da presidente Dilma Rousseff sobre o senador Aécio Neves (PSDB-MG) com uma margem apertada de votos. Para ele, essa eleição foi a mais renhida disputa desde a redemocratização do país.

Embora tenha sido reeleita, Freire disse que a petista iniciará um novo governo com graves fragilidades, uma delas é a “gestão incompetente” na economia.“Isso se reflete nos péssimos indicadores econômicos. E a presidente não fez nenhuma sinalização de que essa situação deva se reverter”, afirmou.

Segundo o parlamentar, Dilma assume um novo mandato tendo que se explicar para a sociedade sobre seu suposto envolvimento no escândalo da propina da Petrobras. Na última sexta-feira, a Revista Veja divulgou trecho de um dos depoimentos do doleiro Alberto Youssef, operador do petrolão, à Justiça Federal, no qual ele revela que “Dilma e Lula sabiam de tudo”.

“Essa denúncia é gravíssima e coloca a presidente no epicentro desse escândalo. Dilma deve explicações”, cobrou Freire.

Ao destacar o fortalecimento das oposições tanto na sociedade como no Parlamento, Roberto Freire defendeu que esses partidos devam lutar para superar o “discurso do ódio” que foi utilizado na campanha do PT.

“É importante impedir a continuidade desse discurso exacerbado de Dilma e de Lula que dividiu o país entre ricos e pobres, nós e eles, norte e sul. Não se constrói uma nação com essa prática condenável”, criticou o parlamentar.

Reforma política e plebiscito

• Analistas ressaltam papel importante da pressão popular para que regras possam ser aprovadas, mas divergem no grau de decisão que a população deverá ter em eventual consulta por mudança das normas

Eduardo Miranda – Brasil Econômico

Mais importante reforma do próximo mandato de Dilma Rousseff, segundo a própria presidenta em discurso de vitória na noite de domingo, a reforma política apresenta um leque tão variado de propostas que talvez seja este o maior empecilho para ela ir adiante. Analistas concordam, no entanto, que a pressão popular será fundamental para que o parlamento brasileiro perceba a urgência da implementação da reforma. Atualmente, há em curso um Projeto de Lei de iniciativa popular de uma coalizão que reúne 104 entidades da sociedade civil e que vêm discutindo alguns dos pontos da reforma. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é uma das entidades à frente do movimento e está contemplando quatro questões fundamentais, "partindo da constatação da crise de representação ligada ao nosso sistema eleitoral", segundo o secretário da Comissão Especial de Mobilização de Reforma Política do Conselho Federal da OAB, Aldo Arantes.

"Nossos principais pontos dizem respeito ao financiamento democrático de campanha, ao voto proporcional em dois turnos (no primeiro turno, seria voto no partido), o estímulo à participação da mulher na política e a democracia direta por meio de plebiscitos em que questões relevantes sejam submetidas à população", enumera Arantes, frisando que a reforma dependerá da participação da sociedade no debate nacional: "Queremos coletar 1,5 milhão de assinaturas, isso pode assegurar que o Congresso seja sensibilizado". Para o cientista político Murillo de Aragão, da Arko Advice, apesar da dependência do Congresso para aprovar a reforma, a presidenta Dilma deve assumir o papel que ela reivindicou para si, no sentido de liderar o movimento. "Para encaminhar a reforma, ela precisa convocar os três poderes e assumir a liderança. Ninguém queria aprovar a Lei da Ficha Limpa, mas terminou aprovando por pressão da sociedade civil, da imprensa e de diversos setores", compara Aragão.

Outro ponto de dissenso e que provoca receios entre parlamentares desde quando se iniciou o debate sobre a reforma diz respeito ao momento em que cada tópico será colocado em prática no sistema partidário e eleitoral. Por isso, Aragão afirma que o maior empecilho à aprovação da reforma não é o que será contemplado. "O maior problema é o tempo de entrada da reforma. Por isso, deve haver um cronograma que permita a implementação em etapas. O ideal é saber onde existe consenso, para aprovar com rapidez. Onde houver dissenso, (teremos) mais tempo para discutir", defende Aragão, adiantando que mudanças no financiamento de campanha tendem a provocar menos discordâncias, enquanto o número de deputados por estado na Câmara deve ser discutido por um prazo maior.

Diante das dificuldades que possam surgir com o novo Congresso, que ganhou mais representantes conservadores, Rafael Kritski, líder do Levante Popular da Juventude, que conduziu, junto com outras entidades e movimentos sociais, o plebiscito popular pela reforma política, defende que os beneficiários do sistema atual não deveriam participar da elaboração da reforma. "Propomos um processo diferente, por exemplo, da Constituinte de 1988, em que, por imposição do presidente José Sarney, representante colocado pela ditadura, a assembléia foi conduzida por aqueles que já estavam submissos às regras do sistema político", argumenta Kritski.

Posição ainda mais progressista é a defendida pelo cientista político Júlio Aurélio Vianna Lopes, da Fundação Casa de Rui Barbosa. Junto de um grupo de acadêmicos, ele pretende apresentar ao Congresso e à presidenta Dilma a proposta de plebiscito que delegue à população o poder de responder sim ou não a aproximadamente oito questões sobre os sistemas partidário e eleitoral e sobre as configurações institucionais. "Apesar da boa intenção das entidades que estão envolvidas na proposta da reforma, elas complicam politicamente, porque têm o projeto com vários pontos definidos e buscam tornar esse projeto norma constitucional através de consultas à população.

Eles chamam de plebiscito, mas a rigor a proposta é fechada. Estou propondo que o consenso surja da consulta. O melhor sistema é aquele ao qual a população aderir. Se escolher mal, que escolha. Esse risco é intrínseco ao aprendizado democrático", afirma o pesquisador. Vianna espera vencer o receio do Congresso, de que ele estaria alijado do processo decisório. "Não é uma destituição do Congresso. Só ele poderá conformar as normas votadas pela população".

‘Dilma não tem direito a lua de mel’, afirma Aloysio Nunes

• Vice da chapa de Aécio promete ‘não dar trégua’ à presidentee adverte que oposição ‘firme’ e ‘sem transigência’ começa agora

Débora Bergamasco e Ricardo Chapola - O Estado de S. Paulo

Um dia depois da derrota de Aécio Neves na disputa presidencial, o candidato a vice da chapa tucana, Aloysio Nunes Ferreira, disse ontem que a presidente Dilma Rousseff "não tem direito à lua de mel" e prometeu fazer oposição "firme" e "sem transigência". Aloysio e Aécio são senadores eleitos em 2010 - o primeiro, por São Paulo, e o segundo por Minas - e retornam às atividades parlamentares após o fim das eleições.

"Não tem por que diminuir a intensidade da oposição. Ela (Dilma) não tem direito à lua de mel que todo governante recém-eleito tem quando tem novo mandato", afirmou Aloysio ao Estado. "Nós vamos trabalhar para cobrar aquilo que ela prometeu (na campanha), para revelar aquilo que ela escondeu. Ela não terá trégua da nossa parte." Para Aloysio, o PSDB deixou as eleições deste ano "com um mandato": o de endurecer a oposição.

Com a derrota de Aécio, o PSDB está focado a partir de agora em manter o tom duro de oposição a Dilma usado ao longo da campanha eleitoral. O partido tem como objetivo levar ao Congresso um discurso afinado com o adotado pelo partido principalmente em São Paulo, onde capitalizou praticamente sozinho o sentimento antipetista dos eleitores. Além de Aécio e Aloysio, o PSDB contará com outros nomes combativos da sigla para defender essa nova postura, como José Serra (SP), Alvaro Dias (PR) e Tasso Jereissati (CE). Em 2015, a bancada do PSDB no Senado será menor: a legenda conta hoje com 12 parlamentares e terá 10 a partir do ano que vem.

Na Câmara dos Deputados, onde o PSDB aumento sua bancada - saltou de 44 para 57 parlamentares -, o partido já se articula para fortalecer a oposição. Hoje, representantes de partidos do bloco oposicionista se reunirão na casa do deputado Mendonça Filho (DEM-PE) para começar a alinhar discursos e traçar estratégias.

"Nós não vamos afrouxar as nossas convicções. Quem ganha governa. Quem perde fiscaliza", disse o deputado reeleito Duarte Nogueira (PSDB-SP), que participará do encontro em Brasília. "Nossa oposição vai ser muito intensa e durante todo o mandato (de Dilma). Vamos cobrá-la dos compromissos assumidos."

Diálogo. Alguns parlamentares são céticos sobre a disposição de Dilma em dialogar com a bancada oposicionista no segundo mandato. O deputado Marcus Pestana, presidente do PSDB em Minas, disse que a presidente "não tem vocação para o diálogo" e é dona de uma "índole autoritária".

'Em momento algum a presidente propôs um diálogo com a oposição. Ela não teve a humildade de mencionar nada em relação aos 48 milhões de eleitores que a rejeitaram e o que fez foi um discurso em que reafirma a continuidade", afirmou o deputado mineiro. "E não acho que depois de certa idade as pessoas mudem. Não creio nessa conversão súbita, não creio que mude sua índole autoritária. Nossa oposição não vai titubear em vocalizar o desejo de metade do Brasil."

Para Duarte Nogueira, conversar com a oposição seria "um bom começo" da presidente. O tucano sugeriu que Dilma fizesse o mesmo que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua gestão, segundo quem não fechou os canais de diálogo com representantes de fora da base aliada.

"Se ela (Dilma) quiser, para efeito de início de diálogo, pode sentar para conversar com a gente para explicarmos as nossas teses, que podem ser unidas às ideias que ela já tem. Fica aqui minha sugestão", disse.

Eleição acabou, mas partidos já se preparam para a próxima – Valor Econômico / Editorial

Uma eleição é apenas o prelúdio de outra e, mal contados os votos, as peças da próxima disputa presidencial já se movem no tabuleiro político. A montagem da nova equipe ministerial de Dilma Rousseff abre o leque de indicações de futuros candidatos bem posicionados ao Planalto em 2018. As movimentações de Lula darão sinais na mesma direção. No PSDB, mesmo a votação de 51,64 milhões para o senador Aécio Neves, a maior para um tucano em eleições em que enfrentou o PT, não lhe garante posição cativa para tentar novamente retirar os petistas do poder. Marina Silva, com mais de 20 milhões de votos, eliminada no primeiro turno, continua em busca de um rumo para construir uma candidatura mais sólida.

Tudo será definido, em última instância, pelo sucesso ou fracasso do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Sem que ela modifique os rumos de sua política, é possível que o desejo de Agripino Maia, presidente do DEM e coordenador da campanha derrotada de Aécio Neves à Presidência se cumpra e o país assistirá à "contagem regressiva" do domínio petista no governo federal. Interpretações de alas petistas de que a eleição, em que um candidato da legenda menos votos recebeu, e a mais apertada desde 1989, ratificou apoio à política econômica atual apenas mostram que lições óbvias das urnas não foram assimiladas.

Ainda que seja uma simplificação, entre a plena autonomia e tutela de Lula os destinos de Dilma balançam. Um segundo mandato liberta a presidente de boa parte dos compromissos com o futuro, mas não em um partido como o PT. Um bom governo de Dilma será essencial para a continuidade do projeto petista e para a própria presidente, cuja marca na história que gostaria de deixar seguramente não seria a de uma coveira desse projeto. O primeiro mandato, porém, não foi bom e o PT e Lula se mostraram muito preocupados com isso durante a campanha.

Ao que se sabe, o ex-presidente Lula tem mais reparos ao estilo político de Dilma, pouco afeito ao diálogo com o Congresso, políticos, empresários etc, do que com seu receituário econômico. Se for isso, um reforço na coordenação política seria suficiente para que um nome de consenso entre ambos para a sucessão fosse em frente. Do lado de Lula, parece claro que sua disposição é entrar na disputa se o PT estiver seriamente ameaçado de perder o poder. Ele tem se inclinado por novas lideranças, mas suas apostas nas eleições de 2014 deram errado - Lindbergh Farias, Gleisi Hoffmann e Alexandre Padilha.

O próximo candidato petista terá de ter a visibilidade de um governo, e por isso os nomes que surgem são os de Fernando Pimentel, que ajudou a derrotar Aécio em seu próprio Estado, ou o de Fernando Haddad, o prefeito paulista cuja projeção política está mudando para melhor, depois de um início difícil. Não se sabe por quem se inclinaria Dilma, mas isso poderá ficar claro com a indicação dos postos de maior projeção política do novo ministério.

O segundo mandato da presidente será mais conturbado que o primeiro, e não apenas no front econômico. O novelo de escândalos que aflige a Petrobras apenas começou a ser desenrolado e, pelo pouco que veio à tona com a delação premiada de Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Yousseff, há potencial suficiente para destruir caciques petistas e da base aliada, assim como seus grandes financiadores de campanha.

Lula, um observador sagaz, comentou que ficou insatisfeito com a facilidade com que a pecha da corrupção colou no partido. Essa foi uma mancha com peso eleitoral e que facilitou o trabalho da oposição, ainda que ela mesma tenha telhado de vidro. O escândalo da Petrobras pode abrir uma crise política, e é um dos pontos que permitem antever que Dilma, PT e Lula precisarão agir na mesma direção ao longo do próximo governo.

Aécio teve grande desempenho eleitoral, mas perdeu em seu território e só ganhou a densidade que teve no maior colégio eleitoral, São Paulo, com a chancela de Geraldo Alckmin e dos caciques paulistas da legenda. Alckmin é um candidato óbvio ao Planalto. Marina Silva, a outra voz com votos da oposição, precisa definir o que quer. Ela terá de optar por construir o Rede ou permanecer no PSB. Seu apoio a Aécio trouxe dúvidas sobre sua capacidade de transferir votos. Das 41 cidades em que Marina venceu no primeiro turno, Aécio só ganhou em 4 no segundo. Mas ela tem muita força eleitoral para ser desprezada.

A mensagem das urnas – O Globo / Editorial

• A eleição presidencial mais parelha dos 125 anos de República deixa o país dividido entre os que produzem e pagam impostos e os beneficiários de programas sociais

A 21ª eleição presidencial direta ganha o merecido destaque nos 125 anos de história da República brasileira. O seu desfecho foi não só o mais parelho desde 1989, quando Collor venceu Lula, como de todos os tempos, com a vitória da candidata petista à reeleição, Dilma Rousseff, por apenas 3,2 pontos percentuais sobre o oposicionista tucano Aécio Neves, metade da já estreita margem observada em 89: 51,64% contra 48,36%, uma diferença, em grandes número, de 3 milhões de votos, equivalente a um eleitorado pouco maior que o da Paraíba. O desenho esboçado no primeiro turno, com a divisão do país em dois grandes blocos, recebeu traços mais fortes: grosso modo, o Norte-Nordeste perfilado ao PT, o Sudeste-Sul-Centro/Oeste com a oposição. Fica evidente que o país que produz e paga impostos — pesados, ressalte-se — deseja o PT longe do Planalto, enquanto aquele Brasil cuja população se beneficia dos lautos programas sociais — não só o Bolsa Família —, financiados pelos impostos, não quer mudanças em Brasília, por óbvias razões.

Este comportamento eleitoral previsível foi explorado pelo PT. A campanha de Aécio denunciou uma série de golpes baixos desfechados para aterrorizar beneficiários desses programas — considerando os dependentes, apenas o Bolsa Família congrega uma clientela de 50 milhões de pessoas, um quarto da população brasileira, muitos deles eleitores. Há registro de mensagens recebidas por bolsistas de que Aécio acabaria com o BF, o mesmo tendo ocorrido com participantes do Minha Casa Minha Vida. Quem teria acesso a esses cadastros a não ser gente do governo? A arma do terrorismo é peça de artilharia da marquetagem eleitoral já conhecida. Mas, desta vez, seu emprego teria aumentado de escala.

Partidos do governo, num país como o Brasil, de grandes desníveis sociais e regionais, costumam cavar trincheiras nas áreas mais pobres, por serem elas as mais dependentes de repasses de recursos públicos. Não é novidade. A ressalva está na demarcação de um forte sentimento antipetista no Sudeste, Centro-Oeste e Sul, mais que em outros pleitos.

A avassaladora antipetização do Estado de São Paulo, o mais populoso e rico da Federação, leva mensagem que precisa ser decifrada pelo Planalto e partido. O mais otimista tucano não poderia esperar que um mineiro receberia 15,3 milhões de votos no estado, 64,3% do colégio eleitoral paulista, contra 35,6% confiados a Dilma. Foi dura a derrota do PT no estado em que nasceu, inclusive na região específica do ABC, na qual o movimento sindical dos metalúrgicos, na década de 70, gerou Lula e outras lideranças do partido e da CUT.

Em contrapartida, o mais pessimista tucano não imaginaria que Aécio perderia na própria Minas, no primeiro turno e no segundo. No primeiro, além de ficar atrás de Dilma, não conseguiu que seu candidato Pimenta da Veiga impedisse Fernando Pimentel (PT) de vencer a eleição para governador no primeiro turno. No segundo, o máximo que o tucano conseguiu foi reduzir danos, perder para Dilma por uma diferença menor (52,4% a 47,6%). O equívoco na escolha para disputar Minas de um político já desligado do Estado, uma demonstração de excesso de confiança, se somou à enorme e nada surpreendente vitória de Dilma no Nordeste e Norte para explicar a derrota de Aécio, na maior chance que a oposição teve de voltar ao Planalto desde a primeira vitória de Lula, em 2002.

Foi, portanto, com justificada alegria que Dilma, Lula e correligionários subiram ao palco, num hotel em Brasília, na noite de domingo, para comemorar a difícil vitória. O fato de Dilma e Lula estarem de branco, e uma bandeira do Brasil ficar exposta no púlpito, foi um símbolo positivo: os dois fizeram questão de não trajar o vermelho partidário, forma de sinalizar uma adequada preocupação em engavetar, pelo menos naquela hora, a paixão partidária. Que continue assim.

No primeiro discurso como candidata reeleita, a presidente reforçou a mensagem simbólica ao dar um importante aceno, mesmo sem admitir a divisão do país: “algumas vezes na história, os resultados apertados produziram mudanças mais fortes e rápidas do que as vitórias amplas. (...) Minhas primeiras palavras são de chamamento da base e da união. (...) Esta presidente está disposta ao diálogo, e esse é meu primeiro compromisso no segundo mandato: o diálogo."

O discurso, infelizmente, teve partes contraditórias, como se houvesse sido escrito por dois redatores diferentes. Esta parte da proposta de diálogo, e uma outra, em oposição ao entendimento, de defesa de uma reforma política por meio de plebiscito, já rejeitada pelo Congresso, no ano passado, quando a ideia foi gestada em frações nacional-populistas do PT, em meio às manifestações de junho, e levadas a Dilma.

Ora, se em 2013 a ameaça de inspiração chavista de escantear o Congresso por meio de uma consulta popular para viabilizar projetos petistas — eleição em lista fechada, financiamento público de campanha, etc — já não prosperou, na próxima legislatura é que não vingará mesmo. Afinal, no Congresso que assume em 2015, o PT continuará o maior partido da Câmara (70 deputados), porém com a supressão de 18 cadeiras. O PMDB, contra o plebiscito, perderá menos deputados — 66 contra 71 —, e ainda haverá um PSDB com 54 cadeiras, dez a mais que no Congresso que está em fim de legislatura. Isso sem considerar a forte bancada que a oposição terá no Senado, com a volta dos tucanos José Serra (SP) e Tasso Jereissatti (CE), que se juntam a Aloysio Nunes e Aécio, donos de ainda quatro anos de mandato, tendo o candidato derrotado por Dilma saído da eleição como forte líder das oposições. A melhor alternativa é negociar alterações tópicas e eficazes: cláusula de barreira e fim das coligações em eleições proporcionais.,

Erra Dilma ao anular seu aceno de diálogo com a reafirmação de uma proposta que crispará os ânimos a partir de 2015. Entende-se que ela, no domingo, precisava animar a militância. Mas exagerou. Em vez de semear conflitos, a presidente reeleita deve tratar de começar a desatar nós cegos que existem na economia — razão pela qual os mercados regiram ontem com mau humor aos mais quatro anos deste governo. Esta urgente lição de casa passa pela escolha de nomes para postos-chave da área econômica que mostre que a presidente não cometerá o erro fatal de dobrar a aposta numa política fracassada. Os sinais são gritantes: inflação engessada em torno do limite superior da meta (6,5%), estagnação na produção com inexoráveis reflexos no mercado de trabalho — um trunfo eleitoral que se esvai —, contas externas em sério desequilíbrio e contas públicas desalinhadas e em total descrédito.

Este quadro também foi denunciado pela metade do país que ficou na oposição. Faz parte da mensagem a ser entendida.

Dilma 'melhor', só vendo - O Estado de S. Paulo / Editorial

Contados os votos, resta ao País avaliar se, reeleita, Dilma Rousseff conseguirá ser a presidente "muito melhor do que fui até agora" e uma pessoa "ainda melhor", como disse desejar no discurso de vitória. Sem isso, o diálogo que ela anunciou como "primeiro compromisso do segundo mandato" terá como interlocutor apenas o seu espelho. A transfiguração prometida é indissociável da aspiração nacional por mudança, "a palavra dominante" da campanha, conforme reconheceu. Para que venha a dominar também os seus atos nos próximos quatro anos, Dilma não deveria perder de vista que as urnas de domingo foram muito mais severas consigo do que as de 2010. Desde a redemocratização, aliás, nenhum candidato ao Planalto levou a melhor por tão escassa vantagem - 3,2 pontos porcentuais, ou 3,5 milhões de votos, em 105 milhões validados.

A apertada aritmética talvez nem sequer exprima suficientemente o amargor dos antagonismos entre os brasileiros divididos entre manter ou remover o PT do poder - a questão de fundo da disputa recém-concluída que passará para a história, entre outras ignomínias, pela maneira feroz com que a incumbente e o seu partido se lançaram sobre a candidata Marina Silva para estraçalhar as suas chances de chegar ao segundo turno. O fato impossível de desconhecer é que, de tanto ser agredida pela estridente retórica petista de que o Brasil vive um permanente confronto à morte entre "nós e eles", a oposição só teve a alternativa de responder na mesma moeda, contaminando, afinal, o seu próprio eleitorado. A inescapável conclusão é de que o País saiu da sucessão presidencial mais crispado do que nela entrou. Diante disso, ainda que tomando pelo valor de face a sua fala aparentemente conciliadora, será um feito de enormes proporções ela construir uma liderança que dê conta dessa realidade adversa e, a partir daí, comandar o seu desmanche.

De resto, ela mesma já começou dando motivos para o ceticismo. A Dilma de sempre confinou ao palavrório o chamamento à abertura e disposição para o diálogo. De um lado, porque não teve a decência política elementar - para não falar em mera cortesia pessoal - de mencionar o nome do adversário Aécio Neves, a quem superou a duras penas na incerta jornada de horas antes e que, por sua vez, não hesitou em lhe telefonar tão logo se tornaram conhecidos os resultados da disputa. De outro lado, porque voltou atrás no tempo, aos idos de 2013, quando tentou responder ao clamor por mudanças que ecoava pelo País com a proposta de reforma política mediante plebiscito. Qual reforma seria essa e quais seriam os termos de uma consulta popular sobre um tema que não pode ser reduzido a umas poucas disjuntivas a presidente não se deu ao trabalho de esclarecer.

Nem o PMDB, que vinha sendo o esteio da base governista no Congresso, abriu espaço para tal. Abateu sumariamente a tentativa de impor ao Legislativo a agenda petista das regras do jogo político-eleitoral, começando pelo financiamento público das campanhas e a adoção do voto para deputado em listas fechadas, compostas pelas cúpulas partidárias. Agora, a legenda do seu vice, Michel Temer - o qual, à época, manifestou à titular o seu desagrado com o lance oportunista -, só pode se sentir injuriado com a sua exumação. Mesmo que, numa tentativa de dourar a pílula, Dilma tenha concedido que a reforma é de "responsabilidade constitucional do Congresso", como se esta fosse complementar à consulta a resultar de uma discussão do governo "com todos os movimentos sociais e as forças da sociedade civil".

Nesse momento, ademais, a sociedade está de olhos postos em outra questão - os escândalos da Petrobrás. No ano que se aproxima, os desdobramentos judiciais das delações premiadas do ex-diretor de abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa e do seu comparsa, o megadoleiro Alberto Youssef, com a provável identificação da trintena de políticos que teria citado em conexão com a lambança - e que deve incluir parlamentares do PT, PMDB e PP, pelo menos -, representarão um obstáculo de monta para a distensão política que Dilma apregoa. Nesse clima, não convém esperar o advento de uma presidente "muito melhor do que fui até agora".

Devassa na Petrobras – Folha de S. Paulo / Editorial

• Às graves distorções econômicas e institucionais impostas à estatal somam-se os testemunhos sobre vasto esquema de corrupção

Até o ano passado, a Petrobras era objeto de uma discussão em grande parte centrada nos muitos problemas econômicos e financeiros da empresa, causados por interferências equivocadas ou indevidas do governo federal, como a política industrial, o controle de preços e mudanças nas leis e programas de exploração do petróleo.

As primeiras evidências decisivas sobre um vastíssimo sistema de corrupção na estatal relegou o debate econômico ao segundo plano.

No entanto, as degradações de ordem variada de que padece a petroleira derivam todas do descaso federal em relação a princípios institucionais e de racionalidade econômica, da indiferença a normas e à ideia de eficiência. A estatal tornou-se, assim, quase mero instrumento do governo.

Não deveria ser necessário lembrar que se trata de uma empresa de relevância maior na economia brasileira. Apenas seu faturamento equivale a 6% do PIB. No ano passado, a Petrobras pagou R$ 68,6 bilhões em impostos no país, cerca de 1,5% do PIB (no segundo governo Lula, a contribuição da empresa era de 2,1% do PIB).

Somadas as participações governamentais nos rendimentos, como royalties, os pagamentos da estatal aos governos se aproxima de R$ 100 bilhões por ano, o equivalente, por exemplo, a quatro vezes o desembolso com o Bolsa Família.

Essa empresa de grande capacidade técnica tornou-se, lamentavelmente, caso exemplar dos descalabros da administração federal.

Perdeu receita devido à política de controle de preços dos combustíveis, um artifício contraproducente para maquiar a inflação. Foi sujeita à política industrial de conteúdo nacional (dar certas preferências a fornecedores brasileiros).

Dentro de certos limites, tal programa é razoável. Quando atrasa investimentos e deteriora a qualidade de projetos e balanços, fomenta ineficiências em toda a cadeia produtiva nacional.

Um programa de investimentos por demais ambicioso e a receita reduzida fizeram com que o endividamento relativo da empresa triplicasse desde 2009. Observe-se que parte dos investimentos é de uma extravagância perdulária, caso da refinaria Abreu e Lima --para nem mencionar os episódios de superfaturamento.

Não bastassem todos esses problemas, os testemunhos sobre corrupção indicam que os mecanismos de controle da Petrobras não são apenas falhos. A atuação criminosa de pelo menos uma diretoria indica o quanto a estatal está sujeita aos efeitos do nível mais baixo da política e é conivente com o conluio de grandes fornecedoras.

Parece pouco o anúncio de que a empresa contratou duas agências independentes de investigação para apurar as denúncias do ex-diretor Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef.

Politizada, prejudicada financeiramente, sujeita ao arbítrio político, a maior empresa do Brasil foi entregue a interesses privados e partidários bancados pelo governo. É preciso uma devassa na Petrobras.

Merval Pereira - Ao vencedor, os problemas

- O Globo

Só saberemos quais são as verdadeiras intenções da presidente Dilma reeleita quando ela anunciar os integrantes de seu futuro Ministério, especialmente o ministro da Fazenda e o da negociação política. A presidente e o PT saem das urnas enfraquecidos, com menos votos do que jamais conseguiram, tanto para a Presidência da República quanto para o Congresso.

Por região, é possível ver-se a redução de votação do PT. Em 2010, a candidata Dilma venceu em três regiões: Norte, Nordeste e Sudeste. No domingo, venceu no Norte e no Nordeste. Sua votação cresceu apenas no Nordeste, onde obteve 72% dos votos, contra 70% em 2010. No Norte, repetiu o mesmo índice: 57%.

No Centro-Oeste, em vez de um empate virtual em 2010, perdeu de 57% a 43%. Já no Sudeste, apesar da vitória em Minas, perdeu de 56% a 44%. Em 2010, vencera na região de 51% a 48%. No Sul, perdeu de 59% a 41%, quando tivera, em 2010, 46% dos votos.

O novo governo tem pela frente um mandato dificílimo, basicamente devido à própria "herança maldita" com que terá que lidar. Não apenas na parte econômica, mas, sobretudo, no combate à corrupção, com o caso da Petrobras já em processo de delação premiada que levará ao envolvimento de inúmeros políticos do Congresso e do Executivo, com o risco de a própria Dilma e Lula verem-se às voltas com acusações do doleiro Alberto Youssef, como revelaram a revista "Veja" e os jornais "Folha de S. Paulo" e "O Estado de S. Paulo".

Temos, portanto, crises econômicas, políticas e institucionais já programadas, e pouca capacidade negociadora da presidente para enfrentá-las, pelo que apresentou até agora, e mesmo na hora de seu discurso de vencedora. Sua impaciência com os militantes poderia ser até folclórica, se não tivesse permitido os gritos de guerra contra a imprensa profissional independente, na figura da Rede Globo, com um sorrisinho no canto da boca, enquanto o presidente do partido, Rui Falcão, fazia o sinal de positivo.

Seu chamamento à concórdia e ao diálogo poderia ser até bom recomeço, se não viesse acoplado à insistência em fazer reforma política com a aprovação de um plebiscito. Controle da chamada mídia profissional e plebiscito sobre formas de governo são receitas típicas de regimes autoritários de países vizinhos muito ao gosto de setores importantes do atual governo.

Se a presidente Dilma se preparava para fazer um governo marcado por seu toque pessoal, terá agora que negociar duplamente: dentro de seu próprio partido, que passou por um susto tremendo e não vai querer deixar em mãos tão incompetentes o futuro de um projeto político que pretende se perpetuar no poder; e com o Congresso, que terá uma oposição revigorada com a maior votação já recebida desde o fim da era Fernando Henrique, justamente no momento em que o projeto político e econômico do PSDB foi recuperado.

Mesmo perdendo, Aécio fez coisas admiráveis nesta eleição: enfrentou os ataques do PT contra as políticas do PSDB, revigorando o legado do Plano Real e exorcizando a lenda de que perderia votos quem enfrentasse o PT e Lula. A oposição aprendeu nesta campanha a ser oposição de verdade, e será muito mais dura na próxima legislatura, sob a liderança do presidente do PSDB.

A dificuldade que os petistas tiveram para reeleger Dilma só demonstra o esgotamento deste modelo. Os métodos utilizados na campanha para alcançar os objetivos foram muito além do "fazer o diabo" já anunciado pela própria presidente.

A legitimidade de um mandato não se basta em si mesma, mas advém da maneira como foi conquistado. Embora as baixarias da campanha petista tenham ficado num nível comum ao de grandes democracias como os EUA, não é bom sinal que tenhamos importado esse tipo de marketing político negativo, em vez de nos equiparamos a democracias mais avançadas que reprovam instrumentos como esses.

O abuso da máquina pública, por exemplo, é prática ilegal que não encontra equivalente em nenhuma democracia moderna. O PT continua com a maior bancada da Câmara, mas perdeu nada menos que 18 deputados federais. No Senado, continuará sendo a segunda maior bancada, mas com um senador a menos. Elegeu 5 governadores, sendo que a joia da coroa é sem dúvida Minas, arrebatada do grupo político de Aécio.

Mas será o partido que governará a menor percentagem do PIB nacional entre os três maiores, com 16,1%. O PSDB continuará a governar a maior parcela do PIB (44,4%). Em segundo lugar no PIB está o PMDB, com (22,4%), que ficou com o maior número de governadores e dois dos maiores colégios eleitorais, Rio e RS.

João Bosco Rabello - Sinais trocados

– O Estado de S. Paulo

Não foram boas as sinalizações da presidente reeleita, Dilma Rousseff, no seu discurso de vitória, em que sobressai a proposta de uma reforma política plebiscitária, já rejeitada pelo Congresso Nacional quando proposta no auge das manifestações de rua em junho de 2013.

Ali atribuiu-se à falta de resposta imediata ao clamor das ruas por melhor gestão pública, o recurso reforma como panaceia para as mazelas nacionais. Mas sua reinserção no discurso da presidente vitoriosa nas urnas parece desconhecer a ineficiência da proposta para a reversão dos problemas que respondem pelo desgaste de seu governo.

Dilma não mencionou a oposição na sua proposta de diálogo, uma omissão que, em discurso lido, preparado com antecedência, não pode ser debitada a uma falha comum ao improviso dos pronunciamentos feitos no calor das comemorações.

Sua oferta de diálogo pareceu ter como destinatário o eleitor, mesmo finda a campanha, resvalando novamente para a relação direta com a população, que a proposta plebiscitária já traíra no início de sua fala. Disse não ver o país dividido e respaldou a exortação à união na abstrata figura de “uma energia mobilizadora, um bom terreno para a construção e pontes”.

É um mau começo para quem precisa sinalizar a um legislativo que reduziu numericamente a bancada do PT, fortaleceu o PMDB que, por sua vez, sai das eleições dividido em duas alas – a governista e a oposicionista. E que terá um PSDB motivado na oposição , o que não ocorreu em todo o seu primeiro mandato.

Dilma insistiu na crença de que o plebiscito legitimará a reforma política que pretende fazer, abraçando a linha bolivariana do PT que reduz a importância do Congresso Nacional como fórum , este sim, legitimador das mudanças a serem implementadas no país.

A opção por fazer o discurso da vitória em ambiente de militância, transformou o que deveria ser uma peça isenta, em consonância com a proposta de conciliação nacional, em uma comemoração partidária, cuja moldura era formada pelos dirigentes do PT que vocalizam o discurso do “nós contra eles”, que permeou a campanha da candidata vitoriosa.

O palco do pronunciamento teve o desenho de gueto, a denunciar a pressão que o PT tentará exercer sobre o segundo mandato da presidente, sob os aplausos da militância, desprezando a importância do ritual político que simboliza um governo para todos.

Dilma reeleita mostrou-se a mesma Dilma do primeiro mandato, que continua sem pressa na indispensável reconciliação com o mercado, que amanheceu de ressaca com o resultado eleitoral: bolsa em queda de 6%, dólar em alta, a R$ 2,56 e as ações da Petrobras em baixa superior a 14%.

Não houve na campanha, e continua ausente, a informação essencial ao mercado: o que pensa a presidente reeleita , para a economia, em seu segundo mandato. A única menção ao tema foi tão vaga quanta desalentadora, pela sugestão de medidas de varejo: “Promoverei ações localizadas para retomar o ritmo de crescimento e manter a garantia de níveis altos de emprego e salários”.

A corrupção, que seguramente será a principal protagonista do cenário político, mereceu referência breve e genérica: “Terei um compromisso rigoroso com o combate à corrupção, com mudanças na legislação para acabar com a impunidade”.

É surpreendente que a presidente mantenha discurso que associa o combate à corrupção com mais legislação, quando esta já garantiu o avanço das investigações sobre a Petrobrás até o Supremo Tribunal Federal, palco anterior das condenações de dirigentes de seu partido, e de outros da base aliada, sem que fosse preciso uma parágrafo a mais no texto legal.

O descuido com uma cena de vitória mais sintonizada com o momento de divisão eleitoral do país, revela um bastidor conflagrado no PT, que entrou na campanha dividido, inclusive com os dois principais atores do teatro político, o ex-presidente Lula e a presidente reeleita, estremecidos pessoalmente.

O discurso da presidente não contribuiu para a difícil tarefa de dar a um governo reeleito sob forte desgaste político, um clima de novo. Subtraídos os 15 milhões de votos dos beneficiários do bolsa-família obtidos no primeiro turno – e ratificados no segundo -, pode-se dizer que o governo foi politicamente reprovado nas urnas pela maioria da sociedade organizada.

Com o país registrando crescimento abaixo de 1%, sem investimentos, com inflação acima da meta e credibilidade internacional abalada (há expectativa de novos rebaixamentos de crédito), analistas do próprio universo governista temem que a presidente acredite que foi reeleita por seus acertos.

Eliane Cantanhêde - Nós contra nós

- Folha de S. Paulo

Em campanha, Dilma falava em "nós contra eles", comparando os governos do PT aos de FHC, encerrados há 12 anos. De volta à realidade, Dilma vai ter de enfrentar o "nós contra nós", com o PT confrontando os seus quatro anos aos oito de Lula. Ela perde feio.

Dilma venceu a eleição por menos de quatro pontos (51,64%) e já tem três frentes de batalha antes mesmo do segundo mandato: o buraco na economia, os escândalos da Petrobras e uma negociação política difícil não só com sua gulosa base aliada, mas sobretudo com o próprio PT. Onde encaixar os derrotados? São "só" 39 ministérios. E o Sesi é uma mãe, mas não tem vaga para todos.

É quando Lula entra em cena. Dilma é o presente, mas Lula não é só o passado, é o guardião do futuro do PT. Não porque ele seja obrigatoriamente o candidato do partido em 2018, como muitos creem, mas porque há uma simbiose indissolúvel entre Lula e o partido.

Nos dois governos Lula, sobretudo no segundo, os ventos internacionais eram favoráveis, os ministros e o presidente do BC eram fortes, o Brasil era a grande vedete do momento e a economia era considerada um sucesso por pobres e ricos, sindicatos e bancos. O clima mudou, todos esses ativos perderam valor no primeiro mandato de Dilma e até ameaçaram o projeto continuísta do PT.

Na sua segunda chance, Dilma tem duas opções: ouvir Lula, reconhecer os erros e resgatar os pilares da economia e a confiança dos investidores ou, ao contrário, dobrar a aposta. Aí mora o perigo.

Por isso, as Bolsas despencam, o dólar dispara. Mas engana-se quem pensa que é só um chilique do mercado, como o das mocinhas do Leblon, sem consequências. Com a economia e a indústria vacilando, quem mais vai sofrer é o pobre, a classe C.

Os tucanos perdem por não superar a imagem cristalizada de que o PT cuida dos pobres, e o PSDB, dos ricos. Mas, neste momento, como sempre, os pobres é que estão sob risco.

Dora Kramer - Fala mansa

- O Estado de S. Paulo

A vantagem da reeleição é que o País não precisa esperar os dois meses que separam a eleição da posse nem os tradicionais primeiros 100 dias de governo para conferir se a figura do candidato se encaixa na pessoa do presidente. Ou melhor: se o que foi feito para ganhar combina com o que será feito para governar.

A presidente Dilma Rousseff que surgiu reeleita na noite de domingo para discursar em prol do diálogo e da união nacional era outra na forma, mas ainda ficou devendo a prova de que na essência não continua a mesma.

Livre das jogadas ensaiadas que fizeram dela mera repetidora de frases desconexas, Dilma pôde se dirigir à nação com surpreendente fluência. Um alívio, pois se vê que não há nada de preocupante com ela. Apenas, não sendo política de raiz, tampouco é uma atriz. Nem improvisa nem segue com naturalidade o script.

Dilma disse as palavras adequadas no momento certo. A cobrança dos últimos dias eram todas no sentido em que foi construído o discurso. Era o que se esperava dela. Correspondeu bem a essa expectativa, principalmente quando exaltou o valor dos resultados apertados como agentes de mudanças mais eficazes do que vitórias muito amplas.

Foi ao ponto ao estabelecer que falar em união não significa defender unidade de ação e pensamento, pois o espaço para a divergência é sagrado. E foi em frente no comprometimento com reformas, com o reconhecimento de que pode ser uma pessoa de trato bastante melhorado, que a economia necessita de mudança de rumos, que o diálogo com todos os setores precisa ser qualificado, que a corrupção requer duro combate e o Congresso um relacionamento renovado.

As palavras da presidente são completamente diferentes das atitudes da candidata. Em quem o País deve acreditar? Aí depende da disposição de se aceitar, ou não, a teoria do "diabo", segundo a qual pela vitória vale tudo. Ou os fins justificam os meios.

O problema da tese é que quem se orienta por ela pode adotá-la em qualquer situação: na campanha ou no governo. De onde a correção do discurso presidencial logo após a vitória deve ser visto com ressalvas. Primeira delas: tão amoldado à expectativa e contraditório em relação ao que gritava a militância que o ouvia ensandecida contra a "mídia golpista", que autoriza a desconfiança de que seja mais uma peça de marketing.

A suspeita tem base em práticas anteriores. Já vivemos a publicidade da "faxina", da "gerente", da "durona", que hoje promete ser "uma pessoa melhor". Mas, sigamos com fé. Para que essa fé não nos falhe é necessário que a formalidade das palavras seja correspondida pela efetividade dos atos.

A presidente acena com diálogo. Se a memória não comete grave traição, ela fez gesto semelhante ao assumir a Presidência em 2010. A realidade resultou em isolamento. Sim, pode ter havido aprendizado, mas desta vez é preciso explicitar quais as bases, com quem e como o governo pretende estabelecer a interlocução para ganhar crédito. Terá de levar o PT a adotar a mesma orientação de que a crítica não significa "golpismo" e representa apenas uma parcela substantiva da população.

O compromisso com as reformas também não pode se resumir à repetição da proposta já repudiada do plebiscito para a reforma política. Há outras na pauta que implicam disposição do Poder Executivo de enfrentar e arbitrar contenciosos.

Para concluir, o enrosco urgente da Petrobrás. A presidente aborda o tema da corrupção falando em mudanças nas leis. Não poderá, no entanto, passar os próximos quatro anos de olhos fechados para o fato de o PT ter optado por financiar seu projeto de poder por meio de traficâncias no aparelho do Estado.

Raymundo Costa - Diálogo começa pelos governadores eleitos

• Dilma quer votar novo indexador da dívida até dezembro

- Valor Econômico

Da retórica à prática, a presidente Dilma Rousseff começou ontem mesmo a telefonar para os governadores eleitos com os quais deve tratar, no início do próximo ano, do compartilhamento da gestão de serviços públicos, especialmente segurança e saúde, conforme promessa de campanha.

Segundo o ministro Miguel Rossetto, um dos integrantes da coordenação da campanha da presidente à reeleição, "as eleições acabaram". Pode parecer óbvio, mas significa que a presidente deixou para trás o embate eleitoral e está disposta a iniciar o prometido diálogo, inclusive com adversários na disputa que acabou em 26 de outubro.

Diálogo com o Congresso, com o Judiciário, com os movimentos sociais e até com aqueles que mais reclamaram de seus ouvidos moucos, os empresários e o sistema financeiro. Não há previsão de uma conversa com Aécio Neves, o candidato derrotado do PSDB.

O discurso surpreendeu positivamente as alas mais moderadas do PT. Numa tradução livre, Dilma falou que entendeu o recado de mudança enviado pelas urnas, que lhe deram a menor vantagem já obtida por um presidente eleito do PT, e que vai mudar inclusive pessoalmente.

Mudança no governo, mudança pessoal e diálogo. Nos termos de seu slogan de campanha, o "Mais Mudanças"

De acordo com Rossetto, o fim das eleições determina também o fim dos alinhamentos automáticos, o que permite à presidente procurar os governadores eleitos, sejam quais forem seus partidos, sem nenhum constrangimento. "Ela está ligando para todos. No tempo adequado vai chamá-los para uma reunião".

O encontro deve ser feito mais à frente, pois os atuais governadores ainda têm quase dois meses de mandato a cumprir. Com estes Dilma deve tratar do projeto que muda o indexador da dívida dos Estados. A ideia é votá-lo até dezembro, antes do recesso de fim de ano do Congresso

Rossetto, que deixou o Ministério do Desenvolvimento Agrário para se tornar uma espécie de sombra da presidente, durante a campanha eleitoral, conta que a intenção de Dilma é "qualificar a relação federativa". De imediato ela deve tratar com os governadores da emenda constitucional que enviará ao Congresso tratando da gestão compartilhada da segurança pública.

Atualmente a segurança pública é uma atribuição constitucional dos Estados. União e Estados costumam se recriminar mutuamente, sobretudo nos períodos eleitorais, pela crise no setor. O fato é que o crime não tem fronteiras estaduais nem internacionais e o modelo brasileiro para tratar da segurança é obsoleto, para dizer o mínimo. Há um consenso de que precisa mudar.

Com os governadores a presidente deve tratar também do compartilhamento da gestão da saúde. O modelo deve sair da discussão da União com os Estados. A reforma que já tem as bases assentadas é a reforma política. O desenho é o projeto que a presidente propôs como resposta às manifestações de junho de 2013.

À época o projeto não foi bem recebido pelo Congresso, mas o ministro Miguel Rossetto deixa entrever que há um largo espaço para a negociação. Não só com os partidos e o Congresso. A presidente Dilma também pretende ouvir as iniciativas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a CNBB.

"O básico, para o governo, é acabar com o financiamento empresarial que produz campanhas extremamente caras", diz o ministro. Em sua opinião, "há um consenso de que o atual modelo se esgotou. É uma fonte de corrupção e produz uma relação ruim das empresas com a estrutura pública. Essa é a base da cultura da corrupção".

O financiamento empresarial parece com os dias contados no Supremo Tribunal Federal (STF), onde seis ministros já votaram por sua extinção. Mas pode voltar, mesmo depois de uma decisão do Judiciário, por meio de uma legislação congressual. É nesse terreno que o governo deve se movimentar para viabilizar o financiamento público.

"A democracia não pode ser vista como investimento econômico no país", insiste Miguel Rossetto.

O ministro considerou a eleição "difícil, polarizada e politizada" talvez como nenhuma outra desde a redemocratização. "Que eleição discutiu a independência do Banco Central, juros, inflação, superávit primário, emprego e renda, violência contra mulher, bancos públicos e programas sociais como esta"? Segundo o ministro, "a campanha repassou todos os temas da agenda nacional, o que a distingue das outras, e dela saiu uma agenda de reformas e mudanças".

Apesar da estreita diferença de votos em relação à oposição, o ministro Rossetto diz que a presidente da República "sai fortalecida para chamar o diálogo com os movimentos sociais, o Congresso, o Judiciário para negociar uma agenda eleita. Isso o processo eleitoral teve". Nessa agenda, evidentemente, está o tema da "corrupção e eficiência da máquina administrativa".

Pelo que fala Rossetto, o projeto de regulação da mídia pode caminhar num segundo governo Dilma, mas com cautela e sem ferir a liberdade de expressão. O ministro usa palavras duras contra a revista 'Veja', que às vésperas da eleição publicou reportagem sobre o suposto aval de Dilma e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a um esquema de cobrança de propina na Petrobras.

"Todos devem avaliar seu desempenho, todas as estruturas, buscando aperfeiçoar", diz. "Há um fato grave produzido pela editora para manipular a decisão dos eleitores. O TSE considerou ilegal. As decisões foram desconsideradas. A utilização de meios de comunicação social para burlar e fazer campanha é um fato que preocupa e precisamos compreender o que aconteceu, a dimensão dessa 'Operação Abril'. É inaceitável no regime democrático. É um tema que deve ser avaliado", afirma Rossetto.

Para o ministro, a eventual lei dos meios de comunicação tem de levar em conta dois marcos. O primeiro é "a liberdade de expressão e restrição a qualquer tipo de censura à imprensa". O segundo "é o direito à informação democrática e plural fora de um regime de monopólio da imprensa - entre esses dois modelos há uma espaço para discussão", arremata o ministro. Com Rossetto só não há diálogo sobre o que será no futuro governo. Está cotado para a Secretaria Geral da Presidência da República. Mas sobre isso o ministro não fala. Nada.